Language of document : ECLI:EU:C:2023:887

Edição provisória

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

JEAN RICHARD DE LA TOUR

apresentadas em 16 de novembro de 2023 (1)

Processo C14/23 [Perle] (i)

XXX

contra

État belge, représenté par la Secrétaire d’État à l’Asile et la Migration (Estado belga, representado pela secretária de Estado para o Asilo e a Migração)

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Bélgica)]

«Reenvio prejudicial — Política de imigração — Diretiva (UE) 2016/801. — Condições de entrada e de residência de nacionais de países terceiros para efeitos de estudos — Artigo 20.°, n.° 2, alínea f) — Motivo facultativo de indeferimento do pedido de admissão — Pedido que prossegue fins diferentes — Modalidades de apreciação — Consideração da intenção de o requerente prosseguir os estudos — Falta de transposição — Artigo 34.°, n.° 5 — Garantias processuais — Autonomia processual dos Estados‑Membros — Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Artigo 47.° — Direito à ação — Princípios da equivalência e da efetividade — Extensão dos poderes da autoridade administrativa ou judicial chamada a conhecer de um recurso — Inexistência de poder de alteração»






I.      Introdução

1.        O presente pedido de decisão prejudicial oferece ao Tribunal de Justiça a oportunidade de precisar as condições de admissão dos nacionais de países terceiros que desejem prosseguir os seus estudos num estabelecimento de ensino superior de um Estado‑Membro, bem como as garantias processuais de que estes últimos beneficiam por força da Diretiva (UE) 2016/801 (2).

2.        Este pedido foi apresentado no contexto de um litígio que opõe uma nacional dos Camarões ao État belge, representado pela secretária de Estado do Asilo e da Migração, a respeito da legalidade do indeferimento, pelo Estado belga, do pedido de visto, com o fundamento de que a recorrente não teria vontade de estudar na Bélgica. Embora o artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 dê aos Estados‑Membros a possibilidade de indeferirem esse pedido se existirem provas ou motivos que permitam concluir que o nacional de um país terceiro pretende residir para efeitos distintos daqueles para os quais pede admissão, a legislação belga aplicável ao litígio no processo principal não previa expressamente esse motivo de recusa.

3.        No Acórdão de 10 de setembro de 2014, Ben Alaya (3), relativo à interpretação da diretiva 2004/114/CE (4), O Tribunal de Justiça tinha concluído que os Estados‑Membros tinham a liberdade de exigir todas as provas necessárias para apreciar a coerência do pedido apresentado pelo nacional de um país terceiro, a fim de evitar qualquer utilização abusiva ou fraudulenta do procedimento previsto nesta diretiva (5). Esta interpretação assentava num exame dos termos dos artigos 6.° e 7.° da referida diretiva, relativos às condições gerais e específicas de admissão de um nacional de um país terceiro para efeitos de estudos, e da sistemática geral e finalidade da mesma diretiva.

4.        O presente processo foi instaurado, apesar de a Diretiva 2004/114 ter sido revogada e substituída pela Diretiva 2016/801, que tem por objetivo melhorar e simplificar essas condições, garantir a celeridade do procedimento de admissão e reforçar os direitos processuais dos nacionais de países terceiros.

5.        O Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Bélgica) interroga o Tribunal de Justiça sobre três aspetos do procedimento de admissão para efeitos de estudos.

6.        Em primeiro lugar, convida o Tribunal de Justiça a precisar as condições em que um Estado‑Membro pode indeferir o pedido de autorização de residência ou de visto para efeitos de estudos (a seguir «autorização de residência ou visto “estudante”») com o fundamento de que a permanência do nacional de um país terceiro no território nacional prossegue, na realidade, outra finalidade. Por conseguinte, o Tribunal de Justiça é chamado a interpretar o artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 e a debruçar‑se, nomeadamente, sobre as estratégias que os Estados‑Membros podem adotar, durante a fase que antecede a entrada desse nacional no território nacional, para combater os riscos de abuso da autorização de residência ou do visto «estudante». Segundo o estudo realizado pela Rede Europeia das Migrações em março de 2022, doze Estados‑Membros, entre os quais o Reino da Bélgica, tinham adotado tais estratégias (6).

7.        Nas presentes conclusões, exporei as razões pelas quais considero que uma autoridade competente de um Estado‑Membro só pode indeferir um pedido de autorização de residência ou de visto «estudante» se tiver provas ou motivos sérios e objetivos para concluir que a permanência do nacional de um país terceiro no território nacional não tem por objeto nem por finalidade essencial a prossecução, a título de atividade principal, de um ciclo de estudos a tempo inteiro conducente à obtenção de um título de ensino superior reconhecido por esse Estado‑Membro.

8.        Em segundo lugar, o Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) interroga o Tribunal de Justiça sobre as modalidades de transposição para o direito interno do artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801, que constitui uma disposição facultativa (7).

9.        A este respeito, explicarei que os princípios da segurança jurídica e da transparência exigem que o Estado‑Membro que pretenda transpor esta disposição para o seu ordenamento jurídico interno preveja expressamente, num quadro legal claro, preciso e previsível, que tem a faculdade de indeferir um pedido de autorização de residência ou de visto «estudante» com o fundamento de que tem provas ou motivos sérios e objetivos que permitem concluir que o nacional de um país terceiro em causa pretende residir para efeitos distintos daqueles para os quais pede a sua admissão.

10.      Em terceiro e último lugar, o Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) questiona o Tribunal de Justiça quanto às modalidades processuais do recurso da decisão que indefere o pedido de autorização de residência ou de visto «estudante», previsto no artigo 34.°, n.° 5, da Diretiva 2016/801, e, especialmente, quanto ao alcance dos poderes que devem ser conferidos para esse efeito à autoridade administrativa ou jurisdicional chamada a conhecer desse recurso.

11.      A este respeito, exporei os fundamentos pelos quais considero que esta disposição, lida à luz do artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (8), deve ser interpretada no sentido de que não se opõe a que um Estado‑Membro confira um poder de anulação à autoridade administrativa ou jurisdicional que conhece do recurso interposto de uma decisão de indeferimento de um pedido de autorização de residência ou de visto «estudante», com exclusão de um poder de alteração, desde que a nova decisão seja proferida pela autoridade competente antes do início do ano académico na instituição de ensino superior na qual o nacional de um país terceiro está regularmente inscrito.

II.    Quadro jurídico

A.      Direito da União

12.      Os considerandos 41 e 60 da Diretiva 2016/801 enunciam:

«(41)      Caso haja dúvidas a respeito dos fundamentos do pedido de admissão, os Estados‑Membros devem poder efetuar os controlos apropriados ou exigir provas para avaliarem, caso a caso [...] os estudos [ou] a formação [que o requerente] pretende efetuar [...] e combaterem a utilização abusiva e indevida do procedimento estabelecido na presente diretiva.

[...]

(60)      Os Estados‑Membros deverão assegurar que sejam colocadas à disposição do público, nomeadamente através da internet, informações adequadas e regularmente atualizadas sobre as entidades de acolhimento aprovadas e sobre as condições e os procedimentos de admissão de nacionais de países terceiros no seu território para efeitos da presente diretiva.»

13.      O artigo 3.°, pontos 3 e 21, desta diretiva dispõe:

«Para os efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

[...]

3)      “estudante do ensino superior”, o nacional de um país terceiro que tenha sido aceite por uma instituição de ensino superior e admitido no território de um Estado‑Membro para frequentar, a título de atividade principal, numa instituição de ensino superior um ciclo de estudos a tempo inteiro conducente à obtenção de um título de ensino superior reconhecido por esse Estado‑Membro, nomeadamente um diploma, um certificado ou um doutoramento, o que poderá abranger um curso de preparação para tais estudos nos termos do direito nacional ou formação obrigatória no programa de estudos;

[...]

21)      “autorização”, um título de residência ou, se assim previsto na legislação nacional, um visto de longa duração emitido para efeitos da presente diretiva.»

14.      O capítulo II da Diretiva 2004/114, sob a epígrafe «Admissão», compreende os artigos 5.° a 16.° O artigo 5.° desta diretiva, sob a epígrafe «Princípios», tem a seguinte redação:

«1.      A admissão de nacionais de países terceiros ao abrigo da presente diretiva fica sujeita à verificação de provas documentais que certifiquem que essas pessoas preenchem:

a)      as condições gerais estabelecidas no artigo 7.°; e

b)      as condições específicas pertinentes previstas nos artigos 8.°, 11.°, 12.°, 13.°, 14.° ou 16.°

2.      Os Estados‑Membros podem exigir que o requerente apresente as provas documentais a que se refere o n.° 1 numa das línguas oficiais do Estado‑Membro em causa ou na língua oficial da União [Europeia] que esse Estado‑Membro determine.

3.      Caso todas as condições gerais e todas as condições específicas pertinentes estejam preenchidas, os nacionais de países terceiros têm o direito de obter a respetiva autorização.

Se um Estado‑Membro só emitir títulos de residência no seu território e estiverem preenchidas todas as condições de admissão previstas na presente diretiva, o Estado‑Membro em causa deve conceder ao nacional do país terceiro o visto solicitado.»

15.      O artigo 7.° da Diretiva 2016/801, sob a epígrafe «Condições gerais», dispõe:

«1.      No que respeita à admissão de nacionais de países terceiros ao abrigo da presente diretiva, os requerentes:

a)      apresentam um documento de viagem válido nos termos definidos pela legislação nacional e, se assim for exigido, um pedido de visto ou um visto válido ou, se aplicável, um título de residência ou um visto de longa duração igualmente válidos; os Estados‑Membros podem exigir que o período de validade do documento de viagem cubra pelo menos a duração prevista da estadia;

b)      se os nacionais de países terceiros forem menores de idade nos termos da legislação nacional do Estado‑Membro em causa, apresentam uma autorização parental ou um documento equivalente para a estadia prevista;

c)      comprovam que os nacionais de países terceiros possuem ou, se a legislação nacional assim o previr, requereram um seguro de doença que cubra todos os riscos contra os quais estão normalmente cobertos os nacionais do Estado‑Membro em causa. O período de validade do seguro cobrirá a duração prevista da estadia;

d)      se o Estado‑Membro o exigir, comprovam que pagaram a taxa fixada para o tratamento do pedido, prevista no artigo 36.°;

e)      a pedido do Estado‑Membro em causa, comprovam que, durante a estadia prevista, os nacionais de países terceiros disporão de recursos suficientes para cobrir as suas despesas de subsistência sem recorrer ao sistema de assistência social do Estado‑Membro, bem como para custear a viagem de regresso. A suficiência dos recursos é avaliada com base no exame individual do caso e tem em conta os recursos provenientes, nomeadamente, de uma subvenção ou bolsa de estudo, de um contrato de trabalho válido, de uma oferta firme de trabalho ou de um compromisso financeiro assumido por uma organização responsável por programas de intercâmbio de estudantes, por uma entidade de acolhimento de estagiários, por uma organização responsável por programas de voluntariado, por uma família de acolhimento ou por uma organização de colocação de pessoas au pair.

2.      Os Estados‑Membros podem exigir que o requerente comunique o endereço do nacional do país terceiro em causa no seu território.

[...]

3.      Os Estados‑Membros podem indicar um montante de referência que, em seu entender, constitua os “recursos suficientes” referidos no n.° 1, alínea e). A avaliação da suficiência dos recursos baseia‑se num exame individual do caso.

4.      O pedido é apresentado e analisado quer o nacional do país terceiro em causa resida fora do território do Estado‑Membro em que pretende ser admitido, quer resida já nesse Estado‑Membro enquanto titular de uma autorização de residência válida ou de um visto de longa duração.

A título de derrogação, um Estado‑Membro pode, nos termos da legislação nacional, aceitar um pedido apresentado por um nacional de um país terceiro que não possua nem um título de residência válido nem um visto de longa duração, mas resida legalmente no seu território.

5.      Os Estados‑Membros determinam se os pedidos devem ser apresentados pelo nacional do país terceiro, pela entidade de acolhimento ou por ambos.

6.      Não são admitidos os nacionais de países terceiros que constituam uma ameaça para a ordem pública, para a segurança pública ou para a saúde pública.»

16.      O artigo 11.° desta diretiva prevê, como o seu título indica, as «[c]ondições específicas aplicáveis aos estudantes do ensino superior». Dispõe:

«1.      Para além das condições gerais estabelecidas no artigo 7.°, no que respeita à admissão de nacionais de países terceiros para efeitos de estudos, o requerente deve comprovar:

a)      que os nacionais de países terceiros tenham sido aceites por uma instituição de ensino superior para efetuar um programa de estudos;

b)      que foi efetuado o pagamento das propinas cobradas pela instituição de ensino superior, se o Estado‑Membro assim o exigir;

c)      a posse de conhecimentos suficientes da língua em que é ministrado o programa de estudos frequentado, se o Estado‑Membro assim o exigir;

d)      que os nacionais de países terceiros possuem recursos suficientes para custear as despesas incorridas com os estudos a efetuar.

2.      Pressupõe‑se que os nacionais de países terceiros que beneficiem automaticamente de um seguro de doença que cubra todos os riscos contra os quais estão normalmente cobertos os nacionais do Estado‑Membro em causa por força da sua inscrição numa instituição de ensino superior preenchem a condição estabelecida no artigo 7.º, n.° 1, alínea c).

3.      O Estado‑Membro que tenha estabelecido um procedimento de aprovação das instituições de ensino superior em conformidade com o artigo 15.° dispensa os requerentes de apresentarem um ou mais dos documentos ou elementos de prova referidos no n.° 1, alíneas b), c) ou d), do presente artigo, no artigo 7.°, n.° 1, alínea d), ou no artigo 7.°, n.° 2, desde que os nacionais de países terceiros sejam acolhidos por instituições de ensino superior aprovadas.»

17.      Figurando no capítulo IV da referida diretiva, intitulado «Motivos de recusa, de retirada ou de não renovação das autorizações», o artigo 20.°, relativo aos «[m]otivos de recusa», tem a seguinte redação:

«1.      Os Estados‑Membros indeferem o pedido se:

a)      não estiverem reunidas as condições estabelecidas no artigo 7.° ou as condições específicas estabelecidas nos artigos 8.°, 11.°, 12.°, 13.°, 14.° ou 16.°;

[...]

2.      Os Estados‑Membros podem indeferir o pedido se:

[...]

f)      o Estado‑Membro tiver provas ou motivos sérios e objetivos para concluir que o nacional de um país terceiro pretende residir para efeitos distintos daqueles para os quais pede admissão.

[...]

4.      Sem prejuízo do n.° 1, a decisão de indeferimento de um pedido tem em conta as circunstâncias específicas do caso e respeita o princípio da proporcionalidade.»

18.      Este capítulo IV inclui também o artigo 21.° que, em conformidade com a sua epígrafe, prevê os «[m]otivos de retirada ou de não renovação da autorização».

19.      Do capítulo VII da Diretiva 2016/801, sob a epígrafe «Procedimento e transparência», constam os artigos 33.° a 36.°. O artigo 34.° desta diretiva, relativo às «[g]arantias processuais e transparência», prevê:

«1.      As autoridades competentes do Estado‑Membro em causa decidem sobre o pedido de autorização ou sobre a renovação da mesma, e notificam a decisão ao requerente por escrito, o mais cedo possível mas o mais tardar 90 dias a contar da data de apresentação do pedido completo, em conformidade com os processos de notificação previstos na legislação nacional desse Estado‑Membro.

2.      Em derrogação do n.° 1 do presente artigo, no caso de o processo de admissão estar relacionado com uma entidade de acolhimento aprovada nos termos dos artigos 9.° e 15.°, a decisão sobre o pedido completo é tomada o mais rapidamente possível, no prazo máximo de 60 dias.

3.      Se as informações ou a documentação comprovativas do pedido forem incompletas, as autoridades competentes notificam ao requerente, num prazo razoável, as informações adicionais necessárias e fixam um prazo razoável para a sua apresentação. O prazo referido nos n.os 1 e 2 fica suspenso até que as autoridades competentes tenham recebido as informações complementares exigidas. Se as informações ou os documentos adicionais não forem apresentados dentro do prazo, o pedido pode ser indeferido.

4.      Os fundamentos da decisão que declara inadmissível ou indefere um pedido ou recusa a sua renovação são comunicados por escrito ao requerente. Os fundamentos da decisão de retirar uma autorização são comunicados por escrito ao nacional de um país terceiro. Os fundamentos da decisão de retirar uma autorização podem ser comunicados por escrito também à entidade de acolhimento.

5.      Qualquer decisão que declara inadmissível ou indefere um pedido, recusa a renovação ou cancela a autorização é passível de recurso no Estado‑Membro em causa, em conformidade com a legislação nacional. A notificação escrita especifica o tribunal ou a autoridade administrativa perante os quais pode ser interposto o recurso e o prazo para o interpor.»

20.      O artigo 35.° da referida diretiva, sob a epígrafe «Transparência e acesso à informação», enuncia:

«Os Estados‑Membros facilitam o acesso dos requerentes à informação sobre todas as provas documentais necessárias ao pedido bem como à informação sobre entrada e permanência, incluindo os direitos, as obrigações e as garantias processuais dos nacionais de países terceiros abrangidos pela presente diretiva e, se aplicável, dos membros das suas famílias. Quando aplicável, esta informação inclui o nível suficiente de recursos mensais, nomeadamente os recursos necessários para cobrir as despesas decorrentes dos estudos ou da formação, sem prejuízo de uma análise individual de cada caso, e as taxas aplicáveis.

As autoridades competentes em cada um dos Estados‑Membros publicam as listas das entidades de acolhimento aprovadas para efeitos da presente diretiva. As versões atualizadas das referidas listas são publicadas o mais rapidamente possível depois de terem sido alteradas.»

21.      Incluído no capítulo VIII da Diretiva 2016/801, intitulado «Disposições finais», o artigo 40.°, relativo à «[t]ransposição», dispõe:

«1.      Os Estados‑Membros põem em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente diretiva até 23 de maio de 2018. Comunicam imediatamente à Comissão [Europeia] o texto dessas disposições.

Quando os Estados‑Membros adotarem essas disposições, estas incluem uma referência à presente diretiva ou são acompanhadas dessa referência aquando da sua publicação oficial. Incluem igualmente uma menção precisando que as remissões, nas disposições legislativas, regulamentares e administrativas em vigor, para as diretivas revogadas pela presente diretiva, se entendem como sendo feitas para a presente diretiva. As modalidades dessa referência e a formulação dessa menção são estabelecidas pelos Estados‑Membros.

2.      Os Estados‑Membros comunicam à Comissão o texto das principais disposições de direito interno que adotarem nas matérias reguladas pela presente diretiva.»

B.      Direito belga

22.      O artigo 3.° da Lei relativa ao Acesso ao Território, à Residência, ao Estabelecimento e ao Afastamento de Estrangeiros, de 15 de dezembro de 1980 (9), previa:

«Salvo exceções previstas num tratado internacional ou numa lei, pode ser recusada a entrada ao estrangeiro que se encontre numa das seguintes situações:

1.°      se for detido na zona de trânsito aeroportuário sem ser portador dos documentos exigidos pelo artigo 2.°;

[...]

5.°      se estiver indicado para efeitos de não admissão e de interdição de permanência no [Sistema de Informação de Schengen (10)] ou no Banco de Dados Nacional Geral;

6.°      se for considerado suscetível de comprometer as relações internacionais da Bélgica ou de um Estado parte numa convenção internacional relativa à passagem das fronteiras externas, que vincule a Bélgica;

7.°      se for considerado suscetível de comprometer a paz pública, a ordem pública ou a segurança nacional;

8.°      se tiver sido repatriado ou expulso do Reino há menos de dez anos e a medida não tiver sido suspensa ou revogada.»

23.      O artigo 39/2.°, n.° 2, desta lei enunciava:

«O Conseil [du contentieux des étrangers (Bélgica)] [Conselho do Contencioso dos Estrangeiros (Bélgica) (11)] decide da anulação, por acórdão, dos outros recursos por preterição de formalidades essenciais ou passíveis de nulidade, excesso ou desvio de poder.»

24.      O artigo 58.° da Lei de 15 de dezembro de 1980 dispunha:

«Quando um pedido de autorização de residência no Reino por mais de três meses seja apresentado junto de um posto diplomático ou consular belga por um estrangeiro que pretenda realizar na Bélgica estudos de ensino superior ou neste país frequentar um ano de preparação para o ensino superior, essa autorização deve ser concedida se a pessoa interessada não se encontrar num dos casos previstos no artigo 3.°, primeiro parágrafo, [n.os] 5.° a 8.° e se apresentar os seguintes documentos:

1.°      certificado passado por uma instituição de ensino em conformidade com o disposto no artigo 59.°;

2.°      prova de que possui meios de subsistência suficientes;

3.°      atestado médico do qual resulte que não sofre de uma das doenças ou enfermidades enumeradas no anexo da presente lei;

4.°      certificado de inexistência de condenações por crimes de direito comum, se o interessado tiver mais de 21 anos de idade.

Na falta de apresentação do certificado previsto no [n.° 3] e no [n.° 4] do primeiro parágrafo, o Ministro [competente em matéria de acesso ao território, residência, estabelecimento e afastamento de estrangeiros (12)] ou o seu delegado pode, no entanto, tendo em conta as circunstâncias, autorizar o estrangeiro a permanecer na Bélgica para aí estudar.

A autorização de residência por mais de três meses no Reino pode ser requerida pelo estrangeiro segundo as modalidades fixadas pelo Rei em aplicação do artigo 9.°, parágrafo 2.»

25.      A Lei de 11 de julho de 2021, que altera a Lei de 15 de dezembro de 1980 relativa ao acesso ao território, à residência, ao estabelecimento e ao afastamento de estrangeiros, no que respeita aos estudantes do ensino superior (13), transpôs parcialmente a Diretiva 2016/801, após o termo do prazo de transposição desta diretiva, previsto no seu artigo 40.°

III. Factos do litígio no processo principal e questões prejudiciais

26.      Em 6 de agosto de 2020, a recorrente no processo principal, nacional dos Camarões, apresentou, na Embaixada da Bélgica em Yaoundé (Camarões), um pedido de visto «estudante» com base no artigo 58.° da Lei de 15 de dezembro de 1980.

27.      Tendo‑lhe sido recusada a concessão de visto por decisão de 18 de setembro de 2020, a recorrente no processo principal pediu, em 28 de setembro de 2020, a anulação dessa decisão no Conseil du contentieux des étrangers (Conselho do Contencioso dos Estrangeiros), que indeferiu o seu pedido por Acórdão de 23 de dezembro de 2020.

28.      A este respeito, o Conseil du contentieux des étrangers (Conselho do Contencioso dos Estrangeiros) decidiu, em substância, que o artigo 58.° da Lei de 15 de dezembro de 1980 impõe ao Reino da Bélgica que verifique a vontade da recorrente no processo principal de estudar na Bélgica. Além disso, considerou que o Reino da Bélgica podia recusar o visto requerido com base neste artigo 58.°, ainda que o artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 não tivesse sido transposto, uma vez que o referido artigo 58.° previa também a faculdade de indeferir esse pedido de visto. Segundo o Conseil du contentieux des étrangers (Conselho do Contencioso dos Estrangeiros), o artigo 58.° da Lei de 15 de dezembro de 1980 impõe ao Reino da Bélgica que verifique a realidade do desejo de estudar na Bélgica e permite‑lhe assim indeferir o pedido se se verificar que o nacional de um país terceiro não tem uma vontade real de prosseguir estudos.

29.      Por petição de 19 de janeiro de 2021, a recorrente no processo principal interpôs recurso de cassação no Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional).

30.      Alega, primeiro, que o Conseil du contentieux des étrangers (Conselho do Contencioso dos Estrangeiros) não podia, corretamente, decidir que a aplicação do artigo 58.° da Lei de 15 de dezembro de 1980 era conforme com o artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801, quando esta última disposição não tinha sido transposta para o direito belga e que, contrariamente às obrigações de transparência e de segurança jurídica, o direito belga não precisava os motivos sérios e objetivos que permitiriam concluir que a recorrente pretendia residir para efeitos distintos daqueles para os quais pedia admissão.

31.      Por outro lado, enquanto o Estado belga sustenta, em sua defesa, que essa diretiva, nomeadamente o seu considerando 41, permite às autoridades competentes verificarem a realidade do projeto de estudos do requerente e a sua intenção de estudar, de modo que os Estados‑Membros podem exigir as provas necessárias para avaliar a coerência do pedido de admissão, a recorrente no processo principal considera que a definição do conceito de «estudante do ensino superior» prevista no artigo 3.°, n.° 3, da referida diretiva permite apenas garantir que o requerente é admitido num estabelecimento de ensino superior, e não verificar se pretende estudar.

32.      Com efeito, o Estado belga sustenta que o artigo 58.° da Lei de 15 de dezembro de 1980, que dispõe que a autorização de residência é concedida a um estrangeiro que deseje estudar na Bélgica, assegura uma transposição do artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801, o que a recorrente no processo principal contesta.

33.      Por conseguinte, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre se esta referência ao «desejo de estudar» é suficiente para efeitos da transposição desse artigo 20.°, n.° 2, alínea f), e se uma leitura conforme desta diretiva cumpre as obrigações de transparência e de segurança jurídica. Refere ainda que a definição ou mesmo a enumeração das provas ou dos motivos sérios e objetivos que permitem demonstrar que o nacional de um país terceiro reside para fins diferentes daqueles para os quais pede a sua admissão não figura no artigo 58.° da Lei de 15 de dezembro de 1980 e interroga‑se, portanto, sobre se esta teria que estar expressamente prevista nas medidas nacionais de transposição.

34.      O órgão jurisdicional de reenvio considera que este argumento da recorrente no processo principal é improcedente, uma vez que o artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 permite indeferir o pedido se se verificar que o nacional de um país terceiro pretende reside para efeitos distintos daqueles para os quais pede admissão, o que implica que os Estados‑Membros possam necessariamente verificar se o requerente tem efetivamente a intenção de residir com o objetivo que justifica o seu pedido. Todavia, considera que há que colocar a questão ao Tribunal de Justiça a este respeito.

35.      Além disso, esse órgão jurisdicional coloca a questão de saber se a aplicação conforme do artigo 20.°, n.° 2, alínea f), desta diretiva, no respeito dos princípios da transparência e da segurança jurídica, exige, por um lado, que o direito nacional preveja expressamente que esse pedido pode ser indeferido se o Estado‑Membro tiver provas ou motivos sérios e objetivos para concluir que o nacional de um país terceiro pretende residir para efeitos distintos daqueles para os quais pede admissão e, por outro, que o direito nacional especifique quais são essas provas ou esses motivos sérios e objetivos que permitem demonstrar que o nacional de um país terceiro pretende residir para efeitos distintos daqueles para os quais pede admissão.

36.      Segundo, a recorrente no processo principal alega que as modalidades de fiscalização exercidas pelo Conseil du contentieux des étrangers (Conselho do Contencioso dos Estrangeiros) não respeitam as exigências que decorrem do direito da União. Nos termos do artigo 39.°/2, segundo parágrafo, da Lei de 15 de dezembro de 1980, essa fiscalização é uma fiscalização da legalidade, pelo que, embora o Conseil du contentieux des étrangers (Conselho do Contencioso dos Estrangeiros) possa pronunciar‑se sobre uma ilegalidade, não dispõe de um poder de alterar decisões. Todavia, em caso de anulação da decisão controvertida, a parte contrária seria obrigada a respeitar o caso julgado do dispositivo do acórdão e dos respetivos fundamentos que lhe servem necessariamente de base.

37.      Por conseguinte, o órgão jurisdicional de reenvio considera que há que perguntar ao Tribunal de Justiça se, como sustenta a recorrente no processo principal, o artigo 39.°/2, segundo parágrafo, da Lei de 15 de dezembro de 1980 respeita as exigências que decorrem do artigo 34.°, n.° 5, da Diretiva 2016/801, do princípio da efetividade e do artigo 47.° da Carta.

38.      Nestas circunstâncias, o Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Atendendo ao artigo 288.° [TFUE], aos artigos 14.° e 52.° da [Carta], aos artigos 3.°, 5.°, 7.°, 11.°, 20.°, 34.°, 35.° e 40.° da Diretiva [2016/801] e aos seus considerandos 2 e 60, bem como aos princípios da segurança jurídica e da transparência, deve a faculdade de indeferimento do pedido de residência conferida ao Estado‑Membro pelo [artigo 20.°, n.° 2, alínea f),] [desta diretiva], para ser utilizada pelo referido Estado‑Membro, estar expressamente prevista na legislação deste último? Em caso de resposta afirmativa, devem os motivos sérios e objetivos estar especificados na sua legislação? Em caso de resposta afirmativa, devem os motivos sérios e objetivos estar especificados na sua legislação?

2)      O exame do pedido de visto para efeitos de realização de estudos impõe ao Estado‑Membro que verifique a vontade e a intenção do estrangeiro de realizar estudos, embora o artigo 3.° da Diretiva [2016/801] defina o estudante como um nacional de um país terceiro que tenha sido aceite numa instituição de ensino superior e os motivos de indeferimento do pedido referidos no artigo 20.°, n.° 2, alínea f), desta diretiva sejam facultativos e não vinculativos à semelhança dos que são enunciados no artigo 20.°, n.° 1, da referida diretiva?

3)      O artigo 47.° da [Carta], o princípio da efetividade e o artigo [34.°, n.° 5], da Diretiva [2016/801] exigem que o recurso, previsto no direito nacional que tenha por objeto uma decisão de indeferimento de um pedido de admissão no território para efeitos de realização de estudos, permita que o juiz substitua a apreciação da autoridade administrativa pela sua apreciação e que [altere] a decisão dessa autoridade ou é suficiente que proceda a uma fiscalização da legalidade que permita ao juiz declarar uma ilegalidade, nomeadamente um erro manifesto de apreciação, anulando a decisão da autoridade administrativa?»

39.      Apresentadas observações a recorrente no processo principal, o Governo Belga e a Comissão. Estas partes participaram na audiência realizada em 11 de outubro de 2023, na qual os Governos Checo, Lituano, Luxemburguês, Húngaro e Neerlandês apresentaram igualmente observações orais (14).

IV.    Análise

40.      Proponho ao Tribunal de Justiça que examine, num primeiro momento, a segunda questão prejudicial, relativa às condições em que um Estado‑Membro pode indeferir um pedido de autorização de residência ou de visto «estudante» pelo motivo enunciado no artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801. Numa segunda fase, abordarei as modalidades de transposição desta disposição para o direito interno, no qual se concentra o órgão jurisdicional de reenvio na sua primeira questão prejudicial. Por último, num terceiro momento, analisarei as modalidades processuais do recurso da decisão que indefere o pedido de autorização de residência ou de visto «estudante», previsto no artigo 34.°, n.° 5, desta diretiva, que são objeto da terceira questão prejudicial.

A.      Quanto ao alcance da faculdade proporcionada ao EstadoMembro de indeferir um pedido de autorização de residência ou de visto «estudante» pelo motivo previsto no artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 (segunda questão prejudicial)

41.      Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, ao Tribunal de Justiça se, para efeitos do exame de um pedido de autorização de residência ou de visto «estudante» apresentado com base na Diretiva 2016/801, a autoridade competente é obrigada a verificar a vontade e a intenção do nacional de um país terceiro de prosseguir os estudos e, sendo caso disso, em que condições deve proceder a esse exame.

42.      O órgão jurisdicional de reenvio não se refere expressamente ao exame exigido ao abrigo do artigo 20.°, n.° 2, alínea f), desta diretiva, mas de uma forma mais geral «[ao] exame do pedido de visto para estudos». Ora, pelas razões que passo a expor, só esta disposição implica que a autoridade competente verifique a intenção do nacional de um país terceiro de prosseguir os seus estudos no território do Estado‑Membro de acolhimento para efeitos da apreciação desse pedido.

43.      Com efeito, resulta do artigo 5.° da Diretiva 2016/801, lido em conjugação com o seu considerando 30, que o nacional de um país terceiro tem direito a uma autorização de residência ou a um visto «estudante» se a autoridade competente determinar que o pedido preenche as condições gerais e específicas enunciadas, respetivamente, nos artigos 7.° e 11.° desta diretiva (15).

44.      Nenhuma destas condições, quer sejam gerais ou específicas, implica que a autoridade competente verifique a intenção e a vontade do nacional de um país terceiro de prosseguir os estudos, propriamente ditas. A admissão numa instituição de ensino superior para frequentar um ciclo de estudos (16), o pagamento das respetivas propinas ou ainda o conhecimento suficiente da língua do programa de estudos são critérios objetivos que permitem normalmente demonstrar a intenção do requerente de estudar. Todavia, estas constatações materiais não permitem excluir as situações em que a autoridade competente pode ser enganada, de forma intencional ou não, quanto ao objetivo de residência do nacional de um país terceiro.

45.      O considerando 36 da Diretiva 2016/801 precisa, assim, que «[o]s Estados‑Membros deverão poder recusar a admissão por motivos devidamente justificados». Como recordou a Comissão na audiência, estes fundamentos são enumerados de forma taxativa no artigo 20.° desta diretiva e os Estados‑Membros não podem acrescentar outros.

46.      O artigo 20.°, n.° 1, da Diretiva 2016/801 prevê os motivos pelos quais o Estado‑Membro deve indeferir o pedido de admissão. Trata‑se de motivos obrigatórios. Em contrapartida, o artigo 20.°, n.° 2, desta diretiva, prevê os motivos pelos quais o Estado‑Membro pode indeferir o pedido. Como demonstra a utilização do verbo «poder» pelo legislador da União, esses motivos são facultativos para o Estado‑Membro.

47.      Ora, de entre todos estes motivos, só o motivo de recusa previsto no artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da referida diretiva diz respeito, propriamente dito, à finalidade da residência do requerente (17).

48.      Portanto, importa agora determinar em que medida a autoridade competente de um Estado‑Membro, à qual foi apresentado um pedido de autorização de residência ou de visto «estudante», deve verificar a intenção do nacional de um país terceiro de prosseguir os estudos. Para o efeito, iniciarei o meu exame através de uma análise textual do artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801, antes de estudar o contexto e os objetivos prosseguidos pela legislação em que esta disposição se insere.

1.      Análise textual do artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801

49.      O artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 confere à autoridade competente de um Estado‑Membro a faculdade de indeferir um pedido de admissão por ter «provas ou motivos sérios e objetivos para concluir que o nacional de um país terceiro pretende residir para efeitos distintos daqueles para os quais pede admissão».

50.      Em primeiro lugar, esta disposição deve ser interpretada restritivamente. Com efeito, permite à autoridade competente indeferir um pedido de autorização de residência ou de visto «estudante» e, assim, recusar a entrada e a residência de um nacional de um país terceiro para efeitos de estudos no território do Estado‑Membro de acolhimento apesar de estar demonstrado que esse pedido não padece de nenhum dos vícios enunciados no artigo 20.°, n.° 1, da Diretiva 2016/801, isto é, preenche os requisitos de elegibilidade exigidos nos artigos 7.° e 11.° desta diretiva, e os documentos e dados em que o referido pedido se baseia são autênticos e exatos e, sendo caso disso, a entidade de acolhimento em causa é aprovada.

51.      Impõe‑se uma interpretação estrita do artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801, tanto mais que o motivo de indeferimento do pedido de admissão previsto nesta disposição constitui igualmente um motivo de retirada ou de não renovação de uma autorização concedida ao estudante, em conformidade com o artigo 21.°, n.° 1, alínea d), desta diretiva, bem como um motivo de indeferimento do pedido de mobilidade apresentado por este último a um segundo Estado‑Membro em conformidade com o artigo 31.°, n.° 7, alínea b), da referida diretiva. Nestas circunstâncias, tal motivo é suscetível de ter consequências ainda mais graves, no que respeita não só ao requerente mas também aos membros da sua família (18).

52.      Em segundo lugar, resulta dos termos do artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 que este visa a situação em que a autorização de residência ou o visto teriam «efeitos distintos» daqueles para os quais foram pedidos. O legislador da União eleva a finalidade da residência a requisito essencial, o que é coerente à luz da «natureza específica da permanência de cada categoria de nacionais de países terceiros» abrangida por esta diretiva (19).

53.      No que respeita à autorização de residência ou ao visto «estudante», a finalidade da residência decorre da definição do conceito de «estudante do ensino superior», enunciado no artigo 3.°, n.° 3, da Diretiva 2016/801, por força da qual um estudante é «o nacional de um país terceiro que tenha sido aceite por uma instituição de ensino superior e admitido no território de um Estado‑Membro para frequentar, a título de atividade principal, numa instituição de ensino superior um ciclo de estudos a tempo inteiro conducente à obtenção de um título de ensino superior reconhecido por esse EstadoMembro» (20).

54.      Por conseguinte, contrariamente ao que sustenta a recorrente no processo principal, um nacional de um país terceiro que foi admitido numa instituição de ensino superior, mas cujo pedido de admissão está a ser analisado pela autoridade competente, não tem a qualidade de «estudante do ensino superior» na aceção do artigo 3.°, n.° 3, desta diretiva.

55.      Com efeito, decorre desta definição, especialmente do emprego da conjunção coordenativa «e», que a qualidade de «estudante do ensino superior» exige que sejam preenchidos dois requisitos cumulativos, a saber, por um lado, que o nacional de um país terceiro seja admitido por uma instituição de ensino superior e, por outro, que seja admitido no território do Estado‑Membro de acolhimento, para prosseguir os seus estudos a título de atividade principal e a tempo inteiro, na instituição de ensino superior na qual está regularmente inscrito. Como sublinhou o Governo Belga na audiência, esta finalidade está também expressa no artigo 11.°, n.° 1, alínea a), da Diretiva 2016/801, que exige que esse nacional tenha sido aceite por uma instituição de ensino superior «para efetuar um programa de estudos». Tendo em conta a referida definição, parece‑me que a autoridade competente de um Estado‑Membro pode, por conseguinte, indeferir um pedido de título de residência ou de visto «estudante» com base no artigo 20.°, n.° 2, alínea f), desta diretiva quando estabelece que a residência do referido nacional prosseguiria outra finalidade.

56.      Tal situação pode resultar de um erro involuntário. Pode ser esse o caso quando a autoridade competente verifique que o nacional de um país terceiro pretende exercer uma atividade económica em condições que não lhe permitam utilizar o «período consagrado ao programa de estudos» — para retomar os termos do artigo 24.° desta diretiva (21) —, privando assim a residência do seu objeto e da sua finalidade essencial.

57.      Tal situação pode igualmente ter origem numa tentativa de desvio deliberado do processo. Neste caso, a autoridade competente é enganada, relativamente à verdadeira finalidade da residência, pela intenção abusiva ou fraudulenta da entidade de acolhimento ou do nacional de um país terceiro (22). Este poderia assim apresentar um pedido de autorização de residência ou de visto «estudante» apenas para abusar das facilidades criadas pelo direito da União em beneficio dos estudantes estrangeiros, para tirar partido dos direitos e benefícios do estatuto de estudante (23), para se eximir às condições de entrada e residência que lhe seriam, de outra forma, aplicáveis, ou ainda para permanecer no Estado‑Membro. Por conseguinte, o artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 tem por objetivo prevenir as situações em que se demonstre que o direito de residência ou o visto «estudante» será desviado da sua finalidade, deixando aos Estados‑Membros os meios para as detetar, à semelhança das medidas que estes últimos podem tomar nas suas embaixadas ou consulados para detetar e prevenir abusos do direito ao reagrupamento familiar, por exemplo, pelos casamentos de conveniência (24).

58.      Esta interpretação do artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 é confirmada pelo considerando 41 desta diretiva que indica que, «[c]aso haja dúvidas a respeito dos fundamentos do pedido de admissão, os Estados‑Membros devem poder efetuar os controlos apropriados ou exigir provas para avaliarem, caso a caso [...] os estudos [ou] a formação [...] que o requerente pretende efetuar [...] e combaterem a utilização abusiva e indevida do procedimento estabelecido na [referida] diretiva» (25).

59.      Em terceiro lugar, a utilização do condicional [na versão francesa «séjournerait»], [na versão portuguesa «pretende residir»], no artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 permite precisar a natureza da apreciação a que deve proceder a autoridade competente. Trata‑se de uma apreciação ex ante, sendo esta autoridade chamada a determinar, num contexto hipotético, as intenções do requerente quanto ao objeto e à finalidade da residência (26).

60.      Esta apreciação distingue‑se, portanto, da que a referida autoridade deve efetuar nos termos do artigo 21.°, n.° 1, alínea d), da Diretiva 2016/801. Por força desta disposição, deve retirar ou recusar renovar uma autorização previamente concedida se concluir que «o nacional de um país terceiro» está a «permanecer no território para efeitos diferentes daqueles para que foi autorizado a residir» (27). Neste caso, circunstancias objetivas, como o facto de o nacional de um país terceiro não ter iniciado os estudos em causa, tê‑los suspenso ou abandonado prematuramente, ou ainda o facto de exercer uma atividade profissional que exceda o numero máximo de horas de trabalho permitidas, residir longe do local de estudo, ou mesmo no território de outro Estado‑Membro fora dos seus direitos de mobilidade na União Europeia, são constatações materiais que permitem apurar mais facilmente o objeto e a finalidade da residência do referido nacional e, especialmente, os casos de desvio de procedimento. Isso é mais difícil de apurar quando o pedido é apresentado enquanto o nacional de um país terceiro ainda reside fora do território do Estado‑Membro em causa.

61.      A este respeito, no silêncio do artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801, a prova é livre. O legislador da União não fixa nenhuma exigência específica quanto à sua forma, indicando este no considerando 41 desta diretiva que os Estados‑Membros devem poder efetuar os «controlos apropriados» e exigir as «provas» (28) para avaliar, em função de cada caso concreto, os estudos ou a formação que o nacional de um país terceiro pretende efetuar, bem como o risco de abuso ou fraude. Além disso, decorre da redação deste artigo que os motivos em que se baseia a autoridade competente devem ser «objetivos e sérios» (29), o que implica que esta dispõe de motivos detalhados e sólidos, resultantes de uma análise individualizada do pedido, que justifiquem o seu indeferimento.

62.      À luz destas indicações textuais, formularei duas observações.

63.      A primeira respeita ao ónus da prova. Na minha opinião, não é suficiente que a autoridade competente ponha em dúvida o objeto e a finalidade do pedido de autorização de residência ou de visto «estudante». Pelo contrário, parece‑me necessário que adquira a convicção de que a residência não terá por objeto nem por finalidade o prosseguimento dos estudos na instituição de ensino superior visada nesse pedido. Esta apreciação deve assentar num conjunto de indícios tanto objetivos como subjetivos e pode requerer a cooperação de todos os atores em causa, não só do requerente, das missões diplomáticas, das embaixadas ou dos consulados (consoante a organização das instâncias nacionais em causa), mas também das instituições de ensino superior, ou mesmo dos serviços responsáveis pela imigração. A intenção do nacional de um país terceiro é um elemento subjetivo que será normalmente estabelecido por referência a critérios objetivos, como a sua inscrição numa instituição de ensino superior, as despesas com os estudos efetuadas, o conhecimento da língua do Estado‑Membro de acolhimento, a regularidade das suas estadas anteriores num Estado‑Membro da União. Alguns Estados‑Membros podem prestar especial atenção, neste contexto, à coerência do projeto de estudos do requerente. Em França, os pedidos apresentados pelos nacionais egípcios devem fazer‑se acompanhar de um projeto fundamentado, que seja «coerente e, na medida do possível, que esteja na continuidade [do] percurso anterior» (30). Na Bélgica, como resulta das peças anexadas às observações pela recorrente no processo principal e das indicações fornecidas pelo Governo Belga na audiência, o pedido de admissão apresentado junto das autoridades consolares nos Camarões inclui um questionário e é acompanhado de uma entrevista que deve permitir ao nacional de um país terceiro demonstrar a realidade da sua intenção de residir na Bélgica na qualidade de estudante do ensino superior (31). Nesta hipótese, a coerência do projeto de estudos é apreciada à luz das competências adquiridas pelo nacional de um país terceiro, nomeadamente mediante o seu percurso académico, e à luz das suas aspirações e ambições profissionais. Esse nacional tem igualmente a possibilidade de explicitar ou defender o seu projeto de estudos ou de formação numa entrevista com um conselheiro de orientação.

64.      Na audiência, foi dada especial atenção à relevância da consideração da coerência do projeto de estudos do nacional de um país terceiro no âmbito da deteção e da prevenção do desvio de procedimento. Com efeito, embora o legislador da União visasse expressamente este elemento no considerando 15 da Diretiva 2004/114, não o reproduziu no considerando 41 da Diretiva 2016/801, preferindo uma formulação mais geral centrada nos «estudos» ou na «formação» pretendida pelo nacional de um país terceiro. Na minha opinião, nada se opõe a que a autoridade competente tenha em conta a coerência do projeto de estudos desse nacional, desde que essa apreciação seja individualizada, efetuada com prudência por pessoal qualificado e em cooperação com o referido nacional. Parece‑me igualmente essencial ter em conta as situações em que o nacional de um país terceiro possa ter seguido um percurso académico não convencional ou tencione reorientar‑se. A coerência do projeto de estudos é, portanto, um elemento que pode ser tomado em consideração pela autoridade competente, mas cujo peso variará em função das circunstâncias de cada caso concreto.

65.      No caso, resulta dos documentos anexos às observações da recorrente no processo principal que as autoridades consulares belgas lhe atribuíram grande importância. Com efeito, com base nas respostas por ela formuladas ao questionário junto ao seu pedido de admissão e na sequência da sua entrevista com um conselheiro de orientação, essas autoridades consideraram que o seu projeto de estudos enfermava de «incoerências manifestas», não só à luz do seu percurso académico mas também do seu projeto profissional. Concluíram pelo indeferimento do pedido pelo motivo de que este constituía uma tentativa de desvio de procedimento de emissão do visto «estudante» para fins migratórios (32). Limitar‑me‑ei a precisar que, na minha opinião, um Estado‑Membro só pode indeferir um pedido de admissão com o fundamento de o projeto de estudos do nacional de um país terceiro enfermar de incoerências se, por um lado, permitir que o requerente exponha e justifique o seu projeto junto de pessoal qualificado e, por outro lado, essas incoerências se revelarem manifestas.

66.      A segunda observação que pretendo formular é relativa à transposição do artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 para o ordenamento jurídico interno. Nada exige que o Estado‑Membro enumere, na sua lei de transposição, os motivos suscetíveis de demonstrar que o nacional de um país terceiro pretende residir para efeitos distintos daqueles para os quais pede admissão. Estes motivos dependem da apreciação de cada caso concreto e essa enumeração seria suscetível de privar a autoridade competente da sua margem de apreciação. Em contrapartida, essa autoridade é obrigada, por força do artigo 34.°, n.° 4, desta diretiva, a comunicar por escrito o motivo pelo qual o pedido é indeferido, permitindo assim ao nacional de um país terceiro invocar todas as circunstâncias que comprovem a realidade ou a coerência do seu projeto de estudos no âmbito do recurso que pode interpor ao abrigo do n.° 5 deste artigo.

67.      Em conclusão desta análise textual, penso que uma autoridade competente de um Estado‑Membro só pode indeferir um pedido de autorização de residência ou de visto «estudante» com base no artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 se demonstrar, na sequência de uma apreciação individualizada do pedido e com base em provas ou motivos sérios e objetivos, que a residência do nacional de um país terceiro não tem por objeto nem por finalidade essencial a prossecução, a título de atividade principal, de um ciclo de estudos a tempo inteiro conducente à obtenção de um titulo do ensino superior reconhecido por esse Estado. No âmbito dessa análise, nada se opõe a que a autoridade competente tenha em conta a coerência do projeto de estudos.

68.      Uma análise sistemática e teleológica da Diretiva 2016/801 corrobora esta interpretação.

2.      Análise sistemática e teleológica da Diretiva 2016/801

69.      No que respeita, em primeiro lugar, à análise sistemática da Diretiva 2016/801, tal interpretação permite, na minha opinião, assegurar o respeito pelo princípio da proporcionalidade e pelos direitos fundamentais da pessoa em causa.

70.      Com efeito, decorre do considerando 61 desta diretiva que a decisão de indeferimento de um pedido de admissão deve respeitar os direitos fundamentais dessa pessoa, tal como garantidos pela Carta, entre os quais figura o direito à educação.

71.      Além disso, o artigo 20.°, n.° 4, da referida diretiva enuncia que «a decisão de indeferimento de um pedido tem em conta as circunstâncias específicas do caso e respeita o princípio da proporcionalidade». Isto implica que a autoridade competente proceda, antes de decidir sobre o pedido, a um exame individualizado do mesmo, no âmbito do qual deve avaliar de maneira exaustiva os elementos tanto objetivos como subjetivos de que dispõe e ter em conta, de maneira equilibrada e razoável, todos os interesses em jogo (33).

72.      O princípio da proporcionalidade constitui um princípio geral do direto da União que se impõe aos Estados‑Membros quando estes aplicam esse direito (34). Assim, embora o combate à fraude constitua um objetivo legítimo que justifica verificações e, se for caso disso, o indeferimento do pedido, recordo que, num caso como o que está em causa, o nacional de um país terceiro preenche as condições gerais e específicas de elegibilidade exigidas pelos artigos 7.° e 11.° da Diretiva 2016/801. Isto implica que foi admitido numa instituição de ensino superior e que apresentou, sendo caso disso, a prova do pagamento das propinas. Por conseguinte, este nacional corre o risco de ver indeferido o seu pedido de autorização de residência ou de visto «estudante» e, portanto, de ser privado da possibilidade de prosseguir os estudos na instituição de ensino superior em que está inscrito. Nestas circunstâncias, e com exceção das situações em que existe um manifesto abuso de direito, é essencial, na minha opinião, que a autoridade competente avalie caso a caso se o indeferimento do pedido não é desproporcionado e não é suscetível de prejudicar alguns dos direitos fundamentais garantidos pela Carta.

73.      No que respeita, em segundo lugar, à análise teleológica da Diretiva 2016/801, a decisão pela qual uma autoridade competente de um Estado‑Membro indefere um pedido de admissão para efeitos de estudos, pelo motivo de o nacional de um país terceiro não residir no território nacional para prosseguir, a título de atividade principal, um ciclo de estudos a tempo inteiro conducente à obtenção de um título de ensino superior reconhecido por esse Estado, contribui para a realização dos objetivos dessa diretiva.

74.      Antes de mais, a Diretiva 2016/801 visa determinar as condições de entrada e de residência tanto no território do Estado‑Membro de acolhimento como no território dos outros Estados‑Membros de várias categorias de nacionais de países terceiros, sendo estas condições determinadas em função da natureza específica da residência de cada uma destas categorias.

75.      No que diz respeito à residência para efeitos de estudos, a Diretiva 2016/801 tem como objetivo promover a Europa como centro mundial de excelência para os estudos, melhorando e simplificando as «condições de entrada e de residência das pessoas que pretendem entrar na União para esses efeitos» (35). Além disso, decorre dos seus considerandos 15 e 44 que esta diretiva visa facilitar a mobilidade dos estudantes no interior da União para tornar o ensino superior europeu mais atrativo e competitivo. Para este efeito, a referida diretiva tem por objeto estabelecer, em conformidade com os seus considerandos 44 e 48, um «regime específico de mobilidade» dos estudantes no interior da União que inclua regras autónomas para a entrada e estadia para efeitos de estudos nos Estados‑Membros que não o Estado‑Membro de acolhimento. A autorização de residência emitida pelo Estado‑Membro de acolhimento confere assim aos nacionais de países terceiros o direito de entrarem e permanecerem no território de outro Estado‑Membro para aí realizarem uma parte dos seus estudos por um período máximo de 360 dias, em conformidade com as disposições que regem a mobilidade nos termos do artigo 31.° da mesma diretiva.

76.      Seguidamente, a Diretiva 2016/801 tem por objeto, em conformidade com o seu artigo 1.°, enunciar os direitos dos nacionais de países terceiros para efeitos de estudos tanto no território do Estado‑Membro de acolhimento como no território dos outros Estados‑Membros. Resulta do seu considerando 54 que esta diretiva visa aproximar os direitos desses nacionais aos direitos de que gozam os nacionais do Estado‑Membro em causa, permitindo assim a autorização de residência ao estudante beneficiar da igualdade de tratamento nas condições previstas no artigo 22.°, n.° 3, da referida diretiva.

77.      Ora, a decisão de uma autoridade competente que indefere um pedido de admissão para efeitos de estudos, pelo motivo de o nacional de um país terceiro não pretender residir no território do Estado‑Membro com o objetivo de prosseguir, a título de atividade principal, um ciclo de estudos a tempo inteiro conducente à obtenção de um título de ensino superior reconhecido por esse Estado, permite evitar as situações em que esse nacional beneficiaria de condições simplificadas de entrada e de residência e em que lhe seria reconhecido o estatuto de «estudante», bem como os direitos alargados associados a esse estatuto, sem razão legítima. Tal decisão permite assim igualmente garantir a especificidade das condições de entrada e de residência das diferentes categorias de nacionais de países terceiros, na qual assenta a Diretiva 2016/801, e evitar que certos nacionais de países terceiros se eximam às condições de emissão da autorização de residência que, de outro modo, lhes seriam aplicáveis.

78.      Por último, tendo em conta os amplos direitos associados à autorização de residência ou ao visto «estudante», o artigo 20.°, n.° 2, alínea f), desta diretiva deverá permitir aos Estados‑Membros combaterem eficazmente a fraude ou o abuso de direito, dando‑lhes a possibilidade de recusarem a admissão quando se demonstre que o requerente a requer de forma abusiva ou fraudulenta. De acordo com jurisprudência constante, ninguém pode exigir a aquisição ou a manutenção de direitos adquiridos por meio de fraude, seja essa fraude cometida ou não pelo beneficiário desses direitos ou do seu conhecimento (36).

79.      À luz de todas estas considerações, proponho ao Tribunal de Justiça que declare que o artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 deve ser interpretado no sentido de que uma autoridade competente de um Estado‑Membro só pode indeferir o pedido de autorização de residência ou de visto «estudante» se tiver provas ou motivos sérios e objetivos que demonstrem que a residência do nacional de um país terceiro no território nacional não tem por objeto nem por finalidade essencial a prossecução, a título de atividade principal, de um ciclo de estudos a tempo inteiro conducente à obtenção de um título de ensino superior reconhecido por esse Estado. A decisão de indeferimento desse pedido deve ser precedida de um exame individualizado do mesmo, no âmbito do qual a intenção do nacional de um país terceiro de prosseguir os seus estudos no território nacional deve ser avaliada com base em elementos tanto objetivos como subjetivos, entre os quais pode figurar a coerência do seu projeto de estudos.

B.      Quanto às modalidades de transposição do artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 para o direito interno (primeira questão prejudicial)

80.      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, ao Tribunal de Justiça se, tendo em conta o artigo 288.° TFUE, os artigos 14.° e 52.° da Carta, os artigos 3.°, 5.°, 7.°, 11.°, 20.°, 34.°, 35.° e 40.° da Diretiva 2016/801, os seus considerandos 2 e 60 e os princípios da segurança jurídica e da transparência, o Estado‑Membro que pretenda indeferir um pedido de autorização de residência ou de visto «estudante» pelo motivo enunciado no artigo 20.°, n.° 2, alínea f), desta diretiva é obrigado a prever expressamente no seu direito interno essa faculdade e, se for caso disso, os motivos que lhe permitem demonstrar que o nacional de um país terceiro pretende residir para efeitos distintos daqueles para os quais pede admissão.

81.      Esta questão coloca‑se uma vez que, contrariamente à legislação belga atual, que procede a uma transposição formal do artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 ao prever que o Ministro competente em matéria de acesso ao território, residência, estabelecimento e afastamento de estrangeiros ou o seu delegado pode indeferir um pedido quando tenha «provas ou motivos sérios e objetivos para concluir que a residência prossegue outras finalidades que não os estudos», tal não era o caso da legislação aplicável aos factos do litígio no processo principal (37).

82.      Começarei a minha análise precisando que os motivos de indeferimento dos pedidos previstos no artigo 20.°, n.° 2, da Diretiva 2016/801 são facultativos para os Estados‑Membros. Esta diretiva apenas impõe, portanto, um certo grau de harmonização no que respeita às condições de entrada e de residência das categorias de nacionais de países terceiros abrangidas pelo seu âmbito de aplicação, uma vez que a transposição desta disposição para os ordenamentos jurídicos nacionais é deixada à discricionariedade de cada um dos Estados‑Membros. Estes têm a liberdade de decidir, soberanamente, transpô‑las em função de considerações de ordem política, jurídica, económica ou ainda social. Alguns Estados‑Membros, de entre os mais expostos aos riscos de desvio de procedimento de emissão de vistos «estudante», parecem assim exercer uma análise mais aprofundada dos pedidos apresentados pelos nacionais de determinados países terceiros ou que visem um ciclo de estudos em determinados estabelecimentos de ensino superior (38).

83.      Em contrapartida, o facto de o artigo 20.°, n.° 2, da Diretiva 2016/801 ser uma disposição facultativa não significa que os Estados‑Membros disponham de uma liberdade total quanto à sua aplicação para recusarem, consoante a sua boa vontade, a residência dos nacionais de países terceiros abrangidos pelo âmbito de aplicação desta disposição.

84.      Primeiro, os Estados‑Membros são obrigados a exercer o seu poder no respeito dos princípios gerais do direito da União, entre os quais figura o princípio da segurança jurídica (39). O Tribunal de Justiça recordou recentemente que a transposição de disposições do direito da União para o direito nacional exige que as mesmas sejam implementadas por disposições com a especificidade, a precisão e a clareza necessárias para cumprir a exigência de segurança jurídica (40). Este princípio visa garantir a previsibilidade das situações e das relações jurídicas que resultam do direito da União e exige que qualquer ato da administração que produza efeitos jurídicos seja claro e preciso para que os interessados possam conhecer sem ambiguidade os seus direitos e obrigações e agir em conformidade. Esta exigência impõe‑se, concretamente, quando o ato em causa possa ter consequências desfavoráveis para os interessados (41).

85.      No que respeita, especialmente, ao artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801, se se verificar que o Estado‑Membro não respeita o referido princípio, a autoridade competente desse Estado não pode invocar esta disposição para indeferir o pedido de autorização de residência ou de visto «estudante».

86.      Segundo, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a liberdade de que dispõem os Estados‑Membros deve ser utilizada de forma respeitadora dos termos fixados pelo legislador da União e que não prejudique o objetivo da Diretiva 2016/801 nem o seu efeito útil (42).

87.      Ora, ao adotar a Diretiva 2016/801, o legislador da União pretendeu corrigir os erros do regime anteriormente instituído pela Diretiva 2004/114 e aperfeiçoá‑lo a fim de «assegurar maior transparência e maior segurança jurídica [...] para as diferentes categorias de nacionais de países terceiros que entram na União» como salienta expressamente no considerando 2 da Diretiva 2016/801 (43). A este respeito, o artigo 35.° desta diretiva, intitulado de maneira inequívoca «Transparência e acesso à informação» exige dos Estados‑Membros que estes comuniquem aos requerentes as informações relativas às condições de entrada e permanência, incluindo os direitos, as obrigações e as garantias processuais abrangidos pela referida diretiva. Neste contexto, parece‑me essencial que um nacional de um país terceiro que apresente um pedido de autorização de residência ou de visto «estudante» e que preencha os requisitos de elegibilidade exigidos seja informado de que esse pedido, independentemente de ser apresentado de boa‑fé ou de má‑fé, pode ser indeferido se a sua estada prosseguir outra finalidade.

88.      Por conseguinte, tanto o princípio da segurança jurídica como o princípio da transparência exigem que o Estado‑Membro que pretenda invocar as disposições enunciadas no artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 preveja expressamente, num quadro legal claro, preciso e previsível, que tem a faculdade de indeferir um pedido de admissão pelo motivo de que tem provas ou motivos sérios e objetivos que demonstrem que o nacional de um país terceiro pretende residir para efeitos distintos daqueles para os quais pede admissão.

89.      Em contrapartida, pelos motivos enunciados no n.° 66 das presentes conclusões, a transposição deste artigo não impõe ao Estado‑Membro que enumere esses motivos.

90.      Importa agora examinar a questão de saber se o artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 foi transposto para o diploma em vigor à data dos factos do litígio no processo principal.

91.      O Governo Belga admitiu na audiência que não houve um ato positivo de transposição desta disposição. Salientou, a este respeito, em linha com as suas observações escritas, que o artigo 58.° da Lei de 15 de dezembro de 1980 pode ser considerado uma disposição nacional preexistente que assegurava uma transposição suficiente do direito da União para o direito interno (44). É igualmente facto assente que esse diploma não continha nenhuma referência à Diretiva 2016/801 nem estava acompanhado dessa referência, contrariamente às disposições do artigo 40.°, n.° 1, segundo parágrafo, dessa diretiva.

92.      O artigo 58.° da Lei de 15 de dezembro de 1980 dispõe que, «[q]uando um pedido de autorização de residência no Reino por mais de três meses seja apresentado num posto diplomático ou consular belga por um estrangeiro que pretenda realizar na Bélgica estudos de ensino superior ou neste país frequentar um ano de preparação para o ensino superior» (45), essa autorização deve ser concedida se o nacional de um país terceiro não se encontrar num dos casos previstos no artigo 3.°, primeiro parágrafo, n.os 5 a 8, e apresentar um certificado passado por uma instituição de ensino, a prova de que possui meios de subsistência suficientes, um atestado médico e um certificado da inexistência de condenações por crimes de direito comum.

93.      Resulta inequivocamente deste artigo que a autorização de residência pode ser recusada se o nacional de um país terceiro não preencher algumas das condições gerais e específicas de elegibilidade do pedido contidas nos artigos 7.° e 11.° da Diretiva 2016/801.

94.      Todavia, o artigo 58.° da Lei de 15 de dezembro de 1980 não prevê expressamente que o visto «estudante» pode ser recusado no caso de se demonstrar, através de provas ou de motivos sérios e objetivos, que a residência do nacional de um país terceiro prossegue uma finalidade diferente da de estudar na Bélgica. O caso previsto nessa disposição nacional de o pedido ser apresentado por um estrangeiro que «deseje realizar estudos na Bélgica no ensino superior» é interpretado pelo Conseil du contentieux des étrangers (Conselho do Contencioso dos Estrangeiros) no sentido de que implica examinar a vontade do nacional de um país terceiro de estudar no ensino superior. Trata‑se de um elemento constitutivo do pedido, pelo que o Estado belga pode indeferir um pedido se se verificar que esse nacional não tem essa intenção. Ora, penso que esse facto não pode ser entendido no sentido de que remete para o motivo de indeferimento de um pedido de admissão previsto no artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 e não pode ser interpretado no sentido de que garante a transposição desta disposição em conformidade com as exigências de clareza, de precisão e de previsibilidade acima referidas.

95.      Por conseguinte, considero que o artigo 58.° da Lei de 15 de dezembro de 1980, na sua versão aplicável ao litígio no processo principal, não assegura uma transposição do artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801 em condições que respeitem os princípios da segurança jurídica e da transparência.

C.      Quanto às modalidades processuais do recurso jurisdicional da decisão de indeferimento do pedido de autorização de residência ou de visto «estudante» (terceira questão prejudicial)

96.      Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, ao Tribunal de Justiça se o artigo 34.°, n.° 5, da Diretiva 2016/801, lido à luz do artigo 47.° da Carta, deve ser interpretado no sentido de que exige que os Estados‑Membros confiram à autoridade administrativa ou jurisdicional que conhece de um recurso interposto de uma decisão de indeferimento do pedido de autorização de residência ou de visto «estudante» o poder de alterar essa decisão e de substituir pela sua a apreciação da autoridade competente que a adotou (46).

97.      A primeira frase do artigo 34.°, n.° 5 da Diretiva 2016/801 confere expressamente aos requerentes a possibilidade de interporem recurso no Estado‑Membro em causa da decisão de indeferimento de um pedido de admissão, «em conformidade com a legislação nacional». Todavia, esta diretiva não contém nenhuma disposição relativa, por um lado, ao alcance e às modalidades desse recurso, especialmente aos prazos em que este deve ser interposto e julgado, e aos poderes que incumbem para esse efeito à autoridade administrativa ou jurisdicional chamada a pronunciar‑se e, por outro, aos efeitos da anulação da decisão adotada pela autoridade competente, nomeadamente à questão de saber de que prazo dispõe para adotar uma nova decisão. Os Estados‑Membros beneficiam, por conseguinte, de uma grande margem de apreciação. O legislador da União precisa apenas na segunda frase do artigo 34.°, n.° 5, da referida diretiva que as autoridades competentes do Estado‑Membro em causa devem indicar, por notificação escrita, o tribunal ou a autoridade administrativa junto do qual o recurso pode ser interposto, bem como o prazo em que este deve ser interposto.

98.      O Tribunal de Justiça interpretou o alcance da primeira frase do artigo 34.°, n.° 5, da Diretiva 2016/801 no Acórdão de 10 de março de 2021, Konsul Rzeczypospolitej Polskiej w N. (47), que dizia respeito à recusa de emissão de um visto «estudante», por uma autoridade consular polaca, a um nacional de um país terceiro que a havia solicitado. O Tribunal de Justiça declarou que, de acordo com o princípio da autonomia processual, o legislador da União deixou aos Estados‑Membros a liberdade de decidirem sobre a natureza e as modalidades concretas dos meios processuais de que dispõem os requerentes de vistos de longa duração abrangidos por essa diretiva. Os Estados‑Membros podem, portanto, conferir um poder de anulação ou de alteração à autoridade administrativa ou jurisdicional chamada a pronunciar‑se. Uma análise comparativa das diferentes legislações nacionais demonstra, a este respeito, que os Estados‑Membros adotaram soluções processuais muito variadas consoante as suas tradições jurídicas (48).

99.      Todavia, de acordo com a sua jurisprudência constante, o Tribunal de Justiça recordou que as características do processo de recurso previsto no artigo 34.°, n.° 5, da Diretiva 2016/801 devem ser determinadas em conformidade, por um lado, com o artigo 47.° da Carta, que impõe aos Estados‑Membros a obrigação de assegurarem uma proteção jurisdicional efetiva dos direitos individuais derivados da ordem jurídica da União (49), e, por outro, com o princípio da equivalência (as modalidades processuais não devem ser menos favoráveis do que as que regulam situações semelhantes sujeitas ao direito interno) e com o princípio da efetividade (as modalidades processuais não devem tornar impossível, na prática, ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pelo direito da União) (50).

100. No processo principal, apenas se coloca a questão do respeito do artigo 47.° da Carta e do princípio da efetividade.

101. No que diz respeito ao presente processo, há que salientar três aspetos.

102. O primeiro aspeto diz respeito à existência de um direito de recurso. Resulta da decisão de reenvio que a lei belga prevê um direito de recurso das decisões de indeferimento de um pedido de autorização de residência ou de visto «estudante». Este direito de recurso é interposto para o Conseil du contentieux des étrangers (Conselho do Contencioso dos Estrangeiros), que, de acordo com o artigo 39.°/1, n.° 1, da Lei de 15 de dezembro de 1980, é um órgão jurisdicional administrativo exclusivamente competente para conhecer dos recursos interpostos de decisões individuais adotadas em aplicação das leis relativas ao acesso ao território, à residência, ao estabelecimento e à expulsão de estrangeiros.

103. O segundo aspeto diz respeito ao alcance dos poderes da autoridade administrativa ou judicial chamada a conhecer do recurso. O órgão jurisdicional de reenvio precisa, a este respeito, que, nos termos do artigo 39.°/2, n.° 2, desta lei, o Conseil du contentieux des étrangers (Conselho do Contencioso dos Estrangeiros) tem competência para anular uma decisão que indefere um pedido de visto «estudante». Todavia, não indica em que medida essa sentença tem que ser respeitada pela autoridade competente.

104. O terceiro aspeto diz respeito aos prazos de julgamento. Embora o órgão jurisdicional de reenvio não se refira a esses prazos no pedido de decisão prejudicial, verifica‑se, à luz da jurisprudência do Tribunal de Justiça, que estes últimos assumem especial importância quando os poderes da autoridade administrativa ou jurisdicional que conhece do recurso são limitados ao poder de anulação, como é o caso na Bélgica (51). Por conseguinte, esclareço que, por força do artigo 39/82, n.os 1 e 4, da Lei de 15 de dezembro de 1980, o Conseil du contentieux des étrangers (Conselho do Contencioso dos Estrangeiros) tem o poder de ordenar a suspensão da execução da decisão da qual foi interposto recurso e decidir, para esse efeito, no prazo de 30 dias após esse pedido (52). Se a suspensão for ordenada, o pedido de anulação será decidido no prazo de quatro meses a contar da prolação da decisão.

105. Começarei a minha análise por um exame do requisito relativo à garantia de uma tutela jurisdicional efetiva exigida pelo artigo 47.° da Carta.

106. Os Acórdãos de 25 de julho de 2018, Alheto (53), de 29 de julho de 2019, Torubarov (54), e de 19 de março de 2020, Bevándorlási és Menekültügyi Hivatal (55), relativos à apreciação da legalidade de decisões sobre a concessão de proteção internacional, fornecem esclarecimentos úteis no contexto de regulamentações nacionais que apenas conferem um poder de anulação à autoridade administrativa ou jurisdicional competente, com exclusão de um poder de alteração.

107. Tais regulamentações não violam, em si mesmas, a exigência de uma proteção jurisdicional efetiva. Em contrapartida, o Tribunal de Justiça considera que cada Estado‑Membro deve adaptar o seu direito nacional para que, na sequência de uma anulação da decisão inicial e em caso de devolução do processo à autoridade competente, esta adote uma nova decisão, por um lado, num prazo curto e, por outro, que seja conforme com a apreciação contida na Sentença que decretou a anulação (56). O Tribunal de Justiça baseia o seu raciocínio em três considerações principais: a necessidade de assegurar um tratamento tão rápido quanto possível dos pedidos de proteção internacional, a preocupação de assegurar um efeito útil às disposições que consagram a existência de um direito de recurso e, por último, a necessidade de garantir um recurso jurisdicional efetivo em conformidade com o artigo 47.° da Carta.

108. Por razões diferentes das que presidem à adoção de uma decisão de concessão de proteção internacional, a decisão relativa à concessão de uma autorização de residência ou de um visto «estudante» deve ser adotada o mais rapidamente possível, a fim de permitir ao nacional de um país terceiro iniciar o seu ano de estudos na instituição de ensino superior na qual está regularmente inscrito e pagou as suas propinas.

109. Já, no âmbito da Diretiva 2004/114, o legislador da União sublinhava que qualquer decisão sobre um pedido de autorização de residência ou de visto «estudante» deve ser adotada num «prazo que não impeça o prosseguimento dos estudos em causa, assegurando‑se ao mesmo tempo que as autoridades competentes disponham de tempo suficiente para processar o pedido» (57).

110. A adoção da Diretiva 2016/801 tinha como objetivo melhorar e facilitar as condições de entrada e de residência de nacionais de países terceiros que pretendessem entrar na Europa para prosseguir os seus estudos, garantir a celeridade do seu processo de admissão e reforçar os seus direitos processuais (58). Estes objetivos exigem que o nacional de um país terceiro que preencha as condições substantivas necessárias para a obtenção da autorização de residência ou do visto «estudante» possa obter a emissão da autorização ou visto num prazo que lhe permita beneficiar dos direitos e benefícios desse estatuto.

111. Assim, resulta do artigo 34.°, n.° 1, da Diretiva 2016/801 que as autoridades competentes decidem o mais cedo possível, até 90 dias a contar da data de apresentação do pedido completo. A importância dos prazos está também expressa, por um lado, no considerando 42 desta diretiva, no qual o legislador da União insiste que as informações complementares exigidas sejam fornecidas pelo requerente num «prazo razoável», e, por outro, no considerando 43 da referida diretiva, no qual recomenda às autoridades competentes que notifiquem por escrito a decisão «o mais rapidamente possível».

112. Esta exigência de celeridade é inerente à natureza específica da residência «estudante» prevista pela Diretiva 2016/801 a favor dos nacionais de países terceiros.

113. A natureza dessa residência implica que o nacional de um país terceiro faça prova de todas as diligências exigidas para apresentar o seu pedido de autorização de residência ou de visto «estudante» num prazo razoável e, sendo caso disso, para o completar, em função do calendário adotado por cada uma das instituições de ensino superior em causa. Implica que o Estado‑Membro possa proferir uma decisão definitiva, eventualmente após a anulação de uma primeira decisão pela autoridade administrativa ou jurisdicional, antes do início do ano académico, e para conceder a esse nacional tempo suficiente para efetuar os outros passos necessários para a sua entrada e permanência no território do Estado‑Membro de acolhimento, especialmente, se residir fora desse território.

114. Por conseguinte, embora os Estados‑Membros possam conferir, como parece fazer o direito belga no caso em apreço, um poder de anulação à autoridade administrativa ou jurisdicional chamada a conhecer de um recurso interposto dessa decisão, com exclusão de um poder de alteração, o processo de recurso deve, no entanto, responder a uma exigência de celeridade, para garantir aos nacionais de países terceiros não só um recurso jurisdicional efetivo em conformidade com o artigo 47.° da Carta, mas também a plena eficácia dos direitos que lhes são conferidos pela Diretiva 2016/801. Esta exigência de celeridade não me parece inconciliável com a natureza da análise exigida pela apresentação de um pedido de autorização de residência ou de visto «estudante», uma vez que, na minha opinião, essa análise é desprovida de apreciações factuais complexas.

115. Daqui decorre, na minha opinião, que cada Estado‑Membro deverá, portanto, adaptar o seu direito nacional para que, na sequência da anulação de uma decisão inicial e em caso de devolução do processo à autoridade competente, esta adote uma nova decisão que seja conforme com a apreciação contida na Sentença que decretou a anulação e que seja, além disso, proferida antes do início do ano académico na instituição de ensino superior na qual o nacional de um país terceiro está regularmente inscrito.

116. Acrescento que, na definição destas modalidades processuais, os Estados‑Membros devem prestar especial atenção à situação dos requerentes que apresentam o seu pedido, apesar de residirem fora do território do Estado‑Membro em causa — colocando‑os em condições de exercerem de maneira efetiva o direito de interpor um recurso jurisdicional — e à situação daqueles que, apesar de estarem presentes no território desse Estado, dispõem de uma autorização de residência ou de um visto prestes a expirar.

117. À luz de todas estas considerações, proponho ao Tribunal de Justiça que declare que o artigo 34.°, n.° 5, da Diretiva 2016/801, lido à luz do artigo 47.° da Carta, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que um Estado‑Membro confira um poder de anulação à autoridade administrativa ou jurisdicional chamada a conhecer do recurso interposto de uma decisão de indeferimento de um pedido de autorização de residência ou de visto «estudante», com exclusão de um poder de alteração, desde que a nova decisão seja proferida pela autoridade competente antes do início do ano académico na instituição de ensino superior na qual o nacional de um país terceiro está regularmente inscrito.

V.      Conclusão

118. Tendo em conta todas estas considerações, proponho ao Tribunal de Justiça que responda às questões prejudiciais submetidas pelo Conseil d’État (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Bélgica) do seguinte modo:

1)      O artigo 20.°, n.° 2, alínea f), da Diretiva 2016/801/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de maio de 2016, relativa às condições de entrada e de residência de nacionais de países terceiros para efeitos de investigação, de estudos, de formação, de voluntariado, de programas de intercâmbio de estudantes, de projetos educativos e de colocação au pair,

deve ser interpretado no sentido de que:

–        os princípios da segurança jurídica e da transparência exigem que o Estado‑Membro que pretenda transpor esta disposição para a sua ordem jurídica interna preveja expressamente, num quadro legal claro, preciso e previsível, que tem a faculdade de indeferir um pedido de admissão com o fundamento de que tem provas ou motivos sérios e objetivos para concluir que o nacional de um país terceiro em causa pretende residir para efeitos distintos daqueles para os quais pede admissão. A transposição dessa disposição não impõe ao Estado‑Membro que enumere esses motivos.

–        uma autoridade competente de um Estado‑Membro só pode indeferir um pedido de admissão para efeitos de estudos se tiver provas ou motivos sérios e objetivos que demonstrem que a residência do nacional de um país terceiro no território nacional não tem por objeto nem por finalidade essencial a prossecução, a título de atividade principal, de um ciclo de estudos a tempo inteiro conducente à obtenção de um título de ensino superior reconhecido por esse Estado.

a decisão de indeferimento desse pedido deve ser precedida de um exame individualizado, no âmbito do qual a intenção do nacional de um país terceiro de prosseguir os seus estudos no território nacional deve ser avaliada com base em elementos tanto objetivos como subjetivos, entre os quais pode figurar a coerência do seu projeto de estudos.

2)      O artigo 34.°, n.° 5, da Diretiva 2016/801, lido à luz do artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia,

deve ser interpretado no sentido de que:

não se opõe a que um Estado‑Membro confira um poder de anulação à autoridade administrativa ou jurisdicional chamada a conhecer do recurso interposto de uma decisão de indeferimento de um pedido de admissão para efeitos de estudos, com exclusão do poder de alteração, desde que a nova decisão seja proferida pela autoridade competente antes do início do ano académico na instituição de ensino superior na qual o nacional de um país terceiro está regularmente inscrito.


1      Língua original: francês.


i      O nome do presente processo é um nome fictício. Não corresponde ao nome verdadeiro de nenhuma das partes no processo.


2      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de maio de 2016, relativa às condições de entrada e de residência de nacionais de países terceiros para efeitos de investigação, de estudos, de formação, de voluntariado, de programas de intercâmbio de estudantes, de projetos educativos e de colocação au pair (JO 2016, L 132, p. 21).


3      C‑491/13, EU:C:2014:2187.


4      Diretiva do Conselho, de 13 de dezembro de 2004, relativa às condições de admissão de nacionais de países terceiros para efeitos de estudos, de intercâmbio de estudantes, de formação não remunerada ou de voluntariado (JO 2004, L 375, p. 12).


5      V. Acórdão de 10 de setembro de 2014, Ben Alaya (C‑491/13, EU:C:2014:2187, n.º 34).


6      V. nota de síntese da Rede Europeia das Migrações, intitulada «Prevenção, deteção e combate ao abuso de autorizações de residência na UE para efeitos de estudos», março de 2022 (a seguir «nota de síntese da REM»), n.º 2.


7      V., neste sentido, Acórdão de 23 de janeiro de 2019, M.A. e o. (C‑661/17, EU:C:2019:53, n.º 60 e jurisprudência referida).


8      A seguir «Carta».


9      Moniteur belge de 31 de dezembro de 1980, p. 14584), na sua versão com a última redação que lhe foi dada pela Lei de 5 de maio de 2019 (Moniteur belge de 22 de agosto de 2019, p. 80425) (a seguir «Lei de 15 de dezembro de 1980»).


10      Ao qual se refere o Regulamento (CE) n.º 1987/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de dezembro de 2006, relativo ao estabelecimento, ao funcionamento e à utilização do Sistema de Informação de Schengen de segunda geração (SIS II) (JO 2006, L 381, p. 4); o Regulamento (UE) 2018/1860 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de novembro de 2018, relativo à utilização do Sistema de Informação de Schengen para efeitos de regresso dos nacionais de países terceiros em situação irregular (JO 2018, L 312, p. 1), e o Regulamento (UE) 2018/1861 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de novembro de 2018, relativo ao estabelecimento, ao funcionamento e à utilização do Sistema de Informação de Schengen (SIS) no domínio dos controlos de fronteira, e que altera a Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen e altera e revoga o Regulamento (CE) n.º 1987/2006 (JO 2018, L 312, p. 14) (V. artigo 1.º, n.º 17, da Lei de 15 de dezembro de 1980).


11      V. artigo 39/1.º da Lei de 15 de dezembro de 1980.


12      V. artigo 1.º, n.º 2, da Lei de 15 de dezembro de 1980.


13      Moniteur belge de 5 de agosto de 2021, p. 77965


14      Na audiência, os Governos Checo, Lituano, Luxemburguês, Húngaro e Neerlandês centraram as suas alegações na primeira questão para resposta oral colocada pelo Tribunal de Justiça, relativa à transposição da Diretiva 2016/801.


15      A forma e a duração da autorização de residência são especificadas nos artigos 17.º a 19.º da referida diretiva.


16      Sob reserva de uma análise mais aprofundada do requisito específico enunciado no artigo 11.º, n.º 1, alínea a), da Diretiva 2016/801, penso que a expressão «para efetuar um programa de estudos» não permite, por si só, exigir ao Estado‑Membro que verifique a vontade e a intenção do requerente de estudar. Na minha opinião, esta expressão deve permitir distinguir o requerente que pretenda fazer um ciclo de estudos daquele que se limita a um intercâmbio de duração limitada.


17      O motivo de recusa obrigatória previsto no artigo 20.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva 2016/801 visa a situação em que o requerente apresentou documentos falsificados ou os obteve de modo fraudulento. Sem prejuízo da interpretação desta disposição, a constatação de uma fraude implicaria também que a autoridade competente tivesse em conta a intenção do nacional de um país terceiro, neste caso, a intenção de contornar ou de eludir as condições de emissão da autorização de residência com vista a obter a vantagem que lhe está associada. V., a este respeito, os princípios enunciados pelo Tribunal de Justiça relativamente à conclusão pela existência de fraude, no Acórdão de 6 de fevereiro de 2018, Altun e o. (C‑359/16, EU:C:2018:63). A conclusão pela existência de uma fraude implica a verificação da existência de um conjunto de indícios concordantes que determinam a reunião de um elemento objetivo e de um elemento subjetivo. (n.º 50 desse Acórdão). Por conseguinte, apenas a fraude cometida material e intencionalmente pelo nacional do país terceiro que apresentou o pedido de autorização de residência ou de visto «estudante» pode ser objeto de uma sanção. No que respeita ao elemento subjetivo necessário para a constatação da fraude, esse elemento corresponde, segundo a definição dada no Acórdão de 6 de fevereiro de 2018, Altun e o. (C‑359/16, EU:C:2018:63) aplicado às circunstâncias do processo principal, à intenção da requerente de contornar ou de eludir as condições de emissão da autorização de residência com vista a obter a vantagem que lhe está associada.


18      Com efeito, o considerando 11 da Diretiva 2016/801 indica que «deverão aplicar‑se todas as disposições da Diretiva 2003/86/CE [do Conselho, de 22 de setembro de 2003, relativa ao direito ao reagrupamento familiar (JO 2003, L 251, p. 12)], incluindo os motivos de indeferimento, retirada ou recusa de renovação. Por conseguinte, os títulos de residência dos membros da família dos investigadores podem ser retirados ou não renovados se a autorização do investigador em causa caducar e os seus familiares não beneficiarem do direito a uma autorização de residência autónoma».


19      V. considerando 32 da Diretiva 2016/801.


20      O sublinhado é meu.


21      O artigo 24.º da referida diretiva enuncia as condições e os limites dentro dos quais um estudante pode, paralelamente ao prosseguimento dos seus estudos, exercer uma atividade profissional.


22      V., a este respeito, artigo 20.º, n.º 2, alínea d), da Diretiva 2016/801.


23      Resulta do considerando 54 da Diretiva 2016/801 que os estudantes do ensino superior beneficiam das disposições da Diretiva 2011/98/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, relativa a um procedimento de pedido único de concessão de uma autorização única para os nacionais de países terceiros residirem e trabalharem no território de um Estado‑Membro e a um conjunto comum de direitos para os trabalhadores de países terceiros que residem legalmente num Estado‑Membro (JO 2011, L 343, p. 1), que prevê um conjunto comum de direitos, baseado na igualdade de tratamento em relação aos nacionais do Estado‑Membro de acolhimento [considerando 20 e artigo 1, n.º 1, alínea b) da Diretiva 2011/98].


24      V. artigo 16.º, n.º 4, da Diretiva 2003/86 e, no que respeita à jurisprudência, Acórdão de 23 de setembro de 2003, Akrich (C‑109/01, EU:C:2003:491, n.º 57).


25      As outras versões linguísticas deste considerando, como as versões em língua espanhola, inglesa ou italiana, não utilizam as locuções «por um lado [...] por outro», mas sim a conjunção coordenativa «e».


26      A versão em língua italiana deste artigo refere‑se, aliás, expressamente ao conceito de «intenção» («che il cittadino di paese terzo intende soggiornare», o sublinhado é meu).


27      O sublinhado é meu.


28      O artigo 34.º, n.º 3, da referida diretiva permite à autoridade competente exigir ao requerente informações adicionais para justificar o seu pedido.


29      Resulta de uma análise comparativa das diferentes versões linguísticas do artigo 20.º, n.º 2, alínea f), da Diretiva 2016/801, primeiro, que os adjetivos «sérios e objetivos» se referem aos «motivos» e não às «provas» [V., por exemplo, versões em língua inglesa («the Member State has evidence or serious and objective grounds») ou italiana («lo Stato membro è in possesso di prove o ha motivi seri e oggettivi»] e, em segundo lugar, que o conceito de «motivos sérios» se distingue do de «razões graves» utilizado pelo legislador da União em numerosos textos de direito derivado relativos à residência dos cidadãos da União ou dos nacionais de países terceiros na União, como a Diretiva 2004/38/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros, que altera o Regulamento (CEE) n.º 1612/68 e que revoga as Diretivas 64/221/CEE, 68/360/CEE, 72/194/CEE, 73/148/CEE, 75/34/CEE, 75/35/CEE, 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/CEE (JO 2004, L 158, p. 77, e retificações no JO 2004, L 229, p. 35 e no JO 2005, L 197, p. 34).


30      V. por exemplo, sítio Internet Campus France Egito: https://www.egypte.campusfrance.org/fr/preparer‑un‑projet‑d‑etudes‑clair‑et‑coherent.


31      Resulta da nota de síntese da REM que a validação dos documentos e as entrevistas com os requerentes são os dois métodos mais frequentemente utilizados na fase anterior à chegada ao território nacional (n.º 2).


32      Resulta dos autos do processo nacional que o pedido de admissão apresentado às autoridades consulares belgas deve permitir ao nacional de um país terceiro demonstrar a realidade da sua intenção de residir na Bélgica na qualidade de estudante para aí prosseguir estudos superiores. O questionário deve permitir a esse nacional expor e fundamentar o seu projeto de estudos tendo em conta o seu percurso académico e as suas ambições profissionais, ao passo que a entrevista lhe deve dar a oportunidade de explicitar ou de defender esse projeto.


33      Saliento também que, no Acórdão de 18 de dezembro de 2014, McCarthy e o. (C‑202/13, EU:C:2014:2450), relativo à interpretação do artigo 35.º da Diretiva 2004/38, o Tribunal de Justiça declarou que o facto de um Estado‑Membro se ver confrontado com um número elevado de casos de abuso de direito ou de fraude cometidos por nacionais de países terceiros não pode justificar a adoção de medidas assentes em considerações de prevenção geral, com exclusão de qualquer apreciação específica do comportamento próprio da pessoa em causa (n.º 55).


34      V., também, o considerando 36 da Diretiva 2016/801, que precisa que «deverá ser possível recusar a admissão se um Estado‑Membro considerar, com base numa avaliação individual dos factos, e tendo em conta o princípio da proporcionalidade, que o nacional de um país terceiro representa uma potencial ameaça para a ordem pública, para a segurança pública ou para a saúde pública».


35      V. considerando 14 da Diretiva 2016/801 (o sublinhado é meu).


36      V., por analogia, Acórdão de 14 de março de 2019, Y. Z. e o. (Fraude no reagrupamento familiar) (C‑557/17, EU:C:2019:203, n.ºs 64 e 65).


37      A Lei de 11 de julho de 2021, que altera a Lei de 15 de dezembro de 1980 relativa ao acesso ao território, à residência, ao estabelecimento e ao afastamento de estrangeiros no que respeita aos estudantes, dispõe, no seu artigo 2.º, que «transpõe parcialmente a Diretiva 2016/801» e, no seu artigo 15.º, transpõe o motivo de recusa enunciado no artigo 20.º, n.º 2, alínea f), desta diretiva.


38      V., a este respeito, nota de síntese da REM, n.º 5.


39      V. Acórdão de 16 de fevereiro de 2023, DGRFP Cluj (C‑519/21, EU:C:2023:106, n.º 105).


40      V. Acórdão de 29 de junho de 2023, Stadt Frankfurt am Main e Stadt Offenbach am Main (Renovação de uma autorização de residência no segundo Estado‑Membro) (C‑829/21 e C‑129/22, EU:C:2023:525, n.º 77 e jurisprudência referida). Embora esta consideração diga respeito às disposições obrigatórias enunciadas no artigo 9.º, n.º 4, segundo parágrafo, e no artigo 22.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva 2003/109/CE do Conselho, de 25 de novembro de 2003, relativa ao estatuto dos nacionais de países terceiros residentes de longa duração (JO 2004, L 16, p. 44), conforme alterada pela Diretiva 2011/51/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de maio de 2011 (JO 2011, L 132, p. 1), penso que é aplicável por analogia a uma disposição facultativa como o artigo 20.º, n.º 2, alínea f), da Diretiva 2016/801.


41      V. Acórdão de 16 de fevereiro de 2023, DGRFP Cluj (C‑519/21, EU:C:2023:106, n.º 105).


42      V., por analogia, Acórdão de 13 de março de 2019, E. (C‑635/17, EU:C:2019:192, n.º 53 e jurisprudência referida).


43      V., também, Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho, de 28 de setembro de 2011, sobre a aplicação da Diretiva 2004/114/CE relativa às condições de admissão de nacionais de países terceiros para efeitos de estudos, de intercâmbio de estudantes, de formação não remunerada ou de voluntariado [COM (2011) 587 final], no qual a Comissão salientou «a obrigação mais geral que consiste em informar os nacionais de países terceiros sobre as regras aplicáveis à admissão de estudantes, para garantir a transparência e a segurança jurídica aos potenciais estudantes, incentivando‑os assim a estudar na UE» (p. 4 «Condições específicas aplicáveis aos estudantes»).


44      O Tribunal de Justiça declarou que pode considerar‑se que se enquadram no âmbito de aplicação de uma diretiva não só as disposições nacionais cujo objetivo expresso é transpor essa diretiva mas também, a partir da data de entrada em vigor da referida diretiva, as disposições nacionais já existentes, suscetíveis de assegurar a sua transposição para o direito nacional [V. Acórdão de 25 de julho de 2018, Alheto (C‑585/16, EU:C:2018:584, n.º 77 e jurisprudência referida)].


45      O sublinhado é meu.


46      Em apoio das suas observações, a recorrente no processo principal refere‑se ao artigo 46.º, n.os 1 e 3, da Diretiva 2013/32/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional (JO 2013, L 180, p. 60). Ora, considero que tal paralelo não pode ser estabelecido porque este artigo dispõe expressamente que o recurso efetivo de uma decisão que declara inadmissível ou infundado um pedido de proteção internacional prevê uma análise exaustiva e ex nunc da matéria de facto e de direito.


47      C‑949/19, EU:C:2021:186, n.ºs 37 a 46 e jurisprudência referida.


48      V. nota de síntese da REM, n.º 7.


49      V. Acórdão de 8 de novembro de 2022, Staatssecretaris van Justitie en Veiligheid (Exame oficioso da detenção) (C‑704/20 e C‑39/21, EU:C:2022:858, n.º 81 e jurisprudência referida).


50      V. Acórdão de 10 de março de 2021, Konsul Rzeczypospolitej Polskiej w N. (C‑949/19, EU:C:2021:186, n.ºs 42 a 44 e jurisprudência referida).


51      Esclareço que o processo Darvate e o. (C‑299/23), atualmente pendente no Tribunal de Justiça, diz especificamente respeito aos prazos de julgamento previstos na lei belga no contexto do artigo 34.º, n.º 5, da Diretiva 2016/801.


52      O pedido de suspensão com extrema urgência, que é tratado em 48 horas, está reservado às medidas de afastamento e de repulsão cuja execução é iminente.


53      C‑585/16, EU:C:2018:584.


54      C‑556/17, EU:C:2019:626.


55      C‑406/18, EU:C:2020:216.


56      V. Acórdão de 19 de março de 2020, Bevándorlási és Menekültügyi Hivatal (C‑406/18, EU:C:2020:216, n.º 22 e jurisprudência referida).


57      Artigo 18.º, n.º 1, da Diretiva 2004/114.


58      V. Commission staff working document, Impact assessment, que acompanha a proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às condições de entrada e de residência de nacionais de países terceiros para efeitos de investigação, de estudos, de intercâmbio de estudantes, de formação remunerada e não remunerada, de voluntariado e de colocação au pair [COM (2013) 151 final), disponível no seguinte endereço Internet: https://data.consilium.europa.eu/doc/document/ST‑7869‑2013‑ADD‑1/en/pdf (p. 19).