Language of document : ECLI:EU:T:2008:25

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

31 de Janeiro de 2008 (*)

«Variedades vegetais – Recurso para a instância de recurso do Instituto Comunitário das Variedades Vegetais – Inadmissibilidade – Inexistência de afectação individual – Tutela jurisdicional efectiva – Dever de fundamentação»

No processo T‑95/06,

Federación de Cooperativas Agrarias de la Comunidad Valenciana, com sede em Valência (Espanha), representada por S. Roig Girbes, R. Ortega Bueno e M. Delgado Echevarría, advogados,

recorrente,

contra

Instituto Comunitário das Variedades Vegetais (ICVV), representado por M. Ekvad, na qualidade de agente, assistido por D. O’Keefe, solicitor, J. Rivas de Andrés e M. Canal Fontcuberta, advogados,

recorrido,

sendo a outra parte no processo na instância de recurso do ICVV, interveniente no Tribunal de Primeira Instância,

Nador Cott Protection SARL, com sede em Saint‑Raphaël (França), representada por M. Fernández Mateos, S. González Malabia e M. Marín Bataller, advogados,

que tem por objecto um recurso da decisão da instância do recurso do ICVV de 8 de Novembro de 2005 (processo A 001/2005), relativo à atribuição da protecção comunitária à variedade de tangerina Nadorcott,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIADAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Segunda Secção),

composto por: N. J. Forwood, exercendo funções de presidente, I. Pelikánová e S. Papasavvas, juízes,

secretário: K. Andová, administradora,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 21 de Março de 2006,

vista a resposta do ICVV entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 7 de Julho de 2006,

vistas as observações da interveniente entradas na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 3 de Julho de 2006,

após a audiência de 4 de Julho de 2007,

profere o presente

Acórdão

 Quadro jurídico

1        O artigo 59.° do Regulamento (CE) n.° 2100/94 do Conselho, de 27 de Julho de 1994, relativo ao regime comunitário de protecção das variedades vegetais (JO L 227, p. 1, a seguir «regulamento de base»), que se refere à oposição ao reconhecimento de um direito, prevê:

«1.      Qualquer pessoa pode transmitir por escrito ao instituto a sua oposição ao reconhecimento de um direito comunitário de protecção de uma variedade vegetal.

2.      Os opositores devem ser partes no processo de reconhecimento do direito comunitário de protecção da variedade vegetal, paralelamente ao requerente. Sem prejuízo do disposto no artigo 88.°, os opositores devem ter acesso aos documentos, incluindo os resultados do exame técnico e a descrição da variedade, tal como referidos no n.° 2 do artigo 57.°

[…]

5.      As decisões relativas às oposições podem ser tomadas ao mesmo tempo que as decisões previstas nos artigos 61.°, 62.° ou 63.°»

2        O artigo 67.°, n.° 1, do regulamento de base enuncia que «[s]ão susceptíveis de recurso as decisões do instituto tomadas nos termos dos artigos 20.°, 21.°, 59.°, 61.° a 63.° e 66.°».

3        Nos termos do artigo 68.° do regulamento de base:

«Sem prejuízo do disposto no artigo 82.°, qualquer pessoa singular ou colectiva pode recorrer de uma decisão de que seja destinatária ou de uma decisão que, embora formalmente dirigida a outra pessoa, lhe diga directa e individualmente respeito. As partes no processo poderão ser partes no processo de recurso e o instituto será obrigatoriamente parte no processo.»

4        O artigo 49.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 1239/95 da Comissão, de 31 de Maio de 1995, que estabelece normas de execução do regulamento de base (JO L 121, p. 37, a seguir «regulamento de execução»), prevê, sob o título «Recusa do recurso por inadmissibilidade», que «[s]e o recurso não satisfizer ao disposto no regulamento de base, nomeadamente aos artigos 67.° a 69.° e ao disposto no presente regulamento, nomeadamente ao artigo 45.°, a instância de recurso comunicará esse facto ao recorrente e convidá‑lo‑á a corrigir as irregularidades detectadas, se possível num prazo que determinará» e que, «[s]e o recurso não for regularizado no prazo estabelecido, a instância de recurso declará‑lo‑á inadmissível».

5        O artigo 50.° do regulamento de execução, relativo ao processo oral na instância de recurso do Instituto Comunitário das Variedades Vegetais (ICVV), precisa:

«1.      Após a remissão do caso (remessa do processo), o presidente da instância de recurso convocará imediatamente as partes no processo de recurso para o processo oral, conforme previsto no artigo 77.° do regulamento de base, e chamará a sua atenção para o teor do n.° 2 do artigo 59.°

2.      O processo oral e a instrução desenrolar‑se‑ão em princípio em conjunto numa única audiência.

3.      Qualquer pedido de novo processo oral só será admissível se se basear em circunstâncias que tenham sofrido alterações no decurso da audiência ou posteriormente.»

 Antecedentes do litígio

6        A recorrente é uma federação que reúne os sindicatos de cooperativas agrícolas das províncias de Alicante, de Castellón e de Valência (Espanha), que reúnem, por sua vez, a quase totalidade das cooperativas agrícolas locais destas três províncias.

7        O titular da variedade de tangerina Nadorcott, Sr. N., cedeu, em 22 de Agosto de 1995, os seus direitos relativos a esta variedade ao Sr. M. Este último apresentou, no mesmo dia, um pedido de protecção comunitária desta variedade vegetal no ICVV.

8        O pedido foi publicado na Gazeta Oficial do ICVV de 26 de Fevereiro de 1996.

9        Em 21 de Março de 1997, o Sr. M. cedeu os seus direitos relativos à variedade Nadorcott à interveniente e notificou esta cessão ao ICVV.

10      O ICVV atribuiu a protecção comunitária à variedade da interveniente através da decisão n.° 14111, de 4 de Outubro de 2004 (a seguir «decisão de atribuição»).

11      A decisão de atribuição foi publicada na Gazeta Oficial do ICVV de 15 de Dezembro de 2004.

12      Em 11 de Fevereiro de 2005, a recorrente interpôs recurso da decisão de atribuição para a instância de recurso. Os fundamentos do recurso constam de um articulado de 14 de Abril de 2005. No que se refere, em especial, à admissibilidade desse recurso, a recorrente alegou, nesse articulado, que a atribuição da protecção à variedade Nadorcott lhe dizia directa e individualmente respeito. No que se refere ao mérito, considerou designadamente que essa protecção era nula devido à inexistência de novidade e de carácter distintivo da variedade em causa.

13      Em 24 de Fevereiro de 2005, a interveniente apresentou um pedido de intervenção e, em 29 de Julho de 2005, desenvolveu os seus argumentos num articulado separado. Alegou que a recorrente não tinha legitimidade para agir na medida em que, designadamente, a decisão de atribuição não lhe dizia directa e individualmente respeito. Contestou igualmente o fundamento do recurso.

14      No seu articulado de 15 de Setembro de 2005, o ICVV suscitou, a título liminar, uma questão prévia de inadmissibilidade do recurso por falta de legitimidade para agir. Quanto ao mérito, o ICVV pediu também que fosse negado provimento ao recurso.

15      A audiência na instância de recurso teve lugar em 8 de Novembro de 2005. A recorrente alegou aí que, nos termos do artigo 49.° do regulamento de execução, a instância de recurso devia, antes da audiência, tê‑la convidado a apresentar documentos que demonstrassem que a decisão de atribuição dizia directa e individualmente respeito aos seus membros. Solicitou que lhe fosse concedido um prazo para regressar a Espanha a fim de reunir e apresentar documentação exaustiva a esse respeito ou que, pelo menos, lhe fosse dada a possibilidade de apresentar na audiência a documentação incompleta que os seus representantes tinham trazido. Afirmou que desta documentação faziam parte documentos que lhe davam poderes para interpor recurso em nome de produtores individuais de tangerinas bem como um contrato celebrado entre a Geslive (organismo responsável pela gestão e defesa em Espanha dos direitos e interesses da interveniente sobre a variedade Nadorcott) e a cooperativa Anecoop (membro de um sindicato de cooperativas, membro da recorrente) relativo ao pagamento por esta última de direitos pela exploração da variedade Nadorcott.

16      Por decisão de 8 de Novembro de 2005 (a seguir «decisão recorrida»), a instância de recurso julgou o recurso da recorrente inadmissível, por esta não ter legitimidade para agir. Indeferiu ainda o seu pedido de apresentação de documentos.

 Pedidos das partes

17      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal de Primeira Instância se digne:

–        anular a decisão recorrida;

–        condenar o ICVV nas despesas.

18      O ICVV conclui pedindo que o Tribunal de Primeira Instância se digne:

–        negar provimento ao recurso na íntegra;

–        condenar a recorrente nas despesas e, a título subsidiário, no caso de ser dado provimento ao recurso, condenar o ICVV apenas nas suas próprias despesas.

19      A interveniente conclui pedindo que o Tribunal de Primeira Instância se digne:

–        negar provimento ao recurso na íntegra;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

20      Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca essencialmente três fundamentos baseados, o primeiro, numa violação dos artigos 49.° e 50.° do regulamento de execução e dos princípios da diligência e da boa administração, o segundo, no indevido não reconhecimento pela instância de recurso da sua legitimidade para agir e, o terceiro, no não cumprimento do dever de fundamentação.

1.     Quanto ao primeiro fundamento, relativo a uma violação dos artigos 49.° e 50.° do regulamento de execução e dos princípios da diligência e da boa administração

21      O primeiro fundamento divide‑se em duas partes relativas, a primeira, a uma violação do artigo 49.° do regulamento de execução e, a segunda, a uma violação do artigo 50.° do regulamento de execução. Em ambas as partes a recorrente alega também violações dos princípios da diligência e da boa administração.

 Quanto à primeira parte, relativa à violação do artigo 49.° do regulamento de execução e dos princípios da diligência e da boa administração

 Argumentos das partes

22      A recorrente alega que, caso o seu recurso não respeitasse o artigo 68.° do regulamento de base, a instância de recurso deveria, nos termos do artigo 49.° do regulamento de execução, ter‑lhe notificado esse facto e convidá‑la a corrigir as irregularidades detectadas, se possível, dentro dos prazos fixados pela instância de recurso. Ora, a instância de recurso nunca notificou a recorrente de que não tinha legitimidade para agir e não a convidou a corrigir essa irregularidade. O comportamento da instância de recurso baseia‑se assim numa interpretação errada do artigo 49.° do regulamento de execução.

23      Em primeiro lugar, segundo a recorrente, resulta da leitura do artigo 49.° do regulamento de execução que não se pode alegar que este artigo faz referência apenas às «irregularidades evidentes de um recurso». Na medida em que esta disposição menciona expressamente entre essas irregularidades a inadmissibilidade referida no artigo 68.° do regulamento de base, é pouco provável que o legislador comunitário tenha querido referir apenas irregularidades evidentes, não sendo nunca evidente uma irregularidade relativa à inadmissibilidade. Deste modo, independentemente da dificuldade que pressuporia a correcção da irregularidade, a instância de recurso estava obrigada a respeitar a obrigação prevista no artigo 49.° do regulamento de execução quando fosse possível corrigir a irregularidade. A recorrente baseia‑se a este respeito não apenas nos princípios da diligência e da boa administração, mas também numa garantia conferida pela ordem jurídica comunitária ao recorrente, que não pode ser interpretada de forma tão restritiva como sucedeu no presente caso. A recorrente baseia‑se por outro lado no não provimento do recurso devido à sua alegada falta de legitimidade para agir para sublinhar que a instância de recurso não contesta que esta irregularidade existia nem que ainda teve dúvidas na audiência relativamente a elementos relevantes para apreciar a sua legitimidade.

24      Em segundo lugar, a recorrente contesta a interpretação por parte da instância de recurso dos termos «se possível» do artigo 49.° do regulamento de execução. Em sua opinião, não cabe à instância de recurso examinar se a irregularidade é susceptível de ser facilmente corrigida e, ainda que devesse proceder a esse exame, seria sempre obrigada a pedir ao recorrente que corrigisse a irregularidade. Na medida em que cabia ao administrado, e não à instância de recurso, procurar corrigir a irregularidade detectada, esta última não pode proceder imediatamente a uma análise para saber se o recorrente pode ou não corrigi‑la. Esta interpretação conduziria a uma situação de arbitrariedade, na medida em que o exercício de um direito do administrado estaria sujeito à percepção que a Administração tem da capacidade de este último exercer o seu direito.

25      Em terceiro lugar, a recorrente sublinha que o artigo 49.° do regulamento de execução está redigido de forma imperativa quando prevê que «a instância de recurso comunicará esse facto ao recorrente e convidá‑lo‑á a corrigir as irregularidades detectadas». Desta forma, este artigo obriga a instância de recurso a notificar a irregularidade e a convidar a corrigi‑la. Ora, a instância de recurso não respeitou estas duas obrigações. Em contrapartida, segundo a recorrente, a instância de recurso não tem obrigação de lhe indicar que deve apresentar documentos para corrigir a irregularidade. Com efeito, o artigo 49.° do regulamento de execução não prevê esta situação, na medida em que a apresentação de documentos é apenas um dos numerosos meios à disposição do administrado para corrigir a irregularidade detectada.

26      Em quarto lugar, a recorrente considera que a notificação das objecções das outras partes relativas à admissibilidade do recurso não justifica a falta de diligência da instância de recurso no cumprimento da sua obrigação prevista no artigo 49.° do regulamento de execução. Esta última não pode fazer depender o cumprimento da sua obrigação de um exame do conteúdo das alegações das partes nem agir apenas quando as partes não se refiram a irregularidades visadas no artigo 49.° do regulamento de execução. Com efeito, não se trata de um «processo de justiça privada».

27      Em quinto lugar, a recorrente considera que a instância de recurso negligencia a natureza administrativa do processo de recurso quando considera que o facto de autorizar a recorrente a corrigir a falta de legitimidade para agir equivale a julgar antecipadamente uma questão contestada pelas partes. Relembra que a inadmissibilidade é uma questão de ordem pública que o órgão para o qual foi interposto o recurso examina oficiosamente. Desta forma, é indiferente que a falta de legitimidade para agir tenha sido suscitada pelas partes.

28      Em último lugar, a recorrente alegou pela primeira vez na audiência no Tribunal que o único documento que lhe foi comunicado pela instância de recurso antes da audiência era relativo a uma decisão de suspensão de 27 de Junho de 2005, segundo a qual, sem prejuízo da decisão final, a instância de recurso não considerou que o recurso carecesse manifestamente de fundamento. Alegou que dessa decisão e da não aplicação do artigo 49.°, n.° 1, do regulamento de execução decorria para si uma confiança legítima em que a sua legitimidade para agir tinha sido suficientemente demonstrada antes da audiência.

29      O ICVV considera que a interpretação do artigo 49.° do regulamento de execução proposta pela recorrente não tem fundamento. Considerando que a falta de legitimidade para agir só dificilmente pode ser corrigida, o ICVV sustenta que a referência feita no artigo 49.° do regulamento de execução ao artigo 68.° do regulamento de base só pode remeter para a correcção de erros meramente formais. Além disso, tendo a recorrente respondido, durante a fase escrita, às alegações relativas ao facto de a decisão não lhe dizer directa e individualmente respeito que foram formuladas pela interveniente, a legitimidade da recorrente para agir transformou‑se numa «questão de mérito» do processo. Desta forma, não era necessário que a instância de recurso tentasse que fosse corrigida esta irregularidade como um erro formal. Por outro lado, segundo o ICVV, reconhecer que tinham sido conferidos poderes pelos produtores individuais teria significado permitir a uma nova entidade tornar‑se parte no processo, quando o prazo conferido para agir já tinha expirado. Na medida em que interpôs o recurso em seu próprio nome, a recorrente não podia invocar na audiência poderes conferidos por produtores individuais que não são membros directos da sua organização.

30      Segundo a interveniente, a instância de recurso não é obrigada a verificar previamente se resulta dos documentos apresentados pela recorrente que esta tem efectivamente legitimidade para agir. Cabe à recorrente invocar a sua legitimidade e apresentar os respectivos elementos de prova. O artigo 49.° do regulamento de execução obriga a instância de recurso a verificar se este requisito formal está preenchido, mas não lhe impõe que verifique se a recorrente tem efectivamente legitimidade para agir.

 Apreciação do Tribunal

31      Na presente parte do fundamento, a recorrente acusa a instância de recurso, por um lado, de não a ter notificado de que considerava que a recorrente não tinha legitimidade para agir e, por outro, de não a ter convidado a demonstrar a sua legitimidade.

32      Em primeiro lugar, há que verificar se a instância de recurso, como afirma a recorrente, violou o artigo 49.°, n.° 1, do regulamento de execução. A este respeito, há que salientar, a título preliminar, que esta disposição obriga a instância de recurso, por um lado, a verificar a conformidade do recurso com as disposições dos regulamentos de base e de execução e, por outro, a notificar o recorrente das irregularidades detectadas, convidando‑o a corrigi‑las, se tal for possível, dentro do prazo que a mesma instância fixar.

33      Relativamente à obrigação de verificar a conformidade do recurso com as disposições dos regulamentos de base e de execução, há que referir que as outras versões linguísticas do artigo 49.°, n.° 1, do regulamento de execução visam a conformidade do recurso com todas as disposições dos dois regulamentos ao passo que as versões francesa e grega visam um controlo por parte da instância de recurso da conformidade do recurso apenas com as disposições dos artigos 67.°, 68.° e 69.° do regulamento de base e com as do artigo 45.° do regulamento de execução. Ora, dado que a necessidade de uma interpretação uniforme dos regulamentos comunitários exclui que se considere isoladamente um texto determinado e exige, em caso de dúvida, que ele seja interpretado e aplicado à luz das versões estabelecidas nas outras línguas oficiais (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 17 de Outubro de 1996, Lubella, C‑64/95, Colect., p. I‑5105, n.° 17 e jurisprudência referida), o Tribunal considera que as versões francesa e grega do artigo 49.°, n.° 1, do regulamento de execução não conferem a esta passagem um sentido diferente do das outras versões linguísticas e que aquelas devem ser interpretadas e aplicadas à luz das versões redigidas nas outras línguas oficiais (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 27 de Fevereiro de 1997, Ebony Maritime e Loten Navigation, C‑177/95, Colect., p. I‑1111, n.os 29 a 31).

34      Relativamente à dupla obrigação de notificar e de convidar a corrigir, há que salientar, em primeiro lugar, que resulta designadamente das versões alemã, inglesa, dinamarquesa, espanhola, italiana e neerlandesa do artigo 49.°, n.° 1, do regulamento de execução que o termo «se possível» faz depender a obrigação de notificar e de convidar a corrigir da possibilidade objectiva de corrigir as irregularidades detectadas. Desta forma, contrariamente ao que a recorrente alega, esta disposição obriga a instância de recurso a analisar a possibilidade de o recorrente corrigir uma irregularidade de forma a limitar os seus convites às correcções possíveis. Com efeito, na medida em que o objectivo do dever de notificar e de convidar a corrigir previsto no artigo 49.°, n.° 1, do regulamento de execução consiste em permitir que o recorrente corrija, dentro do prazo fixado, as irregularidades detectadas pela instância de recurso, deve ser possível corrigir as referidas irregularidades. Ora, como alegam o ICVV e a interveniente, a falta de legitimidade para agir não pode ser corrigida.

35      Por outro lado, o artigo 49.°, n.° 1, do regulamento de execução designa o que deverá ser objecto de correcção através dos termos «irrégularités» em francês, «Mängel» em alemão, «deficiencies» em inglês, «irregolarità» em italiano, «mangler» em dinamarquês e «irregularidades» em português, o que leva a pensar que visam a correcção de erros de tipo formal [v., por exemplo, a utilização destes termos na regra 9, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 2868/95 da Comissão, de 13 de Dezembro de 1995, relativo à execução do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, sobre a marca comunitária (JO L 303, p. 1), e no artigo 10, n.os 1 e 2, do Regulamento (CE) n.° 2245/2002 da Comissão, de 21 de Outubro de 2002, de execução do Regulamento (CE) n.° 6/2002 do Conselho relativo aos desenhos ou modelos comunitários (JO L 341, p. 28)]. De igual modo, os termos «rectifié» em francês, «berichtigt» em alemão, «berigtiges» em dinamarquês, «rettificato» em italiano e «regularizado» em português, utilizados no segundo período do artigo 49.°, n.° 1, do regulamento de execução, visam antes a correcção de erros formais (v., por exemplo, a regra 53 do Regulamento n.° 2868/95 e, relativamente aos termos francês, alemão e dinamarquês, o artigo 12.°, n.° 2, do Regulamento n.° 2245/2002) e não um pedido de argumentação ou de provas suplementares que uma parte ainda não tenha apresentado e que sejam relativos a elementos essenciais da admissibilidade do seu recurso, como seja a legitimidade para agir.

36      Deste modo, há que considerar que o artigo 49.°, n.° 1, do regulamento de execução não obrigava a instância de recurso a convidar a recorrente a corrigir a falta de legitimidade para agir que tinha detectado, dado que essa irregularidade constitui uma irregularidade substancial que não pode ser «regularizad[a]» na acepção do segundo período desta disposição e que não pode ser corrigida.

37      Há que considerar, em segundo lugar, que o dever de notificar está ligado ao de convidar a corrigir as irregularidades susceptíveis de o serem. Com efeito, se assim não fosse, e dado que o artigo 49.°, n.° 1, do regulamento de execução obriga a instância de recurso a controlar a conformidade do recurso com todas as disposições dos regulamentos de base e de execução, esta seria assim obrigada a notificar qualquer problema de admissibilidade, incluindo os problemas que não podem ser corrigidos, o que é contrário ao objectivo desta disposição como foi acima referido no n.° 34. Embora em determinadas situações específicas a notificação de um problema de admissibilidade que não pode ser corrigido possa, é certo, servir para proteger um recorrente de uma decisão baseada num raciocínio que não foi objecto de discussão, um dever tão genérico de notificar seria a maior parte das vezes uma tarefa pesada para a instância de recurso e, simultaneamente, inoperante, na medida em que o recorrente não a poderia corrigir. Além disso, há ainda que recordar que, no presente caso, a falta de legitimidade para agir da recorrente já tinha sido suscitada pelas partes e fazia parte dos elementos do litígio.

38      Com efeito, desde o pedido de intervenção de 24 de Fevereiro de 2005 que a recorrente tinha sido alertada para este problema, pelo que já não era necessária uma notificação por parte da instância de recurso para que se pudesse pronunciar. Com efeito, no seu articulado de 14 de Abril de 2005, a recorrente reagiu às alegações da interveniente e expôs os motivos pelos quais considerava ter legitimidade para agir. Além disso, a interveniente precisou, no seu articulado de 29 de Julho de 2005, os seus argumentos relativos à falta de legitimidade para agir da recorrente e o ICVV alegou igualmente, no seu articulado, que a recorrente carecia dessa legitimidade.

39      Por outro lado, contrariamente ao que a recorrente afirma, a referência do artigo 49.°, n.° 1, do regulamento de execução ao artigo 68.° do regulamento de base não se opõe a esta interpretação, uma vez que, na implementação desta disposição, também se podem colocar problemas de ordem formal que podem ser corrigidos. A título exemplificativo, abrindo‑se com esta disposição uma via de recurso para as pessoas colectivas, estas são obrigadas, nos termos do artigo 82.° do regulamento de base, a indicar a sua sede ou estabelecimento, ou o domicílio de um mandatário. Se essa indicação tiver sido omitida, a instância de recurso é obrigada a notificar essa irregularidade à recorrente e a convidá‑la a corrigir a mesma.

40      Daqui resulta que a instância de recurso não violou o artigo 49.°, n.° 1, do regulamento de execução ao não ter notificado a recorrente de que considerava que esta não tinha legitimidade para agir e ao não a ter convidado a corrigir esta irregularidade.

41      Em segundo lugar, relativamente à alegada violação dos princípios da diligência e da boa administração, há que salientar que a recorrente não indicou qualquer circunstância que permita detectar uma violação destes princípios, para além do facto de a instância de recurso não lhe ter notificado a falta de legitimidade para agir que tinha detectado e de não a ter convidado a corrigi‑la. Ora, na medida em que resulta designadamente dos n.os 34 a 40, supra, que esta posição da instância de recurso estava em conformidade com as exigências do artigo 49.°, n.° 1, do regulamento de execução, a mesma não violou os princípios da diligência e da boa administração.

42      Em último lugar, relativamente à alegação da recorrente sobre a sua confiança legítima quanto à sua legitimidade para agir ter ficado suficientemente assente antes da audiência, há que salientar que a recorrente suscitou este argumento pela primeira vez na audiência no Tribunal. Ora, a decisão de suspensão de 27 de Junho de 2005, que a recorrente invoca em apoio da sua confiança legítima, foi proferida em resposta a um pedido da interveniente que tinha por objecto o levantamento do efeito suspensivo do recurso interposto pela recorrente da decisão de atribuição. Há que salientar que essa decisão não emana da instância de recurso mas de um comité diferente, competente para proferir decisões de levantamento do efeito suspensivo dos recursos, comité esse que, aliás, não era composto pelas mesmas pessoas que compunham a instância de recurso. Além disso, este comité observou, no n.° 10 da sua decisão, que era delicado apreciar, no estado actual do processo, o fundamento do recurso da recorrente pendente na instância de recurso, designadamente porque a interveniente ainda não tinha apresentado as suas alegações. Salientou em seguida que, sem prejuízo da posição final do ICVV, não concluía, naquele momento, que o recurso carecesse manifestamente de fundamento. Daqui resulta que o comité não efectuou uma apreciação específica sobre a admissibilidade do recurso da recorrente nem se referiu a essa decisão da instância de recurso. Formulou, além disso, as suas apreciações sob reserva da decisão final. Nestas circunstâncias, há que considerar que esta decisão não podia criar para a recorrente uma confiança legítima na aceitação da sua legitimidade para agir na instância de recurso. Consequentemente, há que julgar este argumento improcedente.

43      Daqui resulta que há que julgar improcedente a primeira parte do fundamento.

 Quanto à segunda parte, relativa a uma violação do artigo 50.° do regulamento de execução e dos princípios da diligência e da boa administração

 Argumentos das partes

44      A recorrente considera que a instância de recurso devia, nos termos do artigo 50.° do regulamento de execução, ter realizado uma segunda audiência a fim de permitir às outras partes examinar os documentos que tinha intenção de apresentar para fundamentar a admissibilidade do seu recurso. A este respeito, a recorrente observa que, segundo a redacção do artigo 50.° do regulamento de execução, a audiência é a fase do processo durante o qual decorre a instrução. A recorrente deduz deste artigo que a instância de recurso deve autorizar, em aplicação do princípio da boa administração, a apresentação de todos os elementos de prova que as partes considerem necessários ou, se tal não for possível, realizar uma segunda audiência, como prevê expressamente o regulamento de execução.

45      Segundo a recorrente, embora as instituições comunitárias tenham um determinado poder de apreciação no exercício das suas competências, não deixa de ser verdade que esse poder é contrabalançado pelos princípios da diligência e da boa administração que as obrigam a tomar uma decisão com pleno conhecimento de causa. A jurisprudência reconheceu assim que, nos casos em que as instituições dispõem de um poder de apreciação, o respeito das garantias conferidas pela ordem jurídica comunitária nos processos administrativos, entre as quais figura a obrigação de a instituição competente examinar, com cuidado e imparcialidade, todos os elementos relevantes do caso em apreço, reveste uma importância fundamental.

46      Se a conclusão de que a recorrente não tem legitimidade para agir contra a decisão de atribuição implica que esta seja privada da única via de recurso efectivo disponível, tanto no direito comunitário como no direito nacional, a instância de recurso devia, no entender da recorrente, ter‑lhe dado a oportunidade de resolver a questão da admissibilidade sobre a qual a instância de recurso tinha dúvidas.

47      O ICVV considera que a instância de recurso não tinha qualquer obrigação de aceitar a apresentação de documentos requerida pela recorrente, na medida em que esses documentos não eram relevantes para efeitos da análise da legitimidade desta para agir, que interpôs o recurso em seu próprio nome e não no de produtores individuais determinados. A admissão desses documentos teria constituído uma violação das garantias processuais ao alterar substancialmente o recurso na fase da audiência. Acresce que o ICVV considera que, na medida em que a instância de recurso reconheceu que os fornecedores de material da variedade Nadorcott podem ser afectados pela decisão de atribuição, a apresentação na audiência de um contrato entre a Geslive e a Anecoop relativo ao pagamento de direitos não teria relevância para a análise da legitimidade para agir da recorrente. Além disso, os regulamentos que regem a tramitação na instância de recurso não impediam a recorrente de apresentar por escrito observações relativamente aos argumentos quanto à inadmissibilidade constantes dos articulados da interveniente de 29 de Julho de 2005 e do ICVV de 15 de Setembro de 2005. Por último, a decisão relativa à oportunidade de uma segunda audiência enquadra‑se, segundo o ICVV, na autonomia de que deve dispor uma instância de recurso tendo em conta questões de economia processual.

48      A interveniente considera, além disso, que foi com razão que a instância de recurso indeferiu o pedido da recorrente, uma vez que a admissão de novos documentos teria implicado a realização de uma nova audiência, em violação do princípio da audiência única consagrado no artigo 50.° do regulamento de execução.

 Apreciação do Tribunal

49      A título liminar, há que recordar que a recorrente requereu durante a audiência na instância de recurso, a título principal, que lhe fosse concedido um prazo para reunir e posteriormente remeter à instância de recurso documentação completa que demonstrasse que os seus membros eram directa e individualmente afectados pela decisão de atribuição. A título subsidiário, pediu que lhe fosse possibilitado apresentar na audiência a documentação incompleta que os seus representantes tinham trazido, que incluía as procurações outorgadas pelos produtores individuais para interpor recurso da decisão de atribuição e um contrato entre a cooperativa Anecoop e a Geslive sobre o pagamento de direitos pela exploração da variedade Nadorcott.

50      Em primeiro lugar, relativamente à alegada violação do artigo 50.° do regulamento de execução, há que salientar que os seus n.os 1 e 2 organizam uma resolução rápida dos litígios, através de um processo oral convocado sem prazo e concentrado numa única audiência. Resulta do n.° 3 do mesmo artigo que só pode ser solicitada uma segunda audiência quando seja considerada necessária devido a uma alteração dos factos, ocorrida durante ou posteriormente à audiência.

51      A este respeito, há que notar, em primeiro lugar, que os documentos que a recorrente pretendia apresentar não se baseavam em factos que se tivessem alterado durante ou posteriormente à audiência. Com efeito, o contrato e as procurações que pretendia juntar na audiência são manifestamente documentos que foram elaborados antes da referida audiência. Em todo o caso, nem esses documentos nem as procurações suplementares que a recorrente pretendia apresentar depois da audiência podem ser considerados modificativos dos factos do litígio. O ICVV e a interveniente sublinham com razão, por um lado, que a recorrente interpôs o recurso em seu próprio nome e não pode ser substituída, no decurso da instância, por outras pessoas que não interpuseram recurso dentro do prazo previsto. Por outro lado, do contrato não resulta qualquer facto novo, porque, como foi salientado pela instância de recurso, o mesmo se limita a evidenciar que os produtores individuais de tangerinas e, eventualmente, a Anecoop devem pagar direitos pelo fornecimento e pela utilização da variedade protegida. Ora, esta obrigação decorre directamente do sistema de protecção das variedades vegetais e foi reconhecida pela instância de recurso sem necessidade de prova.

52      Em segundo lugar, ainda que se admita que os elementos de prova alegados eram relevantes, a recorrente beneficiou de um prazo de vários meses entre a apresentação dos articulados da interveniente e do ICVV e a audiência. Durante esse período, teve possibilidade de reunir e apresentar os documentos ou, pelo menos, de solicitar à instância de recurso o adiamento da audiência para permitir a análise de todos os elementos de prova durante uma única audiência. Com efeito, nada indica que, se a recorrente tivesse feito prova da diligência exigida no que respeita à preparação da audiência, a instrução não se tivesse podido desenrolar numa única audiência.

53      Daqui resulta que, não reunindo as circunstâncias do processo os requisitos enunciados no artigo 50.° do regulamento de execução para a realização de uma segunda audiência, a instância de recurso não violou esta disposição ao indeferir os pedidos da recorrente.

54      Em segundo lugar, relativamente à alegada violação dos princípios da diligência e da boa administração, há que salientar que a recorrente não adiantou qualquer circunstância que permitisse constatar uma violação destes princípios, para além do facto de a instância de recurso não ter autorizado a apresentação dos elementos de prova que os representantes da recorrente tinham levado para a audiência ou que queriam apresentar posteriormente. Ora, resulta do que precede que a instância de recurso não é obrigada, pelo artigo 50.° do regulamento de execução, a autorizar a apresentação de todos os elementos de prova que as partes considerem necessários. Pelo contrário, em nome da boa administração, a instância de recurso só deve, segundo esta disposição, aceitar provas que impliquem a realização de uma segunda audiência se se tratar de elementos relevantes baseados em factos que se alteraram durante ou após a audiência.

55      Foi também salientado que, no presente caso, não ficou provado que as provas que a recorrente considera deverem ser analisadas pela instância de recurso se baseiam em factos que se alteraram durante ou após a audiência a audiência (v. n.° 51, supra). Além disso, as provas oferecidas não são relevantes no presente caso (v. n.° 51, supra) e não foram apresentadas em tempo útil de forma a permitir a sua análise durante uma única audiência (v. n.° 52, supra). Nestas circunstâncias, a redacção do artigo 50.° do regulamento de execução opõe‑se à aceitação destas provas. Daqui resulta que a instância de recurso não podia violar, ao recusar estes elementos de prova, os princípios da diligência e da boa administração.

56      Consequentemente, há que julgar improcedente a segunda parte do fundamento.

57      Resulta de tudo o que precede que improcede o primeiro fundamento.

2.     Quanto ao segundo fundamento, relativo ao indevido não reconhecimento da legitimidade para agir da recorrente

58      O segundo fundamento articula‑se em duas partes relativas, a primeira, ao facto de a recorrente e os seus membros serem individualmente afectados pela decisão de atribuição e, a segunda, a uma alegada falta de tutela jurisdicional efectiva.

 Quanto à primeira parte, relativa ao facto de a recorrente e os seus membros serem individualmente afectados pela decisão de atribuição

 Argumentos das partes

59      Em primeiro lugar, a recorrente acusa a instância de recurso de ser ter concentrado no facto de a recorrente ser uma associação e de ter negligenciado a legitimidade para agir dos seus membros. Não há que examinar exclusivamente se a recorrente tem por si mesma legitimidade para agir contra a decisão de atribuição, mas sim examinar também se os seus membros ou os membros dos seus membros (no caso em apreço a Copal de Algemesi, membro da Anecoop) têm a referida legitimidade. Ora, na decisão recorrida, a instância de recurso não tomou em consideração a jurisprudência do Tribunal de Primeira Instância segundo a qual as associações de empresas também podem pedir a anulação de actos quando os seus membros possam interpor recurso a título individual.

60      Em segundo lugar, a recorrente considera que a instância de recurso fez erradamente depender o reconhecimento da sua legitimidade para agir da de todos os seus membros. Desta forma, a instância de recurso deu importância ao facto de apenas alguns membros da recorrente serem abrangidos pela decisão de atribuição enquanto produtores ao passo que outros poderiam não o ser. Ora, segundo a jurisprudência, as associações que tenham pelo menos um membro que possa por si próprio interpor recurso têm legitimidade para agir.

61      Em terceiro lugar, a recorrente contesta as considerações da instância de recurso relativas à questão de saber se a recorrente representa realmente os interesses gerais dos produtores em causa. Segundo a recorrente, a instância de recurso negligenciou o facto de a recorrente contestar a protecção da variedade Nadorcott em nome de todos os produtores membros das cooperativas, os quais, nos termos do artigo 2.°, alínea a), dos seus estatutos, representa os sindicatos de cooperativas, que não manifestaram qualquer oposição ao recurso em causa e que representam eles próprios as cooperativas. Além disso, resulta da jurisprudência que se pressupõe que todos os membros de uma associação conferiram poderes a esta para agir em seu nome, se os estatutos o previrem e se os membros não tiverem manifestado a sua oposição.

62      Em quarto lugar, a recorrente considera que a instância de recurso cometeu um erro ao afirmar que a decisão de atribuição não lhe diz individualmente respeito, na medida em que não possui determinadas qualidades que lhe sejam específicas ou que não se encontra numa situação de facto que a caracterize relativamente a qualquer outra pessoa. Resulta da jurisprudência que este requisito está preenchido quando a situação jurídica da empresa em causa é afectada pelo acto recorrido devido a determinadas qualidades que lhe são específicas ou a uma situação de facto que a caracteriza relativamente a qualquer outra pessoa e a individualiza de forma análoga à do destinatário do acto. O facto de o acto produzir efeitos relativamente a todos os operadores económicos interessados não impede que o mesmo diga individualmente respeito a alguns deles.

63      Em primeiro lugar, relativamente à qualidade da recorrente enquanto fornecedor de material vegetal, a decisão de atribuição tem como consequência que qualquer pessoa que queira participar na reprodução ou no fornecimento de material vegetal tem de dispor de uma licença concedida pelo titular. Consequentemente, seria necessário examinar se a situação jurídica dos membros da recorrente é afectada de forma diferente da dos outros reprodutores ou fornecedores de material vegetal. Ora, a decisão de atribuição obrigou determinados membros da recorrente que forneciam a variedade Nadorcott a cessar essa actividade, facto que acarretou prejuízos importantes, o que os individualizou relativamente a qualquer outro fornecedor de material vegetal. Embora a instância de recurso mencione na decisão recorrida que a Anecoop fornece esse material vegetal, omitiu posteriormente este dado e concentrou‑se no facto de a recorrente não fornecer ela própria material vegetal. Ora, um exame da situação da Anecoop teria demonstrado que a recorrente tinha legitimidade para requerer a anulação da decisão de atribuição.

64      Em segundo lugar, relativamente à qualidade de produtor da recorrente, esta salienta que não afirmou representar os interesses gerais dos produtores para defender que era individualmente afectada. Pelo contrário, a recorrente considera que tem legitimidade para agir porque representa os interesses de membros que foram directamente afectados enquanto produtores. A recorrente observa que, estando 90% das sociedades de acondicionamento da variedade Nadorcott estabelecidas em Valência, é impossível afirmar que a decisão de atribuição é susceptível de ter os mesmos efeitos sobre a recorrente que sobre outras federações de produtores e de cooperativas na Comunidade. Com efeito, as cooperativas em causa distribuem mais de metade dos citrinos provenientes de Valência e, reunindo a recorrente a quase totalidade dessas cooperativas, entre os seus membros encontram‑se as principais entidades lesadas pela decisão de atribuição.

65      Dado que a quase totalidade da produção da variedade Nadorcott provém de Valência, o facto de a decisão de atribuição ter por consequência que qualquer produtor da Comunidade tenha de pagar um direito para cultivar a variedade Nadorcott implica que, não sendo pago esse direito, quase toda a produção de Valência fica em situação irregular. Só estes produtores passariam a ser obrigados a pagar ao titular um direito ou a destruir as suas plantações, o que afectaria a sua posição concorrencial no mercado no momento da comercialização da mercadoria. Assim, é incorrecto afirmar que a decisão de atribuição prejudica os membros da recorrente da mesma forma que prejudica qualquer produtor que no futuro venha a cultivar a variedade em causa, dado que os seus membros apresentam, pelo contrário, um conjunto de qualidades que os caracteriza relativamente a qualquer outro produtor.

66      Em terceiro lugar, a recorrente considera que os seus membros apresentam as mesmas características que a sociedade Van Zanten Plants (a seguir «Van Zanten»), que interpôs recurso para a instância de recurso (processos A 005/2003 e A 006/2003). Tendo a Van Zanten sido o distribuidor mundial de uma variedade protegida que apresenta, segundo alega, semelhanças com uma nova variedade à qual o ICVV atribuiu protecção comunitária, a instância de recurso reconheceu a sua legitimidade para agir. Com efeito, a instância de recurso considerou que existiria uma confusão nos mercados se se viesse a demonstrar que a semelhança das variedades era real e que, deste modo, a Van Zanten seria obrigada a defender‑se através da propositura de acções pela violação dos seus direitos.

67      A recorrente considera que, no presente caso, a situação é semelhante, na medida em que a decisão de atribuição obriga os seus membros a arrancar todas as suas plantações se não aceitarem as condições onerosas impostas pela interveniente. Sendo a recorrente representante de empresas que fornecem material da variedade Afourer, concorrente da variedade Nadorcott, o facto de ser individualmente afectada resulta em ambos os casos da qualidade de concorrente da empresa que solicitou a protecção. A instância de recurso devia ter tomado em consideração, no presente caso, a afectação da posição de negociadora e de concorrente da recorrente, que foi tomada em consideração no processo relativo à Van Zanten.

68      Em quarto lugar, a recorrente critica a instância de recurso por ter afastado sem razão a aplicação ao presente caso da jurisprudência comunitária em matéria de auxílios de Estado. Considera que o processo de oposição à protecção de variedades vegetais não é diferente do processo em matéria de auxílios de Estado ao ponto de a jurisprudência relativa à legitimidade para interpor recurso das decisões adoptadas pela Comissão em matéria de auxílios de Estado lhe não ser aplicável. Resulta desta jurisprudência que os interessados visados pelo artigo 88.°, n.° 2, CE são também as pessoas, empresas ou associações eventualmente afectadas nos seus interesses pela concessão do auxílio, nomeadamente as empresas concorrentes e as organizações profissionais (acórdãos do Tribunal de Justiça de 14 de Novembro de 1984, Intermills/Comissão, 323/82, Recueil, p. 3809, n.° 16, e de 3 de Maio de 2001, Portugal/Comissão, C‑204/97, Colect., p. I‑3175, n.° 31). Segundo a recorrente, o reconhecimento da legitimidade para agir às empresas concorrentes da empresa beneficiária de um auxílio de Estado não decorre de particularidades próprias do processo de fiscalização dos auxílios de Estado previsto nos artigos 87.° CE e 88.° CE. Esta legitimidade resulta, na realidade, dos efeitos de um auxílio de Estado sobre a posição concorrencial dos operadores do mesmo mercado que dele não beneficiam. No entender da recorrente, no presente processo, a situação é semelhante, o que permite a aplicação desta jurisprudência ao presente caso.

69      Por outro lado, segundo a recorrente, os direitos de terceiros que pretendam contestar a protecção de uma variedade vegetal não se limitam ao processo de oposição previsto no artigo 59.° do regulamento de base. Podem também interpor recurso nos termos dos artigos 67.° e seguintes do mesmo regulamento. Com efeito, o processo de oposição do artigo 59.° do regulamento de base, que permite às partes apenas contestar os factos com base nos quais o ICVV concedeu a protecção, responde a objectivos diferentes dos do recurso do artigo 67.° do regulamento de base. Segundo a recorrente, ao negligenciar esta possibilidade de recurso, a instância de recurso opõe‑se também à sua prática decisória relativa à legitimidade para agir. Na sua decisão relativa à Van Zanten, afirmou que o artigo 67.° do regulamento de base não priva os terceiros do seu direito de interpor recurso nos termos desta disposição pelo facto de não terem anteriormente formulado qualquer objecção. Ora, a instância de recurso não indicou por que motivo a participação no processo de concessão da protecção é relevante no presente caso.

70      Tal como o beneficiário de um auxílio de Estado, o titular de uma variedade protegida adquire, segundo a recorrente, uma vantagem sobre os seus concorrentes, que afecta a sua posição concorrencial. Resulta da jurisprudência que, ainda que concorrentes directos de beneficiários de auxílios de Estado sejam necessariamente afectados na sua posição concorrencial por esses auxílios, a sua posição no mercado não é substancialmente afectada por esse motivo na medida em que todos os agricultores da Comunidade possam ser considerados concorrentes dos beneficiários do auxílio. No presente caso, os produtores representados pela recorrente são substancialmente afectados pela protecção concedida à variedade Nadorcott. São prejudicados relativamente a qualquer produtor da Comunidade que pretenda começar a cultivar esta variedade, porque já a cultivavam à data da adopção da decisão de atribuição. Segundo a recorrente, os produtores que ainda não possuam tangerineiras desta variedade poderão escolher uma outra variedade se as condições de concessão de uma licença que o titular lhes propõe não parecerem aceitáveis, sem que isso envolva consequências graves para a sua actividade económica. Pelo contrário, os produtores que já tenham árvores desta variedade nas suas plantações serão obrigados a arrancá‑las. Sendo a «vida útil» destas árvores de cerca de 20 anos, a quase totalidade dos produtores ainda não amortizou as suas plantações. Consequentemente, a situação dos membros da recorrente não é comparável à de outros produtores e a decisão de atribuição afectou substancialmente a posição concorrencial dos primeiros.

71      Por último, relativamente à jurisprudência que exige a participação de um recorrente no processo administrativo para o reconhecimento da sua legitimidade para requerer a anulação de uma decisão da Comissão em matéria de auxílios de Estado, a recorrente sublinha que o processo na instância de recurso é também um processo administrativo. Dado que faz parte do órgão administrativo que detém o poder de decisão em matéria de protecção das variedades vegetais, a instância de recurso não é um órgão jurisdicional. Consequentemente, um recurso interposto de uma decisão do ICVV é uma etapa do processo administrativo que conduz à protecção de uma variedade vegetal. Assim, a recorrente participou no processo administrativo.

72      A título preliminar, o ICVV considera que a formulação do artigo 68.° do regulamento de base é idêntica à do artigo 230.° CE. Assim, considera que a análise do presente fundamento se deve basear na interpretação jurisprudencial da expressão «que lhe digam individualmente respeito» constante desta última disposição. A jurisprudência reconhece legitimidade para agir a uma associação profissional constituída para defesa dos interesses dos seus membros se a associação for individualizada por ser afectada nos seus próprios interesses, quando represente os interesses de pessoas que, por si próprias, teriam legitimidade para agir e quando uma disposição lhe reconheça expressamente uma série de faculdades de natureza processual.

73      Em primeiro lugar, o ICVV considera que, segundo a jurisprudência, um acto não afecta de forma individual um recorrente quando a sua situação não tenha sido tomada em consideração na adopção desse acto, o qual o afecta, assim, da mesma forma que a todas as outras pessoas que se encontram na mesma situação. No presente caso, não ficou provado que a recorrente é um fornecedor de material vegetal e, seja como for, a mesma não apresenta características próprias ou circunstâncias que permitam distingui‑la de outros fornecedores de material vegetal.

74      Em segundo lugar, o ICVV considera que, segundo os seus estatutos, os membros directos da recorrente são os sindicatos de cooperativas e não as próprias cooperativas nem os produtores de tangerinas. Deste modo, a recorrente pode representar legitimamente os interesses dos sindicatos de cooperativas, mas não apresentou qualquer elemento que demonstre que esses sindicatos são individualmente afectados, os quais mais não fazem do que defender os interesses gerais dos seus membros. Além disso, na medida em que alguns dos seus membros podem fornecer material vegetal, a recorrente não avançou qualquer característica especial que permita que estes sejam individualizados relativamente aos outros fornecedores. No que se refere à situação dos produtores individuais, o ICVV refere que a recorrente interpôs o recurso em seu próprio nome e que não existe qualquer elemento nos seus estatutos que permita afirmar que a recorrente está habilitada a recorrer à justiça para defender os interesses de determinados produtores específicos de tangerinas. Além disso, os interesses individuais de determinados produtores de tangerinas divergem dos interesses gerais das cooperativas que a recorrente pode representar. Finalmente, os produtores da variedade Nadorcott, membros indirectos da recorrente, só foram afectados devido a uma situação de facto objectiva que em nada os diferencia de todos os outros produtores da variedade, uma vez que a obrigação de pagar um direito para cultivar a variedade passou a decorrer directamente do sistema comunitário de protecção das variedades vegetais. Em especial, resulta da jurisprudência que não basta que um acto tenha repercussões económicas mais importantes sobre determinados operadores do que sobre outros operadores desse sector para que se considere que são individualmente afectados por esse acto.

75      Em terceiro lugar, o ICVV sublinha que o regulamento de base, designadamente o artigo 59.°, reconhece uma série de faculdades de natureza processual às partes que participem no processo de atribuição no ICVV. Observa que a recorrente teve conhecimento do pedido de protecção publicado na Gazeta Oficial do ICVV, em 26 de Fevereiro de 1996, e que não se opôs a esse pedido. Por conseguinte, não lhe podem dizer individualmente respeito as faculdades de natureza processual que podia ter obtido ao participar nesse processo. Por outro lado, o processo do artigo 59.° do regulamento de base ficaria desprovido de sentido se, em vez de apresentarem as respectivas observações no decurso do processo administrativo, todos aqueles que pretendessem opor‑se à atribuição da protecção a uma variedade pudessem esperar pelo final do processo no ICVV para interpor recurso alegando a invalidade da protecção atribuída. Por último, existe uma diferença fundamental entre a situação da Van Zanten, que era o distribuidor exclusivo do titular da variedade registada no ICVV, em concorrência directa com a nova variedade à qual foi atribuída protecção, e a da recorrente, que apenas alega que ela própria ou os seus membros são titulares de direitos subjectivos registados e que gozam de protecção.

76      A interveniente avança, em substância, os mesmos argumentos que o ICVV.

 Apreciação do Tribunal

77      Há que notar desde já que, não fazendo a recorrente parte dos destinatários designados pela decisão de atribuição, a decisão deve dizer‑lhe directa e individualmente respeito, nos termos do artigo 68.° do regulamento de base, para que esta possa interpor recurso para a instância de recurso.

78      A este respeito, é de salientar, em primeiro lugar, que as versões espanhola e italiana do artigo 68.° do regulamento de base prevêem, respectivamente, que podem interpor recurso as pessoas que sejam abrangidas «directa y personalmente» e «direttamente e personalmente». No entanto, as versões inglesa, alemã, portuguesa, dinamarquesa, maltesa, neerlandesa, polaca, sueca e grega seguem os termos da versão francesa «directement et individuellement». A este respeito, há que recordar que a necessidade de uma interpretação uniforme dos regulamentos comunitários exige, em caso de dúvida, que estes sejam interpretados e aplicados à luz das versões redigidas nas outras línguas oficiais (v. n.° 33, supra). Desta forma, há que considerar que as versões espanhola e italiana não conferem a esta passagem um sentido diferente do das outras versões linguísticas e que devem ser interpretadas e aplicadas à luz das versões redigidas nas outras línguas oficiais (v., neste sentido, acórdão Ebony Maritime e Loten Navigation, já referido, n.os 29 a 31).

79      Consequentemente, os termos do artigo 68.° do regulamento de base devem considerar‑se idênticos aos do artigo 230.°, quarto parágrafo, CE. Ora, tendo estes termos sido especificamente interpretados pelo Tribunal de Justiça (acórdão de 15 de Julho de 1963, Plaumann/Comissão, 25/62, Colect. 1962‑1964, pp. 279, 284), o Tribunal considera que há que zelar por uma interpretação coerente do conceito de «pessoa individualmente afectada», na medida em que a economia do regulamento de base a isso não se opõe.

80      Neste contexto, há que salientar, em segundo lugar, que o artigo 59.°, n.° 1, do regulamento de base permite que qualquer pessoa apresente ao ICVV a sua oposição, por escrito, à atribuição de uma protecção e que o seu n.° 2 enuncia que os opositores adquirem, ao lado do requerente, a qualidade de parte no processo de atribuição. Além disso, o artigo 59.°, n.° 5, do regulamento de base prevê expressamente que o ICVV toma decisões relativas às oposições, ao mesmo tempo que as decisões de recusa do pedido de protecção, as decisões de concessão de protecção ou as decisões relativas à denominação da variedade. Resulta do artigo 67.°, n.° 1, do regulamento de base que as decisões relativas às oposições podem ser objecto de recurso para a instância de recurso. Na medida em que os opositores são, por conseguinte, os destinatários designados destas decisões na acepção do artigo 68.° do regulamento de base, qualquer pessoa que pretenda opor‑se à atribuição de uma protecção pode, graças à sua participação no processo administrativo, interpor recurso para a instância de recurso.

81      Por outro lado, nos termos dos artigos 20.° e 21.° do regulamento de base, qualquer pessoa pode convidar o ICVV, depois da atribuição de uma protecção e independentemente de ter sido interposto recurso para a instância de recurso, a declarar nulo esse direito de protecção ou a privar o titular do seu direito alegando que a referida protecção foi atribuída a uma variedade que não respeita os critérios materiais dos artigos 7.° a 10.° do referido regulamento.

82      Nestas circunstâncias, há que considerar que a interpretação ampla do termo «individualmente» que a recorrente sustenta não é necessária para salvaguardar os interesses de terceiros.

83      Em terceiro lugar, é de salientar que o ICVV sustenta com razão que a economia do regulamento de base exige uma interpretação do termo «individualmente» mais restritiva do que a que é reivindicada pela recorrente. Com efeito, uma interpretação ampla permitiria a qualquer pessoa que se pretendesse opor à atribuição de uma protecção alegar a sua invalidade através de um recurso, depois do processo de atribuição, em vez de apresentar as suas observações durante esse processo, que é simultaneamente longo e pesado devido aos exames técnicos necessários. Por conseguinte, a interpretação apontada pela recorrente prejudicaria a utilidade desse processo, ao passo que uma interpretação como a adoptada no acórdão Plaumann/Comissão, já referido, incentiva qualquer pessoa interessada a apresentar as suas observações logo a partir do processo administrativo de atribuição.

84      Atendendo ao que precede, o Tribunal considera que, para determinar se uma decisão diz individualmente respeito a uma pessoa, na acepção do artigo 68.° do regulamento de base, há que remeter para o acórdão Plaumann/Comissão, já referido.

85      Resulta do que foi referido que a recorrente tem de ser afectada pela decisão de atribuição em razão de determinadas qualidades que lhe sejam próprias ou de uma situação de facto que a caracterize relativamente a qualquer outra pessoa, individualizando‑a de forma idêntica à do destinatário da decisão (acórdão Plaumann/Comissão, já referido).

86      A este respeito, resulta da jurisprudência que uma associação profissional constituída para defesa e representação dos interesses dos seus membros tem legitimidade para interpor um recurso de anulação, em primeiro lugar, quando a própria associação é individualizada devido à violação dos seus próprios interesses enquanto associação, designadamente porque a sua posição de negociadora foi afectada pelo acto cuja anulação é pedida, em segundo lugar, quando a associação representa os interesses de empresas que teriam, elas próprias, legitimidade activa e, em terceiro lugar, quando uma disposição legal lhe reconhece expressamente uma série de faculdades de carácter processual (v. despacho do Tribunal de Primeira Instância de 13 de Dezembro de 2005, Confédération générale des producteurs de lait de brebis et des industriels de roquefort/Comissão, T‑381/02, Colect., p. II‑5337, n.° 54 e jurisprudência referida).

87      Em primeiro lugar, relativamente à violação dos interesses próprios da recorrente, há que salientar, desde logo, que esta não alega ser ela própria um produtor ou um fornecedor de material vegetal.

88      Em segundo lugar, a recorrente não alega que é titular de direitos subjectivos registados à escala nacional ou comunitária que beneficiem de protecção. Daqui resulta que não é afectada enquanto titular de direitos e não se encontra numa situação comparável à da Van Zanten.

89      Em terceiro lugar, uma vez que a recorrente alega que a sua posição de negociadora é afectada pela decisão de atribuição, há que notar que não fundamentou a sua alegação.

90      Por último, na medida em que resulta do que precede que as circunstâncias que a recorrente invoca não demonstram que a decisão de atribuição viola os seus interesses próprios, a questão de saber em que medida a posição da recorrente se distingue da de outras federações similares da Comunidade é indiferente. Em qualquer caso, o simples facto de, segundo a recorrente, 90% das sociedades de acondicionamento da variedade controvertida estarem estabelecidas em Valência não permite distinguir a recorrente de outras federações relativamente à atribuição da protecção. Com efeito, não basta que um acto tenha repercussões económicas mais importantes sobre determinados operadores do que sobre outros operadores desse sector para que se considere que são individualmente afectados por este acto (v., neste sentido, despacho do Tribunal de Primeira Instância de 23 de Novembro de 1999, Unión de Pequeños Agricultores/Conselho, T‑173/98, Colect., p. II‑3357, n.° 50 e jurisprudência referida nos n.os 102 e 103, infra).

91      Por conseguinte, a recorrente não demonstrou que a decisão de atribuição afectou os seus interesses próprios enquanto associação.

92      Em segundo lugar, no que respeita à hipótese segundo a qual a recorrente representa os interesses de empresas que têm legitimidade para agir, há que verificar, por um lado, se a recorrente representa, em conformidade com os seus estatutos, no âmbito do recurso para a instância de recurso, os interesses dos seus membros e, por outro, se estes têm legitimidade para agir (v., neste sentido, despacho Confédération générale des producteurs de lait de brebis et des industriels de roquefort/Comissão, já referido, n.° 61).

93      Em primeiro lugar, relativamente aos membros da recorrente e aos seus interesses, há que recordar que, em conformidade com o artigo 4.° dos seus estatutos, os membros da recorrente podem ser sindicatos de cooperativas das províncias de Alicante, Castellón e Valência que preencham determinados critérios. Resulta, além disso, do artigo 2.° dos seus estatutos que a recorrente representa os seus membros. Por conseguinte, a recorrente pode representar os interesses dos sindicatos de cooperativas que sejam seus membros.

94      Relativamente à questão de saber se os membros da recorrente têm legitimidade para agir, há que notar que a recorrente não apresentou na instância de recurso nem no Tribunal elementos que demonstrem que é individualmente afectada pela decisão de atribuição. A este respeito, há que recordar que se trata de sindicatos de cooperativas que não produzem eles mesmo tangerinas, mas que têm por objecto defender os interesses gerais dos seus próprios membros, as cooperativas agrícolas. Embora a recorrente sustente nos seus articulados que a cooperativa Anecoop faz parte dos seus membros e fornece material vegetal aos produtores, reconheceu no entanto na audiência que a Anecoop não era um dos seus membros, mas antes membro de um sindicato de cooperativas que, este sim, é membro da recorrente. Por outro lado, não apresentou qualquer elemento que permita distinguir a forma como esse fornecedor e qualquer outro fornecedor de material vegetal são afectados pela decisão de atribuição. Por conseguinte, há que considerar que a Anecoop só é afectada pela decisão de atribuição devido a uma situação de facto objectiva que não a caracteriza relativamente a outros fornecedores de material vegetal do sector.

95      Há também que salientar que a recorrente não apresentou qualquer elemento que possa demonstrar que os seus membros se encontram numa situação comparável à da Van Zanten ou que participaram no processo de atribuição da protecção.

96      Deste modo, a recorrente não provou que os seus membros têm legitimidade para agir perante a instância de recurso contra a decisão de atribuição.

97      Em segundo lugar, uma vez que a recorrente se refere também à forma como são afectados produtores individuais de tangerinas, membros das cooperativas inscritas nos sindicatos de cooperativas, que são, eles próprios, membros da recorrente, há que salientar que, nos termos do artigo 4.° dos seus estatutos, nem as próprias cooperativas nem os produtores individuais de tangerinas podem ser membros da recorrente. Além disso, resulta do artigo 2.° dos referidos estatutos que o objecto social da recorrente se limita à promoção dos interesses dos seus membros. Desta forma, os estatutos da recorrente não indicam que está habilitada a recorrer aos tribunais para defender os interesses de determinados produtores específicos de tangerinas que sejam membros indirectos dos seus próprios membros. Na medida em que a recorrente considera que resulta de leis e de decretos em vigor em Espanha que está habilitada a representar os membros dos seus membros, há que notar que a mesma invocou este argumento pela primeira vez na audiência no Tribunal e que as referidas leis e os referidos decretos não fazem parte dos elementos do processo. Além disso, o ICVV salienta com razão que não se pode presumir que os interesses dos sindicatos de cooperativas, que a recorrente pode representar, nos termos do artigo 2.° dos seus estatutos, são idênticos aos de determinados produtores individuais.

98      Neste contexto, a recorrente critica a instância de recurso por ter exigido que todos os seus membros tivessem legitimidade para agir, quando resulta da jurisprudência que as associações que tenham pelo menos um membro que possa ele próprio interpor validamente o recurso têm legitimidade para agir. A este respeito, há que salientar que a instância de recurso examinou a forma como os produtores individuais foram afectados a fim de determinar se tinham todos um interesse comum que a recorrente pudesse eventualmente defender nos termos dos seus estatutos. Tendo considerado que não era esse o caso, porque os interesses dos produtores podem divergir, a instância de recurso limitou‑se a salientar que havia dúvidas quanto ao facto de a recorrente representar um interesse geral dos produtores enquanto categoria. Consequentemente, há que declarar que, ao contrário do que alega a recorrente, a instância de recurso não exigiu que todos os membros da recorrente tivessem legitimidade para agir.

99      Por último, há também que recordar que a recorrente interpôs o recurso em seu nome e não em nome de determinados produtores de tangerinas.

100    Consequentemente, é de entender que não se podia considerar, no presente caso, que a recorrente representava perante a instância de recurso os interesses de produtores individuais de tangerinas.

101    A título exaustivo, há também que referir que os produtores individuais de tangerinas não são individualmente afectados pela atribuição da protecção.

102    A este respeito, é de recordar que o facto de a decisão produzir efeitos relativamente à generalidade dos operadores económicos interessados não impede que a mesma diga individualmente respeito a alguns deles (v. despacho do Tribunal de Primeira Instância de 30 de Abril de 2003, Villiger Söhne/Conselho, T‑154/02, Colect., p. II‑1921, n.° 40 e jurisprudência referida). No entanto, não basta que um acto tenha sobre determinados operadores repercussões económicas mais importantes do que sobre os outros operadores desse sector para que se considere que aqueles são individualmente afectados por esse acto (v., neste sentido, despacho Unión de Pequeños Agricultores/Conselho, já referido, n.° 50). Com efeito, mesmo nos casos em que um recorrente seja considerado o único afectado numa determinada zona geográfica e o principal produtor ou fornecedor do produto num país ou numa zona geográfica determinada, esse recorrente não tem legitimidade para agir (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 17 de Janeiro de 1985, Piraiki‑Patraiki e o./Comissão, 11/82, Recueil, p. 207, n.os 13 e 14, e do Tribunal de Primeira Instância de 22 de Fevereiro de 2000, ACAV e o./Conselho, T‑138/98, Colect., p. II‑341, n.os 64 a 66).

103    Deste forma, o facto de a atribuição da protecção ter sobre determinados produtores repercussões económicas mais importantes do que sobre os outros produtores desse sector, por já terem plantado árvores da variedade que passou a estar protegida, e de 90% dos produtores assim afectados se encontrarem na zona geográfica de Valência não é suficiente para os individualizar. Com efeito, os produtores que a recorrente alega representar só são afectados pela obrigação de pagar um direito devido a uma situação de facto objectiva que não os diferencia dos outros produtores dessa variedade, decorrendo essa obrigação directamente do sistema comunitário de protecção das variedades vegetais. Além disso, as actividades dos produtores em causa podem ser exercidas por todos, actualmente ou no futuro.

104    Há também que salientar que a recorrente não apresentou qualquer elemento que permita demonstrar que os produtores e os fornecedores de material vegetal que alega representar tenham participado no processo de atribuição da protecção ou que se encontrassem numa situação comparável à da Van Zanten. Em especial, o facto de a decisão de atribuição poder obrigar esses produtores a arrancarem as suas árvores e afectar a possibilidade de esses fornecedores fornecerem material da variedade Afourer, concorrente da variedade Nadorcott, se não aceitarem pagar o direito não demonstra a existência de qualidades especiais ou de situações de facto que os caracterizem relativamente a qualquer outro produtor ou fornecedor que se encontre na mesma situação de facto objectiva. Além disso, as relações de concorrência que a recorrente invoca a este respeito não são comparáveis com as que estavam em causa no processo relativo à Van Zanten, cujos direitos subjectivos protegidos foram postos em questão.

105    Resulta do que precede que a recorrente não demonstrou que representava os interesses de produtores ou de fornecedores de material vegetal que tivessem eles próprios legitimidade para agir.

106    No que respeita a disposições legais que reconheçam expressamente à recorrente uma série de faculdades de natureza processual, há que salientar, em primeiro lugar, que a recorrente se refere, é certo, ao artigo 59.° do regulamento de base, mas apenas para defender que este artigo responde a objectivos diferentes dos dos artigos 67.° e seguintes do regulamento de base e que a participação no processo de atribuição não é um requisito prévio dos recursos.

107    Em segundo lugar, a recorrente está equivocada sobre a origem dos direitos processuais nos quais poderia basear a legitimidade para agir perante a instância de recurso. Com efeito, havendo que determinar a admissibilidade do recurso para a instância de recurso, os direitos processuais a salvaguardar neste recurso só podem ser os que resultam do processo administrativo anterior que deu lugar à atribuição da protecção. Ora, não tendo a recorrente participado no processo de atribuição, não pode invocar qualquer direito processual relativo a esse processo que pudesse pretender salvaguardar.

108    Em terceiro lugar, a recorrente invoca também a aplicação aos factos do presente processo da jurisprudência em matéria de auxílios de Estado segundo a qual os interessados visados pelo artigo 88.°, n.° 2, CE não são apenas as empresas favorecidas por um auxílio, mas também as pessoas, empresas ou associações eventualmente afectadas nos seus interesses pela atribuição do auxílio, nomeadamente as empresas concorrentes e as organizações profissionais (v. n.° 68, supra). Ora, a referência da recorrente à jurisprudência em matéria de auxílios de Estado não é relevante no presente caso.

109    A este respeito, há que recordar que esta jurisprudência só é aplicável quando o autor do recurso pretenda, com a sua interposição, salvaguardar os direitos processuais conferidos pelo artigo 88.°, n.° 2, CE (acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de Dezembro de 2005, Comissão/Aktionsgemeinschaft Recht und Eigentum, C‑78/03 P, Colect., p. I‑10737, n.° 35), e dos quais tenha sido privado pela Comissão por esta não ter dado início à fase formal do exame. Ora, os artigos 59.°, 67.° e 68.° do regulamento de base conferem direitos mais amplos do que os que são reconhecidos pela jurisprudência referida no n.° 68, supra, na medida em que permitem que qualquer pessoa que tenha apresentado uma oposição escrita à atribuição da protecção durante o processo administrativo interponha recurso para a instância de recurso (v. n.° 80, supra). Desta forma, na medida em que o exercício dos direitos processuais depende unicamente da iniciativa, em tempo útil, do recorrente, não há que aplicar ao presente caso a jurisprudência em matéria de auxílios de Estado.

110    A título exaustivo, na medida em que a recorrente se refere a uma alegada situação de concorrência que justifica a aplicação por analogia da jurisprudência referida no n.° 68, supra, há que salientar que a recorrente não apresentou qualquer elemento que permita concluir pela existência de uma relação de concorrência com o titular da protecção.

111    Atendendo a tudo o que precede, improcede a primeira parte do fundamento.

 Quanto à segunda parte, relativa à falta de tutela jurisdicional efectiva

 Argumentos das partes

112    Segundo a recorrente, o recurso previsto no artigo 67.° do regulamento de base é a única via efectiva de que dispõe para agir contra a decisão de atribuição. Quando o prazo para interposição de recurso termina, a protecção comunitária da variedade vegetal deixa de poder ser contestada perante qualquer autoridade ou órgão jurisdicional nacional. No processo relativo à Van Zanten, este foi um dos motivos nos quais a instância de recurso se baseou expressamente para reconhecer a legitimidade para agir da referida sociedade. Com efeito, o Tribunal de Justiça afirmou que os particulares devem poder beneficiar de uma tutela jurisdicional efectiva dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária, sendo que o direito a essa tutela faz parte dos princípios gerais de direito que decorrem das tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros.

113    O Tribunal de Justiça também afirmou que respeito desse direito na ordem jurídica comunitária exige que as pessoas singulares e colectivas tenham a possibilidade, consoante os casos, de alegar a invalidade de actos comunitários de alcance geral, seja de forma incidental, perante o juiz comunitário, seja perante os órgãos jurisdicionais nacionais. A existência ou inexistência de um sistema de recursos é um elemento essencial do exame do requisito da afectação individual de um recorrente, dado que o Tribunal de Justiça considerou que este requisito deve ser interpretado à luz do princípio de uma tutela jurisdicional efectiva tomando em consideração as diversas circunstâncias susceptíveis de individualizar um recorrente.

114    A recorrente considera que é individualmente afectada devido à inexistência de qualquer via de recurso para os órgãos jurisdicionais nacionais e comunitários para além da prevista no artigo 67.° do regulamento de base. Com efeito, segundo a recorrente, a decisão recorrida privou‑a da única tutela jurisdicional efectiva de que dispõe.

115    O ICVV considera que a recorrente teve possibilidade de se opor ao pedido de atribuição da protecção e considera que se a recorrente tivesse participado no processo de oposição seria, com toda a probabilidade, individualmente afectada. Por outro lado, resulta da jurisprudência que o juiz comunitário não pode julgar um recurso admissível por não existir uma via de recurso para um órgão jurisdicional nacional. O interesse da ordem jurídica comunitária consiste em garantir a existência de um sistema de controlo jurisdicional dos actos administrativos. Ora, a decisão de atribuição não está subtraída a qualquer controlo jurisdicional, na medida em que todos aqueles que são directa e individualmente afectados podem impugná‑la na instância de recurso.

 Apreciação do Tribunal

116    Resulta de jurisprudência bem assente relativa ao artigo 230.°, quarto parágrafo, CE que, embora seja certo que o requisito da afectação individual colocado por esta disposição deva ser interpretado à luz do princípio de uma tutela jurisdicional efectiva tendo em conta as diversas circunstâncias susceptíveis de individualizar um recorrente, tal interpretação não pode levar a afastar o requisito em causa, que se encontra expressamente previsto no Tratado, sem exceder as competências atribuídas por este último aos órgãos jurisdicionais comunitários (acórdãos do Tribunal de Justiça de 25 de Julho de 2002, Unión de Pequeños Agricultores/Conselho, C‑50/00 P, Colect., p. I‑6677, n.° 44; de 30 de Março de 2004, Rothley e o./Parlamento, C‑167/02 P, Colect., p. I‑3149, n.° 47, e de 1 de Abril de 2004, Comissão/Jégo‑Quéré, C‑263/02 P, Colect., p. I‑3425, n.° 36). Tendo sido salientado nos n.os 78 a 84, supra, que há que aplicar o conceito de «pessoa individualmente afectada» na acepção do artigo 68.° do regulamento de base à luz da jurisprudência relativa à admissibilidade dos recursos interpostos nos termos do artigo 230.°, quarto parágrafo, CE, estas considerações são igualmente válidas no caso em apreço.

117    Por outro lado, há que recordar que, segundo os artigos 59.°, 67.° e 68.° do regulamento de base, qualquer pessoa que tenha apresentado uma oposição escrita à atribuição da protecção durante o processo administrativo pode interpor recurso para a instância de recurso (v. n.° 80, supra). Além disso, o artigo 68.° do regulamento de base abre esta mesma via de recurso a qualquer pessoa que, ainda que não tenha participado no processo e não seja destinatária da decisão adoptada no termo desse processo, seja directa e individualmente afectada por ela. Por conseguinte, dado que o recurso para a instância de recurso abre, em seguida, a possibilidade de recorrer para o juiz comunitário, é sem razão que a recorrente invoca no presente caso uma falta de tutela jurisdicional efectiva.

118    Consequentemente, improcede esta parte do fundamento.

119    Resulta de tudo o que precede que o segundo fundamento é improcedente.

3.     Quanto ao terceiro fundamento, relativo ao não cumprimento do dever de fundamentação

 Argumentos das partes

120    A recorrente recorda que o Tribunal de Justiça entendeu que, para que um acto possa ser considerado fundamentado, deste deve resultar de forma clara e inequívoca o raciocínio da instituição autora do acto, de forma a permitir aos interessados conhecer as justificações da medida adoptada e ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização. A decisão recorrida não respeita esta exigência, na medida em que a instância de recurso não examinou a legitimidade para agir da cooperativa Anecoop, apesar de esta exercer uma actividade, como aliás reconhece a instância de recurso, que será seriamente afectada pela decisão de atribuição. A recorrente sublinha que há que relacionar esta circunstância com a decisão da instância de recurso de não autorizar a junção aos autos dos documentos suplementares destinados a provar que os seus membros foram gravemente afectados na sua qualidade de fornecedores de material vegetal. A instância de recurso não analisou se os seus membros eram individualmente afectados pela decisão de atribuição nesta qualidade. Por outro lado, a sua afirmação de que são numerosas as pessoas susceptíveis de serem fornecedores de material vegetal da variedade protegida e de que a recorrente não se caracteriza relativamente a qualquer outro operador do sector em causa não tem apoio em qualquer documento ou informação.

121    Além disso, para recusar a legitimidade para agir da recorrente enquanto produtor, a instância de recurso limitou‑se a afirmar que aquela representava os interesses dos produtores, sem ter efectuado qualquer outra análise. Consequentemente, o raciocínio da instância de recurso sobre esta questão não está fundamentado.

122    Finalmente, ao não ter justificado em que é que os processos em matéria de auxílios de Estado e os do regulamento de base são diferentes nem de que modo essas diferenças são importantes a ponto de impedirem uma aplicação por analogia ao presente caso dos princípios estabelecidos em matéria de auxílios de Estado, a instância de recurso violou o dever de fundamentação que lhe incumbe.

123    O ICVV e a interveniente contestam os argumentos da recorrente.

 Apreciação do Tribunal

124    Há que recordar que o dever de fundamentação constitui uma formalidade essencial que deve ser distinguida da questão da procedência da fundamentação, relevando essa procedência da legalidade quanto ao mérito do acto em litígio (acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Março de 2001, França/Comissão, C‑17/99, Colect., p. I‑2481, n.° 35). Por outro lado, é jurisprudência assente que a fundamentação exigida pelo artigo 253.° CE deve revelar de modo claro e inequívoco a razão de decidir do autor do acto. Esta obrigação tem o duplo objectivo de permitir, por um lado, aos interessados conhecerem as justificações da medida adoptada, para defenderem os seus direitos, e, por outro, ao juiz comunitário exercer a sua fiscalização da legalidade da decisão [acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Fevereiro de 1990, Delacre e o./Comissão, C‑350/88, Colect., p. I‑395, n.° 15; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Abril de 2000, Kuijer/Conselho, T‑188/98, Colect., p. II‑1959, n.° 36, e de 3 de Dezembro de 2003, Audi/IHMI (TDI), T‑16/02, Colect., p. II‑5167, n.° 88].

125    No presente caso, resulta de tudo o que precede que a decisão recorrida permite que a recorrente defenda os seus direitos e que o Tribunal exerça a sua fiscalização. Por outro lado, a instância de recurso examinou a legitimidade para agir da recorrente à luz das alegadas actividades da cooperativa Anecoop (ponto 3, quarto e quinto parágrafos, dos fundamentos da decisão recorrida), da eventual representação pela recorrente dos produtores individuais de tangerinas (ponto 3, oitavo a décimo parágrafos, dos fundamentos da decisão recorrida) e de uma eventual aplicação da jurisprudência em matéria de auxílios de Estado aos factos do processo (ponto 3, décimo primeiro parágrafo, dos fundamentos da decisão recorrida). A instância de recurso expôs os fundamentos pelos quais considerou que estas três situações não eram aplicáveis ou eram insuficientes para determinar a legitimidade para agir da recorrente. Daqui resulta que esta última não pode sustentar que a decisão recorrida está a este respeito viciada por falta de fundamentação.

126    Em todo o caso, resulta da jurisprudência que um recorrente não tem qualquer interesse legítimo na anulação por vício de forma de uma decisão no caso de a anulação dessa decisão apenas poder dar lugar à adopção de uma nova decisão, idêntica, quanto ao mérito, à decisão anulada (acórdão do Tribunal de Justiça de 6 de Julho de 1983, Geist/Comissão, 117/81, Recueil, p. 2191, n.° 7; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 18 de Dezembro de 1992, Díaz García/Parlamento, T‑43/90, Colect., p. II‑2619, n.° 54, e TDI, já referido, n.° 97; v. também, neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 20 de Setembro de 2000, Orthmann/Comissão, T‑261/97, ColectFP, pp. I‑A‑181 e II‑829, n.os 33 e 35).

127    No presente caso, resulta da análise do segundo fundamento (v. n.os 77 a 110 e 116 a 119, supra) que a recorrente não apresentou qualquer argumento susceptível de demonstrar que tinha legitimidade para agir na acepção do artigo 68.° do regulamento de base e que, por conseguinte, a anulação da decisão recorrida por falta de fundamentação apenas poderia dar origem a uma nova decisão idêntica. Deste modo, há que considerar que a recorrente não tem qualquer interesse legítimo na anulação da decisão recorrida decorrente de uma eventual falta de fundamentação.

128    Consequentemente, há que julgar improcedente o terceiro fundamento.

129    Nestas circunstâncias, deve ser negado provimento ao recurso.

 Quanto às despesas

130    Por força do disposto no artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, nos termos dos pedidos do ICVV e da interveniente.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A Federación de Cooperativas Agrarias de la Comunidad Valenciana é condenada nas despesas.

Forwood

Pelikánová

Papasavvas

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 31 de Janeiro de 2008.

O secretário

 

      O presidente em exercício

E. Coulon

 

      N. J. Forwood

Índice


Quadro jurídico

Antecedentes do litígio

Pedidos das partes

Questão de direito

1.  Quanto ao primeiro fundamento, relativo a uma violação dos artigos 49.° e 50.° do regulamento de execução e dos princípios da diligência e da boa administração

Quanto à primeira parte, relativa à violação do artigo 49.° do regulamento de execução e dos princípios da diligência e da boa administração

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal

Quanto à segunda parte, relativa a uma violação do artigo 50.° do regulamento de execução e dos princípios da diligência e da boa administração

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal

2.  Quanto ao segundo fundamento, relativo ao indevido não reconhecimento da legitimidade para agir da recorrente

Quanto à primeira parte, relativa ao facto de a recorrente e os seus membros serem individualmente afectados pela decisão de atribuição

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal

Quanto à segunda parte, relativa à falta de tutela jurisdicional efectiva

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal

3.  Quanto ao terceiro fundamento, relativo ao não cumprimento do dever de fundamentação

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal

Quanto às despesas


* Língua do processo: espanhol.