Language of document : ECLI:EU:T:2010:371

Processo T‑264/07

CSL Behring GmbH

contra

Comissão Europeia e

Agência Europeia de Medicamentos (AEM)

«Medicamentos para uso humano – Procedimento de designação de medicamentos órfãos – Pedido de designação do fibrinogénio humano como medicamento órfão – Obrigação de apresentar o pedido de designação antes de apresentar o pedido de colocação no mercado – Decisão da AEM relativa à validade do pedido»

Sumário do acórdão

1.      Aproximação das legislações – Legislações uniformes – Medicamentos para uso humano – Medicamentos órfãos

(Regulamentos do Parlamento Europeu e do Conselho n.° 141/2000, artigo 5.º, n.° 1, e n.° 726/2004)

2.      Aproximação das legislações – Legislações uniformes – Medicamentos para uso humano – Medicamentos órfãos

[Regulamento n.° 141/2000 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 3.°, n.° 1, alínea b)]

3.      Aproximação das legislações – Legislações uniformes – Medicamentos para uso humano – Medicamentos órfãos

[Regulamentos do Parlamento Europeu e do Conselho n.° 141/2000, artigos 3.°, n.° 1, alínea b), 5.°, n.° 1, e 8.°, n.° 1, e n.° 726/2004, artigo 3.º, n.° 2, alínea b)]

1.      O artigo 5.°, n.° 1, do Regulamento n.° 141/2000 relativo aos medicamentos órfãos, dispõe de forma clara e inequívoca que os pedidos de designação de um medicamento como medicamento órfão podem ser apresentados em qualquer fase do desenvolvimento do medicamento, antes do requerimento de autorização de colocação no mercado. Esta disposição não distingue consoante o pedido de autorização de colocação no mercado seja feito através do procedimento de reconhecimento mútuo ao nível dos Estados‑Membros ou através do procedimento centralizado ao nível da União, nem foi alterada na sequência da entrada em vigor do Regulamento n.° 726/2004 que estabelece procedimentos comunitários de autorização e de fiscalização de medicamentos para uso humano e veterinário e que institui uma Agência Europeia de Medicamentos, no sentido de indicar que o único procedimento de autorização a partir de agora aplicável aos medicamentos órfãos é o procedimento centralizado.

Com efeito, o Regulamento n.° 726/2004 não alterou, de forma alguma, o artigo 5.°, n.° 1, do Regulamento n.° 141/2000. Tal facto confirma que a questão essencial para o legislador é a de saber se o medicamento em causa representa uma evolução em relação ao tratamento que já foi objecto de um pedido de autorização de colocação no mercado ou que já foi autorizado. Portanto, pouco importa que o pedido de autorização de colocação no mercado do medicamento em causa tenha sido apresentado, e a fortiori obtido, ao nível de um Estado‑Membro ou da União.

(cf. n.os 44, 60)

2.      O artigo 3.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 141/2000 relativo aos medicamentos órfãos, dispõe que um medicamento obtém a designação de medicamento órfão se o seu promotor puder comprovar que não existe qualquer método satisfatório de diagnóstico, de prevenção ou de tratamento de tal doença que tenha sido autorizado na União ou que, se tal método existe, o medicamento objecto do pedido de designação «oferece[rá]» um benefício significativo àqueles que sofram da referida afecção. A este respeito, o facto de se ter conjugado o verbo «oferecer» no futuro do indicativo demonstra que esta disposição visa de forma incontestável um benefício futuro.

Assim, esta disposição confirma que a aplicação dos mecanismos de incentivo previstos no referido regulamento não se justifica no caso de um medicamento já autorizado na União. O mesmo é válido para qualquer outro medicamento destinado à mesma afecção, excepto se esse medicamento vier a oferecer um benefício significativo em relação ao medicamento já autorizado.

(cf. n.° 46)

3.      O artigo 5.°, n.° 1, do Regulamento n.° 141/2000 relativo aos medicamentos órfãos, não viola o direito de propriedade e o livre exercício da sua actividade profissional.

Com efeito, no caso de uma empresa já ser titular de várias autorizações nacionais de colocação no mercado para um medicamento, sem que contudo seja titular da designação como medicamento órfão para este medicamento e em que uma empresa concorrente pretenda obter a designação como medicamento órfão de um medicamento concorrente destinado a tratar a mesma afecção que a visada pelo medicamento já autorizado, deve demonstrar, em conformidade com o artigo 3.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 141/2000, que o seu medicamento oferece um benefício significativo aos doentes afectados pela afecção em causa. Assim sendo, os critérios que permitem concluir pela existência de um benefício significativo são estritos e o aperfeiçoamento de um medicamento que oferece um benefício significativo em relação ao medicamento já autorizado, que trata a mesma afecção, implica, para a empresa que o elabora, investimentos na investigação e no desenvolvimento deste potencial medicamento melhorado. Uma empresa concorrente não pode, assim, limitar‑se a desenvolver um medicamento similar para obter a sua designação como medicamento órfão.

Além disso, enquanto as empresas concorrentes não tiverem desenvolvido um medicamento que ofereça um benefício significativo em relação ao medicamento já autorizado, e enquanto não tiverem obtido a sua designação como medicamento órfão, bem como a sua autorização de colocação no mercado, o titular do medicamento já autorizado conserva o seu direito de recorrer ao procedimento de reconhecimento mútuo do referido medicamento relativamente ao qual pode ser titular de várias autorizações de colocação no mercado. Com efeito, é‑lhe permitido apresentar um pedido de reconhecimento mútuo de uma dessas autorizações num ou vários outros Estados‑Membros da União, em conformidade com o procedimento previsto no capítulo 4 da Directiva 2001/83 que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos para uso humano.

Por outro lado, na eventualidade de uma empresa concorrente obter a designação como medicamento órfão de um medicamento semelhante ao medicamento, que obteve uma autorização de colocação no mercado, mas que é dotado de um benefício significativo, é ainda necessário que lhe seja concedida uma autorização de colocação no mercado para este medicamento. Com efeito, este medicamento deve ser avaliado pelo comité dos medicamentos para uso humano, o qual é independente do comité dos medicamentos órfãos. É apenas no caso de, na sequência de um parecer do referido comité, a Comissão conceder a autorização de colocação no mercado que a empresa concorrente poderá beneficiar da exclusividade comercial em aplicação do artigo 8.°, n.° 1, do Regulamento n.° 141/2000. Contudo, a concessão de exclusividade comercial a uma empresa concorrente não tem por efeito a perda das autorizações existentes de colocação no mercado dos medicamentos que tratam a mesma afecção.

Além do mais, a obtenção de uma designação como medicamento órfão não constitui, de modo algum a única possibilidade de acesso ao procedimento de autorização de colocação no mercado ao nível da União. Com efeito, o artigo 3.°, n.° 2, alínea b), do Regulamento n.° 726/2004 que estabelece procedimentos comunitários de autorização e de fiscalização de medicamentos para uso humano e veterinário e que institui uma Agência Europeia de Medicamentos, dispõe que, no caso de um medicamento não coberto pelo anexo do referido regulamento, a União pode, de acordo com este regulamento, conceder uma autorização de colocação no mercado ao nível da União se o requerente demonstrar que esse medicamento apresenta uma inovação significativa no plano terapêutico, científico ou técnico ou que a concessão de uma autorização em conformidade com o referido regulamento apresenta, para os doentes, um interesse ao nível da União.

(cf. n.os 91, 93‑96, 98, 102, 104)