ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Primeira Secção)
14 de Julho de 1997(1)
[234s«Política social Fundo Social Europeu Contribuição para o financiamento de
acções de formação profissional Recurso de anulação Comunicação da
decisão de aprovação Decisão sobre o pedido de pagamento do saldo
Segurança jurídica Confiança legítima Fundamentação»[s
No processo T-81/95,
Interhotel, Sociedade Internacional de Hóteis, SARL, sociedade de direito
português, com sede em Lisboa, representada por José Miguel Alarcão Júdice,
Nuno Morais Sarmento e Gabriela Rodrigues Martins, advogados no foro de
Lisboa, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado Victor
Gillen, 16, boulevard de la Foire,
recorrente,
contra
Comissão das Comunidades Europeias, representada por António Caeiro, consultor
jurídico, e Günter Wilms, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes,
com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Carlos Gómez de la Cruz,
membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,
recorrida,
que tem por objecto um pedido de anulação da Decisão C(94) 1410/11 da
Comissão, de 12 de Julho de 1994, notificada à recorrente em 27 de Dezembro de
1994, sobre o dossier n.° 870840/P1, relativa a uma contribuição financeira do
Fundo Social Europeu para uma acção de formação,
O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Primeira Secção),
composto por: A. Saggio, presidente, V. Tiili e R. M. Moura Ramos, juízes,
secretário: J. Palacio González, administrador,
vistos os autos e após a audiência de 15 de Janeiro de 1997,
profere o presente
Acórdão
Factos na origem do recurso e tramitação processual
- O projecto contendo um pedido de contribuição financeira a favor da recorrente
que o Departamento para os Assuntos do Fundo Social Europeu (a seguir
«DAFSE»), em Lisboa, propôs para o exercício de 1987, e que recebeu o
n.° 870840/P1, foi aprovado pela Comissão por decisão de aprovação de 30 de
Abril de 1987, com algumas alterações. A recorrente tinha solicitado ao Fundo
Social Europeu (a seguir «FSE») o montante de 152 466 071 ESC para a formação
de 284 pessoas, tendo-lhe sido concedida uma contribuição financeira de
121 647 958 ESC para a formação de 277 pessoas.
- A Comissão comunicou ao DAFSE uma nota intitulada «Anexo <A1> à Decisão
C(87)0860 da Comissão» (anexo 1 à contestação) contendo as seguintes
informações:
número de pessoas envolvidas277
montante pedido
ESC 152 466 071
montante concedido
ESC 121 647 958
não elegível
ESC 27 766 349
redução
ESC 3 051 763
montante total recusado
ESC 30 818 112
- Mais tarde, em 27 de Maio de 1987, o DAFSE informou a recorrente desta decisão
por carta em que indicava o montante concedido e o número de pessoas aprovado
(anexo 4 à petição). Nessa comunicação recordava-se que as contribuições do FSE
são créditos subordinados à realização da acção, no respeito pelas normas
comunitárias, e que a inobservância desta condição tem como consequência a
restituição dos adiantamentos e o não pagamento do saldo. Além disso, sublinhava
que qualquer alteração ao previsto no dossier de candidatura devia ser comunicada
ao DAFSE.
- A acção teve lugar em 1987. Através da circular n.° 10/87, de 8 de Janeiro de 1987
que, segundo a recorrente, foi por ela recebida em 29 de Junho de 1987, o DAFSE
solicitou aos beneficiários de contribuições do FSE que reduzissem os períodos de
formação prática a uma duração equivalente à do ensino teórico. Para dar
cumprimento às exigências da circular, a recorrente reduziu em 36,13% o número
de horas de formação prática projectado. Afirma ter igualmente aplicado, por sua
iniciativa, uma redução proporcional de 36,13% dos custos em todas as rubricas do
orçamento da acção.
- A recorrente recebeu um adiantamento de 50% da contribuição do FSE, ou seja,
60 823 979 ESC. Terminada a acção, apresentou o pedido de pagamento do saldo,
no qual reclamava ao FSE o montante de 73 496 941 ESC, correspondentes ao
montante do adiantamento, mais 12 672 962 ESC.
- Em 19 de Julho de 1989, o DAFSE informou a recorrente de que, nos termos de
uma decisão da Comissão, que juntava, a contribuição do FSE não poderia
finalmente ultrapassar 42 569 539 ESC, uma vez que determinadas despesas,
relativas aos pontos 14.1, 14.2, 14.3, 14.6 e 14.8 do formulário, não eram elegíveis,
«dado que não houve redução proporcional face à redução das horas de formação
e alguns dos elementos da proposta inicial não foram cumpridos (14.1)».
- Na sequência de um recurso interposto pela recorrente, a referida decisão da
Comissão foi anulada pelo Tribunal de Justiça, com o fundamento de que a
Comissão não dera à República Portuguesa a oportunidade de apresentar as suas
observações antes de adoptar uma decisão definitiva de redução da contribuição
(acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de Maio de 1991, Interhotel/Comissão,
C-291/89, Colect., p. I-2257, a seguir «processo C-291/89»).
- A fim de tomar nova decisão sobre o pedido de pagamento do saldo apresentado
pela recorrente, a Comissão transmitiu ao DAFSE, em 6 de Agosto de 1991, um
primeiro projecto de decisão. Por carta de 26 de Agosto de 1991, o DAFSE
manifestou à Comissão o seu desacordo relativamente a algumas das reduções
propostas.
- Em 9 de Fevereiro de 1993, a recorrente solicitou à Comissão que adoptasse nova
decisão dentro do prazo previsto no Tratado, ou seja, dois meses a contar do
pedido.
- Na sequência das observações do DAFSE e do pedido da recorrente mencionado
no número anterior, a Comissão organizou uma missão de controlo em 19 de
Fevereiro de 1993, que prosseguiu em 18 de Março do mesmo ano, com o
objectivo de verificar in loco os elementos justificativos da execução da acção. A
recorrente foi ouvida no decurso desta missão de controlo. Segundo a Comissão,
os elementos disponíveis eram escassos e pouco esclarecedores, designadamente
porque a recorrente tinha subcontratado certos trabalhos à empresa Partex, que,
por seu turno, subcontratara duas empresas, Europraxis e Fortécnica. Nestas
circunstâncias, procedeu-se à verificação dos elementos financeiros e contabilísticos
das empresas subcontratadas pela Partex. Os resultados desta verificação foram
analisados, entre 24 e 26 de Maio de 1993, por um grupo de trabalho em que
estavam representados a Comissão e o DAFSE.
- Mais tarde, em 12 de Novembro de 1993, na nota n.° 22917 (a seguir «nota
n.° 22917»), a Comissão comunicou ao DAFSE um novo projecto de decisão nos
termos do qual a contribuição do FSE seria fixada em 41 190 905 ESC, a menos
que as observações do DAFSE justificassem uma alteração deste montante.
- Esta nota n.° 22917 contém um certo número de explicações quanto às reduções
propostas. Em primeiro lugar, sublinha a existência de discrepâncias entre as
durações indicadas no pedido de pagamento do saldo, os registos de presença dos
formandos e os sumários dos formadores. A nota acrescenta que não foi possível
confirmar a repartição da duração da formação entre as partes teórica e prática.
Finalmente, os períodos de estágio não seriam identificáveis em termos de horários
e objectivos.
Mais concretamente, e no que respeita às diferentes rubricas do pedido de
pagamento do saldo, as reduções propostas eram fundamentadas do seguinte
modo:
14.1 Rendimentos dos estagiários em formação
Subsídios de formação3 180 878 ESC
Constatou-se que a 56 formandos não foi ministrada qualquer
formação prática elegível, donde uma redução correspondente,
baseada num cálculo.
14.2 Preparação dos cursos
Recrutamento e selecção dos formandos
1 456 000 ESC
Constatou-se que a factura da Partex, bem como o pedido de
pagamento do saldo, faziam referência a 490 testes ao preço unitário
de 7 000 ESC, quando a verdade é que esses trabalhos foram
realizados por uma terceira entidade, que facturou à Partex a
realização de 282 testes ao custo unitário de 12 000 ESC. Em
consequência, e verificando-se não ter sido prestado pela Partex
qualquer serviço adicional, considerou-se razoável fixar o custo
relativo a 282 formandos ao preço unitário de 7 000 ESC.
Duplicação de documentação
1 183 680 ESC
Despesa não aprovada na decisão de aprovação e não justificada
tendo em conta os montantes apresentados em material pedagógico
e face ao tipo de acção realizada.
14.3 Funcionamento e gestão dos cursos
Pessoal docente
21 705 954 ESC
Esta rubrica refere-se às remunerações, aos custos de deslocação, de
estadia e de alimentação dos monitores.
O montante relativo a monitores foi na totalidade facturado pela
Partex, a qual, por sua vez, subcontratou outra empresa. Na
verificação feita nesta última empresa constatou-se que a Partex
celebrou um contrato nos termos do qual a empresa subcontratada
devia assegurar a monitoria dos cursos que integravam as acções
promovidas pela Interhotel e por uma outra empresa, Grão-Pará, sem
discriminação de valores. O montante máximo elegível para as acções
de formação foi determinado com base nos custos suportados pela
subcontratada com os formadores que ministraram cursos aos
formandos da Interhotel, acrescidos de uma margem bruta de 50%.
O montante máximo elegível para as acções de formação foi assim
fixado em 10 613 646 ESC.
Relativamente a estadias e alimentação dos monitores, no pedido
inicial foram apresentados os custos com dois técnicos e um director.
Os custos relativos aos dois primeiros foram rejeitados na decisão de
aprovação, pelo que no saldo apenas foram considerados elegíveis os
custos relativos ao técnico superior. O montante elegível de
462 000 ESC foi calculado em aplicação do custo previsto e aprovado
de 700 ESC por dia.
Pessoal administrativo
2 912 955 ESC
As despesas referidas no pedido de pagamento do saldo
reportavam-se ao trabalho de um técnico e de duas secretárias, ao
passo que na decisão de aprovação só fora aprovado o montante
relativo a uma secretária.
Despesas de estadia, alimentação e deslocação do pessoal não docente
2 409 940 ESC
As despesas relativas ao pessoal administrativo e técnico não docente
e não elegível (11 pessoas) tinham sido totalmente recusadas na
decisão de aprovação.
Gestão e controlo orçamental
2 241 136 ESC
Despesa não justificada e não aprovada na decisão de aprovação.
Trabalhos especializados
2 363 000 ESC
Despesa não justificada e não aprovada na decisão de aprovação.
Rendas e alugueres
4 841 969 ESC
De acordo com o previsto e aprovado na decisão de aprovação,
apenas foi considerado o custo diário de 8 000 ESC para o
arrendamento de cada sala já equipada.
Materiais e bens não duradouros
4 550 324 ESC
De acordo com o previsto e aprovado na decisão de aprovação, foi
considerado elegível o custo unitário de 2 500 ESC/semana/formando
durante a formação prática.
Outros fornecimentos e serviços de terceiros
1 777 183 ESC
Recusado por falta de justificação e não aprovado na decisão deaprovação.
14.6 Amortizações normais
3 668 700 ESC
Na decisão de aprovação foram recusadas as amortizações aceleradas,
não tendo sido aceite na fase do pedido de pagamento do saldo a sua
reclassificação em amortizações normais.
14.8 Alojamento e alimentação dos formandos
5 673 000 ESC
Na decisão de aprovação estes custos não foram previstos nem aprovados.
- A pedido do DAFSE, a recorrente apresentou as suas observações sobre este
projecto de decisão em 17 de Dezembro de 1993. Por seu lado, o DAFSE enviou
as suas observações à Comissão por carta de 7 de Fevereiro de 1994, reconhecendo
que as reduções propostas pela Comissão se justificavam.
- Tendo a República Portuguesa sido assim ouvida, em conformidade com o artigo
6.°, n.° 1, do Regulamento (CEE) n.° 2950/83 do Conselho, de 17 de Outubro de
1983, que aplica a Decisão 83/516/CEE relativa às funções do Fundo Social
Europeu, alterado pelo Regulamento (CEE) n.° 3823/85 do Conselho, de 20 de
Dezembro de 1985, em razão da adesão da Espanha e de Portugal
(respectivamente JO L 289, p. 1; EE 05 F4 p. 22 e JO L 370, p. 23;
EE 05 F5 p. 21, a seguir «Regulamento n.° 2950/83»), a Comissão adoptou, em 12
de Julho de 1994, uma nova decisão (C(94)1410/11), que reduziu a contribuição do
FSE a 41 190 905 ESC (a seguir «decisão impugnada»). Nos termos desta decisão,
a análise do pedido de pagamento do saldo tinha revelado que uma parte da
contribuição do Fundo não fora utilizada nas condições fixadas na decisão de
aprovação, pelos motivos expostos na nota n.° 22917, já referida. Esta decisão foi
notificada à recorrente em 27 de Dezembro de 1994, acompanhada de uma carta
do DAFSE.
- Nestas circunstâncias, por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de
Primeira Instância em 9 de Março de 1995, a recorrente interpôs o presente
recurso. A fase escrita do processo decorreu normalmente.
- Foram ouvidas as alegações das partes e as respectivas respostas às perguntas do
Tribunal na audiência de 15 de Janeiro de 1997.
Pedidos
- A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:
- anular a decisão impugnada,
- condenar a Comissão nas despesas.
- A recorrida conclui pedindo que o Tribunal se digne:
- rejeitar o recurso por falta de fundamento,
- condenar a recorrente nas despesas.
Quanto ao mérito
- A recorrente invoca dois fundamentos: em primeiro lugar, violação de princípios
gerais de direito, ou seja, os princípios da protecção dos direitos adquiridos, da
segurança jurídica e da confiança legítima, além de violação do princípio da boa
administração e do dever de diligência; em segundo lugar, violação da obrigação
de fundamentação.
Quanto ao fundamento baseado na violação de princípios gerais de direito, bem como
na violação do princípio da boa administração e do dever de diligência
Exposição sumária dos argumentos das partes
- A recorrente considera que a decisão impugnada deve ser anulada por violação de
princípios gerais de direito, ou seja, dos princípios da protecção dos direitos
adquiridos, da segurança jurídica e da confiança legítima, e por violação do
princípio da boa administração e do dever de diligência. Sublinha a importância dos
princípios gerais que invoca no contexto das acções do FSE, sobretudo quando
estão em causa medidas que podem conduzir à privação do pagamento de um
apoio financeiro pretendido por um Estado-Membro ou por um particular (acórdão
do Tribunal de Justiça de 26 de Maio de 1982, Alemanha/Comissão, 44/81, Recueil,
p. 1855).
- Invoca, a título preliminar, a sua própria inexperiência na matéria em 1987, bem
como a inexperiência do DAFSE, dada a recente adesão de Portugal às
Comunidades Europeias. Refere também os problemas de adaptação da situação
jurídica, económica e social de Portugal, naquela época, que a própria Comissão
não terá deixado de tomar em consideração. A este propósito, faz referência à
Decisão 86/221/CEE da Comissão, de 30 de Abril de 1986, relativa às orientações
para a gestão do FSE para os exercícios de 1987 a 1989 (JO L 153, p. 59, a seguir
«Decisão 86/221»). Ora, mesmo nestas circunstâncias, a recorrente afirma ter
respeitado a regulamentação em vigor e as instruções aplicáveis e a sua acção foi
conforme aos objectivos do FSE. Remete, quanto a isto, para a Decisão
83/516/CEE do Conselho, de 17 de Outubro de 1983, relativa às funções do Fundo
Social Europeu (JO L 289, p. 38; EE 05 F4 p. 26) e para o Regulamento
n.° 2950/83.
- A recorrente considera que a decisão de aprovação da Comissão, tal como lhe foi
comunicada, ficou apenas subordinada à fixação do montante da contribuição do
FSE em 121 647 958 ESC e do número de formandos em 277. Considera que não
havia nenhuma razão para pensar que era necessário proceder a qualquer
verificação complementar. Explica que, nestas circunstâncias, distribuiu a diferença
entre o montante solicitado no pedido de contribuição e o montante aprovado na
decisão de aprovação, tal como lhe foi comunicada, de modo linear ou
proporcional para todas as rubricas.
- A recorrente afirma ter apresentado o método nos termos do qual procedeu às
reduções no pedido de pagamento do adiantamento, ao qual juntou um documento
intitulado «Ponto de situação da acção» indicando as horas de formação a
efectuar. Acrescenta que o método utilizado resulta igualmente do relatório de
avaliação quantitativa que acompanhou o pedido de pagamento do saldo. Sublinha
que nem a Comissão nem o DAFSE levantaram objecções ou fizeram comentários
sobre este ponto. Efectivamente, o DAFSE certificou a exactidão factual e
contabilística das indicações contidas no relatório de avaliação.
- Assim, em sua opinião, a recorrente agiu na convicção legítima de que todas as
despesas contidas no pedido inicial de contribuição, sem prejuízo da redução linear
que efectuou após a decisão de aprovação, por um lado, e da circular do DAFSE,
por outro, tinham sido regularmente efectuadas e de que eram, por isso, elegíveis.
Em seu entender, qualquer outra interpretação implicaria uma violação não só dos
princípios da segurança jurídica e da confiança legítima mas também da Decisão
n.° 86/221.
- De facto, segundo a recorrente, a decisão pela qual o DAFSE lhe comunicou as
condições de aprovação do seu projecto é um acto administrativo que lhe confere
determinados direitos e que é válido mesmo que se considere que faz parte de um
processo mais alargado e inacabado de tomada de decisão pela Comissão. A
revogação de um acto desse tipo violaria as expectativas legítimas e os direitos
adquiridos da recorrente.
- Quanto à pretensa falta de justificação de certas despesas, começa por sublinhar
que os montantes facturados correspondem aos valores normais do mercado na
época; em segundo lugar, afirma que os serviços facturados foram realmente
fornecidos e, em terceiro lugar, que os montantes apresentados no pedido de
pagamento do saldo correspondem aos custos realmente suportados. Acrescentou,
na audiência, que em 1987, tendo em conta as normas nacionais em vigor, bastava,
apresentar o contrato como documento justificativo e que só a partir de 1988 é que
passaram a ser exigidas as facturas pagas.
- No que respeita mais concretamente à justificação dos custos que figuram na
rubrica «Funcionamento e gestão dos cursos Pessoal docente», o montante
inicialmente concedido não foi ultrapassado. Do mesmo modo, no que respeita aos
custos relativos à preparação dos cursos, a Comissão ter-se-á limitado a contestar
a factura apresentada pela Partex à recorrente. A recorrente sublinha que os testes
de selecção dos formandos foram efectuados exactamente como consta das
facturas. Quanto à rubrica «Materiais e bens não duradouros», o montante
indicado corresponde ao custo real e deveria ter sido tomado em consideração
como tal. Finalmente, quanto às amortizações normais, a recorrente acusa a
Comissão de não ter aceite, na fase do pedido de pagamento do saldo, a
rectificação do erro contido no pedido de contribuição.
- De qualquer modo, na opinião da recorrente, incumbe à Comissão fazer prova da
eventual irregularidade dos montantes apresentados e dos documentos
comprovativos, o que não fez.
- Na audiência, a recorrente explicou ainda que, se efectuou despesas não previstas
em matéria de alojamento e de alimentação dos formandos, foi porque, obrigada
a reduzir a carga horária, viu-se na contingência de organizar a acção na época alta
e não pôde, portanto, alojar os formandos em hotéis, como estava previsto.
- A recorrente alega ainda que o tempo que decorreu entre o início do processo e
a adopção da decisão impugnada foi de cerca de oito anos. Este período de tempo
causou à recorrente um prejuízo significativo, dado que foi obrigada a suportar até
este momento encargos financeiros elevados que esperava fossem assumidos pela
Comissão. Pede que o Tribunal de Primeira Instância aprecie em que medida o
período de tempo decorrido implica eventualmente uma violação dos limites e
princípios a que está sujeito o exercício do poder discricionário da Comissão. Além
disso, invoca a impossibilidade manifesta de reconstituir a totalidade dos factos
após esse período de tempo, uma vez que os responsáveis que acompanharam a
realização da formação não estão disponíveis para fornecer informações. Quanto
à obrigação de conservar os documentos comprovativos, a recorrente alega que o
prazo em vigor até 1 de Janeiro de 1989 era de cinco anos, e só passou a ser de
dez quando as acções de formação já estavam concluídas, se bem que,
efectivamente, antes da realização da missão de controlo.
- Na réplica, a recorrente refere, além disso, que a decisão impugnada não foi
adoptada dentro do prazo previsto no Tratado, ou seja, dois meses a contar do
pedido que apresentara para esse efeito.
- A recorrida, por seu turno, afirma que não deixou de verificar a regularidade e a
veracidade das despesas apresentadas no pedido de pagamento do saldo. No que
respeita às despesas que rejeitou na decisão impugnada por já as ter considerado
não elegíveis na decisão de aprovação, a recorrida chegou novamente à conclusão
de que as mesmas não eram elegíveis. Quanto às outras reduções que efectuou,
explica que certas despesas aprovadas na decisão de aprovação estavam
insuficientemente documentadas no pedido de pagamento do saldo e, por
conseguinte, não se afiguraram justificadas na fase de apreciação final.
- A recorrida, que afirma que a acção proposta não teria sido aprovada se não se
integrasse nos objectivos do FSE, salienta que, no caso concreto, o que está em
causa é saber se a entidade promotora observou todas as regras aplicáveis à
execução da acção, designadamente as relativas à justificação das despesas
apresentadas no pedido de pagamento de saldo. A Comissão julga que não foi esse
o caso.
- Quanto ao modo de aplicar as reduções e aos pontos a que estas respeitavam, a
recorrida explica que bastaria à recorrente dividir o custo da acção pelo número
de formandos indicado na proposta e comparar este resultado com o resultado da
divisão do custo total aprovado pelo número de formandos para verificar que a
redução total decidida pela Comissão na decisão de aprovação não correspondia
a uma mera redução linear. Efectivamente, se o custo por formando diminuiu, isso
significa que algumas despesas não foram consideradas elegíveis pela Comissão. A
Comissão, referindo-se às conclusões apresentadas pelo advogado-geral M. Darmon
no processo C-291/89 (n.° 28), alega que compete ao promotor, antes de efectuar
qualquer despesa, verificar se a respectiva rubrica foi aprovada pela Comissão, sob
pena de ser ele próprio responsável pelas consequências. No entender da
Comissão, nem a Comissão nem o DAFSE foram, aliás, informados da redução
linear das despesas previstas no pedido inicial efectuada pela recorrente. O
relatório de avaliação não foi enviado à Comissão na íntegra.
- A recorrida recorda que a decisão de aprovação comunicada ao DAFSE referia
claramente o montante solicitado, o montante concedido, o montante das despesas
declarado não elegível, a redução, e o montante total não concedido. Estes
montantes representam a parte do financiamento do FSE, ou seja 49,5% do custo
total previsto no pedido de contribuição. A Comissão ignora se o DAFSE
comunicou esta decisão à recorrente com todos os pormenores dela constantes ouse apenas lhe enviou o ofício junto como anexo 4 à petição (v., supra, n.° 3).
- Segundo a recorrida, se a recorrente não verificou que a rubrica correspondente
tinha sido aprovada na decisão de aprovação, não pode invocar qualquer
expectativa legítima nem, muito menos, direitos adquiridos relativamente à
elegibilidade das despesas contidas no pedido inicial de contribuição.
- A recorrida alega também, invocando as conclusões apresentadas pelo
advogado-geral M. Darmon no processo C-291/89 (n.° 38), que embora o DAFSE
tenha confirmado os custos e o financiamento tais como foram apresentados no
dossier, «esta breve análise das autoridades nacionais não pode consolidar direitos
que a recorrente só adquirirá definitivamente no termo de uma análise profunda
realizada pelos serviços da Comissão...» e que «... a apreciação das autoridades
nacionais que precede a transmissão do pedido de pagamento à Comissão em nada
prejudica a decisão desta instituição».
- A Comissão não aceita, por outro lado, que uma empresa comercial que, nos
termos da lei nacional, é legalmente obrigada a guardar a sua documentação
durante dez anos, invoque a sua própria incúria ou a de terceiros na conservação
de documentos durante esse prazo para acusar a Comissão de infringir o dever de
diligência.
- A recorrida afirma que o processo de decisão teve uma tramitação normal, não foi
excessivamente demorado e respeitou as regras mais exigentes da defesa dos
interesses do promotor da acção.
Apreciação do Tribunal
- O Tribunal começa por sublinhar que o processo relativo às contribuições do FSE,
regulado pelo Regulamento n.° 2950/83, comporta diversas etapas. Num primeiro
momento, a Comissão, em aplicação do artigo 4.°, n.° 1, decide sobre os pedidos
de contribuição apresentados pelos Estados-Membros a favor das empresas
(decisão de aprovação). Nos termos do artigo 5.°, n.os 1 e 2, a aprovação de um
pedido acarreta o pagamento de um adiantamento. Posteriormente, terminada a
acção, o beneficiário apresenta um pedido de pagamento do saldo, o qual deve
incluir um relatório pormenorizado sobre o conteúdo, os resultados e os aspectos
financeiros da acção em causa. O artigo 5.°, n.° 4, prevê que o Estado-Membro
certifica a exactidão factual e contabilística das indicações contidas nos pedidos de
pagamento.
- Por outro lado, o adiantamento recebido cobre, no máximo, 50% das despesas
aprovadas, pelo que o beneficiário é obrigado a avançar fundos consideráveis na
expectativa do pagamento do saldo que pode legitimamente esperar receber, desde
que justifique ter utilizado a contribuição nas condições fixadas pela decisão de
aprovação (acórdão do Tribunal de Justiça de 4 de Junho de 1992,
Cipeke/Comissão, C-189/90, Colect., p. I-3573, n.° 17).
- Ao apreciar o pedido de pagamento do saldo, a Comissão é obrigada a verificar
se as condições a que a acção estava sujeita foram respeitadas. O artigo 6.°, n.° 1,
prevê que, quando a contribuição do Fundo não for utilizada nas condições fixadas
pela decisão de aprovação, a Comissão pode suspender, reduzir ou suprimir a
contribuição depois de ter dado ao Estado-Membro em causa a oportunidade de
apresentar as suas observações. De facto, resulta claramente desta disposição que
a concessão da contribuição do FSE está sujeita ao cumprimento, pelo beneficiário,
das condições da acção, enunciadas pela Comissão na decisão de aprovação ou
pelo beneficiário no pedido de contribuição que foi objecto da decisão de
aprovação.
- Finalmente, o Tribunal de Justiça considerou incontestável o ponto de vista
segundo o qual «apenas depois de ter recebido um relatório detalhado sobre a
acção em causa entretanto acabada (...) é possível calcular o montante exacto das
despesas elegíveis» (acórdão de 1 de Outubro de 1987, Reino Unido/Comissão,
84/85, Colect., p. 3765, n.° 23). Daqui resulta que a Comissão deve dispor da
faculdade de recusar despesas, mesmo previamente autorizadas, por insuficiente
justificação, sem ofender os direitos adquiridos do beneficiário da contribuição.
Consequentemente, é essencial reconhecer à Comissão uma tal margem de
apreciação na análise do pedido de pagamento do saldo, uma vez que só nessa fase
é que a Comissão poderá verificar, em concreto, as justificações apresentadas pela
empresa (v. igualmente as conclusões do advogado-geral M. Darmon no processo
C-291/89, n.os 35 e 36).
- No caso vertente, tendo a recorrente apresentado o pedido de pagamento do saldo,
a Comissão rejeitou determinadas despesas por três razões diferentes (v., supra,
n.° 12). Em primeiro lugar, foram rejeitadas as despesas não previstas pelo
beneficiário no pedido de contribuição. Em segundo lugar, a Comissão considerou
que certas despesas não estavam suficientemente documentadas e, portanto,
julgou-as injustificadas. Em terceiro lugar, detectou a existência de certas despesas
não aprovadas na decisão de aprovação. Consequentemente, após ouvir o DAFSE,
que tinha, por seu turno, ouvido a recorrente, a Comissão reduziu, através da
decisão impugnada, a contribuição do FSE, fixando-a num montante inferior ao
inicialmente concedido. De resto, o DAFSE aprovou estas reduções.
- O Tribunal entende que há que começar por analisar o fundamento baseado na
violação do princípio da protecção da confiança legítima. O direito de invocar a
protecção da confiança legítima é facultado a qualquer operador económico em
cuja esfera jurídica uma instituição tenha feito nascer esperanças fundadas
(acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 13 de Julho de 1995, O'Dwyer e
o./Conselho, T-466/93; T-469/93, T-473/93, T-474/93 e T-477/93, Colect., p. II-2071,
n.° 48). A questão de saber se a decisão impugnada é conforme às exigências do
princípio da protecção da confiança legítima deve ser apreciada analisando
separadamente as três categorias de reduções acima mencionadas.
- Decorre das regras enunciadas supra (n.os 42 e 43) que, por um lado, a Comissão
tinha o direito de rejeitar o pedido de pagamento do saldo da recorrente na
medida em que solicitava a aprovação de custos não previstos no pedido de
contribuição, não violando com isso o princípio da protecção da confiança legítima.
Por outro lado, era igualmente legítimo, do ponto de vista do respeito por este
princípio, rejeitar o pedido de pagamento do saldo na medida em que solicitava a
aprovação de despesas não justificadas por documentos comprovativos da sua
veracidade e da sua relação com a acção tal como fora aprovada.
- Efectivamente, incumbe ao beneficiário demonstrar a veracidade das despesas e
a sua relação com a acção aprovada. É ele quem está em melhores condições de
o fazer, devendo comprovar que se justifica a obtenção de meios provenientes de
fundos públicos. Ora, a recorrente limitou-se a afirmar que os métodos de cálculo
utilizados pela Comissão para determinar o montante global das despesas
aprovadas eram arbitrários e que os custos que apresentou foram realmente
suportados, sem todavia fornecer documentos justificativos ou qualquer elemento
comprovativo de que as informações e verificações em que se baseou a Comissão
eram erradas. Daqui resulta que os argumentos da recorrente no que respeita à
justificação das despesas indicadas no pedido de pagamento do saldo não podem
ser acolhidos.
- Assim, o princípio da protecção da confiança legítima não foi violado no que
respeita às duas primeiras categorias de reduções.
- Quanto à terceira categoria de reduções, importa recordar, a título preliminar, que
a comunicação da decisão de aprovação do DAFSE apenas indica o montante total
concedido e o número de pessoas aprovado (v., supra, n.° 3). Assim, as apreciações
da Comissão, feitas no quadro da decisão de aprovação sobre a elegibilidade das
despesas propostas, não foram comunicadas à recorrente antes do termo da acção
de formação, de modo a esta poder verificar a sua repartição rubrica a rubrica. A
recorrente, ao executar a acção, não pôde, portanto, identificar as verbas
aprovadas, as verbas recusadas e as que foram reduzidas.
- É igualmente ponto assente que a recorrente, tendo recebido a comunicação
sucinta acima referida, decidiu, em vez de tentar saber se certas despesas tinham
sido consideradas não elegíveis, repartir a diferença entre o montante pedido e o
aprovado, isto é, o total das reduções, proporcionalmente entre todas as rubricas
do pedido de contribuição. Além disso, em cumprimento da circular do DAFSE
acima citada (v. n.° 4), efectuou outras reduções em todas as rubricas do pedido
de contribuição. Efectivamente, o montante reclamado no pedido de pagamento
do saldo, 73 496 941 ESC, era claramente inferior ao montante concedido pela
Comissão na decisão de aprovação, 121 647 958 ESC.
- É importante analisar a justificação da terceira categoria de reduções tendo em
conta o facto de que a decisão de aprovação não foi comunicada à recorrente com
todos os pormenores, de modo que esta não foi informada em tempo útil das
reduções operadas por rubrica. A questão consiste em saber se a inobservância das
condições de uma decisão de aprovação que não foram comunicadas ao
beneficiário antes do termo da acção, de modo a que este pudesse tomá-las em
consideração, é de natureza a justificar a conclusão da Comissão de que as
despesas previstas no pedido de contribuição que foram rejeitadas na decisão de
aprovação são inelegíveis, mesmo que o beneficiário forneça documentos
comprovativos da sua veracidade.
- No caso vertente, embora seja verdade que a regulamentação não exigia a
comunicação dos pormenores da decisão de aprovação ao interessado, o certo é
que essas informações eram indispensáveis para que este pudesse respeitar as
condições de concessão da contribuição no que respeita às despesas que a
Comissão alega não terem sido aprovadas na decisão de aprovação.
- O Tribunal considera que não se pode concluir que o beneficiário de uma
contribuição compreenda, pela simples leitura de uma decisão que revestiu a forma
utilizada no presente caso, que as reduções operadas pela Comissão se reportavam
a certas rubricas. Pelo contrário, o interessado pode razoavelmente pensar e aceitar
que foi efectuada uma redução global e que, consequentemente, apenas foi
imposto um limite global às despesas. Em tal situação, para que a Comissão possa,
ao apreciar o pedido de pagamento do saldo, considerar não elegíveis as despesas
previstas no pedido de contribuição mas pretensamente rejeitadas na decisão de
aprovação, esta deve ser comunicada ao interessado com suficiente precisão. Esta
condição só ficaria preenchida se a comunicação indicasse as reduções por rubricas
ou, pelo menos, contivesse as informações que a Comissão comunicou ao DAFSE,
ou seja, neste caso, o número de pessoas em causa, o montante concedido, o
montante das despesas não elegíveis, o montante das outras reduções e o montante
total recusado. Efectivamente, em obediência nomeadamente ao princípio da
segurança jurídica, para ser obrigado a respeitar as condições da decisão de
aprovação no que respeita às reduções por rubricas, o beneficiário deve, ao
executar a acção de formação, estar em condições de identificar as verbas
aprovadas, as verbas recusadas e as que foram reduzidas.
- Nestas condições, tendo em conta que a recorrente foi informada da adopção de
uma decisão que lhe era parcialmente favorável mas cujo conteúdo não lhe foi
integralmente comunicado, não pode ser acusada de não ter reagido, na altura, à
decisão de aprovação pedindo ao DAFSE esclarecimentos sobre a repartição do
montante concedido.
- O Tribunal verifica que, tal como foi comunicada à recorrente, a decisão de
aprovação não continha nenhuma indicação sobre a repartição das reduções
efectuadas. Por essa razão, deve concluir-se que era passível de suscitar
expectativas fundadas à recorrente, a ponto de lhe criar a convicção de que não
havia outras reduções e que estava autorizada a repartir proporcionalmente, como
fez, o total das reduções por todas as rubricas.
- Além disso, a Comissão não pode invocar os termos de uma decisão que não foram
comunicados ao beneficiário. A este propósito, é irrelevante que tenha sido o
DAFSE a informar a recorrente de que o seu projecto fora aprovado.
Efectivamente, quando a Comissão não toma as precauções necessárias para
garantir que o beneficiário de uma contribuição do FSE seja informado das
condições impostas pela decisão de aprovação, não pode razoavelmente esperarque este as respeite.
- O Tribunal conclui que, na medida em que a veracidade e a relação de tais
despesas com a acção sejam demonstradas através de documentos comprovativos,
é contrário ao princípio da protecção da confiança legítima que a Comissão, na
fase de apreciação do pedido de pagamento do saldo, tenha indeferido o pedido
na medida em se referia a despesas previstas no pedido de contribuição mas que
alegadamente não tinham sido aprovadas na decisão de aprovação, sem que isso
tenha sido comunicado ao beneficiário.
- O presente fundamento, na medida em que denuncia uma violação do princípio da
protecção da confiança legítima, deve, em consequência, ser acolhido na parte
relativa às reduções operadas pela Comissão pelo facto de os custos não terem sido
aprovados na decisão de aprovação.
- Por todas as razões acima expostas, há que anular a decisão impugnada na medida
em que a Comissão efectuou reduções nos montantes reclamados no pedido de
pagamento do saldo da recorrente com o único fundamento de que os custos
correspondentes não tinham sido aprovados na decisão de aprovação.
- Em contrapartida, no que respeita às outras reduções efectuadas pelo facto de os
custos correspondentes não estarem previstos ou documentados, há que considerar
que, contrariamente às alegações da recorrente, não violamm os princípios da
segurança jurídica e da protecção dos direitos adquiridos nem do princípio da boa
administração ou do dever de diligência.
- Efectivamente, o princípio da protecção da segurança jurídica exige,
nomeadamente, que uma regulamentação comunitária permita ao interessado
conhecer sem ambiguidade os seus direitos e obrigações e agir em conformidade
(v., neste sentido, o acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de Fevereiro de 1996,
Van Es Douane Agenten e o., C-143/93, Colect., p. I-431, n.° 27). Embora este
princípio entre em linha de conta, designadamente, na apreciação da legalidade das
decisões relativas à restituição de prestações, ele não é violado quando, como no
caso vertente, a regulamentação em vigor prevê claramente a possibilidade de
restituição da contribuição financeira no caso de as condições a que estava sujeito
o apoio não terem sido respeitadas. Entre essas condições figura, como já foi
sublinhado, a exigência de que o custo tenha sido previsto e que esteja
devidamente documentado.
- Do mesmo modo, o beneficiário de uma contribuição cujo pedido tenha sido
aprovado pela Comissão não adquire, por esse facto, um direito definitivo ao
pagamento integral da contribuição no caso de não respeitar as condições acima
mencionadas.
- No que respeita ao princípio da boa administração e ao dever de diligência, o
Tribunal considera que a Comissão fez prova de boa administração e de diligência,
uma vez que analisou cuidadosamente todos os elementos do processo e, neste
âmbito, contactou as empresas subcontratadas a fim de obter informações e
documentos comprovativos que a recorrente não lhe forneceu. De qualquer forma,
e atendendo a que a recorrente não a desenvolveu mais pormenorizadamente, não
tendo explicado em que é que consistiram as alegadas violações, esta acusação não
pode ser acolhida.
- Quanto ao argumento baseado no período de tempo considerável que terá
decorrido desde o início do processo, o Tribunal considera que o período de tempo
relevante no presente caso, para efeitos de apreciação deste argumento, se situa
entre a data em que foi proferido o acórdão de anulação no processo C-291/89, 7
de Maio de 1991, e a data de adopção da decisão impugnada, 12 de Julho de 1994,
38 meses ou seja, mais de três anos. Efectivamente, atendendo a que a Comissão
era obrigada, na sequência da anulação da primeira decisão pelo Tribunal de
Justiça, a reapreciar a totalidade dos dados disponíveis no momento da adopção
do acto e a tomar nova decisão sobre o pedido de pagamento do saldo, o período
decorrido antes da anulação da primeira decisão da Comissão sobre o pedido de
pagamento do saldo não é pertinente no quadro da apreciação da regularidade da
decisão impugnada.
- A questão de saber se o prazo foi razoável deve ser apreciada caso a caso. Ora,
a Comissão era obrigada, na sequência da anulação da primeira decisão pelo
Tribunal de Justiça, a reapreciar o conjunto dos dados disponíveis no momento da
adopção do acto e a tomar nova decisão sobre o pedido de pagamento do saldo.
Assim, há que ter em conta as diferentes etapas do processo de decisão que o
presente caso conheceu. Foi necessário coligir de novo os elementos do processo.
Este trabalho, orientado e condicionado por suspeitas de irregularidade, incluiu a
organização de uma missão de controlo a Portugal, visitas às empresas
subcontratadas, análise dos dados recolhidos e diversas consultas às autoridades
portuguesas. As autoridades nacionais ouviram igualmente a recorrente sobre os
projectos de decisão da Comissão. O Tribunal considera, tendo em conta as
circunstâncias muito particulares acima expostas, que o processo foi longo mas que
a sua duração não excedeu um prazo razoável.
- De qualquer forma, em caso de recurso de anulação, um prazo, mesmo não
razoável, não pode, por si só, tornar a decisão impugnada ilegal, justificando a sua
anulação em razão de uma violação do princípio da segurança jurídica. Um atraso
no processo de execução de um acórdão não é susceptível de afectar, por si só, a
validade do acto que tenha resultado de tal processo, uma vez que, se esse acto
fosse anulado unicamente em razão da sua extemporaneidade, seria impossível
adoptar um acto válido, dado que o acto destinado a substituir o acto anulado não
poderia ser menos tardio do que este (v., por analogia, o acórdão do Tribunal de
Primeira Instância de 18 de Junho de 1996, Vela Palacios/CES, T-150/94,
Colect.FP, p.II-877, n.° 44).
- Finalmente, o Tribunal rejeita, pelas mesmas razões, o argumento da recorrente
segundo o qual a decisão impugnada está viciada porque não foi adoptada dentro
do prazo de dois meses a contar do pedido apresentado pela recorrente para esse
efeito. Basta ter presente que a circunstância de a recorrente ter convidado a
Comissão a agir em aplicação do artigo 175.°, terceiro parágrafo, do Tratado tinha
unicamente por efeito permitir-lhe intentar uma acção por omissão se a instituição
em causa não tomasse posição no prazo de dois meses a contar desse convite,
prazo estabelecido pelo artigo 175.°, segundo parágrafo, do Tratado. No caso
presente, a recorrente não intentou uma acção por omissão dentro desse prazo de
dois meses a contar da data em que a instituição deveria ter tomado posição. De
qualquer forma, uma decisão posterior não pode ser irregular pelo simples facto
de ter sido adoptada após expirar o referido prazo, dado que tal resultado, a ser
aceite, obstaria definitivamente, nessa fase, à adopção de uma decisão válida.
Quanto ao fundamento baseado na violação da obrigação de fundamentação
- Tendo em conta o que precede, basta analisar o fundamento baseado na violação
da obrigação de fundamentação na parte em que ainda não foi dado provimento
ao recurso, isto é, na parte relativa às reduções efectuadas pelo facto de as
despesas não terem sido previstas no pedido de contribuição ou de não terem sido
justificadas através de documentos comprovativos.
Exposição sumária dos argumentos das partes
- Segundo a recorrente, a decisão impugnada não contém uma fundamentação
suficiente para as reduções efectuadas pelo facto de as despesas relativas às
rubricas «funcionamento e gestão dos cursos pessoal docente», à preparação dos
cursos, aos materiais e bens não duradouros e às amortizações normais, não serem
justificadas e portanto, serem ilegíveis. Efectivamente, no que respeita, em primeiro
lugar, à rubrica «funcionamento e gestão dos cursos pessoal docente», a
Comissão não explicou, na opinião da recorrente, o critério arbitrário que lhe
permitiu fixar o montante global aceitável. Do mesmo modo, quanto à preparação
dos cursos, a Comissão limitou-se a contestar a factura apresentada pela Partex à
recorrente, sem fornecer motivos suficientes. No que respeita à rubrica «materiais
e bens não duradouros», o montante indicado corresponde ao custo real e deveria
ter sido tomado em consideração enquanto tal. No entanto, a Comissão não
justificou a sua posição sobre este ponto.
- A recorrida rejeita as acusações da recorrente no que respeita à fundamentação
da decisão. A Comissão explica que comunicou ao DAFSE o montante global
aprovado e o montante da redução operada relativamente a cada pedido de
contribuição. Neste caso, comunicou a nota referida no n.° 2, supra. Este
procedimento deve-se ao facto de a Comissão, num curto espaço de tempo, ter de
tratar vários milhares de pedidos de comparticipação e de não lhe ser possível,
nesse curto período, especificar e justificar todas as despesas consideradas não
elegíveis, como o Tribunal de Justiça já reconheceu (acórdãos do Tribunal de
Justiça de 25 de Outubro de 1984, Rijksuniversiteit te Groningen, 185/83, Recueil,
p. 3623, e de 7 de Fevereiro de 1990, Gemeente Amsterdam e VIA/Comissão,
C-213/87, Colect., p. I-221). A Comissão acrescenta que, quando em 1988 o
DAFSE lhe solicitou que fornecesse a discriminação das reduções por rubricas, essa
solicitação foi sempre satisfeita.
- A recorrida explica detidamente nos seus memorandos as reduções que efectuou
na decisão impugnada. Tal explicação repete, no essencial, o raciocínio contido na
nota n.° 22917.
Apreciação do Tribunal
- Segundo jurisprudência assente, o dever de fundamentar uma decisão individual
tem por finalidade permitir ao Tribunal o exercício da fiscalização da legalidade da
decisão e fornecer ao interessado indicações suficientes para saber se a decisão está
devidamente fundamentada ou se, eventualmente, enferma de um vício que
permita contestar a sua validade. O alcance deste dever depende da natureza do
acto em causa e do contexto em que ele tenha sido adoptado (acórdão
Cipeke/Comissão, já referido, n.° 14).
- A questão de saber se a fundamentação da decisão impugnada foi suficiente, e
portanto conforme ao Tratado e à jurisprudência, deve ser apreciada analisando
separadamente as reduções efectuadas pelo facto de as despesas não terem sido
previstas no pedido de contribuição e as operadas pelo facto de não terem sido
justificadas através de documentos comprovativos.
- Quanto à rejeição das despesas não previstas no pedido inicial de contribuição, ou
primeira categoria citada, o Tribunal considera que a recorrente, uma vez que está
na origem do pedido, após ter recebido a nota n.° 22917 e a decisão impugnada,
ficou suficientemente esclarecida quanto aos motivos das reduções ou supressões
efectuadas pela Comissão. Efectivamente, as informações contidas nos dois
documentos bastavam para a recorrente compreender que, na decisão impugnada,
a Comissão procedera a reduções nas rubricas «Rendas e alugueres», «Materiais
e bens não duradouros» e «Alojamento e alimentação dos formandos» e que
suprimira totalmente a rubrica «Amortizações normais» uma vez que as despesas
correspondentes não estavam previstas no pedido de contribuição. Nestas
condições, o Tribunal está em condições de exercer a sua fiscalização igualmente
sobre esta parte da decisão impugnada.
- A acusação da recorrente, na medida em que se refere a esta primeira categoria
de reduções, é assim improcedente.
- Quanto à segunda categoria, isto é, as reduções efectuadas pelo facto de certas
despesas não serem justificadas por documentos comprovativos, o Tribunal
considera que a decisão impugnada está igualmente suficientemente fundamentada.
Efectivamente, resulta de modo claro da nota n.° 22917 que as reduções que
afectaram as rubricas «Rendimentos dos estagiários em formação», «Preparação
dos cursos, recrutamento e selecção dos formandos», «Duplicação de
documentação», «Gestão e controlo orçamental», «Trabalhos especializados» e
«Outros fornecimentos e serviços de terceiros», bem como uma parte da rubrica
«funcionamento e gestão dos cursos pessoal docente», foram efectuadas em
razão da insuficiência da documentação apresentada. Os métodos utilizados e os
cálculos foram expostos com precisão suficiente, susceptível de colocar a recorrente
em condições de apreciar a sua regularidade e, eventualmente, de os contestar
apresentando documentação adequada.
- Assim, a acusação da recorrente, na medida em que tem por objecto afundamentação desta segunda categoria de reduções, é igualmente improcedente.
- Daqui resulta que o fundamento baseado em falta de fundamentação, na medida
em que é necessário apreciá-lo, deve ser rejeitado integralmente.
- Deve por isso, quanto ao restante, julgar-se improcedente o pedido de anulação.
Quanto às despesas
- Por força do disposto no n.° 2 do artigo 87.° do Regulamento de Processo, a parte
vencida deve ser condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.
- Neste caso, o pedido de anulação da recorrente, que pediu a condenação da
Comissão nas despesas da presente instância, foi parcialmente julgado procedente.
O Tribunal considera que, embora a recorrente tenha sido vencida numa parte das
suas pretensões, importa ter em conta, para a decisão sobre despesas, os
desenvolvimentos do processo de decisão, acima descritos, que foram de natureza
a colocar a recorrente num estado de incerteza prolongado quanto ao direito de
obter a totalidade da contribuição financeira que lhe fora concedida. Nestas
circunstâncias, não se pode criticar a recorrente por ter recorrido a este Tribunal
a fim de apreciar o comportamento da Comissão e dele tirar as respectivas
conclusões. Há assim que reconhecer que o desencadeamento do litígio foi
favorecido pelo comportamento da recorrida.
- Assim, impõe-se aplicar, além do n.° 2, também o n.° 3, segundo parágrafo, do
artigo 87.° do Regulamento de Processo, nos termos do qual o Tribunal pode
condenar uma parte, mesmo vencedora, a pagar à outra as despesas ocasionadas
por um processo suscitado pelo seu próprio comportamento (v., mutatis mutandis,
o acórdão do Tribunal de Justiça de 27 de Janeiro de 1983, List/Comissão, 263/81,
Recueil, p. 103, n.os 30 e 31 e o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 16
de Outubro de 1996, Efisol/Comissão, T-336/94, ainda não publicado na
Colectânea, n.os 38 e 39) e condenar a Comissão na totalidade das despesas.
- Em consequência, há que condenar a Comissão a suportar, além das suas próprias
despesas, a totalidade das despesas da recorrente.
Pelos fundamentos expostos,O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Primeira Secção),
decide:
- A Decisão C(94) 1410/11 da Comissão, de 12 de Julho de 1994, notificada
à recorrente em 27 de Dezembro de 1994, sobre o dossier n.° 870840/P1,
relativa a uma contribuição financeira do Fundo Social Europeu para uma
acção de formação, é anulada na medida em que procede a reduções nos
montantes solicitados pela recorrente no pedido de pagamento do saldo
apresentando como único fundamento o facto de os custos correspondentes
não terem sido aprovados na decisão de aprovação.
- O recurso é julgado improcedente quanto ao restante.
- A Comissão é condenada nas suas próprias despesas e na totalidade das
despesas da recorrente.
Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 14 de Julho de 1997.
O secretário
O presidente
H. Jung
A. Saggio
1: Língua do processo: português.