Language of document : ECLI:EU:C:2019:386

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção)

8 de maio de 2019 (*)

«Reenvio prejudicial — Transportes — Serviços públicos de transporte ferroviário e rodoviário de passageiros — Regulamento (CE) n.o 1370/2007 — Artigo 5.o, n.os 1 e 2 — Adjudicação por ajuste direto — Contratos de serviços públicos de transporte de passageiros por autocarro e elétrico — Requisitos — Diretiva 2014/24/UE — Artigo 12.o — Diretiva 2014/25/UE — Artigo 28.o»

No processo C‑253/18,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Oberlandesgericht Düsseldorf (Tribunal Regional Superior de Düsseldorf, Alemanha), por Decisão de 7 de março de 2018, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 12 de abril de 2018, no processo

Stadt Euskirchen

contra

Rhenus Veniro GmbH & Co. KG,

sendo interveniente:

SVE Stadtverkehr Euskirchen GmbH,

RVK Regionalverkehr Köln GmbH,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção),

composto por: C. Lycourgos, presidente de Secção, E. Juhász (relator) e I. Jarukaitis, juízes,

advogado‑geral: M. Campos Sánchez‑Bordona,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da Stadt Euskirchen, por S. Schaefer e J. Manka, Rechtsanwälte,

–        em representação da Rhenus Veniro GmbH & Co. KG, por C. Antweiler, Rechtsanwalt,

–        em representação da Comissão Europeia, por W. Mölls, P. Ondrůšek e J. Hottiaux, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 5.o do Regulamento (CE) n.o 1370/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2007, relativo aos serviços públicos de transporte ferroviário e rodoviário de passageiros e que revoga os Regulamentos (CEE) n.o 1191/69 e (CEE) n.o 1107/70 do Conselho (JO 2007, L 315, p. 1).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio entre a Stadt Euskirchen (cidade de Euskirchen, Alemanha) e a Rhenus Veniro GmbH & Co. KG (a seguir «Rhenus Veniro») relativamente a um projeto de adjudicação por ajuste direto de um serviço público de transporte de passageiros em autocarros e outros veículos a motor.

 Quadro jurídico

 Regulamento n.o 1370/2007

3        O artigo 2.o do Regulamento n.o 1370/2007, sob a epígrafe «Definições», tem a seguinte redação:

«Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:

a)      “Transporte público de passageiros”, os serviços de transporte de passageiros de interesse económico geral prestados ao público numa base não discriminatória e regular;

b)      “Autoridade competente”, qualquer autoridade pública, ou agrupamento de autoridades públicas, de um ou mais Estados‑Membros com poder para intervir no transporte público de passageiros numa determinada zona geográfica, ou qualquer organismo investido dessas competências;

[…]

h)      “Adjudicação por ajuste direto”, a adjudicação de um contrato de serviço público a um determinado operador de serviços públicos sem qualquer processo prévio de concurso;

[…]

j)      “Operador interno”, uma entidade juridicamente distinta, sobre a qual a autoridade competente a nível local ou, em caso de agrupamento de autoridades, pelo menos uma autoridade competente a nível local, exerce um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços;

[…]»

4        O artigo 4.o, n.o 7, deste regulamento dispõe:

«Os documentos relativos aos concursos e os contratos de serviço público devem ser transparentes quanto à possibilidade ou impossibilidade de subcontratação e, caso esta seja possível, quanto à sua extensão. Em caso de subcontratação, o operador encarregado da gestão e da prestação de serviços públicos de transporte de passageiros, de acordo com o presente regulamento, é obrigado a prestar ele próprio uma parte substancial dos serviços públicos de transporte. […]»

5        O artigo 5.o do referido regulamento, com a epígrafe «Adjudicação de contratos de serviço público», prevê:

«1.      Os contratos de serviço público devem ser adjudicados de acordo com as regras estabelecidas no presente regulamento. No entanto, os contratos de serviços ou os contratos públicos de serviços, tal como definidos nas Diretivas 2004/17/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais (JO 2004, L 134, p. 1),] ou 2004/18/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos de empreitada de obras públicas, dos contratos públicos de fornecimento e dos contratos públicos de serviços (JO 2004, L 134, p. 114)], para o transporte público de passageiros por autocarro ou elétrico, devem ser adjudicados nos termos dessas diretivas na medida em que tais contratos não assumam a forma de contratos de concessão de serviços, tal como definidos nessas diretivas. Sempre que os contratos devam ser adjudicados nos termos das Diretivas [2004/17] ou [2004/18], não se aplica o disposto nos n.os 2 a 6 do presente artigo.

2.      Salvo proibição prevista pelo direito nacional, qualquer autoridade competente a nível local, quer se trate de uma autoridade singular ou de um agrupamento de autoridades fornecedoras de serviços públicos integrados de transporte de passageiros, pode decidir prestar ela própria serviços de transporte público de passageiros ou adjudicar por ajuste direto contratos de serviço público a uma entidade juridicamente distinta sobre a qual a autoridade competente a nível local, ou caso se trate de um agrupamento de autoridades, pelo menos uma autoridade competente a nível local, exerça um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços. Caso uma autoridade competente a nível local tome essa decisão, aplicam‑se as seguintes disposições:

[…]

b)      É condição de aplicação do presente número que o operador interno e qualquer entidade sobre a qual este operador exerça uma influência, ainda que mínima, exerçam integralmente as suas atividades de transporte público de passageiros no interior do território da autoridade competente a nível local, mesmo que existam linhas secundárias ou outros elementos acessórios dessa atividade que entrem no território de autoridades competentes a nível local vizinhas, e não participem em concursos organizados fora do território da autoridade competente a nível local;

[…]

e)      Em caso de subcontratação ao abrigo do n.o 7 do artigo 4.o, o operador interno é obrigado a prestar ele próprio a maior parte do serviço público de transporte de passageiros.

3.      Qualquer autoridade competente que recorra a um terceiro que não seja um operador interno deve adjudicar os contratos de serviço público com base num concurso, […].

[…]»

6        O artigo 7.o do mesmo regulamento, sob a epígrafe «Publicação», dispõe, no seu n.o 2:

«Cada autoridade competente toma as medidas necessárias para que, o mais tardar um ano antes da abertura do concurso ou um ano antes da adjudicação por ajuste direto, sejam publicadas no Jornal Oficial da União Europeia, no mínimo, as seguintes informações:

a)      Nome e dados de contacto da autoridade competente;

b)      Tipo de procedimento previsto para a adjudicação;

c)      Serviços e territórios potencialmente abrangidos pela adjudicação.

[…]»

 Diretiva 2014/23/UE

7        A Diretiva 2014/23/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa à adjudicação de contratos de concessão (JO 2014, L 94, p. 1), entrou em vigor em 17 de abril de 2014 e as suas disposições deviam ter sido transpostas pelos Estados‑Membros antes de 18 de abril de 2016.

8        O artigo 5.o desta diretiva, com a epígrafe «Definições», dispõe:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

1)      “Concessões”, a concessão de obras públicas ou serviços, tal como definidas nas alíneas a) e b):

a)      “Concessão de obras”, um contrato a título oneroso celebrado por escrito, mediante o qual uma ou mais autoridades adjudicantes ou entidades adjudicantes confiam a execução de obras a um ou mais operadores económicos, cuja contrapartida consiste, quer unicamente no direito de exploração da obra que constitui o objeto do contrato, quer nesse direito acompanhado de um pagamento;

b)      “Concessão de serviços”, um contrato a título oneroso celebrado por escrito, mediante o qual uma ou mais autoridades adjudicantes ou entidades adjudicantes confiam a prestação e a gestão de serviços distintos da execução de obras referida na alínea a) a um ou mais operadores económicos, cuja contrapartida consiste, quer unicamente no direito de exploração dos serviços que constituem o objeto do contrato, quer nesse direito acompanhado de um pagamento.

[…]»

 Diretiva 2014/24/UE

9        O artigo 12.o da Diretiva 2014/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos públicos e que revoga a Diretiva 2004/18/CE (JO 2014, L 94, p. 65), com a epígrafe «Contratos públicos entre entidades no setor público», dispõe:

«1.      Um contrato público adjudicado por uma autoridade adjudicante a outra pessoa coletiva de direito privado ou público fica excluído do âmbito da presente diretiva quando estiverem preenchidas todas as seguintes condições:

a)      A autoridade adjudicante exerce sobre a pessoa coletiva em causa um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços;

b)      Mais de 80 % das atividades da pessoa coletiva controlada são realizadas no desempenho de funções que lhe foram confiadas pela autoridade adjudicante que a controla ou por outras pessoas coletivas controladas pela referida autoridade adjudicante; e

c)      Não há participação direta de capital privado na pessoa coletiva controlada, com exceção das formas de participação de capital privado sem poderes de controlo e sem bloqueio exigidas pelas disposições legislativas nacionais, em conformidade com os Tratados, e que não exercem influência decisiva na pessoa coletiva controlada.

Considera‑se que uma autoridade adjudicante exerce sobre uma pessoa coletiva um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços, na aceção da alínea a) do primeiro parágrafo, quando exerce uma influência decisiva sobre os objetivos estratégicos e as decisões relevantes da pessoa coletiva controlada. Esse controlo pode ser igualmente exercido por outra pessoa coletiva, que, por sua vez, é controlada da mesma forma pela autoridade adjudicante.

2.      O n.o 1 aplica‑se igualmente quando uma pessoa coletiva controlada que é uma autoridade adjudicante adjudica um contrato à autoridade adjudicante que a controla, ou a outra pessoa coletiva controlada pela mesma autoridade adjudicante, desde que não haja participação direta de capital privado na pessoa coletiva à qual o contrato público é adjudicado, com exceção das formas de participação de capital privado sem poderes de controlo e sem bloqueio exigidas pelas disposições legislativas nacionais em conformidade com os Tratados, e que não exercem influência decisiva na pessoa coletiva controlada.

3.      Uma autoridade adjudicante que não exerce controlo sobre uma pessoa coletiva de direito público ou privado na aceção do n.o 1 pode, no entanto, adjudicar um contrato público sem aplicar a presente diretiva a essa pessoa coletiva quando estiverem preenchidas todas as seguintes condições:

a)      A autoridade adjudicante, conjuntamente com outras autoridades adjudicantes, exerce sobre a pessoa coletiva em causa um controlo análogo ao que exerce sobre os seus próprios serviços;

b)      Mais de 80 % das atividades da pessoa coletiva em causa são realizadas no desempenho de funções que lhe foram confiadas pelas autoridades adjudicantes que a controlam ou por outras pessoas coletivas controladas pelas mesmas autoridades adjudicantes;

c)      Não há participação direta de capital privado na pessoa coletiva controlada, com exceção das formas de participação de capital privado sem poderes de controlo e sem bloqueio exigidas pelas disposições legislativas nacionais, em conformidade com os Tratados, e que não exercem influência decisiva na pessoa coletiva controlada.

Para efeitos da alínea a) do primeiro parágrafo, considera‑se que as autoridades adjudicantes exercem conjuntamente um controlo sobre uma pessoa coletiva quando estiverem preenchidas todas as seguintes condições:

i)      os órgãos de decisão da pessoa coletiva controlada são compostos por representantes de todas as autoridades adjudicantes participantes. Várias ou todas as autoridades adjudicantes participantes podem fazer‑se representar por representantes individuais,

ii)      essas autoridades adjudicantes podem exercer conjuntamente uma influência decisiva sobre os objetivos estratégicos e as decisões relevantes da pessoa coletiva controlada,

iii)      a pessoa coletiva controlada não persegue quaisquer interesses contrários aos interesses das autoridades adjudicantes que a controlam.

4.      Um contrato celebrado exclusivamente entre duas ou mais autoridades adjudicantes não releva do âmbito de aplicação da presente diretiva quando estiverem preenchidas todas as seguintes condições:

a)      O contrato estabelece ou executa uma cooperação entre as autoridades adjudicantes participantes, a fim de assegurar que os serviços públicos que lhes cabe executar sejam prestados com o propósito de alcançar os objetivos que têm em comum;

b)      A execução da referida cooperação é unicamente regida por considerações de interesse público; e

c)      As autoridades adjudicantes participantes exercem no mercado livre menos de 20 % das atividades abrangidas pela cooperação.

5.      Para determinar a percentagem de atividades referida no n.o 1, primeiro parágrafo, alínea b), no n.o 3, primeiro parágrafo, alínea b), e no n.o 4, alínea c), deve ser tido em conta o volume médio total de negócios, ou uma medida alternativa adequada, baseada na atividade, por exemplo os custos suportados pela pessoa coletiva em causa ou pela autoridade contratante no que diz respeito a serviços, fornecimentos e obras, nos três anos anteriores à adjudicação do contrato.

Se, devido à data de criação ou de início de atividade da pessoa coletiva em causa ou a autoridade contratante devido à reorganização das suas atividades, o volume de negócios, ou a medida alternativa adequada baseada na atividade, não estiverem disponíveis para os três anos anteriores ou já não forem relevantes, basta mostrar que a medição da atividade é credível, nomeadamente através de projeções de atividades.»

 Diretiva 2014/25/UE

10      O artigo 11.o da Diretiva 2014/25/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos públicos celebrados pelas entidades que operam nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais e que revoga a Diretiva 2004/17/CE (JO 2014, L 94, p. 243), com a epígrafe «Serviços de transporte», dispõe:

«A presente diretiva aplica‑se às atividades que tenham por objetivo a disponibilização ou exploração de redes destinadas à prestação de serviços ao público no domínio dos transportes por caminho de ferro, sistemas automáticos, carros elétricos, tróleis, autocarros ou cabo.

No que diz respeito aos serviços de transporte, considera‑se que existe uma rede quando o serviço é prestado nas condições estabelecidas por uma autoridade competente de um Estado‑Membro, tais como, por exemplo, as condições nas linhas a servir, a capacidade disponível ou a frequência do serviço.»

11      O artigo 28.o da Diretiva 2014/25, com a epígrafe «Contratos entre autoridades adjudicantes», contém disposições, em substância, análogas às do artigo 12.o da Diretiva 2014/24, conforme recordadas no n.o 9 do presente acórdão.

 Litígio no processo principal e questão prejudicial

12      A cidade de Euskirchen é uma autoridade competente, na aceção do artigo 2.o, alínea b), do Regulamento n.o 1370/2007.

13      Em 8 de dezembro de 2016, em conformidade com o artigo 7.o, n.o 2, desse regulamento, a cidade de Euskirchen publicou no suplemento do Jornal Oficial da União Europeia um anúncio de informação prévia relativo a uma adjudicação por ajuste direto dos serviços públicos de transporte de passageiros em autocarros e outros veículos a motor que não revestia a forma de um contrato de concessão de serviços, nos termos do artigo 5.o, n.o 2, do referido regulamento.

14      Nos termos deste anúncio de informação prévia, o referido contrato, que tinha por objeto a execução anual de mais de um milhão de quilómetros, devia ser adjudicado à SVE Stadtverkehr Euskirchen GmbH (a seguir «SVE»), sociedade totalmente detida pela cidade de Euskirchen, por uma duração de 120 meses a partir de 1 de janeiro de 2019.

15      Na medida em que a SVE não dispunha de veículo nem de motorista para executar por si própria os serviços objeto do contrato público, anunciou a sua intenção de celebrar um acordo de subcontratação com a RVK Regionalverkehr Köln GmbH (a seguir «RVK»), sociedade fornecedora dos serviços de transporte em todo o território coberto pela Zweckverband Verkehrsverbund Rhein‑Sieg (Associação para a Gestão dos Transportes de Rhein‑Sieg, Alemanha).

16      A RVK é detida, respetivamente, pela Kölner Verkehrsbetriebe AG, pela Kreisholding Rhein Sieg GmbH, pela Rhein‑Erft Verkehrsgesellschaft mbH, pela Elektrische Bahn der Stadt Bonn und des Rhein Sieg Kreis SBB GmbH (SBB GmbH), pela Stadtwerke Bonn Verkehrs GmbH, pelo Kreis Euskirchen (distrito de Euskirchen, Alemanha) e pelo Rheinisch‑Bergischer Kreis (distrito de Rhin‑Berg, Alemanha), cada um com 12,5 %. As restantes partes são detidas em 2,5 % pelo Oberbergischer Kreis (distrito de Haut‑Berg, Alemanha) e em 10 % pelo próprio operador subcontratante.

17      Durante 2016, a SVE respondeu positivamente à proposta que lhe foi feita para adquirir 2,5 % do capital social da RVK em 1 de janeiro de 2019, data de início da execução do contrato público cuja adjudicação estava prevista.

18      A Rhenus Veniro interpôs recurso contra a adjudicação por ajuste direto na Vergabekammer competente (Órgão de Fiscalização dos Contratos Públicos, Alemanha).

19      Por decisão de 16 de maio de 2017, a Vergabekammer (Órgão de Fiscalização dos Contratos Públicos) proibiu a cidade de Euskirchen de adjudicar o contrato à SVE.

20      A este respeito, a Vergabekammer (Órgão de Fiscalização dos Contratos Públicos) alegou, antes de mais, que a SVE não preenchia o critério de execução pessoal do contrato de transporte, previsto no artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1370/2007. Em seguida, indicou que a RVK executava prestações de transporte noutras áreas regionais que não da cidade de Euskirchen, o que era contrário às referidas disposições. Por último, sublinhou que a atividade da RVK não podia ser imputada à SVE, uma vez que esta última só detinha 2,5 % da RVK em 1 de janeiro de 2019.

21      A SVE interpôs recurso no Oberlandesgericht Düsseldorf (Tribunal Regional Superior de Düsseldorf, Alemanha) da decisão da Vergabekammer (Órgão de Fiscalização dos Contratos Públicos), alegando que esta tinha feito uma aplicação incorreta do artigo 5.o do Regulamento n.o 1370/2007, na medida em que a RVK era controlada conjuntamente por autoridades competentes e que executava as suas prestações no território dessas autoridades.

22      O Oberlandesgericht Düsseldorf (Tribunal Regional Superior de Düsseldorf) salienta, a título preliminar, que a resolução do litígio depende da resposta do Tribunal de Justiça aos pedidos de decisão prejudicial que lhe foram submetidos nos processos apensos Verkehrsbetrieb Hüttebräucker e Rhenus Veniro (C‑266/17 e C‑267/17), relativos à questão da aplicabilidade do artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1370/2007 aos contratos públicos que não são concessões de serviço.

23      Em caso de resposta afirmativa pelo Tribunal de Justiça a esta questão, o Oberlandesgericht Düsseldorf (Tribunal Regional Superior de Düsseldorf) interroga‑se sobre a questão de saber se o artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1370/2007 é aplicável quando o operador interno realiza a maior parte do contrato que lhe foi adjudicado por uma sociedade da qual detém apenas 2,5 % do capital social, pertencendo o resto do capital social, direta ou indiretamente, a outras autoridades competentes.

24      Nestas circunstâncias, o Oberlandesgericht Düsseldorf (Tribunal Regional Superior de Düsseldorf) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O artigo 5.o, n.o 2, segundo período, alínea e), do Regulamento (CE) n.o 1370/2007, ao obrigar o operador interno a prestar ele próprio a maior parte do serviço público de transporte de passageiros, exclui que o operador interno preste essa maior parte dos serviços através de uma filial em que detém uma participação de 2,5 %, sendo as restantes participações detidas, direta ou indiretamente, por outras autoridades competentes?»

 Quanto à questão prejudicial

25      Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, ao Tribunal de Justiça se o artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1370/2007 é aplicável à adjudicação por ajuste direto de um contrato de prestação de serviços públicos de transporte rodoviário que não reveste a forma de um contrato de concessão e, em caso de resposta afirmativa, se esta disposição autoriza o operador interno a realizar a maior parte desse serviço através de uma sociedade de que detém apenas 2,5 % do capital social.

26      A este respeito, há que sublinhar que o Tribunal de Justiça já declarou que, no que diz respeito aos contratos normalmente abrangidos pelo âmbito de aplicação material e ratione temporis da Diretiva 2004/17 ou da Diretiva 2004/18, as adjudicações por ajuste direto de contratos de serviços públicos de transporte rodoviário que não revestem a forma de contratos de concessão na aceção dessas diretivas não estavam sujeitas ao artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1370/2007, mas sim ao regime das adjudicações de contratos públicos por ajuste direto que se desenvolveu com base nessas diretivas (v., nesse sentido, Acórdão de 21 de março de 2019, Verkehrsbetrieb Hüttebräucker e Rhenus Veniro, C‑266/17 e C‑267/17, EU:C:2019:241, n.os 73 a 76).

27      No que diz respeito às Diretivas 2014/24 e 2014/25, que revogaram e substituíram as Diretivas 2004/18 e 2004/17, respetivamente, e que, ao contrário destas duas últimas diretivas, já não definem o conceito de «contrato de concessão», agora regulado pela Diretiva 2014/23, o Tribunal de Justiça salientou que essas duas diretivas codificaram e precisaram, no artigo 12.o, a primeira, e no artigo 28.o, a segunda, a jurisprudência desenvolvida pelo Tribunal de Justiça em matéria de adjudicação por ajuste direto, o que evidencia que o legislador da União quis que este regime de adjudicação por ajuste direto ficasse associado a essas duas diretivas (v., neste sentido, Acórdão de 21 de março de 2019, Verkehrsbetrieb Hüttebräucker e Rhenus Veniro, C‑266/17 e C‑267/17, EU:C:2019:241, n.os 77 e 78).

28      No caso em apreço, o anúncio de informação prévia relativo ao processo de adjudicação por ajuste direto do serviço público de transporte de passageiros em autocarros e outros veículos a motor em causa no processo principal foi publicado em 8 de dezembro de 2016, quando, nessa data, as Diretivas 2014/24 e 2014/25 já eram aplicáveis, uma vez que o prazo previsto para a sua transposição já tinha caducado.

29      Atendendo ao exposto, há que responder à questão prejudicial que o artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1370/2007 deve ser interpretado no sentido de que não é aplicável à adjudicação por ajuste direto de contratos de serviços públicos de transporte por autocarro que não assumam a forma de contratos de concessão, na aceção da Diretiva 2014/23.

 Quanto às despesas

30      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) declara:

O artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento (CE) n.o 1370/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2007, relativo aos serviços públicos de transporte ferroviário e rodoviário de passageiros e que revoga os Regulamentos (CEE) n.o 1191/69 e (CEE) n.o 1107/70 do Conselho, deve ser interpretado no sentido de que não é aplicável à adjudicação por ajuste direto de contratos de serviços públicos de transporte por autocarro que não assumam a forma de contratos de concessão, na aceção da Diretiva 2014/23/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa à adjudicação de contratos de concessão.

Assinaturas


*      Língua do processo: alemão.