Language of document : ECLI:EU:T:2016:242

Edição provisória

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

26 de abril de 2016 (*)

«Acesso a documentos — Regulamento (CE) n.° 1049/2001 — Documentos relativos a um processo de inquérito do OLAF — Recurso de anulação — Recusas tácitas e expressas de acesso — Exceção relativa à proteção da vida privada e da integridade do indivíduo — Exceção relativa à proteção dos interesses comerciais de um terceiro — Exceção relativa à proteção do processo decisório — Dever de fundamentação — Responsabilidade extracontratual»

No processo T‑221/08,

Guido Strack, residente em Colónia (Alemanha), representado por H. Tettenborn e N. Lödler, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada inicialmente por P. Costa de Oliveira e B. Eggers, e em seguida por B. Eggers e J. Baquero Cruz, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto, por um lado, um pedido de anulação de todas as decisões tácitas e expressas da Comissão adotadas na sequência do pedido inicial de acesso aos documentos apresentado por G. Strack em 18 e 19 de janeiro de 2008 e, por outro, um pedido de indemnização,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção),

composto por: I. Pelikánova, presidente, E. Buttigieg (relator) e L. Madise, juízes,

secretário: K. Andová, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 21 de outubro de 2014,

profere o presente

Acórdão (1)

[omissis]

 Tramitação e pedidos das partes

37      Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 6 de junho de 2008, o recorrente interpôs o presente recurso. Por requerimento separado, apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 8 de setembro de 2008, a Comissão suscitou uma exceção de inadmissibilidade nos termos do artigo 114.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral de 2 de maio de 1991, que, por despacho de 14 de janeiro de 2010, foi junta à questão de mérito.

38      Na sequência da adaptação dos seus pedidos, designadamente por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 7 de setembro de 2010, o recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

—        anular as decisões tácitas e expressas de recusa de acesso a documentos da Comissão e a documentos do OLAF, adotadas pela Comissão no âmbito do tratamento dos pedidos iniciais de acesso de 18 e 19 de janeiro de 2008 e dos pedidos confirmativos de 22 de fevereiro, de 18 de abril e, em especial, de 21 de abril de 2008, e, designadamente, das decisões de 19 de maio e de 17 de junho de 2008 e de 30 de abril e 7 de julho de 2010, na medida em indeferem, na totalidade ou em parte, os referidos pedidos de acesso a documentos;

—        condenar a Comissão no pagamento de um montante adequado a título de indemnização, ou, pelo menos, numa indemnização simbólica no valor de 1 EUR;

—        condenar a Comissão nas despesas.

39      A Comissão conclui pedindo, no essencial, que o Tribunal Geral se digne:

—        negar provimento ao recurso;

—        condenar o recorrente nas despesas.

40      Por carta de 5 de julho de 2010, o Tribunal informou as partes de que, por decisão de 2 de julho de 2010, a secção a que o processo foi atribuído indeferiu o pedido de extensão do objeto do recurso à decisão expressa de indeferimento de 17 de junho de 2008 e deferiu o pedido de extensão do objeto do recurso à primeira decisão do OLAF.

41      Por decisão de 5 de novembro de 2010, notificada às partes em 25 de novembro de 2010, o Tribunal Geral deferiu o pedido do recorrente de extensão do objeto do recurso à segunda decisão do OLAF.

42      Na sequência da cessação de funções do juiz relator, o processo foi redistribuído. Tendo a composição das secções do Tribunal sido alterada, o juiz‑relator foi afeto à Primeira Secção, à qual o presente processo foi, consequentemente, atribuído. Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Primeira Secção) decidiu dar início à fase oral do processo.

43      Por despacho de 5 de fevereiro de 2014, nos termos do artigo 65.°, alínea b), do artigo 66.°, n.° 1, e do artigo 67.°, n.° 3, terceiro parágrafo, do Regulamento de Processo de 2 de maio de 1991, foi adotada uma diligência de instrução, determinando à Comissão a apresentação de cópias das versões confidenciais de todos os documentos relacionados com o pedido n.° 590/2008, precisando contudo que estes documentos não seriam comunicados ao recorrente. Por carta de 5 de março de 2014, a Comissão respondeu à referida diligência de instrução.

44      No âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo de 2 de maio de 1991, o Tribunal Geral convidou as partes a responder a certas questões. As partes deram cumprimento a esses pedidos nos prazos estabelecidos. Assim, a Comissão e o recorrente responderam, respetivamente em 5 e em 6 de março de 2014, às questões colocadas pelo Tribunal Geral. Em 27 de março de 2014, o recorrente apresentou observações sobre as respostas da Comissão de 5 de março de 2014.

45      Em 20 de outubro de 2014, o recorrente apresentou na Secretaria do Tribunal Geral uma carta relativa a uma decisão do OLAF, de 31 de julho de 2014, tendo por objeto a «reapreciação da resposta ao [seu] pedido de acesso a dados pessoais, OF/2002/0356» (a seguir «decisão de reapreciação do OLAF de 31 de julho de 2014»), nos termos do artigo 13.° do Regulamento n.° 45/2001, um quadro recapitulativo dos documentos em causa e o anexo a este último, contendo os documentos na posse do OLAF.

46      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões orais feitas pelo Tribunal Geral na audiência de 21 de outubro de 2014.

47      Por carta de 4 de novembro de 2014, a Comissão apresentou observações sobre a carta do recorrente de 20 de outubro de 2014 (v. n.° 45, supra).

48      Na sequência das observações escritas da Comissão de 2 de dezembro de 2014, a respeito das observações escritas do recorrente de 7 de novembro de 2014, relativas às respostas escritas da Comissão, de 22 de outubro de 2014, às questões colocadas pelo Tribunal Geral tendo em vista a audiência, o presidente da Primeira Secção do Tribunal Geral encerrou a fase oral do processo em 8 de dezembro de 2014.

 Questão de direito

[omissis]

 II — Quanto ao pedido de anulação

[omissis]

 C — Quanto ao pedido n.° 590/2008

[omissis]

 3. Quanto ao mérito da ação

[omissis]

 b) Quanto aos fundamentos e alegações que põem em causa o mérito da recusa parcial ou total de acesso aos documentos

[omissis]

 i) Quanto aos documentos incluídos na lista do OLAF de 30 de abril de 2010

[omissis]

 Quanto aos documentos divulgados anteriormente

[omissis]

128    O Regulamento n.° 1049/2001 tem por objetivo tornar os documentos das instituições acessíveis ao público em geral (v., neste sentido, acórdão de 1 de fevereiro de 2007, Sison/Conselho, C‑266/05 P, Colet., EU:C:2007:75, n.os 43 e 44) e, tal como o OLAF observou a este respeito no título 7 da sua primeira decisão, os documentos divulgados nos termos do referido regulamento entram no domínio público (acórdão Catinis/Comissão, n.° 86, supra, EU:T:2014:267, n.° 62; v. também acórdão Agapiou Joséphidès/Comissão e EACEA, n.° 82, supra, EU:T:2010:442, n.° 116, e despacho de 7 de março de 2013, Henkel e Henkel France/Comissão, T‑64/12, EU:T:2013:116, n.° 47).

129    Tal consequência reflete‑se também no artigo 9.°, n.° 2, alínea e), do anexo ao regulamento interno da Comissão, relativo às disposições de aplicação do Regulamento n.° 1049/2001, na redação que resulta da Decisão da Comissão 2001/937/CE, CECA, Euratom da Comissão, de 5 de dezembro de 2001, que altera o seu regulamento interno (JO L 345, p. 94), nos termos do qual os documentos já divulgados na sequência de um pedido anterior são «imediatamente» disponibilizados na sequência de um pedido.

130    É verdade que, tal como a Comissão observou, no processo que deu lugar ao despacho de 14 de janeiro de 2014, Miettinen/Conselho (T‑303/13, EU:T:2014:48, n.os 17 a 19), o Tribunal Geral decidiu que, sempre que o acesso ao documento requerido tenha sido concedido ao requerente, este obtém o único resultado que poderia alcançar com o seu recurso. Contudo, contrariamente ao que se verifica neste caso, no processo Miettinen/Conselho acima referido, o documento requerido tinha justamente sido objeto de uma divulgação pública, de modo que não se pode deduzir desta decisão que a mera circunstância de o interessado ter tido acesso ao documento a um qualquer título o impediria, em qualquer hipótese, de requerer o acesso a esse mesmo documento com fundamento no Regulamento n.° 1049/2001, mesmo que tal documento não tenha sido divulgado ao público.

131    Consequentemente, é manifesto que a primeira decisão do OLAF, na medida em que, com fundamento no Regulamento n.° 1049/2001, recusou conceder ao requerente o acesso aos documentos com a menção «PD» impede, no caso em apreço e como a Comissão sublinhou também nos seus articulados, a consideração como públicos dos referidos documentos, o que precisamente é o propósito procurado pelo recorrente e corresponde ao objetivo prosseguido pelo Regulamento n.° 1049/2001, que consiste em conferir o acesso mais amplo possível aos documentos com vista a uma abertura acrescida, a fim de assegurar uma melhor participação dos cidadãos no processo de decisão e garantir uma maior legitimidade, eficácia e responsabilidade da Administração perante os cidadãos num sistema democrático, como resulta do considerando 2 do Regulamento n.° 1049/2001 (acórdão de 1 de julho de 2008, Suécia e Turco/Conselho, C‑39/05 P e C‑52/05 P, Colet., EU:C.2008:374, n.° 45).

132    Consequentemente, a circunstância de o recorrente deter já os documentos visados no seu pedido de acesso e não ser portanto o objetivo deste último permitir‑lhe tomar conhecimento do conteúdo daqueles mas antes divulgá‑los a terceiros é indiferente, tanto mais quanto os motivos que justificam a decisão do recorrente de apresentação de um tal pedido são irrelevantes, não prevendo o Regulamento n.° 1049/2001 nem o interesse que deve motivar o pedido de acesso aos documentos nem que os motivos justificativos de um tal pedido possam desempenhar um papel na decisão da sua admissão ou recusa (despacho Henkel e Henkel France/Comissão, n.° 128, supra, EU:T:2013:116, n.° 47).

133    Do mesmo modo, o argumento da Comissão relativo à excessiva carga de trabalho que para si resultaria da obrigação de dar acesso a documentos que se encontram já na posse do requerente, mesmo que este não tenha tido acesso aos referidos documentos nos termos do Regulamento n.° 1049/2001, deve ser rejeitado.

134    Basta salientar a este respeito que, se uma instituição pode, em circunstâncias excecionais, recusar o acesso a documentos com fundamento em que a carga de trabalho associada à sua divulgação seria desproporcionada relativamente aos objetivos visados pelo pedido de acesso a tais documentos (acórdão Strack/Comissão, n.° 56, supra, EU:C.2014:2250, n.° 28), a Comissão, em qualquer caso, não alegou tais circunstâncias excecionais no caso em apreço. Além do mais, trata‑se em grande parte de documentos que foram já divulgados anteriormente pela mesma instituição.

135    Consequentemente, a Comissão não pode apoiar‑se apenas na circunstância de o requerente estar já, ou poder ter estado, em posse dos documentos solicitados, embora a outro título, para recusar a análise do pedido de acesso a esses mesmos documentos com fundamento no Regulamento n.° 1049/2001, com exceção dos documentos que, tais como o anexo do documento n.° 267, foram já disponibilizados ao público, em razão, designadamente, da sua publicação.

136    Nestes termos, o presente fundamento deve ser julgado procedente no que respeita aos documentos que estiveram ou estão na posse do recorrente, pela circunstância de ser ele o seu autor ou porque foram divulgados anteriormente com outro fundamento que não o Regulamento n.° 1049/2001, sem contudo terem sido disponibilizados ao público.

 Quanto aos documentos não divulgados

[omissis]

 — Quanto à violação do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001

[omissis]

148    Importa salientar antes de mais que, segundo a jurisprudência, a invocação da exceção prevista no artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001, aplicável após a tomada de uma decisão, está enquadrada por condições rigorosas. Abrange unicamente certos tipos de documentos e a condição que permite justificar a recusa é que a divulgação pode prejudicar «gravemente» o processo decisório da instituição (acórdão Comissão/Agrofert Holding, n.° 139, supra, EU:C:2012:394, n.° 77).

149    Importa sublinhar em seguida que o pedido n.° 590/2008 se caracteriza pela circunstância de visar não apenas um único documento, mas um conjunto de documentos designados em termos globais. Tal como resulta do n.° 69, o recorrente pediu em substância o acesso a um conjunto de documentos, designados em termos gerais, a saber, o conjunto do processo de inquérito OF/2002/0356 do OLAF, as transcrições completas e fiéis dos registos sonoros que figuram nesse processo, os documentos de qualquer espécie que não figurem nesses autos mas que respeitem apenas ao processo/ao inquérito supramencionado ou ao seu sujeito. A primeira decisão do OLAF precisa a este respeito que o processo do OLAF compreende todos os documentos relativos a esse processo e que não existem documentos relacionados com o processo que não se encontrem nos autos e que estejam compreendidos no pedido n.° 590/2008.

150    Tal como se acima salienta no n.° 91, neste tipo de situação, o reconhecimento de uma presunção geral de que a divulgação dos documentos de determinada natureza prejudica, em princípio, a proteção de um dos interesses enumerados no artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001 permite à instituição em questão tratar um pedido global e responder‑lhe da maneira correspondente (v., neste sentido, acórdão Comissão/EnBW, n.° 90, supra, EU:C:2014:112, n.os 65 e 68).

151    A primeira decisão do OLAF indica a este respeito que os documentos compreendidos na categoria 1 correspondem às notas do processo elaboradas pelos investigadores responsáveis pelo inquérito em causa e contêm a argumentação e a análise dos investigadores e de outros agentes habilitados relativamente ao desenvolvimento e orientação do inquérito, tanto sobre questões de fundo como administrativas. Segundo a mesma decisão, os documentos da categoria 2 referem‑se à correspondência entre os membros do pessoal do OLAF ou entre estes e os elementos da Comissão no que respeita ao inquérito em causa, à preparação de respostas ao Provedor de Justiça ou às questões do Parlamento Europeu. Tais documentos contêm as reflexões do OLAF e dos serviços da Comissão a respeito do referido inquérito, que conduziram a decisões internas. Finalmente, o documento da categoria 7 é um projeto de relatório final do inquérito em questão.

152    A primeira decisão do OLAF precisa que, embora as diligências do inquérito tenham terminado, os documentos das categorias 1, 2 e 7, aos quais foi recusado acesso, foram redigidos exclusivamente para uso interno, contêm pareceres destinados a uma utilização interna e fazem parte das deliberações e consultas preliminares no seio do OLAF e da Comissão. Os referidos documentos foram divulgados junto dos investigadores do OLAF e dos serviços da Comissão com vista à obtenção de informações precisas por parte dos funcionários em questão. Esses documentos contêm posições preliminares no que respeita às possíveis estratégias de inquérito, atividades operacionais e decisões a tomar. Contêm reflexões, a análise dos factos e as medidas previstas e refletem o processo de elaboração da correspondência externa.

153    Como salienta acertadamente a primeira decisão do OLAF, um acesso do público a tais documentos seria particularmente prejudicial à capacidade da Comissão, e designadamente do OLAF, de cumprimento da sua missão de luta contra a fraude, no interesse público. A divulgação dos documentos em causa prejudicaria consideravelmente o processo decisório da Comissão e do OLAF, uma vez que comprometeria seriamente a plena independência dos futuros inquéritos do OLAF e os objetivos deste, revelando a sua estratégia e métodos de trabalho e reduzindo a possibilidade de obter apreciações independentes da parte dos seus colaboradores e de consultar os serviços da Comissão a respeito de temas muito sensíveis. Tal divulgação arriscaria também desencorajar os particulares de enviar informações sobre eventuais fraudes e, desse modo, privaria o OLAF e a Comissão de informações úteis para conduzir investigações relativas à proteção dos interesses financeiros da União. (v., nesse sentido, acórdão Catinis/Comissão, n.° 86, supra, EU:T:2014:267, n.° 54, a propósito de um inquérito em curso no OLAF ligado à exceção relativa à proteção dos objetivos das atividades de inspeção, de inquérito e de auditoria previstas no artigo 4.°, n.° 2, terceiro travessão, do Regulamento n.° 1049/2001).

154    Esta conclusão impõe‑se tanto mais quando, segundo a jurisprudência, as exceções ao direito de acesso aos documentos que constam designadamente do artigo 4.° do Regulamento n.° 1049/2001, quando, como no caso em apreço, os documentos em questão respeitam a um domínio específico do direito da União, no caso, a proteção dos interesses financeiros da União, a luta contra a fraude, a corrupção e todas as outras atividades prejudiciais aos interesses financeiros da União, não podem ser interpretadas sem ter em conta as normas específicas que regem o acesso a esses documentos (v., nesse sentido, acórdão Comissão/EnBW, n.° 90, supra, EU:C:2014:112, n.° 83).

155    Como é recordado no artigo 3.° da Decisão 1999/352/CE, CECA, Euratom da Comissão, de 28 de abril de 1999, que institui o OLAF (JO L 136, p. 20), o OLAF exerce as competências de inquérito com total independência (v., neste sentido, acórdão de 8 de julho de 2008, Franchet e Byk/Comissão, T‑48/05, Colet., EU:T:2008:257, n.° 255).

156    O artigo 8.°, n.° 2, do Regulamento (CE) n.° 1073/1999 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de maio de 1999, relativo aos inquéritos efetuados pelo OLAF (JO L 136, p. 1), adotado nos termos do artigo 324.° TFUE com vista ao combate à fraude e a todas as outras atividades ilegais lesivas dos interesses financeiros da União, dispõe que todas as informações comunicadas ou obtidas no âmbito dos inquéritos internos, seja qual for a sua forma, ficam abrangidas pelo segredo profissional. Essas informações não podem ser comunicadas a outras pessoas além daquelas que, nas instituições das União ou nos Estados‑Membros, devam conhecê‑las em razão das suas funções, nem ser utilizadas para outros fins que não sejam os de assegurar a luta contra a fraude, a corrupção e qualquer outra atividade ilegal.

157    Como observou a Comissão, a especial confidencialidade de que beneficiam os referidos documentos ligados ao inquérito, e, até certo ponto, o próprio inquérito, relativamente às pessoas por ele alegadamente visadas (v., neste sentido, acórdão Franchet e Byk/Comissão, n.° 155, supra, EU:T:2008:257, n.° 255), justifica‑se não apenas na medida em que o OLAF recolhe, no âmbito de um tal inquérito, segredos comerciais sensíveis e informações muito sensíveis relativas a pessoas, cuja divulgação poderia comprometer consideravelmente a sua reputação, mas também na medida em que o acesso aos documentos relativos a um inquérito interno do OLAF, mesmo após o encerramento do procedimento em questão, mais precisamente àqueles que contêm pareceres destinados a utilização interna no âmbito de deliberações e de consultas preliminares no seio do OLAF, arriscaria dificultar gravemente o trabalho deste órgão, revelar a metodologia e estratégia de instrução do OLAF, prejudicar a disponibilidade dos intervenientes no processo para colaborar no futuro e, assim, comprometer o correto funcionamento dos processos em questão e a realização dos objetivos prosseguidos.

158    Embora os Regulamentos n.os 1049/2001 e 1073/1999 não contenham disposições que prevejam expressamente o primado de um sobre o outro e importe assegurar uma aplicação compatível entre os mesmos, permitindo assim uma aplicação coerente (v., neste sentido, acórdão Comissão/EnBW, n.° 90, supra, EU:C:2014:112, n.° 84), no caso em apreço, tal aplicação justifica plenamente o reconhecimento de uma presunção de recusa de acesso.

159    A isso acresce que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a atividade administrativa da Comissão não exige um acesso aos documentos tão alargado como o relativo à atividade legislativa de uma instituição da União (acórdão Comissão/EnBW, n.° 90, supra, EU:C:2014:112, n.° 91).

160    Daqui resulta que, no que respeita aos processos de inquérito interno do OLAF, nos termos do Regulamento n.° 1073/1999, pode designadamente resultar das suas disposições uma presunção geral de não acesso aos documentos ligados ao inquérito e, em especial, aos que contenham pareceres destinados a uso interno no âmbito de deliberações e de consultas preliminares no seio do OLAF.

161    Nestas condições, a Comissão podia legitimamente presumir, para efeitos de aplicação das exceções previstas no artigo 4.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 1049/2001, sem proceder a uma análise concreta e individual de cada um dos documentos em causa, que um acesso do público a tais documentos, nos termos do Regulamento n.° 1049/2001, implicaria em princípio uma violação da proteção dos interesses aí visados, daí deduzindo que todos esses documentos estariam cobertos pela exceção prevista no artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, desse mesmo regulamento.

162    Tendo em conta as considerações precedentes, a presunção geral de violação dos interesses protegidos, designadamente pelo artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001, que se justifica para evitar qualquer risco de violação grave do processo decisório na aceção da referida disposição, impõe‑se independentemente da questão de saber se o pedido de acesso diz respeito a um procedimento de inquérito já encerrado ou a um procedimento pendente.

163    A circunstância de num documento relativo ao inquérito interno do OLAF constar uma data posterior à do encerramento do inquérito em causa também não se opõe a que a sua divulgação seja recusada com base na presunção geral de recusa de acesso, uma vez que esse documento está ligado ao referido inquérito, contêm informações relativas a pareceres destinados a utilização interna no âmbito das deliberações e de consultas preliminares no seio do OLAF e comporta assim informações cuja divulgação seria suscetível de comprometer o trabalho do OLAF na sua missão de combate à fraude e à corrupção.

164    Do mesmo modo, deve ser rejeitado o argumento do recorrente segundo o qual a correspondência entre o OLAF e a Comissão não revelaria em qualquer caso documentos contendo pareceres destinados a utilização «interna» no âmbito de deliberações e consultas preliminares na aceção do artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001, na medida em que o OLAF e a Comissão não deveriam ser considerados como fazendo parte da mesma instituição. A este respeito, basta salientar que o Regulamento n.° 1049/2001 é aplicável ao OLAF, na medida em que este é reconhecido, para efeitos deste regulamento, como fazendo parte da Comissão, a qual é mencionada no artigo 1.°, alínea a), do referido regulamento entre as instituições às quais este último se aplica.

165    O mesmo é válido quanto ao argumento segundo o qual a correspondência do OLAF com terceiros deveria necessariamente ser excluída da exceção prevista no artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001. Com efeito, tais comunicações podem manifestamente conter informações relativas a pareceres destinados a utilização interna no âmbito das deliberações e de consultas preliminares no seio da instituição em causa, nos termos da referida disposição, e a recusa da sua divulgação impõe‑se desde logo a fim de garantir a independência do OLAF e a confidencialidade da sua missão.

166    Por outro lado, contrariamente ao alegado pelo recorrente, o documento n.° 2 da lista do OLAF de 30 de abril de 2010 não deve ser considerado como erroneamente classificado entre as notas do processo de inquérito, na medida em que se trata de uma «nota para o processo de inquérito do OLAF», que respeita a uma pesquisa ligada ao processo em questão. O mesmo acontece quanto ao documento n.° 34, que manifestamente faz parte das notas para os autos do inquérito em questão, tal como o Tribunal Geral pôde constatar.

167    Acresce que o recorrente não demonstrou nos seus pedidos de acesso a existência de um interesse público que não obstante justificasse a concessão de acesso aos documentos do inquérito em causa. Ora, compete ao recorrente invocar, em concreto, circunstâncias que fundamentam um interesse público superior que justifica a divulgação dos documentos em causa (v., neste sentido, acórdão Strack/Comissão, n.° 56, supra, EU:C:2014:2250, n.° 128). Por outro lado, resulta da primeira decisão do OLAF que este analisou corretamente a existência de interesses superiores para considerar que nenhum elemento permitia concluir que existia um tal interesse superior. A mera alegação do princípio da transparência e da sua importância não basta para este efeito (v., neste sentido, acórdão Strack/Comissão, n.° 56, supra, EU:C:2014:2250, n.os 129 e 131). Finalmente, a tese do recorrente segundo a qual existiria um interesse particular de transparência neste caso preciso dos inquéritos internos em matéria de fraude, tais como o do caso em apreço, a fim de evitar, pela garantia de uma transparência absoluta, qualquer aparência de recurso a procedimentos arbitrários e irregulares, a qual seria prejudicial à reputação das instituições e das sociedades implicadas no inquérito, deve ser rejeitada, não sendo tais considerações manifestamente de natureza a sobrepor‑se aos motivos imperiosos que justificam a recusa de divulgação das informações em questão.

168    Por último, a presunção geral de recusa de acesso supramencionada implica que os documentos por ela cobertos escapam à obrigação de uma divulgação parcial do seu conteúdo, nos termos do artigo 4.°, n.° 6, do Regulamento n.° 1049/2001 (v., neste sentido, acórdão Comissão/EnBW, n.° 89, supra, EU:C:2014:112, n.os 134 e 135).

169    Por todos estes motivos, a Comissão podia validamente recusar o acesso aos documentos com a menção «NA», com fundamento no artigo 4.°, n.° 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1049/2001.

[omissis]

 Quanto aos documentos parcialmente divulgados

 — Quanto à violação do artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001

[omissis]

198    Conforme já foi decidido, a divulgação de dados pessoais que respeitam exclusivamente ao requerente do acesso em causa não pode ser excluída com fundamento de que tal implicaria uma violação da vida privada e da integridade do indivíduo (acórdão de 22 de maio de 2012, Internationaler Hilfsfonds/Comissão, T‑300/10, Colet., EU:T:2012:247, n.° 107).

199    Tal deverá ser o caso especialmente quando, como no caso em apreço, nada permita considerar que o requerente, que visa designadamente tornar públicas as alegadas disfuncionalidades do OLAF no tratamento da sua queixa, pretendeu limitar o acesso aos seus dados pessoais. Por outro lado, a primeira decisão do OLAF deu‑lhe acesso aos dados que lhe diziam respeito, precisando que atuava neste sentido com fundamento apenas no Regulamento n.° 45/2001, sem lhe pedir que clarificasse o âmbito do seu pedido de acesso, nos termos do artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1049/2001, de modo que a Comissão não pode recriminar o recorrente por não ter sido claro a este respeito.

200    Consequentemente, a Comissão errou, no que respeita designadamente aos documentos mencionados pelo recorrente no n.° 173 acima, ao recusar divulgar a identidade do recorrente com fundamento na exceção visada no artigo 4.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1049/2001, devendo o fundamento ser julgado procedente nesta medida e improcedente quanto ao restante.

[omissis]

 Quanto aos documentos n.os 266 e 268 e às fichas de circulação

[omissis]

 — Quanto às fichas de circulação

[omissis]

249    O conceito de «documento», que é objeto de uma definição ampla no artigo 3.°, alínea a), do Regulamento n.° 1049/2001 (v., neste sentido, acórdão de 12 de setembro de 2007, API/Comissão, T‑36/04, Colet., EU:T:2007:258, n.° 59), abrange «qualquer conteúdo, seja qual for o seu suporte (documento escrito em suporte papel ou eletrónico, registo sonoro, visual ou audiovisual) sobre assuntos relativos às políticas, ações e decisões da competência da instituição em causa».

250    Daqui resulta que a definição constante do artigo 3.°, alínea a), do Regulamento n.° 1049/2001 se baseia, em substância, na existência de um conteúdo conservado, suscetível de reprodução ou de consulta posteriores à sua produção, sendo precisado, por um lado, que a natureza do suporte de armazenamento, o tipo e a natureza do conteúdo armazenado, do mesmo modo que a dimensão, a extensão, a importância ou a apresentação de um conteúdo são irrelevantes no que diz respeito à questão de saber se um conteúdo é, ou não, abrangido pela referida definição e, por outro, que a única limitação relacionada com o conteúdo suscetível de ser abrangido por esta definição é a condição segundo a qual esse conteúdo deve dizer respeito a uma matéria relativa às políticas, ações e decisões da competência da instituição em causa (v., por analogia, acórdão de 26 de outubro de 2011, Dufour/BCE, T‑436/09, Colet., EU:T:2011:634, n.os 88 e 90 a 93).

251    Nada autoriza, por conseguinte, a excluir as fichas de circulação do campo de aplicação do artigo 3.°, alínea a), do Regulamento n.° 1049/2001, cujo âmbito não se restringe em todo o caso por uma qualquer regra de organização interna adotada neste caso pelas instituições, como as modalidades de aplicação do anexo ao regulamento interno da Comissão (v. n.° 129 abaixo), que esta última invoca em apoio da sua tese segundo a qual as fichas de circulação deveriam ser consideradas como documentos contendo informação «não substancial», «efémera» e sem lugar a registo, para excluí‑las do conceito de documento na aceção do artigo 3.°, alínea a), do Regulamento n.° 1049/2001.

252    Por outro lado, na medida em que o requerente de acesso não tem de justificar o seu pedido de acesso aos documentos (despacho Henkel e Henkel France/Comissão, n.° 128, supra, EU:T:2013:116, n.° 48), é igualmente indiferente para efeitos do Regulamento n.° 1049/2001 o interesse real que pode representar para o requerente a divulgação das fichas de circulação que, segundo o recorrente, permitem estabelecer eventuais responsabilidades pessoais pela disponibilização de informações sobre os funcionários que participaram na elaboração de um documento ou cujo visto é necessário e sobre a data da sua intervenção no processo de elaboração do documento em questão.

253    A isto acresce que a própria Comissão admite que as fichas de circulação podem comportar anotações e não se limitar, por conseguinte, necessariamente a reproduzir os nomes das pessoas intervenientes no processo de elaboração e adoção do documento ao qual se referem.

254    Finalmente, a Comissão não conseguiu demonstrar em que é que a divulgação de tais fichas, quando existam, representaria uma carga de trabalho desproporcionada para o OLAF.

[omissis]

 Quanto à cláusula de restrição de utilização

[omissis]

264    Importa salientar que o artigo 2.°, n.° 4, da Decisão 2006/291 dispõe que esta não prejudica o Regulamento n.° 1049/2001 nem afeta de nenhum modo as suas disposições. O presente regulamento aplica‑se sem prejuízo das normas em vigor em matéria de direitos de autor que possam limitar o direito de terceiros reproduzirem ou explorarem os documentos divulgados.

265    Como salienta acertadamente a Comissão, a Decisão 2006/291 prevê, para efeitos de reutilização comercial de documentos públicos por si detidos, tal como definidos no artigo 2.°, n.° 1, da referida decisão, um procedimento de autorização distinto do previsto pelo Regulamento n.° 1049/2001, a fim de aceder a esses mesmos documentos.

266    No prazo de 15 dias úteis após o registo do pedido, o serviço da Comissão ou o OPOCE autorizará a reutilização solicitada do documento e, quando adequado, fornecerá uma cópia deste ou, em resposta por escrito, indicará que o pedido é recusado total ou parcialmente, fundamentando essa decisão. A título excecional, o prazo pode ser prorrogado por quinze dias úteis, mediante informação prévia do requerente e fundamentação circunstanciada. Nos termos do n.° 4 do mesmo artigo, em caso de recusa, o requerente é informado do seu direito de intentar uma ação no Tribunal Geral ou de apresentar queixa junto do Provedor de Justiça Europeu.

267    Ora, nada permite considerar que os pedidos de acesso do recorrente deviam ser entendidos como um pedido nos termos da Decisão 2006/291, mesmo limitando‑se a invocar a eventualidade de uma publicação de documentos sem se referir à aludida decisão. Por outro lado, tal como sustenta a Comissão, a aplicação desta decisão pressupõe que os documentos em questão sejam precisamente identificados e tornados públicos. Por último, e sobretudo, mesmo admitindo que os pedidos de acesso do recorrente pudessem ser interpretados como compreendendo um pedido nos termos da Decisão 2006/291 e que a cláusula controvertida pudesse ser entendida como comportando uma decisão implícita de recusa de acesso de acesso por parte do OLAF, e não como uma simples advertência de que a reutilização dos documentos em causa pressupõe uma autorização por parte da Comissão, o recorrente não contestou essa decisão com fundamento na Decisão 2006/291.

[omissis]

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção),

decide:

1)      Não há que decidir sobre a legalidade das decisões tácitas de recusa de acesso aos documentos tomadas no âmbito dos pedidos de acesso apresentados por G. Strack.

2)      Não há que decidir sobre a legalidade das decisões tácitas de recusa parcial ou total de acesso aos documentos adotadas pela Comissão [Europeia] e pelo Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF) no âmbito dos pedidos confirmativos de acesso a documentos, apresentados por G. Strack em 22 de fevereiro e em 21 de abril de 2008, uma vez que esses documentos não existiam ou não estavam já disponíveis, que os documentos, ou partes deles, foram disponibilizados ao público ou que G. Strack admitiu a legalidade da recusa do seu acesso.

3)      A decisão do OLAF de 30 de abril de 2010 é anulada na medida em que:

—        o acesso aos documentos com a menção «PD» foi recusado;

—        o nome de G. Strack foi ocultado nos documentos com a menção «PA»;

—        os documentos foram omitidos da lista do OLAF de 30 de abril de 2010 ou não foram comunicados a G. Strack com fundamento de que era ele o seu autor, que os detinha nos termos do Regulamento (CE) n.° 45/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro de 2000, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais pelas instituições e pelos órgãos comunitários e à livre circulação desses dados, ou a outro título, sem que fossem divulgados ao público, ou que estavam excluídos do pedido de acesso, na medida em que respeitavam aos contactos entre o OLAF e Provedor de Justiça Europeu ou entre o OLAF e G. Strack e que respeitariam a este último, não fazendo parte do processo de inquérito em causa.

4)      A decisão do OLAF de 7 de julho de 2010 é anulada na medida em que:

—        o acesso ao documento n.° 266 foi recusado com fundamento no Regulamento (CE) n.° 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão;

—        o acesso ao documento n.° 268 foi recusado, com exceção das informações a que G. Strack podia ter acesso nos termos do Regulamento n.° 1049/2001 no âmbito da transmissão de outros documentos;

—        o nome de G. Strack foi ocultado das fichas de circulação anexas à referida decisão.

5)      É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

6)      A Comissão é condenada a suportar as suas próprias despesas e três quartos das despesas de G. Strack.

7)      G. Strack suportará um quarto das suas próprias despesas.

Pelikánová

Buttigieg

Madise

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 26 de abril de 2016.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.


1      Apenas são reproduzidos os números do presente acórdão cuja publicação o Tribunal Geral considera útil.