Language of document : ECLI:EU:C:2024:614

Edição provisória

CONCLUSÕES DA ADVOGADA‑GERAL

JULIANE KOKOTT

apresentadas em 11 de julho de 2024 (1)

Processo C419/23

CN

contra

Nemzeti Földügyi Központ,

sendo interveniente:

GW

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Győri Törvényszék (Tribunal Regional de Győr, Hungria)]

«Reenvio prejudicial — Artigo 63.° TFUE — Livre circulação de capitais — Artigo 17.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Direito de propriedade — Direito de usufruto sobre terrenos agrícolas — Reinscrição de um direito de usufruto cancelado em violação do direito da União — Obrigações de um Estado‑Membro decorrentes de um acórdão de incumprimento — Força de caso julgado do registo inicial do direito de usufruto — Conflito entre liberdades fundamentais e direitos fundamentais de entidades diferentes»






I.      Introdução

1.        O presente pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Győri Törvényszék surge na sequência de vários acórdãos do Tribunal de Justiça relativos à compatibilidade das disposições húngaras relativas ao cancelamento dos direitos de usufruto inscritos no registo predial de pessoas não residentes sobre terrenos agrícolas com a livre circulação de capitais consagrada no artigo 63.° TFUE e a garantia do direito de propriedade consagrada no artigo 17.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») (2).

2.        Segundo esta jurisprudência, uma regulamentação nacional é contrária ao artigo 63.° TFUE, em conjugação com o artigo 17.° da Carta, se o cancelamento desse direito de usufruto por ela ordenado, protegido pela garantia do direito de propriedade, prejudicar os nacionais de outros Estados‑Membros. Foi na sequência de uma constatação análoga num acórdão de incumprimento (3) que o Tribunal de Justiça foi levado a debruçar‑se sobre a questão de saber em que condições os titulares afetados por um cancelamento definitivo desses direitos de usufruto podem obter a sua reinscrição junto das autoridades competentes (4).

3.        O litígio no processo principal diz respeito à situação exatamente inversa. Com efeito, o titular do direito de usufruto afetado pelo cancelamento, o interveniente da autoridade recorrida (a seguir «interveniente»), o Nemzeti Földügyi Központ (Centro Nacional do Ordenamento do Território, Hungria), conseguiu obter a reinscrição do seu direito por essa autoridade com base na situação jurídica entretanto alterada na Hungria na sequência do acórdão de incumprimento e, assim, alcançar precisamente a situação exigida pela jurisprudência do Tribunal de Justiça. A proprietária do terreno, residente na Alemanha, e recorrente opõe‑se a isso, invocando, por sua vez, a livre circulação de capitais e a garantia do direito de propriedade. Alega que, antes de reinscrever o direito de usufruto do interveniente no registo predial, a autoridade recorrida deveria ter verificado se a sua inscrição inicial — posteriormente cancelada — era ilegal à luz das disposições húngaras então aplicáveis. Isto não obstante o facto de essa inscrição ser definitiva e de o Tribunal de Justiça ter declarado posteriormente que as disposições relativas ao seu cancelamento eram contrárias ao direito da União. Segundo a recorrente, a reinscrição do direito de usufruto deveria ter sido recusada a fim de proteger a sua livre circulação de capitais e a sua propriedade.

4.        Por conseguinte, o presente processo diz respeito a um «conflito» entre as mesmas liberdades fundamentais (a liberdade de circulação de capitais) e os direitos fundamentais (garantia do direito de propriedade) de diferentes entidades jurídicas. Todavia, coloca‑se a questão de saber se a recorrente pode invocar a livre circulação de capitais prevista no artigo 63.° TFUE e o direito de propriedade previsto no artigo 17.° da Carta para obter um novo cancelamento do direito de usufruto. Com efeito, a sua abordagem visa obter um resultado que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, é, precisamente, incompatível com o artigo 63.° TFUE e o artigo 17.° da Carta, na medida em que estas disposições protegem o titular do direito de usufruto abrangido pelo cancelamento legal, e não o proprietário do terreno que dele beneficia.

II.    Quadro jurídico

A.      Direito da União

5.        O artigo 63.°, n.° 1, TFUE, dispõe:

«No âmbito das disposições do presente capítulo, são proibidas todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados‑Membros e entre Estados‑Membros e países terceiros.»

6.        O artigo 17.°, n.° 1, da Carta, prevê:

«Todas as pessoas têm o direito de fruir da propriedade dos seus bens legalmente adquiridos, de os utilizar, de dispor deles e de os transmitir em vida ou por morte. Ninguém pode ser privado da sua propriedade, exceto por razões de utilidade pública, nos casos e condições previstos por lei e mediante justa indemnização pela respetiva perda, em tempo útil. A utilização dos bens pode ser regulamentada por lei na medida do necessário ao interesse geral.»

B.      Direito nacional

7.        O § 38, n.° 1, da A földről szóló 1987. évi I. törvény (Lei I de 1987, relativa à Terra) previa que as pessoas singulares que não possuíssem nacionalidade húngara ou que a possuíssem, mas que residissem permanentemente fora da Hungria, bem como as pessoas coletivas com sede fora da Hungria ou que, tendo sede na Hungria, mas cujo capital fosse detido por pessoas singulares ou coletivas residentes fora da Hungria, só podiam adquirir a propriedade de terrenos produtivos por compra, permuta ou doação mediante autorização prévia do das Pénzügyminisztérium (Ministério das Finanças, Hungria).

8.        O § 1, n.° 5, do A külföldiek ingatlanszerzéséről szóló 171/1991. (XII. 27.) Korm. [Kormány] rendelet (Decreto do Governo n.° 171/1991, de 27 de dezembro de 1991 sobre a Aquisição de Bens Imóveis por Estrangeiros), que entrou em vigor em 1 de janeiro de 1992, excluiu a possibilidade de as pessoas que não possuíssem nacionalidade húngara, com exceção das pessoas que possuíssem uma autorização de residência permanente e daquelas a quem tivesse sido reconhecido o estatuto de refugiado, adquirirem terrenos produtivos.

9.        A A termőföldről szóló 1994. évi LV. törvény (Lei n.º LV de 1994, relativa aos Terrenos Produtivos; a seguir «Lei de 1994 relativa aos Terrenos Produtivos») manteve a referida proibição de aquisição, alargando‑a simultaneamente às pessoas coletivas, independentemente de estarem ou não estabelecidas na Hungria.

10.      A referida lei foi alterada, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2002, pela A termőföldről szóló 1994. évi LV. törvény módosításáról szóló 2001. évi CXVII. törvény (Lei n.º CXVII de 2001, que Altera a Lei n.º LV de 1994 relativa aos Terrenos Produtivos), a fim de excluir igualmente a possibilidade de se constituir contratualmente um direito de usufruto sobre terrenos produtivos a favor de pessoas singulares que não tivessem nacionalidade húngara ou de pessoas coletivas. No seguimento dessas alterações, o § 11, n.° 1, da Lei de 1994 relativa aos Terrenos Produtivos dispunha que,

«[p]ara a constituição contratual de um direito de usufruto e de um direito de uso, são aplicáveis as disposições do capítulo II relativas às restrições à aquisição de propriedades. [...]»

11.      O § 11, n.° 1, da Lei de 1994 relativa aos Terrenos Produtivos foi, posteriormente, alterado pela Az egyes agrár tárgyú törvények módosításáról szóló 2012. évi CCXIII. törvény (Lei n.º CCXIII de 2012, que Modifica Determinadas Leis Relativas à Agricultura). Na sua nova versão que resulta desta alteração e que entrou em vigor em 1 de janeiro de 2013, este § 11, n.° 1, dispunha:

«[o] direito de usufruto constituído por contrato é nulo, exceto se constituído em benefício de parente próximo.»

12.      A Lei n.º CCXIII de 2012 introduziu igualmente nesta Lei de 1994 um novo § 91, n.° 1, nos termos do qual «[e]m 1 de janeiro de 2033 extinguem‑se ex lege os direitos de usufruto vigentes em 1 de janeiro de 2013 que tenham sido constituídos por contrato celebrado entre pessoas que não sejam familiares próximos, tanto por tempo indeterminado como por um período determinado cujo termo ultrapasse a data de 30 de dezembro de 2032».

13.      A A mező‑ és erdőgazdasági földek forgalmáról szóló 2013. évi CXXII. törvény (Lei n.º CXXII de 2013, relativa à Venda de Terrenos Agrícolas e Silvícolas; a seguir «Lei de 2013 relativa aos Terrenos Agrícolas») foi adotada em 21 de junho de 2013 e entrou em vigor em 15 de dezembro de 2013.

14.      O § 37, n.° 1, da Lei de 2013 relativa aos Terrenos Agrícolas, manteve a regra segundo a qual um direito de usufruto ou de uso sobre esses terrenos constituído por contrato é nulo exceto se tiver sido constituído em benefício de um familiar próximo.

15.      A A mező‑ és erdőgazdasági földek forgalmáról szóló 2013. évi CXXII. törvénnyel összefüggő egyes rendelkezésekről és átmeneti szabályokról szóló 2013. évi CCXII. törvény (Lei n.º CCXII de 2013, que Adota Diversas Disposições e Medidas Transitórias no que respeita à Lei n.º CXXII de 2013 relativa à Venda de Terrenos Agrícolas e Silvícolas; a seguir «Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias») foi adotada em 12 de dezembro de 2013 e entrou em vigor em 15 de dezembro de 2013.

16.      O § 108, n.° 1, desta lei, que revogou o § 91, n.° 1, da Lei de 1994 relativa aos Terrenos Produtivos, enuncia:

«Qualquer direito de usufruto ou de uso que exista à data de 30 de abril de 2014 e constituído por um período indeterminado ou por um período determinado que termine depois de 30 de abril de 2014, por um contrato celebrado entre pessoas que não sejam familiares próximos, extinguir‑se‑á ex lege em 1 de maio de 2014.»

17.      Na sequência da prolação do Acórdão de 6 de março de 2018, SEGRO e Horváth (C‑52/16 e C‑113/16, EU:C:2018:157), o § 108 da Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias foi alterado através do aditamento, com efeitos a partir de 11 de janeiro de 2019, de dois novos n.os 4 e 5, redigidos nos termos seguintes:

«4.      Quando é necessário restabelecer, em execução de uma decisão judicial, um direito extinto em aplicação do n.° 1, mas que, por força das disposições em vigor no momento da sua inscrição inicial, esse direito não podia ser inscrito em razão de um erro formal ou material, o serviço administrativo competente em matéria fundiária informa disso o Ministério Público e suspende o processo até ao encerramento do inquérito do Ministério Público e do processo contencioso intentado com esse fundamento.

5.      É constitutivo de erro na aceção do n.° 4 o facto de que:

a)      O titular do direito de uso seja uma pessoa coletiva;

b)      O direito de usufruto ou o direito de uso tenham sido inscritos no registo predial depois de 31 de dezembro de 2001 em benefício de um titular que seja uma pessoa coletiva ou uma pessoa singular que não tenha a nacionalidade húngara;

c)      Quando, no momento da apresentação do pedido de inscrição do direito de usufruto ou do direito de uso, a aquisição do direito exigisse, por força das disposições em vigor nesse momento, um certificado ou uma autorização emitidos por um outro serviço administrativo, esse documento não tenha sido apresentado pela parte.»

18.      O § 94 da Az ingatlan‑nyilvántartásról szóló 1997. évi CXLI. törvény (Lei n.º CXLI de 1997, relativa ao Registo Predial; a seguir «Lei do Registo Predial»), introduzido pelo § 9 da Az egyes földügyi tárgyú törvények módosításáról szóló 2014. évi XXXI. Törvény (Lei n.º XXXI de 2014 que procedeu à Alteração de Determinadas Leis relativas à Terra), dispõe:

«1.      A fim de proceder ao cancelamento no registo predial dos direitos de usufruto e de uso que se extingam por força do § 108, n.° 1, da [Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias] (a seguir, para efeitos deste artigo, conjuntamente, «direitos de usufruto»), a pessoa singular titular de direitos de usufruto deve declarar, em resposta à notificação para cumprir enviada pela autoridade responsável pela gestão do registo, o mais tardar até 31 de outubro de 2014, no prazo de quinze dias após a receção da notificação, em formulário aprovado para o efeito pelo ministro, a existência de uma relação de familiar próximo entre ela e a pessoa que consta como proprietária do terreno no documento público que serviu de base ao usufruto e que foi apresentado para efeitos de registo. Na falta de declaração dentro do prazo não será dado seguimento aos pedidos de certificação depois de 31 de dezembro de 2014.

[...]

3.      Se da declaração não resultar nenhuma relação de familiar próximo ou se nenhuma declaração tiver sido apresentada dentro do prazo, a autoridade responsável pela gestão do registo predial cancela oficiosamente os direitos de usufruto no referido registo, no prazo de seis meses a contar do termo do prazo para apresentar a declaração, e o mais tardar até 31 de julho de 2015.

[...]

5.      A autoridade responsável pela gestão do registo predial procede oficiosamente, o mais tardar até 31 de dezembro de 2014, ao cancelamento no registo predial dos direitos de usufruto que tinham sido inscritos em proveito de pessoas coletivas ou de entidades que não tenham personalidade jurídica, mas com capacidade para adquirir direitos suscetíveis de ser inscritos no registo, e que foram suprimidos em aplicação do § 108, n.° 1, da [Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias].»

19.      Na sequência de uma ação intentada pela Comissão, o Tribunal de Justiça declarou, no seu Acórdão de incumprimento de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432), que, ao adotar o § 108, n.° 1, da Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias, e ao extinguir, desse modo, ex lege, os direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas e silvícolas sitos na Hungria detidos, direta ou indiretamente, por nacionais de outros Estados‑Membros, a Hungria não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força das disposições conjugadas do artigo 63.° TFUE, em conjugação com o artigo 17.° da Carta.

20.      Em consequência, o legislador húngaro alterou a Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2022 e introduziu, nomeadamente, as seguintes disposições na subsecção 20/F («Regras específicas para a execução do Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia proferido no processo C‑235/17, Comissão Europeia contra Hungria, relativo à extinção ex lege dos direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas»).

21.      Nos termos do § 108/B, n.° 1, da Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias, «[q]ualquer pessoa singular ou coletiva cujo direito de usufruto tenha sido cancelado no registo predial por força das disposições do § 108, n.° 1, em vigor em 30 de abril de 2014 (a seguir «titular de um usufruto cancelado»), ou o seu sucessor, pode requerer, ao abrigo da presente subsecção, a reinscrição no registo predial do direito de usufruto cancelado, bem como a compensação a que tenha direito nos termos desta subsecção».

22.      O § 108/F, n.° 6, da Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias, dispõe:

«Há que declarar que o direito de usufruto cancelado pode ser objeto de reinscrição quando:

a)      alguma das pessoas a que se refere o n.° 7 não seja considerada de boa‑fé, e

b)      não exista nenhum obstáculo legal na aceção do n.° 8.»

23.      Nos termos do § 108/F, n.° 7, da Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias:

«Entre as partes interessadas, não serão consideradas de boa‑fé no que respeita ao imóvel em causa:

a)      O proprietário, se o seu direito de propriedade já existia no momento em que o direito de usufruto foi cancelado.

b)      O proprietário, se tiver adquirido o seu direito de propriedade, quer por força de um contrato celebrado depois de 6 de março de 2018[ (5)], ou antes desta data e apresentado à autoridade competente depois da mesma data mediante um procedimento em conformidade com a [Lei relativa à Venda de Terrenos], incluindo o procedimento de registo predial, quer por força de uma disposição mortis causa posterior a 6 de março de 2018.

c)      O proprietário, se tiver adquirido o seu direito de propriedade depois de 6 de março de 2018 a qualquer título, exceto por contrato ou herança.

d)      O proprietário, se, apesar de ser considerado de boa‑fé nos termos das alíneas b) ou c), tiver constituído um usufruto sobre o imóvel depois de 6 de março de 2018.

e)      O usufrutuário, se o seu direito tiver sido constituído por contrato ou disposição mortis causa posteriores a 6 de março de 2018 ou se, no próprio ato de transmissão do seu direito de propriedade posterior a esta data, tiver reservado para si o direito de usufruto.

f)      O proprietário, quando tenha adquirido o seu direito de propriedade por herança de algum dos proprietários a que se referem as alíneas a) a d).»

24.      O § 108/F, n.° 8, da Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias:

«Considera‑se um obstáculo legal à reinscrição o facto de o imóvel em questão ter sido expropriado ou de o direito de propriedade sobre o mesmo ter sido transmitido por contrato de compra e venda que substitua a expropriação.»

III. Factos

25.      A recorrente no processo principal tem sede na Alemanha e é proprietária do terreno arável na parcela cadastral 0380/1 da zona de Kőszeg (Hungria). O seu título de propriedade foi inscrito no registo predial em 18 de maio de 2012. Nessa data, estava onerado com um direito de usufruto do interveniente. Embora isso não seja expressamente mencionado no despacho de reenvio, há que considerar, em razão dos factos do caso em apreço e das disposições nacionais que a ele se aplicam, que o interveniente é igualmente um investidor não residente.

26.      Este direito de usufruto foi constituído a favor do interveniente pela proprietária anterior mediante um contrato com efeitos a partir de 30 de dezembro de 2001 e foi inscrito no registo predial em 29 de janeiro de 2002. A decisão de registo não foi impugnada administrativa nem judicialmente.

27.      Por Decisão de 27 de julho de 2015 dos Vas Megyei Kormányhivatal Szombathelyi Járási Hivatal [Serviços Administrativos do Departamento de Vas (Gabinete do Distrito de Szombathely), Hungria], o direito de usufruto do interveniente foi cancelado, em conformidade com o § 108, n.° 1, da Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias, e o § 94, n.os 1 e 3, da Lei do Registo Predial.

28.      Na sequência do acórdão de incumprimento (6) (v. n.° 18, supra), o interveniente pediu à autoridade recorrida, com base no § 108/B, n.° 1, da Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias, a reinscrição do seu direito de usufruto.

29.      Por Decisão de 30 de novembro de 2022, a autoridade recorrida ordenou a reinscrição no registo predial do direito de usufruto do interveniente sobre o terreno em questão que tinha sido cancelado. Na sua decisão, a autoridade recorrida salientou que a recorrente não é considerada de boa‑fé na aceção do § 108/F, n.° 7, da Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias, uma vez que o seu direito de propriedade já existia no momento em que foi cancelado o direito de usufruto.

30.      Com o seu recurso no órgão jurisdicional de reenvio, a recorrente pediu o cancelamento da reinscrição do direito de usufruto, tendo em consideração que o registo deste direito foi efetuado ilegalmente. Com efeito, desde 1 de janeiro de 2002, o § 11, n.° 1, da Lei de 1994 relativa aos Terrenos Produtivos já não o permitia.

31.      A autoridade recorrida e o interveniente pediram que fosse negado provimento ao recurso, alegando que não existia obstáculo legal à medida de reinscrição e que a Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias não previa, relativamente a essa medida, a apreciação da legalidade do registo do direito de usufruto.

32.      O órgão jurisdicional de reenvio salienta que, por força da Lei de 1994 relativa aos Terrenos Produtivos, a partir de 1 de janeiro de 2002, os estrangeiros deixaram de poder constituir direitos de usufruto sobre terrenos produtivos. O § 11, n.° 1, da Lei de 1994 relativa aos Terrenos Produtivos, foi objeto de uma interpretação análoga pela jurisprudência nacional (7). No caso em apreço, a inscrição do direito de usufruto que só foi efetuada em 2002 também foi ilegal. No entanto, a decisão de registo tornou‑se definitiva por não ter sido impugnada.

33.      O órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas quanto à questão de saber se a reinscrição do direito de usufruto, anteriormente registado ilegalmente, é compatível com o artigo 63.° TFUE e o artigo 17.° da Carta, uma vez que a recorrente também pode invocar a livre circulação de capitais e que esse direito de usufruto constitui uma violação injustificada do seu direito fundamental de propriedade sobre o terreno em causa. Por força destas disposições, a autoridade recorrida pode ser obrigada a declarar a ilegalidade da inscrição do direito de usufruto e a recusar a sua reinscrição. Por conseguinte, o órgão jurisdicional de reenvio solicitou ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 267.° TFUE, que respondesse à seguinte questão prejudicial:

«Devem o artigo 63.° [TFUE] e o artigo 17.° da [Carta] ser interpretados no sentido de que não se opõem à regulamentação de um Estado‑Membro que, no momento da reinscrição no registo predial de um direito de usufruto ordenada na sequência de um processo por incumprimento — após o cancelamento deste direito de usufruto ilegalmente registado mas de forma definitiva — não prevê a obrigatoriedade de verificar se o registo do direito de usufruto foi efetuado legalmente?»

34.      No processo no Tribunal de Justiça, o Governo Húngaro e a Comissão Europeia apresentaram observações escritas sobre esta questão. Em conformidade com o artigo 76.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, o Tribunal de Justiça decidiu não realizar audiência.

IV.    Apreciação

A.      Admissibilidade

35.      O Governo Húngaro considera que a questão prejudicial é inadmissível pelo facto de o objeto do litígio no processo principal e as disposições nacionais aplicáveis a este respeito não terem relação com a interpretação solicitada do artigo 63.° TFUE e do artigo 17.° da Carta. Em particular, a reinscrição do direito de usufruto é uma medida que promove a livre circulação de capitais, eliminando a violação destas disposições criticadas pelo Tribunal de Justiça a favor dos cidadãos da União provenientes de outros Estados‑Membros. Uma fiscalização da legalidade da inscrição inicial do direito de usufruto, exigida neste caso, é contrária a este objetivo. Em contrapartida, a impossibilidade de efetuar essa fiscalização da legalidade sem distinção (para todos os cidadãos da União) não tem qualquer relação com a livre circulação de capitais.

36.      A questão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 63.° TFUE e do artigo 17.° da Carta no contexto de uma aquisição transfronteiriça de imóveis e da proteção do respetivo direito de propriedade. No caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio considera, com razão, que a livre circulação de capitais prevista no artigo 63.° TFUE é aplicável, uma vez que a recorrente e proprietária do terreno é uma pessoa coletiva estabelecida na Alemanha (8).

37.      O litígio no processo principal tem igualmente por objeto a aplicação do direito da União, na aceção do artigo 51.°, n.° 1, da Carta. Com efeito, na sequência do acórdão de incumprimento, é, em princípio, necessário proceder à reinscrição ex lege dos direitos de usufruto cancelados e detidos por nacionais de outros Estados‑Membros sobre terrenos agrícolas na Hungria, para sanar a violação constatada do artigo 63.° TFUE, em conjugação com o artigo 17.° da Carta (9). Isto decorre igualmente do efeito direto do artigo 63.° TFUE, em conjugação com o princípio do primado (10).

38.      Considero, portanto, que existe um nexo suficiente entre o objeto do litígio e o direito da União ou a sua pertinência para a resolução do litígio no processo principal.

39.      Por conseguinte, o pedido de decisão prejudicial é admissível.

B.      Mérito

1.      Observações preliminares

40.      O órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, essencialmente, se uma autoridade nacional à qual foi apresentado um pedido de reinscrição no registo predial de um direito de usufruto (cancelado em violação do direito da União), está obrigada, por força do artigo 63.° TFUE e do artigo 17.° da Carta, a verificar, no interesse do proprietário do terreno, a legalidade da inscrição inicial, que se tornou definitiva, desse direito à luz das disposições nacionais então em vigor, ainda que, por sua vez, esta última tenha violado essas disposições do direito da União.

41.      Na minha opinião, a resposta a esta questão não suscita qualquer dúvida. No que respeita ao «conflito» suscitado no processo principal entre as liberdades fundamentais e os direitos fundamentais das duas entidades, que têm interesses contraditórios, a saber, a recorrente e proprietária do terreno em causa, por um lado, e o interveniente e titular do direito de usufruto reinscrito no registo predial, por outro, há que dar prioridade às liberdades e aos direitos deste último. Como demonstrarei, esta solução está igualmente na base da jurisprudência do Tribunal de Justiça até à data.

42.      Começarei por examinar se a proprietária do terreno pode invocar as liberdades e os direitos decorrentes do artigo 63.° TFUE e do artigo 17.° da Carta (v. ponto 2, infra). Em seguida, esclarecerei se, e em que medida, resulta do acórdão de incumprimento, cujas constatações definitivas vinculam o órgão jurisdicional de reenvio nos termos do artigo 260.°, n.° 1, TFUE, que as liberdades e os direitos dos titulares de direitos de usufruto sobre os terrenos em causa restringem licitamente os dos proprietários desses terrenos (v. ponto 3, infra). Por último, analisarei se essa restrição às liberdades e aos direitos do proprietário do terreno é igualmente justificada num caso como o presente e se as correspondentes liberdades e os direitos do titular do direito de usufruto também prevalecem no caso em apreço (v. ponto 4, infra).

2.      Proteção do proprietário do terreno não residente nos termos do artigo 63.° TFUE e do artigo 17.° da Carta

43.      A recorrente, enquanto pessoa coletiva com sede na Alemanha, adquiriu o terreno controvertido, situado na Hungria. Por conseguinte, pode, em princípio, invocar a livre circulação de capitais prevista no artigo 63.° TFUE (11).

44.      Além disso, uma regulamentação nacional, ainda que indistintamente aplicável, que permitisse reinscrever um direito de usufruto anteriormente cancelado sem apreciação da legalidade da sua inscrição inicial, poderia dissuadir os investidores estrangeiros de adquirirem imóveis situados na Hungria ou de disporem dos mesmos posteriormente. Com efeito, não podiam ter a certeza de que se trata de uma propriedade não onerada. Assim, uma restrição ilícita à livre circulação de capitais na aceção do artigo 63.° TFUE poderia impor‑se em detrimento destes (12).

45.      Dado que o litígio no processo principal está relacionado com a aplicação do direito da União (v. n.° 36, supra), a recorrente beneficia igualmente, no que respeita à propriedade controvertida, da proteção da garantia do direito de propriedade ao abrigo do artigo 17.°, n.° 1, da Carta.

46.      No entanto, a proteção do proprietário do terreno nos termos do artigo 63.° TFUE e do artigo 17.°, n.° 1, da Carta, não é ilimitada. Em particular, é restringida pela proteção do titular de um direito de usufruto sobre o terreno em questão com base nas mesmas disposições. Esta lógica está igualmente subjacente ao acórdão de incumprimento e ao § 108/B, n.° 1, da Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias, que a autoridade recorrida aplicou para efeitos de reinscrição do direito de usufruto cancelado do interveniente.

47.      Por conseguinte, analisarei em seguida se, e em que medida, o Tribunal de Justiça já apreciou, de forma definitiva, no acórdão de incumprimento, essa restrição na aceção do artigo 260.°, n.° 1, TFUE, e procedeu a uma ponderação de forma vinculativa das liberdades e dos direitos contraditórios dos proprietários dos terrenos em causa, bem como dos titulares dos direitos de usufruto inicialmente registados, mas que foram posteriormente cancelados (em violação do direito da União).

3.      Obrigação de respeitar a interpretação vinculativa do artigo 63.° TFUE e do artigo 17.° da Carta, nomeadamente num acórdão de incumprimento

a)      Força de caso julgado e obrigação de execução nos termos do artigo 260.°, n.° 1, TFUE

48.      Por força do artigo 260.°, n.° 1, TFUE, a Hungria deve tomar as medidas necessárias à execução do acórdão de incumprimento para sanar os incumprimentos das obrigações que lhe incumbem por força dos Tratados que nele são declarados, na medida em que a autoridade de caso julgado abranja os elementos de facto e de direito que foram efetiva ou necessariamente julgados nesse acórdão (13).

49.      A situação da recorrente (proprietária do terreno) e do interveniente (titular do direito de usufruto inicialmente registado mas cancelado) está, em princípio, abrangida pelas constatações do acórdão de incumprimento. Com efeito, o cancelamento ex lege do direito de usufruto do interveniente ocorreu com base no § 108, n.° 1, da Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias, considerado contrário ao direito da União nesse acórdão. É igualmente pacífico que, na sequência de um pedido do interveniente, a autoridade demandada reinscreveu esse direito de usufruto no registo predial em aplicação do § 108/F, n.os 6 e 7, da Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias, alterado na sequência do acórdão de incumprimento. Consequentemente, a propriedade da recorrente foi novamente onerada pelo direito de usufruto do interveniente, que tinha sido cancelado em violação do direito da União na altura, e a violação do artigo 63.° TFUE e do artigo 17.° da Carta constatada pelo Tribunal de Justiça em seu detrimento foi sanada, pelo menos com efeitos para o futuro (14).

50.      O órgão jurisdicional de reenvio não pode, em princípio, adotar uma decisão contrária às constatações vinculativas a este respeito no acórdão de incumprimento, salvo se existirem circunstâncias particulares relativas à recorrente e ao interveniente que não sejam abrangidas pela força de caso julgado. Com efeito, os órgãos jurisdicionais nacionais têm, por seu lado, a obrigação de ter em conta, no exercício das suas funções, os elementos jurídicos fixados nesse acórdão a fim de determinar o alcance das disposições do direito da União que têm por missão aplicar (15). O mesmo se aplica à interpretação vinculativa do direito da União num acórdão prejudicial do Tribunal de Justiça (16).

51.      Por conseguinte, há que examinar mais detalhadamente se e em que medida as constatações vinculativas que figuram no acórdão de incumprimento têm em conta, pelo menos implicitamente, as liberdades e os direitos contraditórios resultantes do artigo 63.° TFUE e do artigo 17.° da Carta em causa no processo principal, bem como a sua necessária ponderação.

b)      Constatações vinculativas que figuram no acórdão de incumprimento quanto à proteção do titular do direito de usufruto nos termos do artigo 63.° TFUE e do artigo 17.° da Carta

52.      É certo que, no acórdão de incumprimento, o Tribunal de Justiça não foi chamado a pronunciar‑se sobre a questão de saber se e em que medida um proprietário do terreno não residente está protegido pelas liberdades e pelos direitos decorrentes do artigo 63.° TFUE e do artigo 17.° da Carta. Todavia, reconheceu a exigência da proteção das liberdades e dos direitos correspondentes do titular de um direito de usufruto cancelado em violação do direito da União não só pelas autoridades estatais mas também em relação a qualquer proprietário de terreno, qualquer que seja a sua origem.

53.      Por um lado, o Tribunal de Justiça declarou que o cancelamento ex lege dos direitos de usufruto dos investidores não residentes implicava uma restrição ilícita ao direito destes últimos à livre circulação de capitais nos termos do artigo 63.° TFUE. Com efeito, ficaram impossibilitados de continuar a exercer o direito de usufruto, por exemplo, através da exploração, da locação, da cessão (incluindo, eventualmente, ao proprietário do terreno), ou de outra utilização lucrativa dos terrenos em causa. Além disso, segundo o Tribunal de Justiça, a injunção legal de cancelamento era suscetível de dissuadir os não residentes de investirem na Hungria no futuro (17).

54.      Por outro lado, o Tribunal de Justiça considerou que o cancelamento ex lege dos direitos de usufruto dos investidores não residentes constituía uma privação da sua propriedade protegida pelo artigo 17.° da Carta (18). Com efeito, o direito de usufruto é uma parte cindida da propriedade. Confere ao seu titular, precisamente em relação ao proprietário do terreno, o direito de utilizar o terreno e de receber as receitas provenientes deste. Este direito é, por conseguinte, inerente a uma restrição correspondente do direito de utilização inerente ao direito de propriedade do proprietário do terreno. Assim, segundo o Tribunal de Justiça, o cancelamento ex lege dos direitos de usufruto existentes implica uma privação forçada, integral e definitiva desses direitos em detrimento dos seus titulares, mas com efeitos a favor dos proprietários de terrenos (19). É o que acontece independentemente do facto de o proprietário do terreno ser ou não residente.

55.      Neste contexto, o Tribunal de Justiça qualificou, além disso, os direitos de usufruto cancelados, mas constituídos contratualmente antes de 1 de janeiro de 2002, de «legalmente adquiridos» ao abrigo do direito nacional em vigor, na aceção do artigo 17.°, n.° 1, da Carta (20). É também o caso da aquisição do direito de usufruto do interveniente que está na origem do litígio no processo principal. Este foi constituído antes de 1 de janeiro de 2002, mas registado após essa data. A circunstância, invocada pela recorrente e pelo órgão jurisdicional de reenvio, de esse direito ter sido ilegalmente inscrito no registo predial após essa data não é, portanto, suscetível de pôr em causa o princípio segundo o qual a situação do interveniente está abrangida pelas constatações feitas no acórdão de incumprimento.

56.      O Tribunal de Justiça concluiu mesmo, num acórdão prejudicial posterior, que uma regulamentação nacional que ordena esse cancelamento e as medidas que a aplicam constituem uma violação manifesta e grave tanto da liberdade fundamental consagrada no artigo 63.° TFUE como do direito de propriedade garantido pelo artigo 17.°, n.° 1, da Carta, em detrimento dos titulares dos direitos de usufruto (21).

57.      É certo que estas constatações vinculativas relativas à proteção dos titulares de direitos de usufruto não residentes cobrem, em princípio, o conflito, como o suscitado no processo principal, com os proprietários dos terrenos onerados por esses direitos. Todavia, não têm em conta uma situação, como no caso em apreço, em que não só o titular do direito de usufruto mas também o proprietário do terreno é um investidor estrangeiro. Com efeito, este último pode, em princípio, invocar igualmente o artigo 63.° TFUE e o artigo 17.° da Carta para beneficiar plenamente do seu investimento e da sua proteção da propriedade (n.os 42 a 44, supra).

58.      Esta abordagem do proprietário do terreno também não pode ser considerada constitutiva de um abuso de direito. As condições do princípio geral do direito da União ou da proibição do abuso de direito, muitas vezes equiparado na jurisprudência a um comportamento fraudulento, não estão manifestamente reunidas no caso em apreço (22). Com efeito, não se trata de beneficiar de uma vantagem prevista pelo direito da União, mesmo que as condições objetivas que este impõe para a sua obtenção estejam apenas formalmente preenchidas (23). Pelo contrário, num caso como o presente, para além das constatações vinculativas do acórdão de incumprimento, há que verificar com precisão se também a restrição das liberdades e dos direitos do proprietário do terreno, prevista no artigo 63.° TFUE e no artigo 17.° da Carta, associada à proteção das liberdades e dos direitos do titular dos direitos de usufruto, é justificada e proporcionada.

4.      Justificação e proporcionalidade da restrição às liberdades e aos direitos do proprietário do terreno nos termos do artigo 63.° TFUE e do artigo 17.° da Carta

a)      Razões imperiosas de interesse geral e liberdades fundamentais e direitos fundamentais de terceiros

59.      Uma restrição à livre circulação de capitais na aceção do artigo 63.° TFUE pode ser admitida se for justificada por razões imperiosas de interesse geral e se for proporcionada. Deve, portanto, ser adequada para garantir a realização de um objetivo legitimamente prosseguido e não ultrapassar o necessário para o atingir. Além disso, tal restrição pode ser justificada pelas razões mencionadas no artigo 65.° TFUE, desde que respeite o princípio da proporcionalidade (24).

60.      Do mesmo modo, uma violação do direito fundamental de propriedade consagrado no artigo 17.°, n.° 1, da Carta, pode ser justificada, em conformidade com o artigo 52.°, n.° 1, da mesma, por um interesse público e no respeito do princípio da proporcionalidade (25). É certo que tal diz apenas respeito a uma privação na aceção do artigo 17.°, n.° 1, segunda frase, da Carta, mas, como resulta igualmente da norma geral de limitação enunciada no artigo 52.°, n.° 1, da Carta, o mesmo acontece no caso de uma simples restrição do direito de propriedade. Na medida em que tal restrição, como no caso em apreço (n.os 52 e 53, supra), constitui uma regulamentação do uso da propriedade na aceção do artigo 17.°, n.° 1, terceira frase, da Carta, é igualmente suficiente que essa regulamentação seja necessária e proporcionada ao interesse público (26).

61.      Em caso de conflito entre as liberdades e os direitos fundamentais, como no caso em apreço, essa justificação pode também basear‑se na liberdade fundamental ou no direito fundamental de outra pessoa. As liberdades e os direitos em conflito devem então ser adequadamente ponderados no âmbito do exame da proporcionalidade, no sentido de uma «concordância prática» (27). É o que resulta igualmente da jurisprudência constante segundo a qual a admissibilidade de restrições às liberdades fundamentais em razão de um interesse geral perentório e a sua própria proporcionalidade devem ser verificadas à luz dos direitos fundamentais da União (28). Esta é também a proteção conferida pelo artigo 17.°, n.° 1, da Carta, a outro titular de direitos fundamentais (29).

62.      Em seguida, analisarei que razões imperiosas de interesse geral podem justificar uma restrição às liberdades e aos direitos dos proprietários de terrenos não residentes, como a recorrente, nos termos do artigo 63.° TFUE e do artigo 17.°, n.° 1, da Carta. Tais fundamentos podem resultar não apenas das constatações definitivas e vinculativas que figuram no acórdão de incumprimento, mas também das liberdades e dos direitos de terceiros, como o interveniente no caso em apreço. Estas liberdades e estes direitos contraditórios devem ser ponderados por razões de proporcionalidade.

b)      Ponderação das liberdades e dos direitos fundamentais do proprietário do terreno e do titular do direito de usufruto

1)      Distinção entre o conflito de direitos em causa e a situação na jurisprudência anterior

63.      O acórdão de incumprimento baseia‑se, essencialmente, na constatação de que o cancelamento ex lege, corrigido no caso em apreço pela autoridade recorrida, dos direitos de usufruto dos titulares não residentes violava não só a liberdade de circulação de capitais prevista no artigo 63.° TFUE em detrimento destes, mas também constituía uma privação ilegal de propriedade na aceção do artigo 17.°, n.° 1, da Carta (v. n.os 52 a 56, supra) (30). Daqui resulta, simetricamente, que, pelo menos, os proprietários de terrenos locais devem, em princípio, tolerar o restabelecimento da situação jurídica inicial em benefício dos titulares dos direitos de usufruto não residentes (31).

64.      Todavia, diferentemente das situações na origem da jurisprudência anterior, o presente processo tem por objeto um conflito entre, por um lado, as liberdades e os direitos fundamentais de um proprietário não residente do terreno onerado pelo direito de usufruto e, por outro lado, os de um titular não residente desse direito.

65.      No entanto, numa situação como a do caso em apreço não existem, sobretudo a do proprietário do terreno não residente, circunstâncias específicas que exijam uma apreciação diferente da que esteve na origem do acórdão de incumprimento.

2)      Restrição admissível ao direito à livre circulação de capitais do proprietário do terrenonão residente

66.      Antes de mais, tal diz respeito à justificação de uma eventual restrição ao direito dos proprietários de terrenos não residentes à livre circulação de capitais nos termos do artigo 63.° TFUE. Com efeito, na medida em que, como no caso em apreço, adquiriram o terreno em causa tendo conhecimento de um direito de usufruto já registado, nem sequer foram impedidos de exercer a sua livre circulação de capitais. Tal só acontece a fortiori se, no momento da aquisição do terreno, o direito de usufruto já estava registado de forma definitiva, como no caso em apreço. Nesse caso, o ónus que esse direito representa para o terreno não pode, em princípio, ter uma influência negativa na decisão de aquisição do mesmo. Pelo contrário, como também sustenta a Comissão, esse ónus permite adquirir um terreno em melhores condições, designadamente a um preço mais vantajoso do que na sua ausência.

67.      Não é possível apreciar diferentemente a restrição, invocada pelo órgão jurisdicional de reenvio, ao poder de livre disposição do proprietário de terrenos não residente através da posterior reinscrição de um direito de usufruto cancelado ex lege, mas anteriormente registado de forma definitiva, sem apreciação da legalidade da sua inscrição inicial. Mesmo admitindo que possa ser considerada uma restrição à livre circulação de capitais, esta é lícita e justificada pela inscrição definitiva do direito de usufruto no momento da aquisição do terreno.

68.      Com efeito, segundo o órgão jurisdicional de reenvio (n.° 31, supra), essa força de caso julgado tem como consequência que, apesar da ilegalidade da sua inscrição, o direito de usufruto já não podia, em princípio, ser posto em causa à luz das disposições nacionais então aplicáveis. Tendo em conta estes elementos, um proprietário do terreno não residente, como a recorrente, não podia depositar a sua confiança no facto de um cancelamento ex lege do direito de usufruto, que se tornou definitivo após a sua aquisição, que foi posteriormente considerado contrário ao direito da União no acórdão de incumprimento, conduzir a uma situação em que o terreno permanece livre de qualquer ónus. Tanto mais que o obstáculo à sua reinscrição invocado no caso em apreço se baseia precisamente nas disposições nacionais que o Tribunal de Justiça considerou incompatíveis com o artigo 63.° TFUE e o artigo 17.° da Carta, pelo que já não podem ser aplicadas (v. n.° 36, supra). Foi essencialmente por estas razões que a autoridade recorrida também negou à recorrente a boa‑fé, na aceção do § 108/F, n.° 7, da Lei de 2013 relativa às Medidas Transitórias.

69.      Em contrapartida, o cancelamento ex lege de um direito de usufruto, anulado pela reinscrição controvertida, constitui uma grave restrição à livre circulação de capitais do titular não residente desse direito (v. n.os 52 e 55, supra). A questão de saber se a situação deveria ser apreciada de forma diferente se o proprietário do terreno não tivesse concedido ele próprio o direito de usufruto ou se tivesse adquirido originalmente o terreno sem ónus não precisa de ser aqui decidida. Não obstante, e tendo igualmente em conta a aplicabilidade direta do artigo 63.° TFUE, parece‑me razoável, de um modo geral, que os adquirentes de terrenos não residentes se informem previamente, através do registo predial, se o terreno está ou esteve onerado por um direito de usufruto de um investidor não residente, eventualmente cancelado ex lege e (ainda) não reinscrito.

70.      Consequentemente, o direito dos proprietários de terrenos não residentes ao abrigo do artigo 63.° TFUE pode ser restringido pelo direito correspondente do titular não residente do direito de usufruto. Como veremos a seguir, esta restrição é igualmente permitida nos termos do artigo 17.°, n.° 1, da Carta, devido à necessidade de proteger o direito de propriedade do titular desse direito.

3)      Restrição admissível do direito de propriedade do proprietário do terreno não residente

71.      Além disso, em conformidade com as constatações feitas no acórdão de incumprimento, considero que a ingerência na propriedade do titular do direito de usufruto, protegida pelo artigo 17.°, n.° 1, da Carta, devido ao seu cancelamento ex lege, é mais grave do que a ingerência no direito de propriedade do proprietário do terreno não residente resultante da reinscrição controvertida do direito de usufruto cancelado ex lege.

72.      Com efeito, como o Tribunal de Justiça salientou com razão, um direito de usufruto legalmente constituído e registado com o acordo do proprietário do terreno restringe o direito de propriedade sobre o terreno, sujeitando‑o simplesmente a outras regras de utilização. Diferentemente do cancelamento ex lege do direito de usufruto contestado no acórdão de incumprimento, isso não implica, portanto, uma privação total da propriedade (32). Do mesmo modo, a nova restrição do direito de propriedade do proprietário do terreno através da reinscrição controvertida do direito de usufruto cancelado, mesmo contra a sua vontade, pesa muito menos do que a privação forçada, integral e definitiva do direito de propriedade do titular do direito de usufruto (enquanto parte cindida da propriedade do terreno, v. n.° 53, supra).

73.      Nesse caso, o proprietário do terreno não residente não pode, portanto, invocar a proteção do seu direito de propriedade para fazer renascer a seu favor o cancelamento (contrário ao direito da União) desse direito de usufruto e anular o ónus que daí decorre para a sua propriedade. Isto é ainda mais verdade quando, como no caso em apreço, a aquisição do terreno ocorreu num momento em que este já estava onerado com um direito de usufruto registado de forma definitiva (n.° 67, supra).

74.      Por conseguinte, a invocação do artigo 63.° TFUE e do artigo 17.° da Carta pelo proprietário do terreno não residente não pode conduzir a um novo cancelamento do direito de usufruto reinscrito. A este respeito, o Governo Húngaro alega, com razão, que as disposições nacionais alteradas na sequência do acórdão de incumprimento e a sua execução são precisamente necessárias para dar cumprimento a esse acórdão nos termos do artigo 260.°, n.° 1, TFUE, e para estabelecer uma situação compatível com essas disposições do direito da União.

75.      Por conseguinte, contrariamente ao que sustenta o órgão jurisdicional de reenvio, também não há que destruir a força de caso julgado da inscrição inicial do direito de usufruto à luz dos princípios da equivalência e da efetividade. Esta questão só se colocaria em caso de execução insuficiente do acórdão de incumprimento, o que, precisamente, não se verifica no caso em apreço. Pelo contrário, decorre do princípio da segurança jurídica que os atos administrativos definitivos que produzem efeitos jurídicos já não podem, em princípio, ser postos em causa (33). Além disso, tal destruição da força de caso julgado seria feita em detrimento da proteção dos direitos do titular do direito de usufruto garantidos no artigo 63.° TFUE e no artigo 17.° da Carta e assentaria precisamente nas disposições nacionais que foram declaradas contrárias ao direito da União pelo Tribunal de Justiça para efeitos dessa proteção.

76.      Por último, não existem outras circunstâncias suscetíveis de pôr em causa o caráter adequado e proporcionado da reinscrição controvertida do direito de usufruto em causa a fim de restringir licitamente os direitos que decorrem para o proprietário do terreno do artigo 63.° TFUE e do artigo 17.° da Carta. Em todo o caso, essa reinscrição não vai além do que era necessário para atingir os referidos objetivos, incluindo a proteção das liberdades e dos direitos de usufruto do titular do direito de usufruto.

5.      Conclusão intermédia

77.      Consequentemente, um proprietário de um terreno cuja propriedade é onerada por um direito de usufruto, inicialmente registado com efeitos definitivos, posteriormente cancelado em violação do direito da União, mas posteriormente reinscrito, não pode invocar os seus direitos ao abrigo do artigo 63.° do TFUE e do artigo 17.° da Carta para obrigar a autoridade competente a cancelar novamente esse direito de usufruto com o fundamento de que o seu registo inicial era contrário às disposições húngaras então em vigor.

V.      Conclusão

78.      Tendo em conta as considerações precedentes, proponho ao Tribunal de Justiça que responda à questão prejudicial submetida pelo Győri Törvényszék do seguinte modo:

Uma regulamentação de um Estado‑Membro que ordena a reinscrição de um direito de usufruto que foi cancelado, em violação do direito da União, e inicialmente registado de forma definitiva, é compatível com o artigo 63.° TFUE e o artigo 17.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, se não obrigar as autoridades competentes a apreciar, antes da reinscrição desse direito, a legalidade do registo inicial desse direito à luz das disposições nacionais então em vigor.


1      Língua original: alemão.


2      Acórdãos de 6 de março de 2018, SEGRO e Horváth (C‑52/16 e C‑113/16, EU:C:2018:157); de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432); e de 10 de março de 2022, Grossmania (C‑177/20, EU:C:2022:175).


3      Acórdão de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432, n.° 131 e n.° 1 do dispositivo).


4      Acórdão de 10 de março de 2022, Grossmania (C‑177/20, EU:C:2022:175).


5      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, esta data refere‑se à prolação do Acórdão de 6 de março de 2018, SEGRO e Horváth (C‑52/16 e C‑113/16, EU:C:2018:157).


6      Acórdão de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432).


7      Acórdãos de princípio EBH2004.1173 e EBH2005.1277.


8      V. Acórdãos de 6 de março de 2018, SEGRO e Horváth (C‑52/16 e C‑113/16, EU:C:2018:157, n.° 56 e jurisprudência referida), e de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432, n.° 54).


9      V. Acórdãos de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432, n.os 65 e segs.), e de 10 de março de 2022, Grossmania (C‑177/20, EU:C:2022:175, n.os 33 e segs.).


10      Acórdão de 10 de março de 2022, Grossmania (C‑177/20, EU:C:2022:175, n.os 43 a 46 e 64). Isto é válido sem prejuízo do princípio da autonomia processual, por força do qual incumbe aos Estados‑Membros determinar, no respeito dos princípios da equivalência e da efetividade, as modalidades processuais das vias de recurso destinadas a garantir a salvaguarda dos direitos dos particulares (v. n.os 49 e segs.).


11      V. Acórdãos de 6 de março de 2018, SEGRO e Horváth (C‑52/16 e C‑113/16, EU:C:2018:157, n.° 56 e jurisprudência referida), e de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432, n.° 54).


12      V., neste sentido, Acórdão de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432, n.° 58 in fine e jurisprudência referida).


13      V., neste sentido, Acórdão de 10 de março de 2022, Grossmania (C‑177/20, EU:C:2022:175, n.° 35 e jurisprudência referida).


14      Neste sentido, Acórdão de 10 de março de 2022, Grossmania (C‑177/20, EU:C:2022:175, n.° 65).


15      Neste sentido, Acórdão de 10 de março de 2022, Grossmania (C‑177/20, EU:C:2022:175, n.° 36 e jurisprudência referida).


16      V. Acórdão de 10 de março de 2022, Grossmania (C‑177/20, EU:C:2022:175, n.os 41 e 42 e jurisprudência referida).


17      V. Acórdão de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432, n.os 54 e segs., em particular n.° 58 e jurisprudência referida).


18      Acórdão de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432, n.os 67 e segs., em particular n.° 82).


19      Neste sentido, Acórdãos de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432, n.° 81), e de 10 de março de 2022, Grossmania (C‑177/20, EU:C:2022:175, n.° 56).


20      Acórdão de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432, n.os 73 a 75).


21      Acórdão de 10 de março de 2022, Grossmania (C‑177/20, EU:C:2022:175, n.° 57).


22      V. Acórdãos de 26 de fevereiro de 2019, T Danmark e Y Denmark (C‑116/16 e C‑117/16, EU:C:2019:135, n.os 70 e segs.), e de 21 de dezembro de 2023, BMW Bank e o. (C‑38/21, C‑47/21 e C‑232/21, EU:C:2023:1014, n.os 281 e segs.).


23      V. Acórdão de 21 de dezembro de 2023, BMW Bank e o. (C‑38/21, C‑47/21 e C‑232/21, EU:C:2023:1014, n.° 283 e jurisprudência referida).


24      Neste sentido, Acórdão de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432, n.os 59 e 60 e jurisprudência referida).


25      Neste sentido, Acórdão de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432, n.os 88 e 89).


26      V., a este respeito, Acórdão de 5 de maio de 2022, BPC Lux 2 e o. (C‑83/20, EU:C:2022:346, n.os 36 e segs.).


27      V., neste sentido, Acórdãos de 22 de janeiro de 2013, Sky Österreich (C‑283/11, EU:C:2013:28, n.° 60 e jurisprudência referida); de 19 de dezembro de 2019, Deutsche Umwelthilfe (C‑752/18, EU:C:2019:1114, n.° 50); e de 26 de abril de 2022, Polónia/Parlamento e Conselho (C‑401/19, EU:C:2022:297, n.° 75). Quanto à questão da equivalência dos direitos fundamentais e das liberdades fundamentais, bem como da eliminação dos conflitos entre estes com fundamento no princípio da proporcionalidade, v. Conclusões da advogada‑geral V. Trstenjak no processo Comissão/Alemanha (C‑271/08, EU:C:2010:183, n.os 183 e segs.); quanto à figura jurídica da «concordância prática», v., desde logo, as minhas Conclusões no processo Parlamento/Conselho (C‑540/03, EU:C:2005:517, n.° 39).


28      V. Acórdão de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432, n.os 64 a 66 e jurisprudência referida).


29      V. Acórdão de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432, n.os 66 e segs.).


30      Acórdão de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432, n.os 54 e segs., bem como n.os 67 e segs., em particular n.° 82).


31      Neste sentido, Acórdão de 10 de março de 2022, Grossmania (C‑177/20, EU:C:2022:175, n.os 57 e segs.).


32      V. Acórdão de 21 de maio de 2019, Comissão/Hungria (Direitos de usufruto sobre terrenos agrícolas) (C‑235/17, EU:C:2019:432, n.os 82 e segs.).


33      V., neste sentido, Acórdão de 10 de março de 2022, Grossmania (C‑177/20, EU:C:2022:175, n.os 49 e segs., em particular n.° 52).