Language of document : ECLI:EU:T:2024:460

Edição provisória

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

10 de julho de 2024 (*)

«Política económica e monetária — Supervisão prudencial das instituições de crédito — Oposição do BCE à aquisição de participações qualificadas numa instituição de crédito — Recurso de anulação — Interesse em agir — Afetação direta — Inadmissibilidade parcial — Idoneidade e competência profissional do proposto adquirente — Solidez financeira — Cumprimento dos requisitos prudenciais — Luta contra o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo — Proporcionalidade»

No processo T‑323/22,

PH,

PI,

PJ,

Socrates Capital Ltd, com sede em Toronto (Canadá),

representados por D. Hillemann, C. Fischer e T. Ehls, advogados,

recorrentes,

contra

Banco Central Europeu (BCE), representado por E. Yoo, S. Letocart e V. Hümpfner, na qualidade de agentes,

recorrido,

apoiado por

Comissão Europeia, representada por D. Triantafyllou, na qualidade de agente,

interveniente,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção),

composto por: R. da Silva Passos, presidente, S. Gervasoni (relator) e T. Pynnä, juízes,

secretário: V. Di Bucci,

vistos os autos,

visto as partes não terem requerido a marcação de audiência no prazo de três semanas a contar da notificação do encerramento da fase escrita do processo e tendo sido decidido, nos termos do artigo 106.°, n.° 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, julgar o recurso prescindindo da fase oral do processo,

profere o presente

Acórdão (1)

1        Por meio do seu recurso interposto ao abrigo do artigo 263.° TFUE, os recorrentes, PH, PI, PJ e a Socrates Capital Ltd, pedem a anulação da Decisão do Banco Central Europeu (BCE) de 22 de março de 2022, através da qual este se opôs a que PH, PI e PJ adquirissem uma participação qualificada no HKB Bank GmbH (a seguir «banco alvo») e a que ultrapassassem 50 % do capital e dos direitos de voto neste último.

I.      Antecedentes do litígio e factos posteriores à interposição do recurso

2        Quando a decisão recorrida foi adotada, o banco alvo era uma instituição de crédito menos significativa, na aceção do artigo 6.°, n.° 4, do Regulamento n.° 1024/2013 do Conselho, de 15 de outubro de 2013, que confere ao BCE atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito (JO 2013, L 287, p. 63), situado na Alemanha e colocado sob a supervisão prudencial direta da Bundesanstalt für Finanzdienstleistungsaufsicht (BaFin, Autoridade Federal de Supervisão dos Serviços Financeiros, Alemanha).

3        À data da decisão recorrida, a Socrates Capital detinha 81,6 % do capital e 95,14 % dos direitos de voto no banco alvo. Ela própria era detida a 100 %, indiretamente (através de duas sociedades holding) e, em última instância, pela A.

[OMISSIS]

7        Em 9 de abril de 2020 e em 9 de julho de 2020, respetivamente, PH, por um lado, e PI e PJ, por outro, comunicaram à BaFin a sua intenção de adquirir, enquanto adquirentes indiretos no que respeita a PH e a PI e enquanto adquirente direto no que respeita a PJ, uma participação qualificada e de ultrapassar 50 % do capital e dos direitos de voto no banco alvo (a seguir «projeto de aquisição»), graças à aquisição de todas as quotas detidas pela Socrates Capital no banco alvo.

[OMISSIS]

10      Em agosto de 2020, a Socrates Capital, por um lado, e PI e PJ, por outro, celebraram um contrato de compra e venda para efeitos do projeto de aquisição (a seguir «contrato de compra e venda»). Nos termos desse contrato, sujeito a condições prévias e a cláusulas de rescisão, a Socrates Capital aceitava vender a PJ, por um montante de [2‑20] milhões de euros, a participação qualificada que tinha adquirido no banco alvo em junho de 2017.

[OMISSIS]

20      Em 22 de março de 2022, o BCE comunicou a decisão recorrida aos propostos adquirentes e a sua resposta às observações sobre o projeto de decisão recorrida (a seguir «resposta às observações»).

21      A decisão recorrida foi adotada com base, nomeadamente, nos artigos 22.° e 23.° da Diretiva 2013/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e à supervisão prudencial das instituições de crédito e empresas de investimento, que altera a Diretiva 2002/87/CE e revoga as Diretivas 2006/48/CE e 2006/49/CE (JO 2013, L 176, p. 338), conforme transpostos para a legislação alemã relativa ao setor do crédito. O BCE considerou, em substância, que se devia opor ao projeto de aquisição, uma vez que os propostos adquirentes não preenchiam os critérios de idoneidade, de solidez financeira, de cumprimento dos requisitos prudenciais e de luta contra o risco de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo.

[OMISSIS]

II.    Tramitação processual e pedidos das partes

26      Por articulado registado na Secretaria do Tribunal Geral em 8 de setembro de 2022, o BCE pediu que o Tribunal Geral se dignasse declarar que não havia que conhecer do mérito do recurso. Por Despacho de 11 de janeiro de 2023, o Tribunal Geral decidiu reservar para final esse pedido de não conhecimento do mérito.

27      Os recorrentes concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        declarar que a decisão recorrida é ilegal e que os seus direitos foram violados;

–        condenar o BCE no pagamento das despesas.

28      O BCE conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        a título principal, declarar que não há que conhecer do mérito do recurso;

–        a título subsidiário, julgar o recurso inadmissível na parte em que foi interposto pela Socrates Capital e, em todo o caso, negar‑lhe provimento;

–        condenar solidariamente os recorrentes nas despesas.

29      A Comissão Europeia, intervindo em apoio do BCE, conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar os recorrentes nas despesas.

III. Questão de direito

[OMISSIS]

C.      Quanto à admissibilidade do recurso na parte em que foi interposto pela Socrates Capital

51      O BCE considera que a decisão recorrida não afeta direta e individualmente a Socrates Capital, pelo que esta não tem legitimidade para interpor um recurso de anulação ao abrigo do artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE. A decisão recorrida não produz efeitos na situação jurídica da Socrates Capital, uma vez que esta decisão não a impede, de um ponto de vista puramente jurídico, de vender a sua participação ao adquirente interessado, não estando prevista nenhuma sanção contra o vendedor das quotas. Do ponto de vista do objetivo do procedimento, dos critérios de apreciação da aquisição de uma participação qualificada e do procedimento administrativo, o vendedor da participação qualificada não é diretamente afetado por uma decisão de oposição à aquisição, que afeta apenas o potencial adquirente. O BCE acrescenta que o requisito da afetação individual não está preenchido, uma vez que a decisão recorrida é o resultado da avaliação de critérios não relacionados com o vendedor da participação qualificada.

52      Os recorrentes contestam esta argumentação. O BCE não teve em conta o facto de o contrato de compra e venda conter uma cláusula de condicionalidade, segundo a qual o contrato não é executório se o BCE se opuser à operação. A decisão recorrida afeta também o direito de propriedade e a liberdade de empresa da Socrates Capital. Além disso, a decisão recorrida indica que a reputação dos propostos adquirentes está prejudicada pelo facto de terem «negociado» com o vendedor, o que equivale a uma proibição geral de adquirir o banco alvo. A Socrates Capital é individualmente afetada, uma vez que nenhuma outra entidade detém a maioria das quotas que os propostos adquirentes pretendem adquirir.

53      A este respeito, há que observar que os quatro recorrentes interpuseram um único e mesmo recurso. Ora, tratando‑se de um único e mesmo recurso, uma vez que PH, PI e PJ dispõem de legitimidade, não há que analisar a legitimidade da Socrates Capital (v., neste sentido, Acórdão de 24 de março de 1993, CIRFS e o./Comissão, C‑313/90, EU:C:1993:111, n.° 31).

54      No entanto, o Tribunal Geral considera oportuno, por razões de boa administração da justiça e devido à especial importância da questão da admissibilidade suscitada pela exceção de inadmissibilidade arguida pelo BCE, pronunciar‑se sobre essa exceção de inadmissibilidade.

55      O artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE prevê dois casos concretos nos quais é reconhecida legitimidade a uma pessoa singular ou coletiva para interpor recurso de um ato do qual não é destinatária. Por um lado, esse recurso pode ser interposto se esse ato lhe disser direta e individualmente respeito. Por outro, essa pessoa pode interpor recurso de um ato regulamentar que não necessite de medidas de execução, se o mesmo lhe disser diretamente respeito (Acórdão de 18 de outubro de 2018, Internacional de Productos Metálicos/Comissão, C‑145/17 P, EU:C:2018:839, n.° 32).

56      As condições de admissibilidade previstas no artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE devem ser interpretadas à luz do direito fundamental a uma proteção jurisdicional efetiva, sem no entanto conduzir ao afastamento das condições expressamente previstas pelo referido Tratado (Acórdão de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho, C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.° 98).

57      No presente litígio, a decisão recorrida não foi comunicada à Socrates Capital. Aliás, nenhuma disposição exigia tal comunicação a essa recorrente na qualidade de cedente da participação qualificada em causa. Uma vez que a Socrates Capital não é destinatária da decisão recorrida, a sua legitimidade só pode, portanto, ser reconhecida se estiver abrangida por um dos dois casos mencionados no n.° 55, supra.

58      Por outro lado, não sendo a decisão recorrida um ato regulamentar, importa analisar a admissibilidade do recurso à luz da primeira hipótese mencionada no n.° 55, supra.

59      Assim, há que determinar, antes de mais, se a decisão recorrida diz diretamente respeito à Socrates Capital.

60      A condição segundo a qual a decisão objeto do recurso deve dizer diretamente respeito a uma pessoa singular ou coletiva, conforme prevista no artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE, requer a reunião de dois critérios cumulativos, a saber, que a medida contestada, por um lado, produza efeitos diretamente na situação jurídica dessa pessoa e, por outro, não deixe nenhuma margem de apreciação aos destinatários encarregados da sua execução, uma vez que esta execução tem caráter puramente automático e decorre apenas da regulamentação da União, sem aplicação de outras regras intermédias [Acórdão de 22 de junho de 2021, Venezuela/Conselho (Afetação de um Estado terceiro), C‑872/19 P, EU:C:2021:507, n.° 61].

61      Para determinar se um ato produz efeitos jurídicos, importa ter em conta, designadamente, o seu objeto, o seu conteúdo, o seu alcance, a sua substância assim como o contexto jurídico e factual no qual esse ato foi adotado [Acórdão de 22 de junho de 2021, Venezuela/Conselho (Afetação de um Estado terceiro), C‑872/19 P, EU:C:2021:507, n.° 66].

62      O dispositivo de controlo das participações qualificadas previsto nos artigos 22.° e seguintes da Diretiva 2013/36 submete a pessoa que pretende adquirir uma participação qualificada numa instituição de crédito a uma avaliação prévia, nomeadamente da sua idoneidade e solidez financeira, a fim de garantir uma gestão sã e prudente da instituição de crédito em causa.

63      Os critérios de apreciação da comunicação de aquisição de uma participação qualificada previstos no artigo 23.° da Diretiva 2013/36 visam apreciar a idoneidade do proposto adquirente e do projeto de aquisição que apresenta à autoridade competente. Designadamente, a apreciação tem por objeto verificar que o proposto adquirente goza de boa reputação e possui a solidez financeira necessária, de modo que a instituição cujas participações vão ser adquiridas continue a cumprir os seus requisitos prudenciais. A apreciação contribui também para evitar que a operação seja financiada com fundos resultantes de atividades ilícitas (Conclusões do advogado‑geral M. Campos Sánchez‑Bordona no processo Berlusconi e Fininvest, C‑219/17, EU:C:2018:502, n.° 80).

64      Nos termos do artigo 22.°, n.° 1, da Diretiva 2013/36, cabe ao proposto adquirente comunicar às autoridades competentes o projeto de aquisição. Por outro lado, esta diretiva não menciona nem a publicação dessa comunicação nem a possibilidade de outras pessoas além do proposto adquirente, nomeadamente a pessoa que pretende ceder a sua participação numa instituição de crédito, participarem no processo de apreciação do projeto de aquisição.

65      Segundo o artigo 22.°, n.° 5, da Diretiva 2013/36, se as autoridades competentes decidirem opor‑se ao projeto de aquisição, informam o proposto adquirente desse facto e da fundamentação dessa decisão.

66      Por último, nos termos do artigo 26.°, n.° 2, terceiro parágrafo, da Diretiva 2013/36, caso seja adquirida uma participação apesar da oposição das autoridades competentes, os Estados‑Membros determinam, sem prejuízo de outras sanções a aplicar, quer a inibição do exercício dos direitos de voto correspondentes, quer a nulidade ou a anulabilidade dos votos expressos.

67      Resulta do que precede que o dispositivo de controlo das participações qualificadas visa avaliar, previamente à aquisição dessas participações, a qualidade dos propostos adquirentes que pretendem aceder ao setor bancário enquanto proprietários.

68      Nestas condições, deve considerar‑se que a oposição à aquisição de uma participação qualificada numa instituição de crédito não altera a situação jurídica da sociedade vendedora dessa participação.

69      Com efeito, embora a oposição à aquisição de uma participação qualificada ponha em causa a possibilidade de os propostos adquirentes celebrarem um contrato com o vendedor de uma participação qualificada, não põe, em contrapartida, em causa o direito do vendedor de proceder a uma operação de cessão, que este pode nomeadamente celebrar com outro proposto adquirente, e corresponde apenas a uma recusa de autorização de os propostos adquirentes acederem ao setor bancário enquanto proprietários.

70      Esta conclusão é corroborada pelo contexto jurídico em que se insere a decisão recorrida. A Diretiva 2013/36 não menciona nem a publicação da comunicação da aquisição de uma participação qualificada numa instituição de crédito, nem a possibilidade de terceiros serem associados ao procedimento administrativo, nem ainda a publicação sistemática da decisão da autoridade competente. Em caso de incumprimento da oposição à aquisição de uma participação qualificada, prevê apenas sanções relativas ao exercício dos direitos de voto correspondentes à participação adquirida pelos propostos adquirentes. Em particular, as sanções previstas no § 2c, n.° 2, da Kreditwesengesetz (Lei relativa ao Setor do Crédito), de 9 de setembro de 1998 (BGBl. 1998 I, p. 2776), conforme alterada pela Lei de 10 de agosto de 2021 (BGBl. 2021 I, p. 3436) (a seguir «KWG») não incluem nem sanções contra o vendedor de uma participação qualificada nem medidas como a nulidade da própria aquisição ou a obrigação de restabelecer a situação anterior à venda.

71      Assim, no caso em apreço, a decisão recorrida aprecia a qualidade dos propostos adquirentes e não a legalidade do contrato de compra e venda.

72      A cláusula do contrato de compra e venda segundo a qual este contrato não entrará em vigor na falta de autorização do BCE foi voluntariamente inserida pelas partes no contrato. É certo que uma cláusula inserida pelas partes num contrato pode ser o reflexo da regulamentação (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 5 de maio de 1998, Dreyfus/Comissão, C‑386/96 P, EU:C:1998:193, n.° 51). Todavia, no caso em apreço, a referida cláusula é o reflexo de uma regulamentação que sujeita individualmente o proposto adquirente a uma autorização administrativa destinada a apreciar se dispõe da qualidade para aceder ao setor bancário enquanto proprietário. Contrariamente às circunstâncias do processo que deu origem ao Acórdão de 5 de maio de 1998, Dreyfus/Comissão (C‑386/96 P, EU:C:1998:193), o BCE não se pronuncia sobre a conformidade do contrato eventualmente celebrado entre os propostos adquirentes e o vendedor de uma participação numa instituição de crédito quando avalia a comunicação da referida aquisição.

73      Por outro lado, o artigo 16.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») dispõe que é reconhecida a liberdade de empresa, de acordo com o direito comunitário e as legislações e as práticas nacionais.

74      O artigo 17.° da Carta dispõe que todas as pessoas têm o direito de fruir da propriedade dos seus bens legalmente adquiridos, de os utilizar, de dispor deles e de os transmitir em vida ou por morte.

75      A este respeito, embora a decisão recorrida constitua uma ingerência no direito de propriedade e na liberdade de empresa dos propostos adquirentes, não pode ser considerada uma ingerência nos mesmos direitos no que respeita à Socrates Capital. Com efeito, a decisão recorrida não lesa de forma direta o direito da Socrates Capital de vender as suas quotas no banco alvo.

76      Contrariamente ao que os recorrentes sustentam, o BCE não considerou que os propostos adquirentes não eram idóneos pelo facto de estes últimos terem, de maneira geral, «negociado» com a Socrates Capital. Em particular, o BCE não acusou os propostos adquirentes de terem assinado o contrato de compra e venda com a Socrates Capital. No ponto 2.7 da decisão recorrida, o BCE apenas acusou os propostos adquirentes da sua intenção de associar A à execução do plano de negócios e de o nomear para o conselho consultivo após a aquisição projetada. Os recorrentes não têm, portanto, fundamento para sustentar que a decisão recorrida equivale a uma proibição geral de a Socrates Capital vender as suas quotas no banco alvo.

77      Por conseguinte, a decisão recorrida não diz diretamente respeito à Socrates Capital.

78      Consequentemente, sem que seja necessário examinar se a decisão recorrida diz individualmente respeito à Socrates Capital, o recurso é inadmissível no que respeita a esta sociedade.

D.      Quanto ao mérito do recurso

[OMISSIS]

6.      Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do § 2c, n.° 1b, primeiro período, ponto 1, da KWG no que respeita à competência profissional

[OMISSIS]

a)      Quanto à possibilidade de o BCE apreciar a competência profissional dos potenciais adquirentes

357    Na réplica, os recorrentes alegam pela primeira vez que o BCE não se podia basear na competência profissional do proposto adquirente para adotar a decisão recorrida. O artigo 23.°, n.° 1, da Diretiva 2013/36 menciona a idoneidade e não a competência profissional do proposto adquirente. Por conseguinte, o BCE violou este artigo, conforme transposto para o direito alemão.

[OMISSIS]

362    Além disso, é verdade que o artigo 23.°, n.° 1, da Diretiva 2013/36 apenas menciona, na alínea a), a idoneidade do proposto adquirente, ao passo que esse mesmo artigo menciona, na alínea b), a idoneidade, conhecimentos, competências e experiência, nos termos previstos no artigo 91.°, n.° 1, da mesma diretiva, de qualquer membro do órgão de administração que dirigirá a atividade da instituição de crédito em resultado da aquisição proposta.

363    Todavia, há que salientar que, segundo a sua aceção usual, o termo «idóneo» significa «que é digno de estima» ou «cuja respeitabilidade é notória». Tal definição, que remete, nomeadamente, para a opinião do público, não exclui que a idoneidade de uma pessoa dependa da sua competência profissional.

364    Segundo o considerando 8 da Diretiva 2007/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de setembro de 2007, que altera a Diretiva 92/49/CEE do Conselho e as Diretivas 2002/83/CE, 2004/39/CE, 2005/68/CE e 2006/48/CE no que se refere a normas processuais e critérios para a avaliação prudencial das aquisições e dos aumentos de participações em entidades do setor financeiro (JO 2007, L 247, p. 1), cujas disposições foram reproduzidas na Diretiva 2013/36, o critério da idoneidade do adquirente potencial implica determinar se existem e se têm fundamento dúvidas quanto à integridade «e à competência profissional» do adquirente potencial.

365    A tomada em consideração, na apreciação da idoneidade do proposto adquirente, da sua competência profissional é coerente com a avaliação da «idoneidade» desse candidato, nos termos do artigo 23.°, n.° 1, da Diretiva 2013/36. É também coerente com o objetivo do controlo da aquisição das participações qualificadas, que é garantir uma gestão sã e prudente da instituição de crédito. Dado que o detentor de uma participação qualificada está em condições de exercer influência sobre a instituição de crédito em causa, a sua competência profissional contribui para essa gestão sã e prudente dessa instituição.

366    As Orientações Conjuntas corroboram, de resto, esta interpretação, uma vez que indicam, nomeadamente no ponto 10.1, que a avaliação da idoneidade do proposto adquirente deve abranger a sua integridade e a sua competência profissional.

367    Os termos do § 2c, n.° 1b, primeiro período, ponto 1, da KWG, recordados no n.° 282, supra, não permitem excluir tal interpretação. A exposição de motivos da Gesetz zur Umsetzung der Beteiligungsrichtlinie (Lei que Transpõe a Diretiva Aquisições), de 12 de março de 2009 (BGBl., 2009 I, p. 470), que transpõe para o direito alemão a Diretiva 2007/44, menciona que o critério de fiabilidade consiste em verificar a existência de dúvidas quanto à integridade «e à capacidade profissional» do proposto adquirente e o fundamento dessas dúvidas.

368    Resulta do exposto que o critério da idoneidade mencionado no artigo 23.°, n.° 1, da Diretiva 2013/36 deve ser interpretado no sentido de que inclui a avaliação da competência profissional do proposto adquirente.

369    Por conseguinte, não assiste razão aos recorrentes quando sustentam que o BCE violou o artigo 23.° da Diretiva 2013/36, conforme transposto para o direito alemão, ao analisar a competência profissional dos candidatos adquirentes.

[OMISSIS]

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      PH, PI, PJ e a Socrates Capital Ltd suportarão as suas próprias despesas, bem como as despesas efetuadas pelo Banco Central Europeu (BCE).

3)      A Comissão Europeia suportará as suas próprias despesas.

Da Silva Passos

Gervasoni

Pynnä

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 10 de julho de 2024.

Assinaturas


*      Língua do processo: inglês.


1      Apenas são reproduzidos os números do presente acórdão cuja publicação o Tribunal Geral considera útil.