Language of document : ECLI:EU:C:2024:241

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

NICHOLAS EMILIOU

apresentadas em 14 de março de 2024 (1)

Processo C147/23

Comissão Europeia

contra

República da Polónia

«Incumprimento de Estado — Artigo 258.o TFUE — Proteção das pessoas que denunciam violações do direito da União — Diretiva (UE) 2019/1937 — Não transposição desta diretiva — Artigo 260.o, n.o 3, TFUE — Sanções financeiras — Sanção pecuniária compulsória — Quantia fixa — Método de cálculo aplicado pela Comissão para propor sanções financeiras ao Tribunal de Justiça — Coeficiente de gravidade — Não comunicação integral das medidas de transposição de uma diretiva — Aplicação sistemática de um coeficiente de 10 — Capacidade de pagamento do Estado‑Membro — Fator “n” — Tomada em consideração da dimensão da população do Estado‑Membro»






I.      Introdução

1.        Quando ao condutor de um veículo é aplicada uma coima por excesso de velocidade, é provável que parta do princípio de que o montante dessa coima refletirá a gravidade da violação e, portanto, será proporcional ao número de quilómetros por hora em que excedeu o limite de velocidade. Num cenário diferente, é possível que uma empresa à qual é aplicada uma coima por violação das regras da concorrência ou de proteção de dados pessoais da União espere (como exige o direito da União) (2) que o montante dessa coima tenha em conta, nomeadamente, a gravidade e a duração da infração, bem como a sua capacidade para pagar a coima com base no seu volume de negócios total. No entanto, nem o condutor nem a empresa, nestes dois exemplos, imaginariam que o montante da respetiva coima sofreria um aumento devido ao facto de o número de pessoas que constituem o seu agregado familiar ou o número de pessoas que empregam no momento da violação ser comparativamente mais elevado do que o do condutor médio ou o de outra empresa.

2.        Deve aplicar‑se uma lógica diferente quando são impostas sanções financeiras a um Estado‑Membro por não ter comunicado à Comissão Europeia as medidas necessárias para transpor uma diretiva? Pode o montante destas sanções depender da dimensão da população do Estado‑Membro?

3.        Trata‑se, em substância, de uma das questões essenciais do presente processo.

4.        Concretamente, esta questão coloca‑se no âmbito de um processo por infração instaurado pela Comissão, ao abrigo do artigo 258.o TFUE, contra a República da Polónia, com o fundamento de que esta não adotou nem comunicou à Comissão as medidas necessárias para transpor a Diretiva (UE) 2019/1937 relativa à proteção das pessoas que denunciam violações do direito da União (3) (a seguir «Diretiva Denunciantes»). A República da Polónia não nega este incumprimento. No entanto, contesta o montante das sanções financeiras que a Comissão propõe ao Tribunal de Justiça que aplique. A este respeito, questiona dois elementos dos métodos de cálculo aplicados pela Comissão. Na sua opinião, um destes elementos conduz sistematicamente a sanções financeiras mais elevadas para os Estados‑Membros que, como a Polónia, têm uma população mais numerosa do que outros.

5.        Neste contexto, o Tribunal de Justiça é chamado a interpretar o artigo 260.o, n.o 3, TFUE, cujo primeiro parágrafo habilita a Comissão a indicar o montante das sanções financeiras que considere adaptado quando propõe uma ação contra um Estado‑Membro ao abrigo do artigo 258.o do TFUE por não comunicação das medidas necessárias para transpor uma diretiva adotada de acordo com um processo legislativo.

II.    Quadro jurídico

1.      Diretiva Denunciantes

6.        O artigo 26.o da Diretiva Denunciantes prevê:

«1.      Os Estados‑Membros põem em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente diretiva até 17 de dezembro de 2021.

2.      Em derrogação do n.o 1, no que diz respeito a entidades jurídicas do setor privado com 50 a 249 trabalhadores, os Estados‑Membros põem em vigor, até 17 de dezembro de 2023, as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à obrigação de criar canais de denúncia interna ao abrigo do artigo 8.o, n.o 3.

3.      As disposições a que se referem os n.os 1 e 2, adotadas pelos Estados‑Membros, fazem referência à presente diretiva ou são acompanhadas dessa referência aquando da sua publicação oficial. Os Estados‑Membros estabelecem o modo como é feita a referência. Os Estados‑Membros comunicam imediatamente à Comissão o texto dessas disposições.»

2.      Comunicação de 2023 (4)

7.        A comunicação de 2023 contém os métodos de cálculo que a Comissão aplica quando propõe ao Tribunal de Justiça a aplicação de sanções financeiras no âmbito dos processos por infração. Estas sanções financeiras podem consistir numa sanção pecuniária compulsória ou numa quantia fixa ou em ambas.

8.        No ponto desta comunicação sob a epígrafe «Princípios gerais», a Comissão afirma que «considera que as sanções financeiras impostas devem basear‑se em três critérios fundamentais […]:

–        A gravidade da infração,

–        A sua duração;

–        A necessidade de assegurar o efeito dissuasivo da própria sanção financeira, para evitar reincidências.»

9.        O ponto 3.2.2 da comunicação de 2023 tem por epígrafe «Não comunicação das medidas de transposição (artigo 260.o, n.o 3, [TFUE])». O seu primeiro parágrafo prevê:

«Para as ações intentadas ao abrigo do artigo 260.o, n.o 3, do TFUE, a Comissão aplica sistematicamente um coeficiente de gravidade de 10 em caso de não comunicação integral das medidas de transposição. Numa União baseada no respeito pelo Estado de direito, todas as diretivas legislativas devem ser consideradas de igual importância e exigir uma transposição completa pelos Estados‑Membros nos prazos por elas fixados.»

10.      O ponto 3.4 da comunicação de 2023, que diz respeito às sanções pecuniárias compulsórias, tem por epígrafe «Capacidade de pagamento do Estado‑Membro». Dispõe:

«O montante da sanção pecuniária compulsória deve assegurar que a sanção seja simultaneamente proporcionada e dissuasiva. O efeito dissuasivo da sanção pecuniária compulsória reveste dois aspetos. A sanção deve ser suficientemente elevada no intuito de garantir que:

–        O Estado‑Membro põe termo à infração (deve, por conseguinte, ser superior ao benefício que o Estado‑Membro retira da infração);

–        O Estado‑Membro não repete a infração.

A fim de ter um efeito dissuasivo, o nível da sanção que se impõe variará em função da capacidade de pagamento dos Estados‑Membros. Este efeito dissuasivo reflete‑se no fator n.o Define‑se como uma média geométrica ponderada do produto interno bruto (PIB) […] do Estado‑Membro em causa em comparação com a média dos PIB dos Estados‑Membros, com uma ponderação equivalente a dois, e da população do Estado‑Membro em causa, em comparação com a média das populações dos Estados‑Membros, com uma ponderação equivalente a um. Esta fórmula representa a capacidade de pagamento do Estado‑Membro em causa em relação à capacidade de pagamento dos demais Estados‑Membros:

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[...]

[O] método de cálculo do fator n […] assenta doravante predominantemente no PIB dos Estados‑Membros e, em segundo lugar, na sua população enquanto critério demográfico que permite manter uma diferenciação razoável entre os diferentes Estados‑Membros. O facto de se ter em conta a população dos Estados‑Membros num terço do cálculo do fator n reduz, numa medida grau razoável, a variação dos fatores n dos Estados‑Membros, em comparação com um cálculo baseado exclusivamente no PIB dos Estados‑Membros. Introduz igualmente um elemento de estabilidade no cálculo do fator n, uma vez que é pouco provável que a população varie significativamente numa base anual. Em contrapartida, o PIB de um Estado‑Membro poderá registar oscilações anuais mais acentuadas, nomeadamente em períodos de crise económica. Ao mesmo tempo, uma vez que o PIB do Estado‑Membro continua a representar dois terços do cálculo, subsiste como fator predominante para efeitos da avaliação da sua capacidade de pagamento.»

11.      O ponto 4.2.2. da comunicação de 2023, que diz respeito às quantias fixas, tem por epígrafe «Outros elementos do método de cálculo da quantia fixa». Dispõe que, «[p]ara o cálculo da quantia fixa, a Comissão aplica o mesmo coeficiente de gravidade e o mesmo fator n fixo que para o cálculo da sanção pecuniária compulsória».

12.      Os fatores n para cada Estado‑Membro são estabelecidos no ponto 3 do anexo I da comunicação de 2023.

III. Procedimento précontencioso

13.      Em 27 de janeiro de 2022, a Comissão enviou uma notificação para cumprir à República da Polónia, alegando que esta não lhe tinha comunicado as medidas adotadas para transpor a Diretiva Denunciantes. Na sua resposta à notificação para cumprir, de 23 de março de 2022, a República da Polónia limitou‑se a indicar que essas medidas estavam em vias de adoção a nível nacional.

14.      Em 15 de julho de 2022, a Comissão enviou um parecer fundamentado à República da Polónia, no qual a convidava a dar cumprimento às obrigações que lhe incumbem por força da Diretiva Denunciantes no prazo de dois meses, a contar do dia da notificação formal do parecer fundamentado.

15.      Na sua resposta de 15 de setembro de 2022, a República da Polónia indicou que, tendo em conta a necessidade de uma consulta interministerial aprofundada sobre as questões abrangidas por esta diretiva, previa o encerramento dos trabalhos parlamentares em curso a nível nacional no final de 2022. Posteriormente, comunicou à Comissão que tencionava publicar as medidas destinadas a transpor a Diretiva Denunciantes em agosto de 2023.

16.      Em 15 de fevereiro de 2023, a Comissão decidiu instaurar um processo por incumprimento contra a República da Polónia no Tribunal de Justiça, em aplicação do artigo 258.o, segundo parágrafo, TFUE.

IV.    Tramitação processual no Tribunal de Justiça e pedidos das partes

17.      Na sua petição, apresentada em 10 de março de 2023, a Comissão conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

–        declarar que, ao não adotar as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para transpor a Diretiva Denunciantes, ou ao não ter comunicado as referidas disposições à Comissão, a República da Polónia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força desta diretiva;

–        condenar a República da Polónia no pagamento à Comissão:

a)      de uma quantia fixa correspondente a um dos dois montantes seguintes, consoante o que for mais elevado:

–        13 700 euros por dia a contar da data do termo do prazo de transposição da Diretiva Denunciantes até à data em que for posto termo à alegada infração ou, se a infração persistir, até à data da prolação do acórdão no presente processo;

–        um montante mínimo de 3 836 000 euros;

b)      no caso de a alegada infração persistir até à data da prolação do acórdão no presente processo, uma sanção pecuniária compulsória de 53 430 euros por dia de atraso no cumprimento das obrigações por força da Diretiva Denunciantes, a contar da data da prolação desse acórdão e até à data em que essas obrigações sejam cumpridas;

–        condenar a República da Polónia nas despesas.

18.      A República da Polónia, tendo sido devidamente notificada da petição inicial, apresentou a sua contestação em 31 de maio de 2023. Pede ao Tribunal de Justiça que se digne:

–        julgar a ação improcedente na sua totalidade;

–        a título subsidiário, não a condenar no pagamento de uma quantia fixa e de uma sanção pecuniária compulsória;

–        a título ainda mais subsidiário, reduzir substancialmente o valor dos montantes propostos pela Comissão para estas sanções financeiras;

–        condenar a Comissão no pagamento das despesas.

19.      As partes no presente processo foram convidadas pelo Tribunal de Justiça a apresentar uma segunda série de observações escritas. A réplica e a tréplica foram apresentadas, respetivamente, em 3 de julho de 2023 e em 9 de agosto de 2023.

20.      Não foi realizada audiência.

V.      Análise

21.      O legislador da União adotou a Diretiva Denunciantes em 2019, depois de uma série de revelações em toda a União (incluindo, sobretudo, as relativas ao «escândalo Lux Leaks») (5) terem atraído significativamente a atenção do público e dos meios de comunicação social, demonstrando a necessidade de legislação da União neste domínio. Esta diretiva visa assegurar um nível de proteção «equilibrado e eficaz» às pessoas que denunciam violações do direito da União sobre as quais obtêm informações em contexto profissional e que são «lesivas do interesse público» (6). Como dispõe o seu artigo 1.o, tem por objetivo «reforçar a aplicação do direito e das políticas da União» em certos domínios específicos que se revestem de importância para o interesse público, estabelecendo normas mínimas comuns para um «nível elevado de proteção» dessas pessoas (7).

22.      Os Estados‑Membros estavam obrigados, por força do artigo 26.o, n.o 1, da Diretiva Denunciantes, a adotar as «disposições legislativas, regulamentares e administrativas» necessárias para dar cumprimento a esta diretiva até 17 de dezembro de 2021 (8). Estavam igualmente obrigados, por força do n.o 3 deste artigo, a incluir nessas medidas de transposição uma referência à Diretiva Denunciantes. Além disso, tinham de comunicar essas medidas à Comissão (como devem geralmente fazer, relativamente a todas as diretivas).

23.      O presente processo faz parte de uma série de seis processos (9) relativos ao alegado incumprimento dessas obrigações por parte de vários Estados‑Membros.

24.      Como já observei supra, na introdução, o presente processo tem por objeto, em substância, um «manquement non contesté» (incumprimento não contestado). Com efeito, a República da Polónia não contesta que não transpôs a Diretiva Denunciantes para o direito polaco. Também não contesta que, por maioria de razão, não comunicou nenhuma medida de transposição à Comissão. No entanto, apresenta várias justificações para esse incumprimento. Além disso, contesta o montante das sanções financeiras que a Comissão propõe que o Tribunal de Justiça aplique.

25.      Começarei por explicar por que razão as justificações invocadas pela República da Polónia podem, a meu ver, ser facilmente rejeitadas pelo Tribunal de Justiça (A). Seguidamente, debruçar‑me‑ei sobre as críticas que este Estado‑Membro dirige ao montante das sanções financeiras propostas pela Comissão no presente processo e, mais concretamente, sobre os métodos aplicados pela Comissão para calcular este montante, conforme detalhados na comunicação de 2023 (B). Esta questão assume importância para os seis processos referidos supra, no n.o 23, bem como, de um modo mais geral, para todos os processos em que a Comissão indique o montante das sanções financeiras que propõe que o Tribunal de Justiça aplique no âmbito de processos por infração.

A.      Quanto às justificações apresentadas pela República da Polónia para a não transposição da Diretiva Denunciantes

1.      Argumentos das partes

26.      A República da Polónia apresenta, em substância, três justificações para a não transposição e, consequentemente, para a não comunicação das medidas necessárias para transpor a Diretiva Denunciantes para o direito polaco no prazo fixado no artigo 26.o, n.o 1, desta diretiva.

27.      Em primeiro lugar, explica que, devido ao amplo âmbito de aplicação da Diretiva Denunciantes e ao seu impacto significativo numa vasta gama de setores, foi necessário um processo de consulta mais longo ao nível nacional. Muitas partes interessadas foram incentivadas ou solicitaram a apresentação de observações no decurso desse processo de consulta. Algumas das dúvidas expressas por estas partes interessadas nas suas observações exigiram uma análise aprofundada adicional, atrasando assim a adoção das medidas de transposição da referida diretiva.

28.      A segunda e a terceira justificações apresentadas pela República da Polónia estão relacionadas com a pandemia de COVID‑19 e com o conflito militar em curso na Ucrânia. Por um lado, a República da Polónia explica que a pandemia de COVID‑19 tornou mais difícil a organização de reuniões presenciais e a realização do processo de consulta. Afirma igualmente que teve de ser dada prioridade a outra legislação, mais premente, relacionada com a gestão e a contenção da pandemia de COVID‑19.

29.      Por outro lado, a República da Polónia observa que o Ministério da Família e da Política Social (que era responsável pela transposição da Diretiva Denunciantes para o direito polaco) teve de desempenhar um papel fundamental na adoção de disposições nacionais relativas à integração dos refugiados ucranianos no sistema polaco de segurança social e às suas condições de acolhimento na Polónia, na sequência do despoletar da guerra na Ucrânia. A necessidade de tomar medidas rápidas e de mobilizar recursos para estas questões atrasou ainda mais a transposição da Diretiva Denunciantes para o direito polaco.

30.      Tendo em conta estes elementos, a República da Polónia alega que a não transposição da Diretiva Denunciantes não resulta de uma falha do seu processo legislativo, mas da necessidade de dar prioridade a outras questões urgentes de saúde, segurança e ordem públicas.

31.      A Comissão não aceita as justificações apresentadas pela República da Polónia.

32.      Em primeiro lugar, considera que a República da Polónia não pode invocar a complexidade da Diretiva Denunciantes para justificar o seu atraso na transposição desta diretiva para o direito nacional. A complexidade de um ato legislativo da União não constitui um obstáculo «anormal ou imprevisível» ao cumprimento das obrigações dos Estados‑Membros em matéria de transposição das diretivas. Os Estados‑Membros também não podem invocar dificuldades enfrentadas durante o processo de consulta a nível nacional para justificar a não transposição de uma diretiva.

33.      Em segundo lugar, a Comissão considera que a República da Polónia não pode alegar que a não transposição da Diretiva Denunciantes no prazo fixado no artigo 26.o, n.o 1, desta diretiva se deveu à pandemia de COVID‑19. A pandemia só pode servir de justificação em duas situações: primeiro, quando o ato da União em causa permite derrogações ou exceções devido a dificuldades relacionadas com a pandemia ou, segundo, quando estão preenchidos os requisitos para a defesa com base em força maior (dificuldades inultrapassáveis). Segundo a Comissão, nenhuma destas situações se aplica no caso em apreço.

34.      Por último, a Comissão observa que o conflito militar em curso na Ucrânia teve início em 24 de fevereiro de 2022, ou seja, após o termo do prazo de transposição da Diretiva Denunciantes. Por conseguinte, alega que a República da Polónia não pode invocar as consequências deste conflito para justificar a não transposição da referida diretiva no prazo fixado no artigo 26.o, n.o 1, da mesma. Em todo o caso, estas consequências são demasiado indiretas ou remotas para a defesa com base em força maior.

2.      Apreciação

35.      As três justificações apresentadas pela República da Polónia no presente processo não são, de modo algum, novas ou invulgares. Na minha opinião, podem ser rejeitadas sem grande dificuldade.

36.      Como indica a Comissão, o Tribunal de Justiça já declarou, por diversas vezes, que um Estado‑Membro não pode invocar disposições, práticas ou situações da sua ordem jurídica interna (ou seja, dificuldades internas) para justificar a não observância das obrigações e prazos fixados por uma diretiva (10). Em especial, é indiferente que o incumprimento desse Estado‑Membro seja o resultado de debates políticos (11) ou seja devido à necessidade de realizar processos de consulta a nível nacional (12).

37.      Além disso, o Tribunal de Justiça tem rejeitado constantemente as justificações baseadas na alegada complexidade da diretiva em causa (13). A este respeito, sublinhou que, se o prazo de transposição de uma diretiva se revelar demasiado curto, o único meio de ação, compatível com o direito da União e de que dispõe o Estado‑Membro em causa, consiste em obter uma prorrogação do prazo junto da instituição competente da União (14).

38.      À luz desta jurisprudência, parece‑me ser perfeitamente evidente que a República da Polónia não pode invocar dificuldades decorrentes do amplo âmbito de aplicação da Diretiva Denunciantes, da sua complexidade ou das dúvidas suscitadas por certas partes interessadas e do seu impacto na duração do processo de consulta a nível nacional para justificar a não transposição deste instrumento (primeira justificação).

39.      Quanto à segunda justificação apresentada pela República da Polónia, que sustenta, em substância, que a situação desfavorável relacionada com a pandemia de COVID‑19 a impediu de transpor a Diretiva Denunciantes no prazo fixado, observo que esta diretiva foi adotada pelo legislador da União apenas alguns meses antes de surgirem os primeiros casos de COVID‑19.

40.      Posso facilmente admitir, como o Tribunal de Justiça fez noutros casos (15), que uma crise sanitária de uma dimensão como a da pandemia de COVID‑19 seja alheia aos Estados‑Membros, bem como anormal e imprevisível. Todavia, na minha opinião, isso não significa que a República da Polónia possa invocar a ocorrência da pandemia de COVID‑19 para apresentar uma defesa com base em força maior no presente processo, isentando‑a das obrigações que lhe incumbem por força do artigo 26.o da Diretiva Denunciantes.

41.      É verdade que o Tribunal de Justiça admitiu, por princípio, a força maior como fundamento de defesa, incluindo em casos de não transposição de uma diretiva (16). No entanto, essa defesa só pode ter vencimento se existirem «circunstâncias estranhas» que tornem «impossível» a adoção das medidas de transposição pertinentes. Embora esta definição não pressuponha uma «impossibilidade absoluta», exige, contudo, «dificuldades anormais» que surjam como «inevitáveis, ainda que sejam desenvolvidos todos os esforços adequados» (17). Trata‑se de um limiar elevado que limita claramente os casos em que os Estados‑Membros podem invocar com sucesso um fundamento de defesa baseado em força maior. Além disso, tal fundamento de defesa deixa de estar à disposição de um Estado‑Membro se o período da sua inação ultrapassar o momento em que os efeitos dessas circunstâncias estranhas desapareceram (18).

42.      A este respeito, parece‑me que o facto de ter sido necessário dar prioridade às propostas legislativas relativas à gestão e à contenção da pandemia de COVID‑19 e de a organização de reuniões presenciais para a transposição da Diretiva Denunciantes ter simplesmente sido dificultada durante esse período não sujeitou a adoção das medidas necessárias para transpor esta diretiva a «dificuldades anormais», que não podiam ser evitadas mesmo que fossem tomadas todas as precauções necessárias, pelo menos, certamente não durante todo o período relevante.

43.      Relembro que o artigo 26.o, n.o 1, da Diretiva Denunciantes obrigava os Estados‑Membros a adotarem as «disposições legislativas, regulamentares e administrativas» necessárias para dar cumprimento a esta diretiva até 17 de dezembro de 2021, ou seja, cerca de um ano e nove meses após o início da pandemia de COVID‑19. A República da Polónia beneficiou de um período adicional de nove meses (correspondente ao período compreendido entre o termo desse prazo e o termo do prazo de dois meses estabelecido no parecer fundamentado da Comissão) para dar cumprimento a esta obrigação, mas ainda não o fez. Na data em que o presente processo foi instaurado pela Comissão, a República da Polónia ainda não tinha adotado as medidas necessárias para transpor este instrumento.

44.      Não é necessário ser um especialista do funcionamento interno de um governo para observar que as alterações às prioridades da agenda legislativa ou das agendas dos ministérios são bastante comuns. Esta observação é válida mesmo quando os acontecimentos que conduzem a essas alterações (como o surto de um vírus) são, quanto a eles, imprevisíveis. Na sequência da fundamentação do Acórdão Comissão/Itália (19), no qual o Tribunal de Justiça recordou que a defesa baseada em «força maior» exige que a falta da prática do ato em causa seja imputável a circunstâncias anormais e imprevisíveis (pelo que esse fundamento de defesa não é invocável se uma pessoa diligente e prudente pudesse ter tomado as medidas necessárias para evitar as consequências decorrentes dessas circunstâncias), entendo que, mesmo antes do termo do prazo fixado no artigo 26.o, n.o 1, da Diretiva Denunciantes, a República da Polónia poderia ter atenuado as perturbações causadas pela pandemia de COVID‑19 e tomado as precauções necessárias para assegurar que a questão da transposição da referida diretiva fosse ainda assim tratada. Além disso, poderia ter encontrado alternativas às reuniões presenciais.

45.      Nestas condições, as circunstâncias invocadas pela República da Polónia parecem‑me resultar de «dificuldades internas», e não de um caso de força maior (20). A conclusão inversa, que me parece dificilmente defensável, significaria que os Estados‑Membros estariam, no essencial, exonerados da obrigação de adotar medidas de transposição de qualquer diretiva cujo prazo de transposição se sobrepusesse, de alguma forma, ao período da pandemia de COVID‑19.

46.      A terceira justificação apresentada pela República da Polónia, que diz respeito ao impacto da guerra na Ucrânia, também não me convence. Como a Comissão indica, a guerra na Ucrânia teve início em fevereiro de 2022, tendo o prazo estabelecido no artigo 26.o°, n.o 1, da Diretiva Denunciantes terminado em 17 de dezembro de 2021 (antes do início dessa guerra). Daqui resulta, na minha opinião, que a República da Polónia não pode justificar a não transposição da Diretiva Denunciantes no prazo fixado por esta disposição invocando o impacto desse conflito.

47.      Evidentemente, não se pode excluir que a guerra na Ucrânia possa ter tido depois impacto na capacidade da República da Polónia de cumprir a sua obrigação de transpor a Diretiva Denunciantes e de comunicar à Comissão as medidas de transposição pertinentes. Todavia, mesmo no que respeita a esse período, que é posterior ao início deste conflito, sou reticente em aceitar a terceira justificação apresentada pela República da Polónia.

48.      Com efeito, os argumentos da República da Polónia a este respeito são, no mínimo, bastante frágeis. De facto, este Estado‑Membro não alega mais nada a não ser o facto de que a adoção das medidas de transposição sofreu um atraso ainda maior durante esse período posterior porque o Ministério da Família e da Política Social teve de dar prioridade às propostas relativas à integração dos refugiados ucranianos no sistema de segurança social polaco e às condições do seu acolhimento na Polónia. Este argumento deve, na minha opinião, ser rejeitado pelas mesmas razões que as expostas supra, nos n.os 44 e 45. A este respeito, observo que a República da Polónia não explica, por exemplo, por que razão não pôde outro ministério assegurar a transposição desta diretiva, quando o Ministério da Família e da Política Social não o pôde fazer.

49.      Nestas condições, nenhuma das três justificações apresentadas pela República da Polónia me convence.

B.      Quanto ao montante das sanções financeiras e aos métodos de cálculo aplicados pela Comissão

50.      A questão essencial do presente processo diz respeito à interpretação do artigo 260.o, n.o 3, TFUE e aos métodos de cálculo aplicados pela Comissão para determinar o montante das sanções financeiras que propõe que o Tribunal de Justiça imponha em aplicação desta disposição.

51.      O artigo 260.o, n.o 3, TFUE foi descrito pela Comissão como um «instrumento inovador» introduzido pelo Tratado FUE «com o objetivo de dar uma resposta efetiva ao fenómeno generalizado da transposição tardia das diretivas» (21). Em conformidade com o seu primeiro parágrafo, «[q]uando propuser uma ação no Tribunal ao abrigo do artigo 258.o [TFUE], por considerar que o Estado‑Membro em causa não cumpriu a obrigação de comunicar as medidas de transposição de uma diretiva adotada de acordo com um processo legislativo, a Comissão pode, se o considerar adequado, indicar o montante da quantia fixa ou da sanção pecuniária compulsória, a pagar por esse Estado, que considere adaptado às circunstâncias» (22).

52.      O artigo 260.o, n.o 3, segundo parágrafo, TFUE indica que, se o Tribunal de Justiça concluir pela existência desse incumprimento, pode condenar o Estado‑Membro em causa ao pagamento de uma quantia fixa ou sanção pecuniária compulsória.

53.      Como o Tribunal de Justiça declarou, esta disposição tem essencialmente uma dupla função. Por um lado, visa conferir prerrogativas específicas à Comissão com vista a assegurar a aplicação efetiva do direito da União. Por outro lado, visa colocar o Tribunal de Justiça em posição de exercer a sua função jurisdicional que consiste em apreciar, no âmbito de um único processo, se o Estado‑Membro em causa cumpriu as suas obrigações em matéria de comunicação das medidas de transposição da diretiva em causa e, sendo caso disso, aplicar as sanções pecuniárias que considere mais adequadas (23).

54.      Em meu entender, há dois aspetos do artigo 260.o, n.o 3, TFUE que merecem mais atenção.

55.      Em primeiro lugar, o Tribunal de Justiça esclareceu que a aplicação do artigo 260.o, n.o 3, TFUE não pode ser considerada isoladamente, mas deve ser associada à propositura de um processo por incumprimento, nos termos do artigo 258.o TFUE (24). Dito de uma forma simples, o «valor acrescentado» do artigo 260.o, n.o 3, TFUE é que, contrariamente às infrações abrangidas unicamente pelo âmbito de aplicação do artigo 258.o TFUE, as infrações às quais se aplicam as duas disposições não exigem um segundo processo distinto para a aplicação de sanções financeiras (25). Com efeito, o artigo 260.o, n.o 3, TFUE permite que o Tribunal de Justiça condene ao pagamento de uma quantia fixa e/ou de uma sanção pecuniária compulsória no mesmo acórdão em que conclui pela existência de um incumprimento da obrigação de comunicar as medidas de transposição. É por esse motivo que o Tribunal de Justiça descreveu o objetivo prosseguido pela introdução do mecanismo que figura no artigo 260.o, n.o 3, TFUE como sendo não apenas incentivar os Estados‑Membros a pôr termo, o mais rapidamente possível, ao incumprimento dessa obrigação mas também aligeirar e acelerar o processo de aplicação de sanções pecuniárias (26).

56.      Em segundo lugar, a Comissão afirmou que os métodos de cálculo que aplica neste âmbito são, no essencial, os mesmos que os previstos no artigo 260.o, n.o 2, TFUE. Esta última disposição habilita a Comissão a propor, e o Tribunal de Justiça a ordenar, sanções financeiras numa situação distinta, a saber, quando um Estado‑Membro não toma as medidas necessárias à execução do acórdão do Tribunal de Justiça (27). No entanto, dado que os mesmos tipos de sanções podem, no essencial, ser impostos ao abrigo das duas disposições e que a apreciação a este respeito deve ser orientada pelos mesmos princípios, o Tribunal de Justiça confirmou a abordagem da Comissão e declarou que a jurisprudência relativa ao artigo 260.o, n.o 2, TFUE se aplica por analogia ao artigo 260.o, n.o 3, TFUE (28).

57.      Esta declaração está, contudo, sujeita a uma ressalva: o poder de apreciação do Tribunal de Justiça ao abrigo desta última disposição está sujeito a uma limitação que não tem equivalente por força do artigo 260.o, n.o 2, TFUE. Com efeito, embora, ao abrigo de ambas as disposições, o Tribunal de Justiça possa afastar‑se das propostas da Comissão, o artigo 260.o, n.o 3, TFUE (contrariamente ao artigo 260.o, n.o 2, TFUE) prevê que o montante das sanções financeiras decididas em última instância pelo Tribunal de Justiça não pode exceder o montante indicado pela Comissão (29).

58.      Feitos estes esclarecimentos, recordo que a Comissão descreve dois métodos de cálculo distintos na comunicação de 2023: um para as quantias fixas e outro para as sanções pecuniárias compulsórias. São aplicadas quantias fixas para sancionar a continuação da infração do Estado‑Membro até à prolação do acórdão do Tribunal de Justiça ou até à plena conformidade, se tal ocorrer antes. As sanções pecuniárias compulsórias visam, quanto a elas, incentivar o Estado‑Membro a pôr termo à infração o mais rapidamente possível após a prolação do acórdão do Tribunal de Justiça e só se justificam, em princípio, se o incumprimento tiver persistido até à apreciação dos factos pelo Tribunal de Justiça (30).

59.      Os dois métodos baseiam‑se na multiplicação de um montante fixo por três elementos. Os dois primeiros elementos representam a gravidade da infração (refletida por um coeficiente de gravidade) e a sua duração (refletida por um coeficiente de duração ou pelo número de dias durante os quais a infração perdurou ou perdura). O terceiro é descrito pela Comissão como o «fator n que reflete a capacidade de pagamento do Estado‑Membro em causa».

60.      Como indiquei supra, no n.o 17, no presente processo, a Comissão calculou o montante da quantia fixa como sendo um dos dois montantes seguintes: 13 700 euros por dia a contar da data do termo do prazo de transposição da Diretiva Denunciantes até à data em que for posto termo à alegada infração ou, se a infração persistir, até à data da prolação do acórdão no presente processo ou um montante mínimo de 3 836 000 euros, consoante o que for mais elevado. Esta instituição pede igualmente ao Tribunal de Justiça que condene a República da Polónia no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de 53 430 euros por dia de atraso no cumprimento das obrigações por força da Diretiva Denunciantes, a contar da data da prolação desse acórdão e até à data em que essas obrigações sejam cumpridas.

61.      A República da Polónia alega que estas sanções são excessivas e desproporcionadas. Concretamente, discorda de dois elementos dos métodos de cálculo aplicados pela Comissão, descritos na comunicação de 2023: por um lado, o coeficiente de gravidade, que, em conformidade com as orientações enunciadas na referida comunicação, é o mesmo em todas as situações de não comunicação integral, pelo Estado‑Membro em causa, das medidas necessárias para transpor uma diretiva (1), e, por outro, o fator «n», que se baseia, em parte, na dimensão da população do Estado‑Membro (2). As questões suscitadas pela República da Polónia relativamente a estes dois elementos não se limitam ao presente processo, mas põem em causa a adequação dos métodos de cálculo estabelecidos pela Comissão na comunicação de 2023 no seu conjunto. Começarei por abordar estas questões mais gerais, antes de me pronunciar sobre o caráter excessivo ou desproporcionado do montante das sanções financeiras indicadas pela Comissão no presente processo (3).

1.      Questão geral (i): o coeficiente de gravidade aplicado pela Comissão

a)      Argumentos das partes

62.      A Comissão recorda que o coeficiente de gravidade, que reflete a gravidade da infração, é fixado num valor compreendido entre 1 e 20. Acrescenta que, como indica a comunicação de 2023, aplica «sistematicamente» um coeficiente de 10 nos processos relativos a um incumprimento integral da obrigação de comunicar as medidas de transposição. Ora, o presente processo tem por objeto um incumprimento integral. Por conseguinte, a Comissão aplicou um coeficiente de gravidade de 10.

63.      A Comissão explica que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça (31), a obrigação de transpor as diretivas e de comunicar as medidas de transposição à Comissão constitui uma «obrigação essencial», que contribui para assegurar a efetividade do direito da União. Os casos de incumprimentos integrais desta obrigação devem ser considerados «de uma certa gravidade». Isto justifica, segundo a Comissão, a aplicação sistemática de um coeficiente de gravidade de 10 em todos esses processos.

64.      A Comissão afirma ainda que todas as diretivas adotadas de acordo com um processo legislativo devem ser consideradas de igual importância e exigem uma transposição completa pelos Estados‑Membros nos prazos nelas indicados. Em seu entender, a natureza da diretiva em causa não deve ter impacto na determinação do coeficiente de gravidade.

65.      A Comissão alega igualmente que a aplicação sistemática de um coeficiente de gravidade de 10 em todos os processos relativos a um incumprimento integral da obrigação de comunicação das medidas de transposição reforça a segurança jurídica. Essa aplicação sistemática torna igualmente mais previsíveis as sanções financeiras propostas pela Comissão e garante a igualdade de tratamento entre os Estados‑Membros.

66.      Além disso, a Comissão considera que a aplicação deste coeficiente é, em todo o caso, justificada no presente processo. A este respeito, sustenta, em primeiro lugar, que a Diretiva Denunciantes desempenha um papel fundamental para facilitar a aplicação efetiva do direito da União em vários domínios importantes e que, por conseguinte, a não transposição desta diretiva pode ter consequências noutros atos do direito da União (os adotados nos domínios abrangidos pelo âmbito de aplicação material da referida diretiva). Em segundo lugar, alega que a falta de proteção efetiva dos denunciantes num Estado‑Membro pode afetar a proteção dos seus direitos fundamentais, o que reforça a gravidade da infração. Em terceiro lugar, a Comissão não tem conhecimento de nenhuma disposição de direito polaco que prossiga os mesmos objetivos que a Diretiva Denunciantes ou que reflita o seu conteúdo. Em quarto lugar, o facto de a República da Polónia ter cooperado com a Comissão durante o procedimento pré‑contencioso não atenua o seu incumprimento.

67.      A República da Polónia alega que a aplicação sistemática de um coeficiente de gravidade de 10 em todos os processos relativos a um incumprimento integral da obrigação de comunicação das medidas de transposição permite à Comissão contornar a sua obrigação de proceder, em todos os casos, a uma apreciação aprofundada da gravidade da alegada infração.

68.      Em especial, a República da Polónia sustenta que, no presente processo, a Comissão não teve em conta o facto de o direito polaco já conferir uma certa forma de proteção aos denunciantes e de a não transposição da diretiva relativa à proteção dessas pessoas ter, por conseguinte, um impacto limitado nos interesses que este instrumento visa proteger. Em seu entender, este facto deve ser considerado um fator atenuante na determinação do coeficiente de gravidade; caso contrário, o coeficiente aplicado pela Comissão basear‑se‑ia apenas nos efeitos potenciais da infração (por oposição às suas consequências reais).

69.      A República da Polónia também observa que o facto de um Estado‑Membro cooperar lealmente (como fez) com a Comissão durante o procedimento pré‑contencioso constitui também um fator atenuante (32).

b)      Apreciação

70.      O Tribunal de Justiça esclareceu que as sanções financeiras aplicadas aos Estados‑Membros em caso de incumprimento das obrigações que lhes incumbem por força do direito da União devem ser «adaptadas às circunstâncias» e «proporcionadas à [infração] e à capacidade de pagamento do Estado‑Membro em causa» (33). A Comissão refere que teve devidamente em conta estas exigências na comunicação de 2023 (34).

71.      Tendo em conta estes elementos, entendo que o coeficiente de gravidade aplicado pela Comissão visa, especificamente, garantir que o montante das quantias fixas e/ou das sanções pecuniárias compulsórias indicadas pela Comissão ao abrigo do artigo 260.o, n.o 3, TFUE seja proporcional à gravidade da infração, apreciada à luz das circunstâncias pertinentes. De facto, trata‑se do único elemento dos métodos de cálculo estabelecidos na comunicação de 2023 que pode refletir a gravidade da infração (35).

72.      É neste contexto que deve ser abordada a questão de saber se a Comissão pode sistematicamente aplicar um coeficiente de gravidade de 10 sempre que a alegada infração, com base na qual propõe ao Tribunal de Justiça a imposição de sanções financeiras em aplicação do artigo 260.o, n.o 3, TFUE, consista num incumprimento integral da obrigação de comunicação das medidas de transposição. Esta questão nunca foi examinada pelo Tribunal de Justiça. Com efeito, antes da comunicação de 2023, a Comissão não aplicava sistematicamente o mesmo coeficiente nestas situações (36).

73.      Por uma questão de clareza, recordo que o artigo 260.o, n.o 3, TFUE é aplicável quando «o Estado‑Membro em causa não cumpriu a obrigação de comunicar as medidas de transposição de uma diretiva adotada de acordo com um processo legislativo». O âmbito de aplicação desta disposição não se limita, portanto, aos casos de incumprimento integral da obrigação de «comunicar», mas abrange situações em que um Estado‑Membro comunica parcial ou incorretamente as medidas de transposição. No entanto, embora a Comissão não refira, na comunicação de 2023, qual o coeficiente de gravidade que deve ser aplicado nesse segundo cenário (37), indica que aplica sistematicamente um coeficiente de 10 no primeiro.

74.      Como explicarei mais adiante, considero que essa abordagem é adequada (e compatível com o princípio da proporcionalidade) se e apenas se se puder considerar que todas as infrações a que se refere apresentam o mesmo grau de gravidade em relação, por um lado, a outros tipos de infrações e, por outro, entre si. No entanto, na minha opinião, não é o que sucede aqui.

1)      Primeira razão: os casos de incumprimento integral da obrigação de adotar e, portanto, de comunicar as medidas de transposição não são necessariamente mais graves do que outros tipos de infrações

75.      Hipoteticamente, a abordagem adotada pela Comissão (que consiste em aplicar sistematicamente um coeficiente de gravidade de 10) poderia cobrir dois tipos de situações: em primeiro lugar, quando o Estado‑Membro em causa adotou as medidas de transposição necessárias (no todo ou em parte), mas simplesmente não as comunicou, e, em segundo lugar, quando esse Estado‑Membro não transpôs completamente a diretiva em questão.

76.      A este respeito, recordo que, como explicou o advogado‑geral M. Szpunar, a obrigação a que se refere o artigo 260.o, n.o 3, TFUE não é a de adotar medidas de transposição, mas a de as notificar (38). Daqui resulta que o facto de um Estado‑Membro não «comunicar» as medidas de transposição (por oposição à não adoção integral de tais medidas) é suficiente para desencadear a aplicação do artigo 260.o, n.o 3, TFUE.

77.      Dito isto, posso facilmente admitir (como a Comissão também parece fazer) que o primeiro cenário é, na prática, pouco provável. Com efeito, na maior parte das situações (senão todas), a razão pela qual um Estado‑Membro não comunica as medidas de transposição é porque também não adotou tais medidas. É, de facto, difícil imaginar por que razão um Estado‑Membro que «fez corretamente o seu trabalho» e adotou as medidas necessárias para transpor uma diretiva não as comunicaria à Comissão. Assim, parece‑me evidente que, quando esta instituição fala de casos de não «comunica[ção]» integral, tem em mente o incumprimento integral da obrigação de transposição (e não, pura e simplesmente, o incumprimento integral da obrigação de comunicar), em conformidade com a sua perceção do artigo 260.o, n.o 3, TFUE, como disposição que introduz um mecanismo destinado a dar «uma resposta efetiva ao fenómeno generalizado da transposição tardia das diretivas» (39).

78.      Nesses casos, o Estado‑Membro em causa é efetivamente responsável por uma dupla infração. Não só não comunicou as medidas de transposição como não adotou tais medidas (sendo o primeiro incumprimento uma consequência do segundo).

79.      À primeira vista, a existência dessa dupla infração pode, com efeito, parecer, como sustenta a Comissão, bastante grave. Contudo, é aí que se torna evidente a fraqueza da solução «única para todos os casos» da Comissão: é claramente demasiado simplista. De acordo com esta abordagem, a Comissão «seleciona» um tipo de incumprimento (o incumprimento integral da obrigação de adotar e, portanto, de comunicar as medidas de transposição) como sendo intrinsecamente mais grave do que outros tipos de infrações, nomeadamente muitas das abrangidas pelo artigo 260.o, n.o 2, TFUE. Ao fazê‑lo, menospreza o facto de isso não ser necessariamente o caso (40).

80.      Para ilustrar este ponto, pode referir‑se a não transposição, pela República Checa, de determinadas disposições da Diretiva 2003/41/CE relativa às atividades e à supervisão das instituições de realização de planos de pensões profissionais (41), que o Tribunal de Justiça examinou no seu Acórdão Comissão/República Checa (42). Deixando de parte o facto de o incumprimento ter sido parcial, e não integral, foi igualmente benigno. Com efeito, a atividade que estas disposições regulavam (no caso concreto, os planos de pensões profissionais) não existia na República Checa. Inversamente, o incumprimento declarado pelo Tribunal de Justiça no seu Acórdão Comissão/França (43), que teve por objeto o incumprimento, pela República Francesa, de certas obrigações de controlo das atividades de pesca dos navios franceses (infração que se enquadra no âmbito de aplicação do atual artigo 260.o, n.o 2, TFUE), foi muito mais grave em termos das consequências que teve para os interesses públicos e privados afetados (44).

2)      Segunda razão: os casos de incumprimento integral da obrigação de adotar e, portanto, de comunicar as medidas de transposição apresentam graus de gravidade diferentes

81.      A segunda razão pela qual considero que a abordagem da Comissão não é adequada é que não se pode afirmar que os casos de incumprimento integral da obrigação de adotar e, portanto, de comunicar as medidas de transposição abrangidas pelo artigo 260.o, n.o 3, TFUE têm, eles próprios, todos a mesma gravidade.

82.      Pouco tempo após a introdução desta nova disposição pelo Tratado FUE, a Comissão explicou que o seu objetivo consistia em incentivar a transposição atempada das diretivas pelos Estados‑Membros, que referiu com sendo de «importância crucial», não só por uma questão de «salvaguarda dos interesses gerais» prosseguidos pela legislação da União mas também, e acima de tudo, por uma questão de proteção dos cidadãos da União que beneficiam de direitos subjetivos dessa legislação (45).

83.      Posteriormente, o Tribunal de Justiça reconheceu expressamente que, no âmbito da aplicação do artigo 260.o, n.o 3, TFUE, a condenação no pagamento de uma quantia fixa deve assentar (como é também o caso ao abrigo do artigo 260.o, n.o 2, TFUE) na apreciação das «consequências […] para os interesses privados e públicos» do incumprimento pelo Estado‑Membro em causa das suas obrigações (46). As mesmas considerações (bem como a urgência em levar o Estado‑Membro em causa a cumprir as suas obrigações) são pertinentes para a determinação do montante de uma sanção pecuniária compulsória (47).

84.      A meu ver, a decisão da Comissão, na comunicação de 2023, de aplicar sistematicamente o mesmo coeficiente de gravidade de 10 a todos os casos em que um Estado‑Membro não adota e, portanto, não «comunica» integralmente à Comissão as medidas de transposição está em contradição com esta abordagem e jurisprudência anteriores. Passarei a explicar esta observação.

85.      Nesse documento, a Comissão justifica a sua nova abordagem afirmando que «todas as diretivas legislativas devem ser consideradas de igual importância e exigir uma transposição completa pelos Estados‑Membros nos prazos por elas fixados» (48). Acrescenta que a «importância de assegurar a transposição das diretivas legislativas pelos Estados‑Membros dentro dos prazos fixados por essas diretivas [se aplica] igualmente a todas as diretivas legislativas (49)». Pelo contrário explica que, no caso de incumprimento parcial (e não integral) da obrigação de comunicação das medidas de transposição, o coeficiente de gravidade é fixado num nível inferior a 10, sendo devidamente tidos em conta os efeitos da infração sobre os «interesses gerais e particulares».

86.      Com base nestas declarações, concluo que a Comissão considera que, no âmbito da aplicação do artigo 260.o, n.o 3, TFUE, a questão de saber quais os interesses e direitos específicos que são afetados pela infração é somente pertinente nos processos diferentes daqueles que dizem respeito a um incumprimento integral da obrigação de comunicar a medida de transposição.

87.      Fica, assim, uma questão por resolver: se, como alega a Comissão, o derradeiro objetivo das sanções financeiras que pode propor que o Tribunal de Justiça imponha em aplicação do artigo 260.o, n.o 3, TFUE é a «proteção dos interesses gerais» prosseguidos pela legislação da União e dos «direitos subjetivos dos cidadãos da União», como pode o montante dessas sanções não ser adaptado em função da medida em que esses interesses e direitos são ou podem eventualmente ser afetados pela infração em todos os casos abrangidos por esta disposição?

88.      A este respeito, já observei supra, no n.o 21, que é admitido de um modo geral (como ilustra, a título exemplificativo, o âmbito de aplicação material da própria Diretiva Denunciantes) que certos domínios do direito da União se revestem de maior importância para o interesse público do que outros. A não transposição integral, por um Estado‑Membro, de uma diretiva num desses domínios é, em princípio, e sobretudo se visa conferir direitos subjetivos aos cidadãos da União, mais grave do que a não transposição, pelo mesmo Estado‑Membro, de uma diretiva noutro domínio (50).

89.      Na minha opinião, não se pode sustentar assim que todas as diretivas adotadas de acordo com um processo legislativo se revestem de igual importância. Concordo que a obrigação de os Estados‑Membros adotarem medidas de transposição atempadamente se aplica «igualmente» a todas estas diretivas. No entanto, outra coisa é alegar, como faz a Comissão, que todos estes instrumentos devem ser colocados em pé de igualdade porque todos se revestem de igual importância (51). O facto de uma infração ser intrinsecamente grave não significa que a sua gravidade não possa variar de situação para situação.

90.      Gostaria de formular duas observações adicionais.

91.      Em primeiro lugar, esta conclusão não é posta em causa pelo facto de o Tribunal de Justiça ter declarado que «a obrigação de adotar as medidas nacionais para assegurar a transposição completa de uma diretiva e a obrigação de comunicar essas medidas à Comissão constituem obrigações essenciais» (52). A este respeito, remeto para as considerações que fiz acima.

92.      Acrescento que a justificação dada pela Comissão no presente processo, segundo a qual a aplicação sistemática de um coeficiente de gravidade de 10 garante a igualdade de tratamento entre os Estados‑Membros, parece‑me particularmente pouco convincente. Não compreendo em que medida a adaptação do coeficiente de gravidade para ter em conta fatores como a importância da diretiva em causa poderia comprometer a igualdade de tratamento entre os Estados‑Membros.

93.      Em segundo lugar, na comunicação de 2023, a Comissão observa que, em relação ao artigo 260.o, n.o 2, TFUE, a importância da infração em causa deve ser determinada tendo em conta «a natureza e o âmbito de aplicação das disposições [legais] em causa». Acrescenta que «[a]s infrações que afetam os direitos fundamentais ou as quatro liberdades fundamentais […] devem, de modo geral, ser consideradas particularmente graves e ser objeto de uma sanção adaptada a essa gravidade» (53). Além disso, explica que os efeitos nos interesses gerais e particulares devem ser avaliados caso a caso, tendo em conta, nomeadamente, a perda de recursos da União, prejuízos graves para os interesses financeiros da União, o impacto da infração no funcionamento da União, danos graves ou irreparáveis para a saúde humana ou para o ambiente, qualquer vantagem financeira eventual que o Estado‑Membro obtenha com a inexecução e a dimensão da população afetada pela infração.

94.      Não vejo razão para que os mesmos princípios orientadores e fatores não possam ter um papel a desempenhar na fixação do coeficiente de gravidade quando a infração consistir num incumprimento integral da obrigação de adotar e, portanto, de comunicar as medidas de transposição na aceção do artigo 260.o, n.o 3, TFUE.

95.      A este respeito, acrescento também que, na sua primeira comunicação sobre o artigo 260.o, n.o 3, TFUE, a Comissão indicou que o coeficiente de gravidade tinha de ser fixado em conformidade com as regras e os critérios aplicáveis às infrações abrangidas pelo artigo 260.o, n.o 2, TFUE, dos quais resultava que esse coeficiente devia simplesmente situar‑se entre 1 e 20 (54). As razões para se afastar desta abordagem (diferentes da igual importância de todas as diretivas adotadas de acordo com um processo legislativo) não estão expostas na comunicação de 2023.

96.      Observo que, no presente processo, a República da Polónia alega que devem ser tidos em conta dois fatores atenuantes: em primeiro lugar, o facto de os denunciantes já estarem protegidos pelo direito polaco e, em segundo lugar, o facto de a República da Polónia ter cooperado lealmente com a Comissão durante o procedimento pré‑contencioso.

97.      Deixarei para mais tarde a minha apreciação do presente processo (v., infra, ponto 3). Por ora, gostaria simplesmente de esclarecer que considero que a Comissão deve reservar, em todos os casos, a possibilidade de o coeficiente de gravidade ser adaptado à luz dos fatores atenuantes e/ou agravantes pertinentes.

3)      Conclusão

98.      Resulta das considerações acima expostas que, na minha opinião, o Tribunal de Justiça deve declarar que a aplicação sistemática de um coeficiente de gravidade de 10 em todos os processos em que está em causa um incumprimento integral da obrigação de comunicação das medidas necessárias para transpor uma diretiva abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 260.o, n.o 3, TFUE é inadequada no que respeita à fixação de sanções financeiras que sejam suficientemente dissuasivas e proporcionadas à infração em causa.

2.      Questão geral (ii): o método de cálculo do fator «n»

a)      Argumentos das partes

99.      Segundo a Comissão, o fator «n» visa ter em conta a capacidade de pagamento dos Estados‑Membros, garantindo assim que as sanções financeiras impostas em aplicação do artigo 260.o, n.o 3, TFUE tenham um efeito dissuasivo. Dois terços deste fator representam o produto interno bruto (PIB) dos Estados‑Membros (em comparação com o PIB médio em todos os Estados‑Membros) e um terço representa a sua população (em comparação com a população média de todos os Estados‑Membros).

100. A Comissão indica que, em conformidade com o ponto 3 do anexo I da comunicação de 2023, ela aplicou no presente processo um fator «n» de 1,37.

101. A Comissão acrescenta que, ao determinar o método de cálculo do fator «n» nessa comunicação, tomou devidamente em consideração o Acórdão do Tribunal de Justiça proferido no processo Comissão/Grécia (Recuperação de auxílios de Estado Ferroníquel) (55). Depreende do n.o 116 desse acórdão que, embora o PIB dos Estados‑Membros deva constituir o fator predominante para efeitos da apreciação da sua capacidade de pagamento, é sem prejuízo da possibilidade de a Comissão propor sanções financeiras assentes numa pluralidade de critérios, especialmente se esses outros critérios se destinarem a manter um afastamento razoável entre os Estados‑Membros.

102. A Comissão considera que a integração de um elemento assente na dimensão da população dos Estados‑Membros no método de cálculo do fator «n» responde precisamente a este objetivo. Alega que o critério demográfico garante igualmente a estabilidade do fator «n» ao longo do tempo, uma vez que é menos provável que a dimensão da população de um Estado‑Membro varie significativamente numa base anual do que o seu PIB.

103. A Comissão sustenta ainda que o método de cálculo do fator «n» adotado na comunicação de 2023 segue as indicações fornecidas pelo advogado‑geral G. Pitruzzella nas suas Conclusões no processo Comissão/Grécia (Recuperação de auxílios de Estado Ferroníquel) (56), nas quais afirmou que «o objetivo de manter uma certa proporção entre os coeficientes aplicados aos diversos Estados‑Membros» poderia ser alcançado «utilizando um critério demográfico que permita relativizar os resultados decorrentes da tomada em consideração do PIB, simples ou comparativo».

104. A República da Polónia discorda da Comissão. Considera que o critério demográfico utilizado para o cálculo do fator «n» é incompatível com o objetivo global deste fator, que é ter em conta a capacidade de pagamento dos Estados‑Membros, assegurando ao mesmo tempo que as sanções financeiras que lhes são aplicadas sejam suficientemente dissuasivas.

105. A República da Polónia alega ainda que o método de cálculo do fator «n» adotado pela Comissão conduz a resultados incoerentes, uma vez que a capacidade de pagamento dos Estados‑Membros pode ser sobreavaliada ou subavaliada, em função da respetiva dimensão da população, o que não seria o caso se o fator «n» se baseasse apenas no seu PIB.

106. A República da Polónia afirma igualmente que há que esperar que ocorram variações do fator «n» dos Estados‑Membros, uma vez que nem todos os Estados‑Membros têm a mesma capacidade de pagamento. De um modo geral, sustenta que a abordagem da Comissão conduz à aplicação de sanções financeiras desproporcionadas aos Estados‑Membros com um PIB mais baixo mas com uma população mais numerosa.

107. Por último, a República da Polónia indica que, nas suas conclusões no processo Comissão/Grécia (57), o advogado‑geral M. Wathelet declarou que «não está excluído que alguns Estados‑Membros com uma determinada população tenham uma menor capacidade de pagamento de que outro Estados‑Membros com uma população menos numerosa» e que este critério, por conseguinte, «também não tem pertinência para o cálculo da sanção pecuniária compulsória».

108. A este respeito, a República da Polónia observa que, desde 2017 (na sequência das Conclusões do advogado‑geral M. Wathelet no processo Comissão/Grécia), o Tribunal de Justiça nunca tomou em consideração elementos diferentes do PIB na determinação da capacidade de pagamento de um Estado‑Membro. Além disso, a referência a um «critério demográfico» nas conclusões do advogado‑geral G. Pitruzzella no processo Comissão/Grécia (Recuperação de auxílios de Estado Ferroníquel) deve simplesmente ser entendida como uma indicação de que pode ser adequado dividir o PIB dos Estados‑Membros pela dimensão da sua população para obter uma ideia mais exata da sua capacidade de pagamento.

109. À luz das considerações acima expostas, a República da Polónia alega que o fator «n» aplicado pela Comissão deve basear‑se na capacidade de pagamento dos Estados‑Membros, que reflete apenas o seu PIB.

b)      Apreciação

110. O método aplicado pela Comissão para calcular o fator «n» é o mesmo para as infrações abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 260.o, n.o 2, TFUE que para as abrangidas pelo artigo 260.o, n.o 3, TFUE.

111. Inicialmente, o método baseava‑se em dois elementos: o PIB do Estado‑Membro em causa, por um lado, e o número de votos de que dispunha esse Estado‑Membro no Conselho para a votação por maioria qualificada, por outro (58). No entanto, as regras de votação por maioria qualificada no Conselho sofreram alterações após a entrada em vigor, em 1 de abril de 2017, da nova «regra da dupla maioria», introduzida pelo artigo 16.o, n.o 4, TUE. O Tribunal examinou as consequências desta evolução no seu Acórdão de 14 de novembro de 2018, Comissão/Grécia (59), no qual declarou que este novo sistema não fornece nenhum critério satisfatório para a determinação da capacidade de pagamento dos Estados‑Membros e, por conseguinte, não podia substituir efetivamente o antigo sistema de ponderação dos votos. Observou também que, de qualquer forma, desde 1 de abril de 2017, o Tribunal de Justiça só teve em conta o PIB do Estado‑Membro em causa para efeitos da avaliação da sua capacidade de pagamento.

112. A Comissão emitiu uma nova comunicação em 2019 (a seguir «comunicação de 2019») (60), na qual incluiu um método de cálculo revisto do fator «n». Este novo método continuava a incluir uma componente que não estava relacionada com o PIB do Estado‑Membro em causa. No entanto, esta componente já não se baseava no número de votos no Conselho, mas no número de lugares dos representantes no Parlamento Europeu.

113. No seu Acórdão de 20 de janeiro de 2022, Comissão/Grécia (Recuperação de auxílios de Estado Ferroníquel) (61), o Tribunal de Justiça declarou novamente que importava basear‑se no PIB do Estado‑Membro em causa enquanto fator predominante para efeitos da apreciação da capacidade de pagamento deste Estado‑Membro e que o objetivo que consiste em fixar sanções financeiras suficientemente dissuasivas não exige necessariamente a tomada em conta do peso institucional na União do Estado‑Membro em causa, uma vez que este elemento não estava relacionado com as características do incumprimento em causa.

114. A comunicação de 2023 foi adotada posteriormente a esse acórdão.

115. Nesta comunicação, o fator «n» é descrito pela Comissão como uma média geométrica ponderada que assenta «predominantemente» no PIB dos Estados‑Membros e «em segundo lugar» na sua população «enquanto critério demográfico que permite manter uma diferenciação razoável entre os […] Estados‑Membros».

116. Partilho da opinião da República da Polónia segundo a qual este «critério demográfico» não é adequado para determinar a capacidade de pagamento relativa dos Estados‑Membros. Três razões principais levam‑me a esta conclusão.

117. Em primeiro lugar, poder‑se‑ia alegar que os elementos expostos supra, no n.o 113, não excluem a possibilidade de a Comissão ter em conta outros fatores ou parâmetros para fixar o método de cálculo do fator «n». Com efeito, como observa a Comissão na sua comunicação de 2023, o Tribunal de Justiça reconheceu efetivamente, no seu Acórdão de 20 de janeiro de 2022, Comissão/Grécia (Recuperação de auxílios de Estado Ferroníquel) (62) (o acórdão que levou a Comissão a rever o seu método de cálculo deste fator e a adotar esta comunicação), que o facto de o PIB do Estado‑Membro em causa ser o fator predominante para efeitos da apreciação da sua capacidade de pagamento era «sem prejuízo» da possibilidade de a Comissão propor sanções financeiras «assentes numa pluralidade de critérios, com vista a permitir, nomeadamente, manter um afastamento razoável entre os diversos Estados‑Membros».

118. No entanto, o que estes elementos demonstram, na minha opinião, é que o Tribunal de Justiça exige efetivamente uma correlação entre o PIB dos Estados‑Membros e os fatores «n» que lhes são respetivamente atribuídos (63). Com efeito, se fosse atribuído a um Estado‑Membro cujo PIB é comparativamente inferior ao de outro Estado‑Membro um fator «n» mais elevado do que o desse outro Estado‑Membro, e vice‑versa, esse fator já não poderia, simplesmente, ser considerado representativo da capacidade de pagamento respetiva dos Estados‑Membros.

119. É precisamente neste ponto que se torna evidente a falha do método de cálculo do fator «n» escolhido pela Comissão na comunicação de 2023. O anexo I da comunicação de 2023 indica que os fatores «n» aí enumerados foram calculados com base no PIB dos Estados‑Membros de 2020. Se se tiver em conta o PIB dos Estados‑Membros durante esse ano (64) e os fatores «n» que a Comissão atribuiu a cada um deles, verifica‑se que:

–        o PIB do Luxemburgo é superior ao da Bulgária, da Croácia, da Eslovénia e da Lituânia, mas o fator «n» que a Comissão aplica ao Luxemburgo é inferior ao que aplica a esses outros Estados‑Membros;

–        o PIB dos Países Baixos é substancialmente mais elevado do que o da Polónia, mas os seus fatores «n» são praticamente idênticos (1,39 contra 1,37);

–        em contrapartida, o PIB da Polónia é apenas ligeiramente superior ao da Suécia, mas os seus fatores «n» variam significativamente (1,37 contra 0,83).

120. Além disso, se se decidir analisar os fatores «n» estabelecidos na comunicação de 2023 à luz do PIB per capita dos Estados‑Membros em 2020 (65), em vez do seu PIB (uma vez que possivelmente, o PIB per capita permite uma melhor comparação da capacidade de pagamento respetiva dos Estados‑Membros), observam‑se resultados ainda mais incoerentes:

–        o PIB per capita da Dinamarca é superior ao da Alemanha, mas o fator «n» da Alemanha é quase 12 vezes superior ao da Dinamarca (6,16 contra 0,52);

–        em contrapartida, foram atribuídos à Irlanda e à Dinamarca fatores «n» semelhantes (0,55 contra 0,52), embora o PIB da Irlanda seja cerca de 1,5 vezes superior ao da Dinamarca;

–        do mesmo modo, os Países Baixos e a Polónia têm fatores «n» semelhantes (1,39 e 1,37), mas existe um afastamento significativo entre os seus PIB per capita (sendo o PIB per capita dos Países Baixos quase quatro vezes superior ao da Polónia);

–        a Itália e Chipre têm PIB semelhantes per capita, mas o fator «n» da Itália é de 3,41, ao passo que o fator «n» de Chipre é de 0,05 (o fator «n» da Itália é, por conseguinte, cerca de 68 vezes superior ao de Chipre);

–        o Luxemburgo tem um dos fatores «n» mais baixos, mas o PIB per capita mais elevado de todos os Estados‑Membros.

121. Tendo em conta estes elementos, parece‑me evidente que os fatores «n» enumerados na comunicação de 2023 não são representativos da capacidade de pagamento respetiva dos Estados‑Membros (independentemente da questão de saber se esta capacidade é determinada à luz do seu PIB ou do seu PIB per capita). Na minha opinião, o argumento apresentado por alguns autores (66) e Estados‑Membros (67) durante o período em que o método de cálculo do fator «n» ainda se baseava nos direitos de voto no Conselho ou no número de representantes no Parlamento Europeu, segundo o qual este fator não dava necessariamente uma ideia exata da capacidade de pagamento dos Estados‑Membros, uma vez que sobreavaliava ou subavaliava a capacidade de pagamento de alguns Estados‑Membros, continua certamente a ser válido (68).

122. Isto leva‑me à segunda razão pela qual considero que o método de cálculo do fator «n» estabelecido na comunicação de 2023 é inadequado. Parece‑me evidente que, ao estabelecer este método, a Comissão pretendeu não só implementar o Acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de janeiro de 2022, Comissão/Grécia (Recuperação de auxílios de Estado Ferroníquel) (69), no qual o método de cálculo anterior (a saber, o estabelecido na comunicação de 2019) foi criticado pelo Tribunal de Justiça, mas também assegurar que os montantes das sanções financeiras que proporia ao Tribunal de Justiça se mantivessem tão próximos quanto possível dos valores obtidos ao abrigo deste método anterior.

123. Com efeito, já na fase de adoção da comunicação de 2019, a Comissão tinha assinalado que a utilização do PIB dos Estados‑Membros como critério único criaria uma diferença entre o fator «n» mais elevado e o mais baixo, que, em seu entender, era inaceitável (70). Posso facilmente imaginar que a Comissão possa ter tido preocupações semelhantes quando sugeriu a inclusão de um critério demográfico no seu novo método de cálculo na comunicação de 2023, em vez de se basear unicamente no PIB ou no PIB per capita. De facto, se compararmos os fatores «n» enumerados no anexo I desta comunicação com os enumerados no anexo I da Comunicação de 2019, verificamos que não existem grandes discrepâncias entre os dois.

124. A este respeito, concordo, e videntemente, com a Comissão que assegurar que o fator «n» se mantenha num intervalo de valores semelhante de um método de cálculo para o outro e tenha um certo grau de estabilidade ao longo do tempo não é um objetivo totalmente errado. Contudo, parece‑me que a estabilidade poderia ser facilmente alcançada por outros meios mais adequados. Para começar, a Comissão poderia ter em conta o PIB ou o PIB per capita dos Estados‑Membros ao longo de vários anos e basear‑se no seu valor médio ao longo de um período de, por exemplo, cinco anos. Além disso, a fim de garantir que as diferenças entre os fatores «n» dos diferentes Estados‑Membros não são demasiado grandes e que permanecem de certa forma do mesmo intervalo de valores em que atualmente se encontram (ou seja, entre 0,03 e 6,16), a Comissão poderia reduzir os valores obtidos com base na média do PIB ou do PIB per capita para que se enquadrem, precisamente, nesse intervalo.

125. Permitam‑me ilustrar. De acordo com a abordagem que proponho, ao Estado‑Membro com o PIB per capita mais elevado seria atribuído um fator «n» de 6,16. A todos os outros Estados‑Membros seria atribuído um fator «n» que reflita o seu PIB comparativo ou o PIB per capita, mas que permaneça abaixo desse valor. Por exemplo, se o Luxemburgo tiver o PIB per capita mais elevado, o seu fator «n» poderá ser de 6,16. O fator «n» para os Países Baixos, cujo PIB per capita era (em 2020) cerca de metade do Luxemburgo, seria próximo de 3.

126. Na minha opinião, e contrariamente ao que sustenta a Comissão, o advogado‑geral G. Pitruzella tinha em mente considerações semelhantes quando declarou, nas suas Conclusões no processo Comissão/Grécia (Recuperação de auxílios de Estado Ferroníquel) (71), que «o objetivo de manter uma certa proporção entre os coeficientes aplicados aos diversos Estados‑Membros» poderia ser alcançado através de métodos diferentes, como, por exemplo, «utilizando um critério demográfico que permita relativizar os resultados decorrentes da tomada em consideração do PIB, simples ou comparativo». Com efeito, não vejo como esta passagem poderia ser lida no sentido proposto pela Comissão, uma vez que, no n.o 35 das mesmas conclusões, o advogado‑geral G. Pitruzzella refere que, em seu entender, o «PIB (simples, per capita ou comparativo), [é passível] de por si só [fornecer] uma indicação adequada da capacidade de pagamento do Estado‑Membro em causa».

127. A terceira razão pela qual considero que o método de cálculo do fator «n» adotado pela Comissão é inadequado prende‑se com algumas reflexões mais amplas sobre a pertinência da dimensão da população do Estado‑Membro em causa na fase da determinação da sua capacidade de pagamento de sanções financeiras.

128. Como já referi, entendo (à semelhança do advogado‑geral G. Pitruzella) que pode ser útil, se não melhor, para obter uma ideia exata da capacidade de pagamento deste Estado‑Membro, basear‑se no seu PIB per capita (o que, para referir o que é óbvio, exige que se tenha em conta a dimensão da sua população). No entanto, não é isso que a Comissão faz na comunicação de 2023. Com efeito, como expliquei acima, nesta comunicação, a Comissão não divide o PIB do Estado‑Membro em causa pela dimensão da sua população, como se faria para calcular o PIB per capita desse Estado‑Membro. Pelo contrário, considera que a riqueza relativa do Estado‑Membro em causa (o seu PIB, avaliado em relação ao PIB médio de todos os Estados‑Membros) deve ser multiplicada pela dimensão da população desse Estado‑Membro (também avaliada em relação à dimensão média da população de todos os Estados‑Membros).

129. Como a República da Polónia argumenta com razão, o resultado desta abordagem é que um Estado‑Membro com uma população com uma dimensão comparativamente maior é sistematicamente considerado como tendo uma maior capacidade de pagamento do que um Estado‑Membro com a mesma riqueza global (PIB) e uma população comparativamente menor. Não vejo como tal pode ser conciliado com o princípio da igualdade de tratamento entre os Estados‑Membros.

130. Além disso, parece‑me que a abordagem da Comissão conduz, em última análise, a um resultado muito infeliz, em que a dimensão da população do Estado‑Membro em causa é efetivamente tratada como um fator agravante ou atenuante (consoante a dimensão da população seja grande ou pequena) na fase da determinação do fator «n». Na minha opinião, tal consideração não tem cabimento na apreciação da capacidade de pagamento relativa dos Estados‑Membros. Com efeito, como alegou o advogado‑geral M. Wathelet, «não está excluído que alguns Estados‑Membros com uma determinada população tenham [efetivamente] uma menor capacidade de pagamento de que outro Estados‑Membros com uma população menos numerosa» (72).

131. Isto leva‑me à minha última observação. Posso facilmente admitir que as obrigações que incumbem aos Estados‑Membros por força do direito da União, nomeadamente as que estão relacionadas com a transposição das diretivas, são, de certo modo, «devidas» por esses Estados‑Membros aos seus cidadãos. Quando um Estado‑Membro não transpõe uma diretiva, compreendo que possa ser pertinente ter em conta o número de cidadãos da União que residem no seu território que são afetados por esse incumprimento. Esta é, na minha opinião, a principal diferença entre o incumprimento, por um Estado‑Membro, das obrigações que lhe incumbem por força do direito da União e o condutor de um automóvel ou a empresa que utilizei como exemplos acima, na introdução. A meu ver, o condutor ou a empresa não imaginariam, nem por um segundo, que o montante da sua coima pudesse variar em função do número de pessoas que vivem no seu agregado familiar ou do número de pessoas que empregam no momento da infração, pela simples razão de que as normas que infringem (quer se trate de regras de trânsito, de concorrência da União ou de proteção de dados pessoais) não implicam obrigações que sejam devidas a essas pessoas.

132. Pelo contrário, o facto de um Estado‑Membro ser sujeito a uma sanção mais elevada por ter uma população mais numerosa do que a de outro Estado‑Membro pode não ser, na minha opinião, totalmente injustificado no âmbito de um processo por infração instaurado ao abrigo do artigo 258.o TFUE. Todavia, considero que este elemento está relacionado com a gravidade da infração, e não com a capacidade de pagamento dos Estados‑Membros. É por esta razão que sou de opinião que a dimensão da população do Estado‑Membro em causa não pode ser utilizada como fator agravante ou atenuante na fase da determinação do fator «n». Ao invés, pode, se for caso disso, figurar entre os fatores atenuantes ou agravantes pertinentes para determinar o coeficiente de gravidade em cada caso concreto. A este respeito, observo que, como já indiquei supra, no n.o 93, a Comissão já prevê essa possibilidade para as infrações abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 260.o, n.o 2, TFUE.

3.      Quanto ao presente processo

133. Nos pontos anteriores, expliquei por que razão considero que é inadequado, por um lado, aplicar «sistematicamente» o mesmo coeficiente de gravidade de 10 a todos os processos por não comunicação integral das medidas de transposição, e, por outro, para efeitos da determinação da capacidade de pagamento do Estado‑Membro em causa, basear‑se num critério demográfico que penaliza sistematicamente os Estados‑Membros que, como a Polónia, têm uma população com uma dimensão maior.

134. Gostaria agora de abordar a questão remanescente das sanções financeiras que o Tribunal de Justiça deve, na minha opinião, adotar no presente processo.

135. A este respeito, recordo, por um lado, que o montante global das sanções financeiras impostas pelo Tribunal de Justiça em aplicação do artigo 260.o, n.o 3, TFUE não pode, como já referi supra, no n.o 57, exceder o montante indicado pela Comissão.

136. Por outro lado, o Tribunal de Justiça tem declarado reiteradamente que, no âmbito dos processos por infração, não está, de um modo geral, vinculado pelas orientações estabelecidas nas comunicações da Comissão, que têm por objetivo contribuir para garantir a transparência, a previsibilidade e a segurança jurídica da ação conduzida por essa instituição quando faz propostas ao Tribunal de Justiça. Além disso, o Tribunal de Justiça declarou que as variáveis matemáticas utilizadas pela Comissão para calcular o montante das sanções financeiras constituem uma «base de referência útil». Por outras palavras, são regras indicativas que se limitam a definir as linhas de conduta que a Comissão tenciona seguir (73).

137. No presente processo, daqui resulta que, embora as propostas feitas pela Comissão tenham sido adotadas em aplicação das orientações enunciadas na comunicação de 2023 e sejam, assim, afetadas pelas duas falhas que identifiquei supra, no n.o 133, estas falhas não obstam a que o Tribunal de Justiça ordene sanções financeiras de montante inferior ao montante indicado pela Comissão, sem respeitar os métodos de cálculo estabelecidos nessa comunicação.

138. Ao mesmo tempo, uma vez que essas propostas colocam um «limite máximo» ao montante que o Tribunal de Justiça pode impor em aplicação desta disposição, não se pode excluir que elas possam, numa situação em que o Tribunal de Justiça considere adequado optar por sanções financeiras de montante superior ao indicado pela Comissão (questão que, felizmente, na minha opinião, não se coloca no presente processo), privar o Tribunal de Justiça dessa possibilidade. É por esta razão que proponho que o Tribunal de Justiça identifique expressamente as falhas de que padecem os métodos de cálculo da Comissão no seu acórdão a proferir no presente processo [como já fez anteriormente nos seus Acórdãos proferidos nos seus Acórdãos de 14 de novembro de 2018, Comissão/Grécia (74) e de 20 de janeiro de 2022, Comissão/Grécia (Recuperação de auxílios de Estado Ferroníquel) (75)].

139. Feitos estes esclarecimentos, constato que a República da Polónia ainda não comunicou à Comissão as medidas necessárias para transpor a Diretiva Denunciantes.

140. Nestas circunstâncias, considero adequado condenar a República da Polónia no pagamento de uma quantia fixa e de uma sanção pecuniária compulsória, a fim de a incentivar a tomar as medidas necessárias para pôr termo à infração verificada.

141. Contudo, para garantir que o montante desta quantia fixa e desta sanção pecuniária compulsória seja, em si, simultaneamente «adaptado às circunstâncias» e «proporcionado à [infração] e à capacidade de pagamento» da República da Polónia (76), o Tribunal de Justiça deve, a meu ver, considerar que a República da Polónia tem uma capacidade de pagamento inferior à que é refletida no fator «n» invocado pela Comissão (77).

142. Além disso, na sua apreciação da gravidade da infração em causa, o Tribunal de Justiça deve, na minha opinião, ter em conta todos os fatores atenuantes ou agravantes pertinentes (como os que enumerei supra, no n.o 93). Entre esses elementos figura o facto de a não transposição da Diretiva Denunciantes pela República da Polónia poder ter impacto nos direitos de um número bastante elevado de cidadãos da União, tendo em conta a população relativamente numerosa desse Estado‑Membro e o facto de esta diretiva visar precisamente conferir direitos subjetivos às pessoas que denunciam violações do direito da União.

143. No que respeita aos efeitos que o incumprimento da República da Polónia tem nos interesses públicos e privados, recordo que, como observei supra, no n.o 21, a Diretiva Denunciantes visa assegurar um nível de proteção «equilibrado e eficaz» às pessoas que denunciam violações do direito da União sobre as quais obtêm informações em contexto profissional e «reforçar a aplicação do direito e das políticas da União» em certos domínios específicos que se revestem de importância para o interesse público. A não transposição deste instrumento deve, portanto, ser considerada particularmente grave, uma vez que tem consequências importantes para esses «domínios que se revestem de importância para o interesse público», bem como para a proteção dos direitos individuais dos denunciantes.

144. Todavia, parece‑me que estas consequências importantes são de alguma forma atenuadas pelo facto de os denunciantes já estarem protegidos pelo direito polaco (e, portanto, de o exercício dos seus direitos não ser afetado tão negativamente pela não transposição da Diretiva Denunciantes por parte República da Polónia como se poderia pensar inicialmente). A este respeito, recordo que o Tribunal de Justiça já considerou que a gravidade da infração pode depender dos seus efeitos práticos, nomeadamente do facto de esses efeitos serem relativamente reduzidos (78). Assim, em princípio, partilho da opinião da República da Polónia segundo a qual o nível de proteção concedido aos denunciantes ao abrigo do direito polaco pode ser considerado um fator atenuante.

145. Além disso, concordo com a República da Polónia que o facto de ter cooperado lealmente com a Comissão durante o procedimento que conduziu ao processo por infração no Tribunal de Justiça pode igualmente ser considerado um fator atenuante (79).

146. Globalmente, parece‑me, tendo em conta as circunstâncias de facto e de direito pertinentes que acabo de expor (e, em especial, a menor capacidade de pagamento da República da Polónia), que seria adequado que o Tribunal de Justiça aplicasse sanções financeiras de montante inferior ao indicado pela Comissão, a saber, uma quantia fixa de 8 700 euros por dia, a contar da data do termo do prazo de transposição da Diretiva Denunciantes até à data da prolação do acórdão no presente processo, e uma sanção pecuniária compulsória de 34 000 euros por dia de atraso no cumprimento das obrigações por força da Diretiva Denunciantes, a contar da data da prolação desse acórdão até à data em que essas obrigações sejam cumpridas.

VI.    Conclusão

147. Tendo em conta o anteriormente exposto, proponho que o Tribunal de Justiça:

–        declare que a República da Polónia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força da Diretiva (UE) 2019/1937 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2019, relativa à proteção das pessoas que denunciam violações do direito da União («Diretiva Denunciantes»), ao não adotar as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para transpor esta diretiva, ou, em todo o caso, ao não ter comunicado as referidas disposições à Comissão;

–        declare que a aplicação sistemática de um coeficiente de gravidade de 10 em todos os processos em que está em causa um incumprimento integral da obrigação de comunicação das medidas necessárias para transpor uma diretiva é inadequada no que respeita à fixação de sanções financeiras que sejam suficientemente dissuasivas e proporcionadas à infração em causa;

–        declare que, para efeitos da fixação de tais sanções financeiras, o método de cálculo utilizado pela Comissão Europeia na sua Comunicação intitulada «Sanções financeiras em processos por infração» para determinar o fator «n» é inadequado para estabelecer a capacidade de pagamento desse Estado‑Membro;

–        condene a República da Polónia no pagamento de uma quantia fixa de 8 700 euros por dia, a contar da data do termo do prazo de transposição da Diretiva Denunciantes até à data da prolação do acórdão no presente processo, e de uma sanção pecuniária compulsória de 34 000 euros por dia de atraso no cumprimento das obrigações por força da Diretiva Denunciantes, a contar da data da prolação desse acórdão até à data em que essas obrigações sejam cumpridas;

–        condene a República da Polónia nas despesas.


1      Língua original: inglês.


2      V., a este respeito, artigo 23.o do Regulamento (CE) n.o 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos [101.o e 102.o] TFUE (JO 2003, L 1, p. 1), e artigo 83.o do Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados e que revoga a Diretiva 95/46/CE (Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados) (JO 2016, L 119, p. 1; a seguir «RGPD»).


3      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2019 (JO 2019, L 305, p. 17).


4      Comunicação da Comissão «Sanções financeiras em processos por infração» (JO 2023, C 2, p. 1).


5      O «escândalo Lux Leaks» está relacionado com as revelações, efetuadas em 2014, de mais de trezentos «acordos fiscais» (regimes fiscais) alcançados pela administração fiscal luxemburguesa com empresas e sociedades e com os processos judiciais posteriores instaurados contra algumas das pessoas envolvidas nessas revelações.


6      V. considerando 1 e artigo 4.o, com a epígrafe «Âmbito de aplicação pessoal», da Diretiva Denunciantes.


7      As regras contidas na Diretiva Denunciantes abrangem uma vasta gama de domínios e compreendem tanto os setores públicos como privados. Incluem uma proibição estrita de todas as formas de retaliação contra os denunciantes. Para um comentário geral desta diretiva, v. Abazi, V., «The European Union Whistleblower Directive: a “game changer” for whistleblowing protection?», Industrial Law Journal, Vol. 49, n.o 4, 2020, pp. 640 a 656.


8      Com exceção das medidas necessárias para dar cumprimento à obrigação de estabelecer canais de denúncia interna por força do artigo 8.o, n.o 3, da Diretiva Denunciantes, no que diz respeito às entidades jurídicas do setor privado com 50 a 249 trabalhadores, em relação às quais os Estados‑Membros beneficiaram de um período adicional de dois anos (até 17 de dezembro de 2023) (v. artigo 26.o, n.o 2, desta diretiva).


9      V. processos C‑149/23, Comissão/Alemanha; C‑150/23, Comissão/Luxemburgo; C‑152/23, Comissão/República Checa; C‑154/23, Comissão/Estónia, e C‑155/23, Comissão/Hungria. Todos estes processos estão atualmente pendentes no Tribunal de Justiça.


10      V., nomeadamente, neste sentido, Acórdão de 20 de setembro de 2001, Comissão/França (C‑468/00, EU:C:2001:482, n.o 10).


11      V., neste sentido, Acórdão de 30 de maio de 2013, Comissão/Suécia (C‑270/11, EU:C:2013:339, n.o 54).


12      V., neste sentido, Acórdãos de 20 de setembro de 2001, Comissão/França (C‑468/00, EU:C:2001:482, n.os 8 a 10), e de 26 de fevereiro de 2008, Comissão/Luxemburgo (C‑273/07, EU:C:2008:122, n.os 8 a 10).


13      V. Acórdão de 17 de julho de 1997, Comissão/Espanha (C‑52/96, EU:C:1997:382, n.os 8 a 11).


14      V. Acórdão de 16 de julho de 2020, Comissão/Irlanda (Luta contra o branqueamento de capitais) (C‑550/18, EU:C:2020:564, n.o 46).


15      V. Acórdão de 8 de junho de 2023, Comissão/Eslováquia (Direito de rescisão sem taxa) (C‑540/21, EU:C:2023:450, n.o 83).


16      V. Acórdão de 6 de julho de 2000, Comissão/Bélgica (C‑236/99, EU:C:2000:374, n.os 21 a 24).


17      V., a este respeito, Acórdãos de 17 de setembro de 1987, Comissão/Grécia (70/86, EU:C:1987:374, n.o 8), e de 8 de julho de 2010, Comissão/Itália (C‑334/08, EU:C:2010:414, n.os 46 e 47).


18      V., neste sentido, Acórdãos de 11 de julho de 1985, Comissão/Itália (101/84, EU:C:1985:330, n.o 16), e de 8 de junho de 2023, Comissão/Eslováquia (Direito de rescisão sem taxa) (C‑540/21, EU:C:2023:450, n.o 81 e jurisprudência referida). V. também Conclusões do advogado‑geral N. Wahl no processo Comissão/Alemanha (C‑527/12, EU:C:2014:90, n.os 47 a 53).


19      Acórdão de 4 de março de 2010 (C‑297/08, EU:C:2010:115, n.os 80 a 86).


20      V., por analogia, Acórdão de 6 de julho de 2000, Comissão/Bélgica (C‑236/99, EU:C:2000:374, n.os 21 a 24).


21      V. ponto 11 da «Comunicação da Comissão Aplicação do artigo 260.o, n.o 3, do TFUE» (JO 2011, C 12, p. 1).


22      Como precisa o artigo 260.o, n.o 3, TFUE, a diretiva em questão deve ter sido «adotada de acordo com um processo legislativo». Não se aplica às diretivas não legislativas.


23      V., neste sentido, Acórdão de 16 de julho de 2020, Comissão/Irlanda (Luta contra o branqueamento de capitais) (C‑550/18, EU:C:2020:564, n.o 55 e jurisprudência referida).


24      Isto porque o pedido de condenação numa sanção pecuniária em conformidade com o artigo 260.o, n.o 3, TFUE constitui apenas uma modalidade acessória do processo por incumprimento, cuja eficácia a Comissão deve assegurar [v. Acórdão de 16 de julho de 2020, Comissão/Roménia (Luta contra o branqueamento de capitais) (C‑549/18, EU:C:2020:563, n.o 49 e jurisprudência referida)].


25      Por uma questão de exaustividade, observo que, embora o artigo 260.o, n.o 3, TFUE seja omisso quanto à questão de saber se a obrigação do Estado‑Membro em causa de cumprir as sanções começa a produzir efeitos a partir da data em que o acórdão é proferido (sem período de carência posterior), o Tribunal de Justiça já ordenou, por diversas vezes, que essas sanções produzam efeitos imediatos [v., por exemplo, Acórdão de 8 de julho de 2019, Comissão/Bélgica (Artigo 260.o, n.o 3, TFUE ‑ Redes de elevado débito), C‑543/17, EU:C:2019:573]. Para o debate doutrinal sobre essa questão, v. Materne, T., «La Procédure en Manquement d’État, Guide Pratique», 2.a ed., Bruylant, p. 483.


26      V., neste sentido, Acórdão de 16 de julho de 2020, Comissão/Irlanda (Luta contra o branqueamento de capitais) (C‑550/18, EU:C:2020:564, n.o 74 e jurisprudência referida).


27      A este respeito, acrescento que, enquanto o artigo 260.o, n.o 2, TFUE visa aquilo que é, no essencial, uma «infração composta» ou uma «dupla infração» (o incumprimento inicial do Estado‑Membro mais o seu incumprimento do acórdão proferido ao abrigo do artigo 258.o TFUE), o artigo 260.o, n.o 3, TFUE aplica‑se no âmbito de uma única infração (a saber, a não transposição de uma diretiva) (v. Wahl, N. e Prete, L., «Between certainty, severity and proportionality: Some reflections on the nature and functioning of Article 260(3) TFEU», European Law Reporter, n.o 6, 2014, pp. 170 a 189, na p. 173).


28      V. Acórdão de 25 de fevereiro de 2021, Comissão/Espanha (Diretiva Dados Pessoais Domínio penal) (C‑658/19, EU:C:2021:138, n.o 56 e jurisprudência referida).


29      Esta limitação afeta não só o próprio montante mas também a escolha do Tribunal de Justiça quanto ao tipo de sanções (quantia fixa ou sanção pecuniária compulsória ou ambas) que considere adequadas [v. Acórdão de 16 de julho de 2020, Comissão/Roménia (Luta contra o branqueamento de capitais) (C‑549/18, EU:C:2020:563, n.o 52)]. Dito isto, observo que, como indica a comunicação de 2023, a Comissão «propõe sistematicamente ao Tribunal que aplique […] tanto uma quantia fixa como uma sanção pecuniária compulsória».


30      V., a este respeito, Acórdão de 25 de fevereiro de 2021, Comissão/Espanha (Diretiva Proteção de Dados ‑ Domínio penal) (C‑658/19, EU:C:2021:138, n.o 55 e jurisprudência referida).


31      V. Acórdão de 13 de janeiro de 2021, Comissão/Eslovénia (MiFID II) (C‑628/18, EU:C:2021:1, n.o 75).


32      A este respeito, invoca os Acórdãos de 25 de junho de 2013, Comissão/República Checa (C‑241/11, EU:C:2013:423), e de 17 de outubro de 2013, Comissão/Bélgica (C‑533/11, EU:C:2013:659).


33      V., no que respeita às sanções pecuniárias compulsórias, Acórdãos de 4 de julho de 2000 Comissão/Grécia (C‑387/97, EU:C:2000:356, n.o 90), e de 25 de fevereiro de 2021, Comissão/Espanha (Diretiva Dados Pessoais ‑ Domínio penal) (C‑658/19, EU:C:2021:138, n.o 62); no que respeita às quantias fixas, Acórdãos de 16 de julho de 2020, Comissão/Irlanda (Luta contra o branqueamento de capitais), C‑550/18 (EU:C:2020:564, n.o 81), e de 25 de fevereiro de 2021, Comissão/Espanha (Diretiva Dados Pessoais Domínio penal) (C‑658/19, EU:C:2021:138, n.o 73).


34      V. ponto 2 da comunicação de 2023.


35      Com efeito, os outros elementos dos métodos de cálculo aplicados pela Comissão (a saber, o montante fixo, o coeficiente de duração ou o número de dias durante os quais a infração perdurou ou perdura e o fator «n») não se baseiam na gravidade da infração.


36      V. ponto 25 da «Comunicação da Comissão — Aplicação do artigo 260.o, n.o 3, do TFUE» (JO 2011, C 12, p. 1).


37      V., para mais pormenores, infra, n.o 85.


38      V., a este respeito, Conclusões do advogado‑geral M. Szpunar no processo Comissão/Bélgica (Artigo 260.o, n.o 3, TFUE Redes de elevado débito) (C‑543/17, EU:C:2019:322, n.o 69).


39      V., supra, n.o 51.


40      V., a este respeito, Conclusões do advogado‑geral M. Szpunar no processo Comissão/Bélgica (Artigo 260.o, n.o 3, TFUE Redes de elevado débito) (C‑543/17, EU:C:2019:322, n.o 56). V. também Wahl, N. e Prete, L., «Between certainty, severity and proportionality: Some reflections on the nature and functioning of Article 260(3) TFEU», European Law Reporter, n.o 6, 2014, pp. 170 a 189, na p. 173.


41      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho de 3 de junho de 2003 (JO 2003, L 235, p. 10).


42      V. Acórdão de 25 de junho de 2013 (C‑241/11, EU:C:2013:423, n.o 53).


43      Acórdão de 12 de julho de 2005 (C‑304/02, EU:C:2005:444)


44      V., a este respeito, Wahl, N. e Prete, L., «Between certainty, severity and proportionality: Some reflections on the nature and functioning of Article 260(3) TFEU», European Law Reporter, n.o 6, 2014, pp. 170 a 189, na p. 173.


45      V. ponto 7 da «Comunicação da Comissão — Aplicação do artigo 260.o, n.o 3, do TFUE» (JO 2011, C 12, p. 1).


46      V. Acórdão de 25 de fevereiro de 2021, Comissão/Espanha (Diretiva Dados Pessoais Domínio penal) (C‑658/19, EU:C:2021:138, n.o 54 e jurisprudência referida).


47      V., por analogia, Acórdão de 20 de janeiro de 2022, Comissão/Grécia (Recuperação de auxílios de Estado Ferroníquel) (C‑51/20, EU:C:2022:36, n.o 96).


48      V. ponto 3.2.2 da comunicação de 2023.


49      V. ponto 2.2 desta comunicação.


50      Dito isto, concordo que, mesmo num domínio considerado de importância geral para o interesse público, é possível que o legislador da União adote uma diretiva sobre um assunto relativamente pouco importante (por exemplo, um assunto muito técnico) e vice‑versa. A gravidade da infração deve, portanto, ser apreciada em cada caso concreto.


51      Foi, possivelmente, com base em considerações semelhantes que a Comissão afirmou, na sua primeira comunicação sobre o artigo 260.o, n.o 3, TFUE, que os princípios e critérios gerais que tinha formulado em relação a esta disposição deviam ser aplicados «caso a caso» e que a sanção pecuniária tinha de ser sempre adaptada às circunstâncias do caso [v. ponto 10 da «Comunicação da Comissão — Aplicação do artigo 260.o, n.o 3, do TFUE» (JO 2011, C 12, p. 1)].


52      V. Acórdão de 13 de janeiro de 2021, Comissão/Eslovénia (MiFID II) (C‑628/18, EU:C:2021:1, n.o 75).


53      V. ponto 3.2.1.1 da comunicação de 2023.


54      V. ponto 25 da «Comunicação da Comissão — Aplicação do artigo 260.o, n.o 3, do TFUE» (JO 2011, C 12, p. 1), que remete para o ponto 16.6 da «Comunicação da Comissão — Aplicação do artigo 228.o do Tratado CE» (SEC/2005/1658).


55      V. Acórdão de 20 de janeiro de 2022 (C‑51/20, EU:C:2022:36).


56      C‑51/20, EU:C:2021:534, n.o 37.


57      C‑93/17, EU:C:2018:315, n.o 139.


58      V. ponto D, com a epígrafe «Tomada em consideração da capacidade de pagamento do Estado‑Membro em causa», da «Comunicação da Comissão — Aplicação do artigo 228.o do Tratado CE» (SEC/2005/1658). Por uma questão de exaustividade, acrescento que o fator «n» surgiu pela primeira vez no documento intitulado «Comunicação da Comissão — Método de cálculo da sanção pecuniária compulsória prevista no artigo 171.o do Tratado CE», de 28 de fevereiro de 1997 (JO 1997, C 63, p. 2), mas só em 2005 é que começou a ser aplicado também no cálculo das quantias fixas.


59      C‑93/17, EU:C:2018:903 (n.os 139 a 141).


60      «Comunicação da Comissão — Alteração do método de cálculo relativo aos pagamentos de uma quantia fixa e de uma sanção pecuniária propostos pela Comissão em processos por infração submetidos ao Tribunal de Justiça da União Europeia» (JO 2019, C 70, p. 1).


61      C‑51/20, EU:C:2022:36 (n.os 113 a 115).


62      C‑51/20, EU:C:2022:36 (n.o 116).


63      A este respeito, acrescento que o Tribunal de Justiça sublinhou, em vários acórdãos, que, no que toca à capacidade de pagamento do Estado‑Membro em causa, importa ter em conta a evolução recente do produto interno bruto (PIB) desse Estado‑Membro, conforme esta se apresenta à data de apreciação dos factos pelo Tribunal de Justiça [v., nomeadamente, Acórdãos de 16 de julho de 2020, Comissão/Roménia (Luta contra o branqueamento de capitais) (C‑549/18, EU:C:2020:563, n.o 85), e de 16 de julho de 2020, Comissão/Irlanda (Luta contra o branqueamento de capitais) (C‑550/18, EU:C:2020:564, n.o 97)]. Além disso, o Tribunal de Justiça considerou que o montante das sanções financeiras devia ser reduzido em situações em que o Estado‑Membro em causa se encontre numa situação de crise económica (e em que o seu PIB diminuiu substancialmente) [v. Acórdão de 19 de dezembro de 2012, Comissão/Irlanda (C‑374/11, EU:C:2012:827, n.o 44)].


64      Com base nos valores fornecidos pelo Eurostat aqui: https://ec.europa.eu/eurostat/databrowser/view/NAMA_10_GDP__custom_1799513/bookmark/bar?lang=en&bookmarkId=d8b13929‑28c2‑478f‑8c40‑492f2c166c77.


65      Com base nos valores fornecidos pelo Eurostat aqui: https://ec.europa.eu/eurostat/databrowser/view/sdg_08_10/default/table?lang=en.


66      V., a este respeito, Kornezov, A. «Imposing the right amount of sanctions under Article 260(2) TFEU: Fairness v. predictability, or how to “bridge the gaps”», vol. 20, n.o 3, Columbia Journal of European Law, 2014, pp. 307 a 331, na p. 329.


67      V., a este respeito, Acórdão de 25 de fevereiro de 2021, Comissão/Espanha (Diretiva Dados Pessoais Domínio penal) (C‑658/19, EU:C:2021:138, n.o 49), no qual o Reino de Espanha alegou que o fator «n» que lhe foi atribuído na comunicação de 2019 o colocou na quarta posição entre os Estados‑Membros em termos de capacidade de pagamento, ao passo que, se esse fator fosse calculado apenas com base no PIB, o Reino de Espanha situar‑se‑ia no décimo quarto lugar.


68      V. também Conclusões do advogado‑geral N. Fennelly no processo Comissão/Grécia (C‑197/98, EU:C:1999:597, n.os 39 a 43).


69      C‑51/20, EU:C:2022:36.


70      V. comunicação de 2019, ponto 2.


71      C‑51/20, EU:C:2021:534, n.o 37.


72      V. Conclusões do advogado‑geral M. Wathelet no processo Comissão/Grécia (C‑93/17, EU:C:2018:315, n.o 139).


73      V. Acórdão de 20 de janeiro de 2022, Comissão/Grécia (Recuperação de auxílios de Estado Ferroníquel) (C‑51/20, EU:C:2022:36, n.os 95, 109 e 110).


74      C‑93/17, EU:C:2018:903.


75      C‑51/20, EU:C:2022:36.


76      V. jurisprudência que recordei no n.o 70 das presentes conclusões.


77      Aplicando o método que descrevi supra, no n.o 125, o fator «n» da República da Polónia poderia, por exemplo, ser de 0,97, uma vez que o seu PIB per capita, entre 2018 e 2022, foi, em média, de 13 354 euros (face a 84 280 euros no caso do Luxemburgo) (com base nos valores fornecidos pelo Eurostat aqui: https://ec.europa.eu/eurostat/databrowser/view/sdg_08_10/default/table?lang=en).


78      V. Acórdão de 13 de janeiro de 2021, Comissão/Eslovénia (MiFID II) (C‑628/18, EU:C:2021:1, n.o 80).


79      V., a este respeito, Acórdãos de 25 de junho de 2013, Comissão/República Checa (C‑241/11, EU:C:2013:423, n.o 51), e de 17 de outubro de 2013, Comissão/Bélgica (C‑533/11, EU:C:2013:659, n.o 40). Pelo contrário, concordo com a Comissão que a falta de cooperação constitui um fator agravante. Com efeito, os Estados‑Membros são obrigados a cooperar lealmente com a Comissão por força do artigo 4.o, n.o 3, TUE.