Language of document : ECLI:EU:T:2011:347

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Secção dos recursos das decisões do Tribunal da Função Pública)

12 de Julho de 2011

Processo T‑80/09 P

Comissão Europeia

contra

Q

«Recurso de decisão do Tribunal da Função Pública — Função pública — Funcionários — Recurso subordinado — Assédio moral — Artigo 12.º‑A do Estatuto — Comunicação sobre a política em matéria de assédio moral à Comissão — Dever de assistência que incumbe à administração — Artigo 24.º do Estatuto — Alcance — Pedido de assistência — Medidas provisórias de afastamento — Dever de solicitude — Responsabilidade — Pedido de indemnização — Plena jurisdição — Requisitos de existência — Relatório de evolução de carreira — Recurso de anulação — Interesse em agir»

Objecto:      Recurso interposto do acórdão do Tribunal da Função Pública da União Europeia (Primeira Secção) de 9 de Dezembro de 2008, Q/Comissão (F‑52/05, ColectFP, pp. I‑A‑1‑409 e II‑A‑1‑2235), que tem por objecto a anulação desse acórdão.

Decisão:      O acórdão do Tribunal da Função Pública da União Europeia (Primeira Secção) de 9 de Dezembro de 2008, Q/Comissão (F‑52/05), é anulado na medida em que, no n.° 2 do dispositivo, condena a Comissão das Comunidades Europeias a pagar a Q uma indemnização no montante de 500 euros, assim como a quantia de 15 000 euros, uma vez que esta visa a reparação do dano moral sofrido por Q em razão de um alegado atraso na abertura do inquérito administrativo, e que, para efeitos de julgar o pedido apresentado em primeira instância improcedente quanto ao restante, no n.° 3 do dispositivo, se pronuncia, nos n.os 147 a 189 da fundamentação, sobre a «acusação de assédio moral formulada por [Q]» e declara, no n.° 230 da fundamentação, não haver lugar a conhecer do mérito do pedido de anulação dos relatórios de evolução de carreira que lhe dizem respeito, elaborados respectivamente a título dos períodos compreendidos entre 1 de Janeiro e 31 de Outubro e 1 de Novembro e 31 de Dezembro de 2003. É negado provimento ao recurso principal e ao recurso incidental quanto ao restante. O processo é remetido ao Tribunal da Função Pública para que se pronuncie sobre o pedido de anulação dos relatórios de evolução de carreira acima referidos, assim como sobre a quantia devida a Q pela Comissão apenas a título do dano moral resultante da recusa, por parte desta última, em adoptar uma medida provisória de afastamento. Reserva‑se para final a decisão quanto às despesas.

Sumário

1.      Recurso de decisão do Tribunal da Função Pública — Fundamentos — Admissibilidade — Questões de direito — Fiscalização da efectivação da responsabilidade extracontratual da União

(Artigo 225.º‑A CE; Estatuto do Tribunal de Justiça, anexo I, artigo 11.º, n.º 1)

2.      Funcionários — Recurso — Quadro processual — Artigo 236.º CE e artigos 90.º e 91.º do Estatuto dos Funcionários

(Artigo 236.º CE; Estatuto dos Funcionários, artigos 90.º e 91.º)

3.      Funcionários — Estatuto — Finalidade — Estabelecimento de direitos e de obrigações recíprocas entre as instituições e os seus funcionários

(Estatuto dos Funcionários)

4.      Funcionários — Responsabilidade extracontratual das instituições — Requisitos — Ilegalidade — Conceito — Distinção entre o regime da responsabilidade da União para com os seus funcionários e o regime geral da responsabilidade da União e dos Estados‑Membros em caso de violação do direito da União

(Artigo 288.º, segundo parágrafo, CE)

5.      Funcionários — Recurso — Competência de plena jurisdição — Alcance — Limites

(Estatuto dos Funcionários, artigos 24.º, 90.º, n.º 2, e 91.º, n.º 1)

6.      Funcionários — Obrigação de assistência por parte da administração — Requisitos — Alcance

(Estatuto dos Funcionários, artigo 24.º, primeiro parágrafo)

7.      Funcionários — Recurso — Acção de indemnização — Recurso ao abrigo da obrigação de a administração reparar um dano causado a um funcionário por um terceiro — Admissibilidade — Requisito — Obrigação de se dirigir previamente aos órgãos jurisdicionais nacionais

(Estatuto dos Funcionários, artigos 12.º‑A, n.º 3, 24.º, segundo parágrafo, e 91.º)

8.      Funcionários — Obrigação de assistência por parte da administração — Âmbito de aplicação — Alcance — Fiscalização jurisdicional — Limites

(Estatuto dos Funcionários, artigo 24.º, primeiro parágrafo)

9.      Funcionários — Organização dos serviços — Afectação do pessoal — Reafectação — Poder de apreciação da administração — Limites — Interesse do serviço — Respeito pela equivalência entre lugar e grau

(Estatuto dos Funcionários, artigos 7.º, n.º 1, e 24.º, primeiro parágrafo)

10.    Funcionários — Obrigação de assistência por parte da administração — Alcance

(Estatuto dos Funcionários, artigo 24.º, primeiro parágrafo)

11.    Tramitação processual — Fundamentos de inadmissibilidade de ordem pública — Conhecimento oficioso pelo juiz — Respeito pelo princípio do contraditório

(Regulamento de Processo do Tribunal Geral, artigo 113.º; Estatuto dos Funcionários, artigos 90.º e 91.º)

12.    Funcionários — Recurso — Acto lesivo — Conceito — Decisões tomadas com base num relatório de inquérito após um processo realizado nos termos do artigo 86.º do Estatuto — Acto preparatório — Exclusão

(Estatuto dos Funcionários, artigos 24.º, 86.º, n.º 3; anexo IX, artigo 3.º)

13.    Funcionários — Recurso — Competência do Tribunal da Função Pública — Exame dos requisitos de admissibilidade

14.    Funcionários — Recurso — Interesse em agir — Apreciação no momento da interposição do recurso — Desaparecimento posterior do interesse em agir — Não conhecimento do mérito

(Estatuto dos Funcionários, artigos 90.º e 91.º)

15.    Funcionários — Recurso — Interesse em agir — Recurso de anulação de um relatório de evolução de carreira — Funcionário aposentado devido a uma invalidez permanente e total durante o processo contencioso — Manutenção do interesse em agir — Limites

(Estatuto dos Funcionários, artigos 53.º, 78.º, 90.º e 91.º; anexo VIII, artigos 13.º a 15.º)

16.    Tribunal de Justiça — Acórdãos — Interpretação das regras jurídicas

1.      Resulta do artigo 225.°‑A do Tratado CE e do artigo 11.°, n.° 1, do anexo I do Estatuto do Tribunal de Justiça que um recurso só pode ter como fundamento a violação de normas jurídicas, ficando excluída qualquer apreciação dos factos.

Por conseguinte, no âmbito de um recurso interposto no Tribunal Geral, é admissível a invocação de uma violação do requisito da efectivação da responsabilidade extracontratual da União Europeia relativo à existência de um comportamento ilegal.

(cf. n.os 24, 25, 27 e 28)

Ver: Tribunal de Justiça, 4 de Julho de 2000, Bergaderm e Goupil/Comissão, C‑352/98 P, Colect., p. I‑5291, n.os 43 e 44; Tribunal Geral, 12 de Março de 2008, Rossi Ferreras/Comissão, T‑107/07 P, ColectFP, pp. I‑B‑1‑5 e II‑B‑1‑31, n.º 29, e jurisprudência referida; Tribunal Geral, 10 de Dezembro de 2008, Nardone/Comissão, T‑57/99, ColectFP, pp. I‑A‑2‑83 e II‑A‑2‑505, n.os 162 a 164

2.      Um litígio entre um funcionário e uma instituição de que este depende ou dependia e que visa a indemnização de um dano é abrangido, quando tiver origem no vínculo laboral que une o interessado à instituição, pelo âmbito de aplicação do artigo 236.° CE e dos artigos 90.° e 91.° do Estatuto e encontra‑se, nomeadamente no que respeita à sua admissibilidade, fora do âmbito de aplicação tanto do artigo 235.° CE e do artigo 288.°, segundo parágrafo, CE, como do artigo 46.° do Estatuto do Tribunal de Justiça.

(cf. n.º 40)

Ver: Tribunal Geral, 26 de Junho de 2009, Marcuccio/Comissão, T‑114/08 P, ColectFP, pp. I‑B‑1‑53 e II‑B‑1‑313, n.º 12, e jurisprudência referida

3.      O Estatuto é um instrumento autónomo que tem como única finalidade regulamentar as relações jurídicas entre as instituições e os funcionários, através do estabelecimento, entre estes últimos, de direitos e de obrigações recíprocos. O Estatuto criou assim, nas relações entre as instituições e os seus funcionários, um equilíbrio de direitos e de obrigações recíprocos, que nem as instituições nem os funcionários devem perturbar. Esse equilíbrio de direitos e de obrigações recíprocos destina‑se, essencialmente, a preservar a relação de confiança que deve existir entre as instituições e os seus funcionários, para garantir aos cidadãos europeus o cumprimento correcto das missões de interesse geral que são atribuídas às instituições.

(cf. n.º 41)

Ver: Tribunal de Justiça, 31 de Maio de 1988, Rousseau/Tribunal de Contas, 167/86, Colect., p. 2705, n.º 13; Tribunal de Justiça, 6 de Março de 2001, Connolly/Comissão, C‑274/99 P, Colect., p. I‑1611, n.os 44 a 47; Tribunal Geral, 18 de Abril de 1996, Kyrpitsis/CES T‑13/95, ColectFP, pp. I‑A‑167 e I‑503, n.º 52; 22 de Fevereiro de 2006, Adam/Comissão, T‑342/04, ColectFP, pp. I‑A‑2‑23 e II‑A‑2‑107, n.º 34

4.      Nos litígios em matéria de relações entre as instituições e os seus funcionários, é reconhecido o direito de indemnização se estiverem preenchidos três requisitos, a saber, a ilegalidade do comportamento imputado às instituições, a realidade do dano e a existência de um nexo de causalidade entre o comportamento e o dano invocado.

Em relação ao requisito da ilegalidade de um comportamento, não se aplica a exigência de que seja feita prova de uma violação suficientemente caracterizada de uma norma jurídica que tenha por objecto conferir direitos aos particulares. Com efeito, esta diz respeito apenas à responsabilidade extracontratual da Comunidade, nos termos do artigo 288.°, segundo parágrafo, CE, e à responsabilidade dos Estados‑Membros por violação do direito comunitário. Em contrapartida, nos litígios em matéria de relações entre as instituições e os seus funcionários, a mera constatação de uma ilegalidade é suficiente para considerar preenchido o primeiro dos três requisitos referidos.

Com efeito, a diferença entre os requisitos de existência da responsabilidade da Comunidade por danos causados aos seus funcionários e antigos funcionários devido a uma violação das disposições estatutárias, por um lado, e os requisitos que regulam a responsabilidade da Comunidade para com terceiros devido a uma violação de outras disposições do direito comunitário, por outro, justifica‑se, à luz do equilíbrio dos direitos e das obrigações que o Estatuto criou especificamente nas relações entre as instituições e os seus funcionários, para garantir aos cidadãos europeus o correcto cumprimento das missões de interesse geral que são atribuídas às instituições.

(cf. n.os 42 a 45)

Ver: Tribunal Geral, 9 de Fevereiro de 1994, Latham/Comissão, T‑82/91, ColectFP, pp. I‑A‑15 e II‑61, n.º 72; Tribunal Geral, 24 de Abril de 2001, Pierard/Comissão, T‑172/00, ColectFP, pp. I‑A‑91 e II‑429, n.º 34; Tribunal Geral, 12 de Setembro de 2007, Combescot/Comissão, T‑249/04, ColectFP, pp. I‑A‑2‑181 e II‑A‑2‑1219, n.º 49

5.      A primeira frase do artigo 91.°, n.° 1, do Estatuto rege a segunda, pelo que esta disposição só atribui ao tribunal uma competência de plena jurisdição quando exista um litígio que tem por objecto a legalidade de um acto lesivo, na acepção do artigo 90.°, n.° 2, do Estatuto.

Por conseguinte, o Tribunal da Função Pública, chamado a pronunciar‑se sobre um recurso interposto por uma pessoa referida no Estatuto que tem por objecto a legalidade de um acto lesivo, só pode, mesmo oficiosamente, nos termos da competência de plena jurisdição, conceder a essa pessoa uma indemnização se esta tiver por fim a reparação de um dano sofrido por essa pessoa devido à ilegalidade do acto lesivo, objecto do recurso, ou, pelo menos, de um dano resultante de uma ilegalidade estreitamente ligada a esse mesmo acto.

A este respeito, não pode haver ligação estreita entre, por um lado, um pedido de assistência nos termos do artigo 24.º do Estatuto que denuncia um assédio moral por parte da hierarquia do interessado e, por outro, uma decisão tácita de indeferimento desse pedido e do pedido de indemnização por violação, por parte da instituição em causa, do dever de solicitude. Com efeito, apesar de os factos denunciados no pedido de assistência deverem ser encarados como actos imputáveis aos seus autores, isso não sucede com a decisão tácita de indeferimento, que é um acto imputável à decisão em causa. Ora, a falta de serviço imputada à instituição é anterior à decisão tácita de indeferimento e, deste modo, não pode ser encarada como estreitamente ligada a esta.

Nestas condições, o Tribunal da Função Pública não se podia ter pronunciado, sem violar os artigos 90.° e 91.° do Estatuto, sobre a questão de saber se certos factos denunciados no pedido de assistência podiam, considerados no seu conjunto, ser qualificados de falta imputável ao serviço da instituição que esteve na origem de um dano, de ordem moral, sofrido pelo recorrente, que deve ser reparado.

(cf. n.os 58, 63, 71 a 73)

Ver: Tribunal de Justiça, 14 de Dezembro de 2006, Meister/IHMI, C‑12/05 P, não publicado na Colectânea, n.os 112 a 116; Tribunal de Justiça, 20 de Maio de 2010, Gogos/Comissão, C‑583/08 P, Colect., p. I‑4469, n.os 49 a 53; Tribunal Geral, 1 de Dezembro de 1994, Schneider/Comissão, T‑54/92, ColectFP, pp. I‑A‑281 e II‑887, n.º 49, e jurisprudência referida, e Ditterich/Comissão, T‑79/92, ColectFP, pp. I‑A‑289 e I‑907, n.º 37, e jurisprudência referida

6.      O dever de assistência estabelecido no artigo 24.°, primeiro parágrafo, do Estatuto visa a defesa dos funcionários, por parte da instituição, contra actuações de terceiros e não contra os actos da própria instituição, cuja fiscalização resulta de outras disposições do Estatuto. Embora o artigo 24.°, primeiro parágrafo, do Estatuto tenha sido, acima de tudo, concebido com o objectivo de proteger os funcionários de ataques e formas de tratamentos incorrectos cometidos por terceiros, este artigo impõe igualmente um dever de assistência à administração quando o autor dos actos previstos nessa disposição seja outro funcionário.

Ver: Tribunal de Justiça, 14 de Junho de 1979, V./Comissão, 18/78, Recueil, p. 2093, n.º 15; Tribunal de Justiça, 17 de Dezembro de 1981, Bellardi‑Ricci e o./Comissão, 178/80, Recueil, p. 3187, n.º 23; Tribunal de Justiça, 25 de Março de 1982, Munk/Comissão, 98/81, Recueil, p. 1155, n.º 21; Tribunal Geral, 9 de Março de 2005, L/Comissão, T‑254/02, ColectFP, pp. I‑A‑63 e II‑277, n.º 85, e jurisprudência referida

7.      A admissibilidade da acção de indemnização intentada por um funcionário, nos termos do artigo 24.°, segundo parágrafo, do Estatuto dos Funcionários, está subordinada ao esgotamento das vias de recurso nacionais, desde que estas assegurem de maneira eficaz a protecção das pessoas interessadas e possam dar lugar à reparação do dano alegado.

A este respeito, o regime especial de responsabilidade, regime de responsabilidade sem culpa, instituído pela referida disposição assenta no dever que incumbe à administração de proteger a saúde e a segurança dos seus funcionários e agentes contra os ataques ou tratamentos incorrectos cometidos por terceiros ou por outros funcionários, de que podem ser vítimas no exercício das suas funções, nomeadamente sob a forma de assédio moral, na acepção do artigo 12.°‑A, n.° 3, do Estatuto.

(cf. n.os 67 e 68)

Ver: Tribunal de Justiça, 5 de Outubro de 2006, Schmidt‑Brown/Comissão, C‑365/05 P, não publicado na Colectânea, n.º 78; Tribunal Geral, 26 de Outubro de 1993, Caronna/Comissão, T‑59/92, n.os 25 e 68; L/Comissão, já referido, n.º 148, e jurisprudência referida, e n.os 143 a 146 e 147 a 153

8.      Por força do dever de assistência constante do artigo 24.°, primeiro parágrafo, do Estatuto, a administração deve, perante um incidente incompatível com a ordem e a serenidade do serviço, intervir com toda a energia necessária e responder com a rapidez e a solicitude exigidas pelas circunstâncias do caso concreto, a fim de apurar os factos e deles extrair, com conhecimento de causa, as consequências adequadas. Para tanto, basta que o funcionário que reclama a protecção da sua instituição apresente indícios da veracidade dos ataques de que afirma ser alvo. Perante esses elementos, compete à instituição em causa adoptar as medidas apropriadas, mandando nomeadamente realizar um inquérito administrativo, que permita determinar os factos que estão na origem da denúncia, em colaboração com o seu autor, sem o que a instituição não pode tomar uma posição definitiva, nomeadamente sobre a questão de saber se a denúncia deve ser arquivada liminarmente ou se deve ser aberto um procedimento disciplinar e, sendo caso disso, se devem ser aplicadas sanções disciplinares.

Além disso, quando um funcionário apresenta um pedido de assistência, nos termos do artigo 24.°, primeiro parágrafo, do Estatuto, a administração está igualmente obrigada, nos termos do dever de protecção que este artigo lhe impõe, a adoptar as medidas preventivas apropriadas, tais como a recolocação ou a mutação provisória da vítima, que se destinam a proteger esta última da repetição do comportamento denunciado durante o tempo necessário para realizar o inquérito administrativo. Em conformidade com o objectivo de protecção, tais medidas não podem depender da existência de um lugar vago nos serviços.

Com efeito, a administração dispõe de um amplo poder de apreciação, sujeito à fiscalização do tribunal da União, para escolher as medidas, tanto provisórias como definitivas, que devem ser adoptadas ao abrigo do artigo 24.° do Estatuto. A fiscalização do tribunal da União está limitada à questão de saber se a instituição em causa se manteve dentro de limites razoáveis e se não utilizou o seu poder de apreciação de maneira manifestamente errada.

(cf. n.os 84 a 86 e 92)

Ver: Tribunal de Justiça, 11 de Julho de 1974, Guillot/Comissão, 53/72, Colect., p. 415, Recueil, p. 791, n.os 3, 12 e 21; Tribunal de Justiça, 26 de Janeiro de 1989, Koutchoumoff/Comissão, 224/87, Colect., p. 99, n.os 15 e 16; Tribunal de Justiça, 9 de Novembro de 1989, Katsoufros/Tribunal de Justiça, 55/88, Colect., p. 3579, n.º 16; Tribunal de Justiça, 12 de Novembro de 1996, Ojha/Comissão, C‑294/95 P, Colect., p. 5863, n.os 40 e 41, e jurisprudência referida; Tribunal Geral, 5 de Dezembro de 2000, Campogrande/Comissão, T‑136/98, ColectFP, pp. I‑A‑267 e II‑1225, n.º 55 ; L/Comissão, já referido, n.º 84, e jurisprudência referida

9.      As decisões de recolocação no interesse do serviço, adoptadas ao abrigo do artigo 7.°, n.° 1, do Estatuto, visam o bom funcionamento do serviço, mesmo quando são justificadas por dificuldades de relacionamento internas, e, por conseguinte, dependem do amplo poder de apreciação das instituições na organização dos respectivos serviços, em função das missões que lhes são confiadas e, em atenção a estas, na colocação do pessoal que se encontra à sua disposição, desde que essa colocação respeite a equivalência entre o lugar e o grau.

(cf. n.º 92)

Ver: Ojha/Comissão, já referido, n.os 40 e 41, e jurisprudência referida

10.    O dever de assistência, previsto no artigo 24.°, primeiro parágrafo, do Estatuto, impõe que a administração responda com a rapidez exigida pelas circunstâncias do caso concreto, nomeadamente mandando proceder à realização de um inquérito administrativo para determinar os factos que estiveram na origem da denúncia em colaboração com o autor desta. Todavia, essa jurisprudência não exclui que razões objectivas, nomeadamente respeitantes às necessidades de organização do inquérito, possam justificar um atraso na abertura do referido inquérito.

(cf. n.º 105)

Ver: Campogrande/Comissão, já referido, n.os 42, 53 e 56

11.    Nos termos do artigo 113.° do seu Regulamento de Processo, o Tribunal Geral pode, a todo o tempo, verificar oficiosamente os fundamentos de inadmissibilidade de ordem pública.

A este respeito, uma vez que os requisitos de admissibilidade de um recurso interposto ao abrigo dos artigos 90.° e 91 do Estatuto dos Funcionários são de ordem pública, compete, sendo caso disso, ao tribunal da União examiná‑los oficiosamente sob reserva de ter previamente convidado as partes a apresentarem as suas observações.

(cf. n.os 129 e 130)

Ver: Tribunal de Justiça, 17 de Dezembro de 2009, Réexamen M/EMEA, C‑197/09 RX‑II, Colect., p. I‑12033, n.º 57, e jurisprudência referida; Tribunal Geral, 8 de Junho de 2009, Krcova/Tribunal de Justiça, T‑498/07 P, ColectFP, pp. I‑B‑1‑35 e II‑B‑1‑197, n.º 52, e jurisprudência referida

12.    Relativamente a um processo de inquérito conduzido nos termos do artigo 86.°, n.° 3, do Estatuto para decidir sobre o pedido de assistência de um funcionário, ao abrigo do artigo 24.° do Estatuto, o seu termo é a decisão final da Autoridade Investida do Poder de Nomeação, tomada com base no relatório do inquérito, como resulta do artigo 3.° do anexo IX do Estatuto. É no momento dessa tomada de decisão que a posição jurídica do funcionário se encontra afectada.

A este respeito, na medida em que se refere às conclusões do relatório do inquérito administrativo, que foi concluído após a decisão tácita de indeferimento do pedido de assistência e no âmbito do qual as alegações do funcionário interessado foram examinadas detalhadamente, a decisão definitiva da Autoridade Investida do Poder de Nomeação deve ser entendida não como uma decisão puramente confirmativa da decisão implícita, mas como uma decisão que a substitui, no termo de um reexame da situação por parte da administração.

(cf. n.os 137 e 138)

Ver: Guillot/Comissão, já referido, n.os 21, 22 e 36; Tribunal de Justiça, 1 de Junho de 1983, Seton/Comissão, 36/81, 37/81 e 218/81, Recueil, p. 1789, n.os 29 a 31; L/Comissão, já referido, n.º 123; Tribunal Geral, 25 de Outubro de 2007, Lo Giudice/Comissão, T‑154/05, ColectFP, pp. I‑A‑2‑203 e II‑A‑2‑1309, n.os 47 e 48

13.    O tribunal da União não pode ser acusado de proceder a constatações factuais no âmbito do exame oficioso dos requisitos de admissibilidade de um pedido de indemnização que lhe foi apresentado no âmbito desse recurso, uma vez que aquelas resultam dos documentos apensos aos autos que lhe foram submetidos pelas partes para que se possa pronunciar sobre o seu pedido.

(cf. n.º 150)

14.    Para que uma pessoa abrangida pelo âmbito de aplicação do Estatuto possa, no âmbito de um recurso interposto nos termos dos artigos 90.° e 91.° do referido Estatuto, pedir a anulação de um acto lesivo, na acepção do artigo 90.°, n.° 2, essa pessoa deve possuir, no momento da interposição do recurso, um interesse, efectivo e actual, suficientemente caracterizado em ver anulado esse acto, pressupondo esse interesse que o pedido é susceptível, pelo seu resultado, de lhe conferir um benefício. Enquanto requisito de admissibilidade, o interesse do recorrente em agir deve ser apreciado no momento da interposição do recurso. Todavia, para que uma pessoa referida no Estatuto possa interpor um recurso de anulação de uma decisão da Autoridade Investida do Poder de Nomeação, é necessário que conserve um interesse pessoal na anulação desta última. A este respeito, não existindo interesse em agir actual, deixa de ser necessário que o tribunal se pronuncie sobre o recurso.

(cf. n.º 156)

Ver: Tribunal Geral, 24 de Abril de 2001, Torre e o./Comissão, T‑159/98, ColectFP, pp. I‑A‑83 e I‑395, n.os 30 e 31, e jurisprudência referida; Tribunal Geral, 28 de Junho de 2005, Ross/Comissão, T‑147/04, ColectFP, pp. I‑A‑171 e II‑771, n.º 25, e jurisprudência referida; 29 de Novembro de 2006, Agne‑Dapper e o./Comissão e o., T‑35/05, T‑61/05, T‑107/05, T‑108/05 e T‑139/05, ColectFP, pp. I‑A‑2‑291 e II‑A‑2‑1497, n.º 35, e jurisprudência referida

15.    Quanto ao interesse em agir de um funcionário ou de um antigo funcionário relativamente à anulação de um relatório de evolução de carreira que lhe diz respeito, importa recordar que o referido relatório constitui um juízo de valor efectuado pelos seus superiores hierárquicos sobre a maneira como o funcionário avaliado desempenhou as tarefas que lhe foram confiadas e sobre a sua conduta no serviço durante o período em causa e que, independentemente da sua utilidade futura, constitui uma prova escrita e formal a respeito da qualidade do trabalho efectuado pelo funcionário. Tal avaliação não é puramente descritiva das tarefas realizadas durante o período em causa, mas comporta também uma apreciação das qualidades humanas que a pessoa classificada revelou no exercício da sua actividade profissional. Assim, cada funcionário possui um direito de que o seu trabalho seja homologado por uma avaliação estabelecida de maneira justa e equitativa. Por conseguinte, de acordo com o direito a uma tutela jurisdicional efectiva, deve em todo o caso ser reconhecido a um funcionário o direito de contestar um relatório de evolução de carreira que lhe diz respeito em razão do seu conteúdo ou porque não foi elaborado de acordo com as regras prescritas no Estatuto.

Além disso, um funcionário que a Comissão de Invalidez reconheceu estar numa situação de incapacidade permanente total passa oficiosamente à reforma, por força dos artigos 53.° e 78.° do Estatuto, uma vez que pode ser reintegrado numa vaga numa instituição, mantém um interesse em que o seu relatório de evolução de carreira seja elaborado de maneira equitativa, objectiva e em conformidade com as normas de uma avaliação regular. A este propósito, a disposição geral do artigo 53.° do Estatuto deve ser lida em conjugação com as disposições específicas dos artigos 13.° a 15.° do anexo VIII deste mesmo Estatuto. Na hipótese de uma reintegração, o referido relatório terá utilidade para a evolução do funcionário no seu serviço ou nas instituições da União.

Só em determinados casos específicos poderá ser diferente, naqueles em que o exame da situação concreta do funcionário declarado em estado de invalidez revelar que este já não pode retomar as suas funções na instituição, à luz, por exemplo, das conclusões da Comissão de Invalidez encarregue de examinar a sua situação de invalidez, das quais resulte que a patologia que determinou a invalidez tem carácter fixo e que não será necessário nenhum exame médico de revisão ou à luz das declarações do funcionário interessado, das quais resulte que, de qualquer forma, não retomará as suas funções numa instituição.

(cf. n.os 157 a 159)

Ver: Ross/Comissão, já referido, n.º 9 e 32; Tribunal de Justiça, 22 de Dezembro de 2008, Gordon/Comissão, C‑198/07 P, Colect., p. I‑10701, n.os 43 e 51; Combescot/Comissão, já referido, n.os 27 e 29

16.    A interpretação que o Tribunal de Justiça faz de uma norma de direito da União esclarece e precisa, se necessário for, o significado e o alcance dessa norma, tal como deve ou deveria ter sido entendida e aplicada desde o momento em que entra em vigor. Daqui resulta que a norma assim interpretada pode e deve ser aplicada mesmo a relatórios jurídicos iniciados e constituídos antes de ser proferido o acórdão pelo Tribunal de Justiça, caso, por outro lado, se encontrem preenchidos os requisitos que permitem submeter aos órgãos jurisdicionais competentes um litígio relativo à aplicação da referida norma. Atendendo a estes princípios, afigura‑se que uma limitação dos efeitos da interpretação feita pelo Tribunal de Justiça deve ser excepcional.

(cf. n.º 164)

Ver: Tribunal de Justiça, 27 de Março de 1980, Denkavit italiana, 61/79, Recueil, p. 1205, n.os 16 e 17; Tribunal de Justiça, 11 Agosto 1995, Roders e o., C‑367/93 a C‑377/93, Colect., p. I‑2229, n.os 42 e 43