Language of document : ECLI:EU:C:2019:468

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

MANUEL CAMPOS SÁNCHEZ‑BORDONA

apresentadas em 6 de junho de 2019 (1)

Processo C233/18

Zubair Haqbin

contra

Federaal agentschap voor de opvang van asielzoekers

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo arbeidshof te Brussel (Tribunal do Trabalho de Bruxelas, Bélgica)]

«Reenvio prejudicial — Política de asilo — Diretiva 2013/33/UE — Normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional — Artigo 20.o — Redução ou retirada do benefício das condições materiais de acolhimento — Sanções aplicáveis a violações graves das regras vigentes nos centros de acolhimento ou a comportamentos violentos graves — Violência cometida por um menor não acompanhado — Legislação nacional que prevê a exclusão temporária do benefício do apoio material — Compatibilidade — Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia»






I.      Introdução

1.        Com as suas questões prejudiciais, o arbeidshof te Brussel (Tribunal do Trabalho de Bruxelas, Bélgica) pede ao Tribunal de Justiça que precise o sentido das disposições previstas no artigo 20.o, n.o 4, da Diretiva 2013/33/UE (2), de modo a determinar se, e sendo caso disso, em que modalidades, um Estado‑Membro pode excluir um menor não acompanhado do benefício das condições materiais de acolhimento, pelo facto de ter cometido uma infração grave das regras vigentes no centro de acolhimento bem como quando adotou um comportamento violento grave.

2.        Este reenvio prejudicial insere‑se no âmbito de um litígio que opõe Zubair Haqbin, um menor não acompanhado de nacionalidade afegã, à Federaal agentschap voor de opvang van asielzoekers (Agência Federal para o Acolhimento dos Requerentes de Asilo, Bélgica) (3). Dada a gravidade da violência cometida por Z. Haqbin, a Fedasil aplicou‑lhe uma sanção de retirada temporária do benefício das condições materiais de acolhimento. Esta sanção implicou a exclusão não só da estrutura de acolhimento mas também de todos os serviços que lhe estão associados.

3.        Na mesma linha dos Acórdãos de 27 de setembro de 2012, Cimade e GISTI (4), e de 27 de fevereiro de 2014, Saciri e o. (5), o Tribunal de Justiça é convidado a precisar as modalidades da tomada a cargo, pelo Estado‑Membro de acolhimento, de um requerente de proteção internacional (6), quando este último é um menor não acompanhado cujo comportamento pôs em perigo o pessoal e os outros residentes da estrutura de acolhimento.

II.    Quadro jurídico

A.      Direito da União

4.        Em conformidade com o seu artigo 1.o, a Diretiva 2013/33 tem por objetivo estabelecer normas em matéria de acolhimento dos requerentes nos Estados‑Membros.

5.        Os considerandos 9, 14, 25 e 35 desta diretiva enunciam:

«(9)      Ao aplicar a presente Diretiva, os Estados‑Membros deverão procurar assegurar o pleno respeito pelos princípios da defesa dos interesses superiores dos menores e da unidade familiar, de acordo, respetivamente, com a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia [(7)], a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança [(8)] e a Convenção […] para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais [(9)] respetivamente.

[…]

(14)      O acolhimento de pessoas com necessidades de acolhimento especiais deverá constituir uma preocupação de base das autoridades nacionais, para garantir que tal acolhimento seja concebido especificamente para satisfazer as necessidades de acolhimento especiais dessas pessoas.

[…]

(25)      As possibilidades de abuso do sistema de acolhimento deverão ser limitadas mediante a especificação das circunstâncias em que as condições materiais de acolhimento previstas para os requerentes podem ser reduzidas ou retiradas, assegurando‑se em simultâneo um nível de vida digno a todos os requerentes.

[…]

(35)      A presente diretiva respeita os direitos fundamentais e os princípios reconhecidos, nomeadamente, pela [Carta]. Em especial, a presente diretiva procura assegurar o respeito integral pela dignidade humana e promover a aplicação dos artigos 1.o, 4.o, 6.o, 7.o, 18.o, 21.o, 24.o e 47.o da [Carta] e deverá ser aplicada em conformidade.»

6.        O artigo 2.o da referida diretiva, com a epígrafe «Definições», dispõe:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

[…]

d)      “Menor”, um nacional de um país terceiro ou apátrida com menos de 18 anos de idade;

e)      “Menores não acompanhados”, os menores que entrem no território de um Estado‑Membro não acompanhados por um adulto que, por força da lei ou das práticas do Estado‑Membro em questão, se responsabilize por eles e enquanto não estiverem efetivamente a cargo dessa pessoa; estão incluídos os menores que ficam desacompanhados após a entrada no território dos Estados‑Membros;

f)      “Condições de acolhimento”, o conjunto de medidas tomadas pelos Estados‑Membros a favor dos requerentes nos termos da presente diretiva;

g)      “Condições materiais de acolhimento”, as condições de acolhimento que compreendem o alojamento, a alimentação e o vestuário, fornecidos em espécie ou sob a forma de subsídios ou de cupões, ou uma combinação dos três, e subsídios para despesas diárias;

[…]

i)      “Centro de acolhimento”, qualquer local utilizado para o alojamento coletivo dos requerentes;

[…]»

7.        O artigo 17.o da Diretiva 2013/33, com a epígrafe «Disposições gerais em matéria de condições materiais de acolhimento e de cuidados de saúde», dispõe, no seu n.o 2:

«Os Estados‑Membros asseguram que as condições materiais de acolhimento proporcionam um nível de vida adequado aos requerentes que garanta a sua subsistência e a sua saúde física e mental.

Os Estados‑Membros asseguram que esse nível de vida seja também garantido no caso de pessoas vulneráveis, nos termos do artigo 21.o, bem como no caso de pessoas detidas.»

8.        O artigo 20.o desta diretiva, única disposição do capítulo III, com a epígrafe «Redução ou retirada do benefício das condições materiais de acolhimento», tem a seguinte redação:

«1.      Os Estados‑Membros podem reduzir ou, em casos excecionais e devidamente justificados, retirar o benefício das condições materiais de acolhimento se o requerente:

a)      Abandonar o local de residência estabelecido pela autoridade competente sem a informar ou sem a autorização caso esta lhe seja exigida; ou

b)      Não cumprir as obrigações de se apresentar ou não satisfizer pedidos no sentido de fornecer informações ou comparecer para entrevistas pessoais sobre o procedimento de asilo durante um período razoável estabelecido no direito nacional; ou

c)      Tiver apresentado um pedido subsequente conforme previsto no artigo 2.o, alínea q)[,] da Diretiva 2013/32/UE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional (10)].

[…]

2.      Os Estados‑Membros podem igualmente reduzir o benefício das condições materiais de acolhimento se puderem determinar que o requerente, sem que houvesse razão para tal, não apresentou o pedido de proteção internacional logo que razoavelmente praticável após a sua chegada ao Estado‑Membro em causa.

3.      Os Estados‑Membros podem reduzir ou retirar o benefício das condições materiais de acolhimento se o requerente tiver dissimulado os seus recursos financeiros e, portanto, beneficiar indevidamente das condições materiais de acolhimento.

4.      Os Estados‑Membros podem estabelecer sanções aplicáveis a violações graves das regras vigentes nos centros de acolhimento, bem como a comportamentos violentos graves.

5.      As decisões relativas à redução ou à retirada do benefício das condições materiais de acolhimento ou às sanções mencionadas nos n.os 1, 2, 3 e 4 do presente artigo devem ser tomadas de forma individual, objetiva e imparcial e devem ser fundamentadas. As decisões devem ter exclusivamente por base a situação particular da pessoa em causa, em especial no que se refere às pessoas abrangidas pelo artigo 21.o, tendo em conta o princípio da proporcionalidade. Sejam quais forem as circunstâncias, os Estados‑Membros asseguram o acesso aos cuidados de saúde, nos termos do artigo 19.o, e asseguram um nível de vida condigno a todos os requerentes.

6.      Os Estados‑Membros asseguram que as condições materiais de acolhimento não são retiradas ou reduzidas antes de ser tomada uma decisão nos termos do n.o 5.»

9.        O capítulo IV da Diretiva 2013/33, sob a epígrafe «Disposições relativas a pessoas vulneráveis», inclui, nomeadamente, os artigos 21.o a 24.o

10.      O artigo 21.o desta diretiva, com a epígrafe «Princípio geral», prevê que, no âmbito do direito nacional de transposição da referida diretiva, os Estados‑Membros devem ter em conta a situação específica das pessoas vulneráveis, designadamente dos menores e dos menores não acompanhados.

11.      O artigo 22.o da Diretiva 2013/33, com a epígrafe «Avaliação das necessidades de acolhimento especiais das pessoas vulneráveis», dispõe, no seu n.o 1, terceiro parágrafo, e no seu n.o 3:

«Os Estados‑Membros asseguram que o apoio prestado aos requerentes com necessidades de acolhimento especiais, nos termos da presente diretiva, tem em conta as suas necessidades de acolhimento especiais ao longo de todo o procedimento de asilo, e devem prever um acompanhamento adequado da situação dos requerentes em causa.

[…]

3.      Apenas as pessoas vulneráveis, na aceção do artigo 21.o, podem ser consideradas como tendo necessidades de acolhimento especiais e só elas podem, assim, beneficiar do apoio específico prestado nos termos da presente diretiva.»

12.      O artigo 23.o desta diretiva, consagrado aos menores, prevê:

«1.      Os interesses superiores da criança constituem uma consideração primordial para os Estados‑Membros na transposição das disposições da presente diretiva respeitantes aos menores […]

2.      Ao avaliarem os interesses superiores dos menores, os Estados‑Membros devem ter especialmente em conta os seguintes fatores:

[…]

b)      O bem‑estar e desenvolvimento social do menor, atendendo às suas origens;

c)      Os aspetos relacionados com a segurança e a proteção, sobretudo se existir o risco de o menor ser vítima de tráfico de seres humanos;

[…]»

13.      O artigo 24.o da referida diretiva, consagrado aos menores não acompanhados, prevê, no seu n.o 2:

«Os menores não acompanhados que apresentem um pedido de proteção internacional, desde o momento em que são autorizados a entrar no território até ao momento em que têm de deixar o Estado‑Membro no qual o pedido de proteção internacional tenha sido apresentado ou esteja a ser examinado, devem ser alojados:

[…]

c)      Em centros de acolhimento com instalações especiais para menores;

d)      Noutros locais de alojamento que disponham de instalações adequadas a menores.

[…]»

B.      Direito belga

14.      A wet betreffende de opvang van asielzoekers en van bepaalde andere categorieën van vreemdelingen (Lei relativa ao Acolhimento dos Requerentes de Asilo e de certas outras Categorias de Estrangeiros) (11), de 12 de janeiro de 2007, ainda não tinha sido objeto de alteração, para efeitos da transposição da Diretiva 2013/33, à data dos factos em causa no processo principal.

15.      Nos termos do artigo 2.o, ponto 6, da Lei relativa ao Acolhimento, o apoio material é definido como o «auxílio concedido [pela Fedasil] ou pelo parceiro, no seio de uma estrutura de acolhimento, e que consiste, nomeadamente, em alojamento, refeições, vestuário, acompanhamento médico, social e psicológico e na concessão de um subsídio para despesas diárias. Inclui igualmente o acesso a assistência judiciária, o acesso a serviços como o de intérprete e a formações, bem como o acesso a um programa de regresso voluntário».

16.      O artigo 3.o, primeiro parágrafo, desta lei dispõe que «[q]ualquer requerente de asilo tem direito a um acolhimento que lhe permita levar uma vida em conformidade com a dignidade humana».

17.      O artigo 5.o da referida lei precisa que, «[s]em prejuízo […] do livro III, título III, relativo às medidas de ordem e sanções, o benefício do apoio material descrito na presente lei não poderá em caso algum ser objeto de supressão».

18.      O livro III, título III, da Lei relativa ao Acolhimento, intitulado «Medidas de ordem e sanções», dispõe, no artigo 45.o:

«O beneficiário do acolhimento pode ser objeto de uma sanção em caso de incumprimento grave do regime e das regras de funcionamento aplicáveis nas estruturas de acolhimento, referida no artigo 19.° Ao escolher a sanção, é tida em conta a natureza e a gravidade do incumprimento assim como as circunstâncias concretas em que o mesmo aconteceu.

Só as seguintes sanções podem ser aplicadas:

[…]

7°      Exclusão temporária do benefício do apoio material numa estrutura de acolhimento, por um período máximo de um mês.

As sanções são aplicadas pelo diretor ou pelo responsável da estrutura de acolhimento. A sanção referida no segundo parágrafo, ponto 7, deve ser confirmada pelo diretor‑geral [da Fedasil] no prazo de três dias úteis a contar da adoção da sanção pelo diretor ou pelo responsável da estrutura de acolhimento. Na falta de confirmação dentro deste prazo, a sanção de exclusão temporária é automaticamente revogada.

As sanções podem ser reduzidas ou revogadas, durante a sua execução, pela autoridade que as aplicou.

A decisão de aplicar uma sanção é tomada com objetividade e imparcialidade e é objeto de fundamentação.

Sem prejuízo da sanção referida no segundo parágrafo, ponto 7, em caso algum a aplicação de uma sanção pode ter por efeito a supressão completa do apoio material concedido nos termos da presente lei nem a diminuição do acesso ao acompanhamento médico. A sanção referida no segundo parágrafo, ponto 7, implica, para a pessoa em causa, a impossibilidade de beneficiar de qualquer outra forma de acolhimento, com exceção do acesso ao acompanhamento médico, conforme previsto nos artigos 24.° e 25.° da lei.

A sanção referida no segundo parágrafo, ponto 7, só pode ser aplicada em caso de violação muito grave do regulamento interno da estrutura de acolhimento que ponha em perigo o pessoal ou os outros residentes da estrutura de acolhimento ou que faça esta última correr riscos caracterizados de segurança ou de respeito da ordem pública.

A pessoa visada pela sanção de exclusão temporária deve ser ouvida antes da sua adoção.

[…]»

III. Factos do litígio no processo principal e questões prejudiciais

A.      Matéria de facto

19.      Em 23 de dezembro de 2015, Z. Haqbin, de nacionalidade afegã, apresentou um pedido de proteção internacional às autoridades belgas, enquanto menor não acompanhado. Foi sucessivamente acolhido nos centros de acolhimento de Sugny e de Broechem (Bélgica) e, ao abrigo da legislação nacional aplicável, foi‑lhe designado um «tutor» encarregado de o representar e assistir (12).

20.      Em 18 de abril de 2016, Z. Haqbin participou em atos de violência que implicaram residentes de diversas origens étnicas no centro de acolhimento de Broechem. A polícia procedeu então à sua detenção administrativa antes de proceder à sua libertação em 19 de abril de 2016. Nesse mesmo dia, o diretor do centro de acolhimento decidiu aplicar a Z. Haqbin a sanção disciplinar prevista no artigo 45.o da Lei relativa ao Acolhimento (13). Esta sanção implica a exclusão temporária do menor não só do centro de acolhimento mas também de todos os serviços que lhe estão associados, tais como as refeições, o vestuário, as atividades e, sem prejuízo da assistência médica urgente, a cessação do acompanhamento médico, social e psicológico.

21.      Esta decisão foi confirmada em 21 de abril de 2016, pelo diretor‑geral da Fedasil, em conformidade com a legislação nacional aplicável.

22.      Resulta da decisão de reenvio que o interessado teria então dormido no parque Maximilien de Bruxelas, nas noites de 19 para 21 de abril de 2016 e, mais tarde, de 24 de abril para 1 de maio de 2016. Nesse período de tempo, a 25 de abril de 2016, o tutor de Z. Haqbin apresentou no arbeidsrechtbank te Antwerpen (Tribunal do Trabalho de Antuérpia, Bélgica) um requerimento para obter a suspensão da medida de exclusão (14). Este pedido foi indeferido por falta de extrema urgência, uma vez que Z. Haqbin não logrou demonstrar que se encontrava sem alojamento.

23.      Em 4 de maio de 2016, Z. Haqbin foi acolhido no centro de acolhimento de Poelcapelle (Bélgica).

24.      O tutor de Z. Haqbin contestou então as decisões relativas à exclusão do centro de acolhimento de Broechem no Nederlandstalige arbeidsrechtbank Brussel (Tribunal do Trabalho de Língua Neerlandesa de Bruxelas, Bélgica), num requerimento com data de 5 de julho de 2016. O tutor considerava que, nestas circunstâncias, a Fedasil era obrigada a conceder acolhimento ou a prever garantias relativas ao respeito da dignidade humana, durante o período de exclusão do interessado, e pediu a reparação de danos não patrimoniais no montante de um euro.

25.      Por Sentença de 21 de fevereiro de 2017, o Nederlandstalige arbeidsrechtbank Brussel (Tribunal do Trabalho de Língua Neerlandesa de Bruxelas) julgou o pedido improcedente, considerando que Z. Haqbin pedia a reparação de um dano que não foi dado como provado.

26.      Por requerimento apresentado em 27 de março de 2017, o tutor interpôs recurso desta decisão para o órgão jurisdicional de reenvio.

B.      Fundamentação da decisão de reenvio

27.      Em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre a questão de saber se, nos termos do artigo 20.o, n.o 4, da Diretiva 2013/33, um Estado‑Membro pode retirar ou limitar o benefício das condições materiais de acolhimento, em caso de violações graves das regras vigentes nos centros de acolhimento ou de comportamentos violentos graves. Refere‑se, a este respeito, ao parecer do Comité de Contacto instituído para auxiliar os Estados‑Membros na transposição da Diretiva 2013/33 (15), bem como à opinião emitida pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (16). Estes consideram que o artigo 20.o, n.os 1 a 3, da Diretiva 2013/33 estabelece uma lista exaustiva dos fundamentos que justificam a limitação ou a retirada das condições materiais de acolhimento e que o artigo 20.o, n.o 4, desta diretiva visa, por conseguinte, outros tipos de sanções. O órgão jurisdicional de reenvio refere igualmente o parecer emitido pelo Raad van State (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Bélgica), segundo o qual esta leitura não seria a única possível, tendo em conta a redação e a articulação do artigo 20.o, n.os 4 a 6, da referida diretiva (17).

28.      Em segundo lugar, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre as diligências que a autoridade nacional competente deve empreender, em concreto, a fim de garantir, na aceção do artigo 20.o, n.os 5 e 6, da Diretiva 2013/33, um nível de vida digno a todos os requerentes, incluindo o requerente excluído temporariamente de um centro de acolhimento.

29.      O órgão jurisdicional de reenvio rejeita os argumentos expostos pela Fedasil, segundo os quais as responsabilidades que incumbem ao tutor bastariam para cumprir esta obrigação. Baseando‑se nas disposições nacionais relativas à tutela de menores estrangeiros não acompanhados, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que o tutor não é legalmente obrigado a prover ele próprio ao acolhimento do menor não acompanhado e exclui qualquer omissão por parte do tutor (18).

30.      Em contrapartida, o órgão jurisdicional de reenvio manifesta dúvidas quanto às diligências que a autoridade nacional competente deve efetuar. Refere que, nos termos da exposição de motivos do projeto de lei (19) que deu origem à lei que altera a Lei de 12 de janeiro de 2007, relativa ao Acolhimento dos Requerentes de Asilo e de certas outras Categorias de Estrangeiros, de 6 de julho de 2016 (20), essa obrigação está cumprida desde que a Fedasil anexe à sua decisão de exclusão uma lista dos lugares de acolhimento para pessoas sem‑abrigo, aos quais o requerente possa ter acesso. Só no caso de se demonstrar que o requerente não pode efetivamente beneficiar dessas infraestruturas é que a Fedasil seria então obrigada a encontrar, a posteriori, uma solução alternativa.

31.      O órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre se tal procedimento permite cumprir a obrigação prevista no artigo 20.o, n.o 5, da Diretiva 2013/33 ou se a observância desta última exige que a autoridade nacional competente garanta o alojamento antes da exclusão do requerente da estrutura de acolhimento.

32.      Em terceiro lugar, na hipótese de o Tribunal de Justiça considerar que as sanções previstas no artigo 20.o, n.o 4, da Diretiva 2013/33 podem assumir a forma de exclusão das condições materiais de acolhimento, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se se, à luz do artigo 20.o, n.o 5, dos artigos 21.o a 23.o e do artigo 24.o, n.o 2, desta diretiva, tais sanções podem ser aplicadas a um menor e, em particular, a um menor não acompanhado. Acrescenta que, neste mesmo contexto, se coloca igualmente a questão da compatibilidade dessas sanções aplicadas a menores com os artigos 1.o, 3.o, 4.o e 24.o da Carta, evocados no considerando 35 da referida diretiva (21).

C.      Questões prejudiciais

33.      Por conseguinte, o arbeidshof te Brussel (Tribunal do Trabalho de Bruxelas) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Deve o artigo 20.o n.os 1 a 3, da Diretiva [2013/33] ser interpretado no sentido de que enumera exaustivamente os casos em que o benefício das condições materiais de acolhimento pode ser reduzido ou retirado, ou resulta do artigo 20.o, n.os 4 e 5, [desta diretiva] que o direito ao benefício das condições materiais de acolhimento também pode ser retirado a título de sanção aplicável a infrações graves das regras vigentes nos centros de acolhimento, bem como a comportamentos violentos graves?

2)      Deve o artigo 20.o, n.os 5 e 6, [da referida diretiva] ser interpretado no sentido de que os Estados‑Membros devem, antes de tomar uma decisão relativa à redução ou à retirada do benefício das condições materiais de acolhimento ou ainda a sanções, e no âmbito dessas decisões, adotar as necessárias medidas que garantam o direito a um nível de vida condigno durante o período de exclusão, ou poder‑se‑á dar cumprimento às referidas disposições por meio de um sistema através do qual, após a decisão de redução ou retirada do benefício das condições materiais de acolhimento, se averigua se a pessoa objeto da decisão tem um nível de vida condigno e, caso necessário, se adotam no momento medidas corretivas?

3)      Deve o artigo 20.o, n.os 4, 5 e 6, [da Diretiva 2013/33,] conjugado com os [seus] artigos 14.o, 21.o, 22.o, 23.o e 24.o […] e com os artigos 1.o, 3.o, 4.o e 24.o da [Carta], ser interpretado no sentido de que uma medida ou sanção de exclusão temporária (ou definitiva) do direito ao benefício das condições materiais de acolhimento é ou não possível em relação a um menor de idade, mais especificamente em relação a um menor não acompanhado?»

IV.    Análise

34.      O órgão jurisdicional de reenvio questiona o Tribunal de Justiça sobre o alcance das normas previstas no artigo 20.o da Diretiva 2013/33, quando um requerente comete uma violação grave das regras vigentes no centro de acolhimento ou adota um comportamento violento grave. Se a primeira e a segunda questão prejudicial dizem respeito ao tratamento reservado a qualquer requerente, independentemente da sua idade e situação, a terceira questão prejudicial é mais precisa e visa especificamente a situação de Z. Haqbin, ou seja, a de um menor não acompanhado.

35.      Penso que estas questões devem ser tratadas apenas à luz da situação de um menor não acompanhado. Com efeito, o processo principal diz respeito, em primeiro lugar, às modalidades de acolhimento, num Estado‑Membro, de um menor não acompanhado. A sua situação requer uma proteção específica e modalidades de acolhimento adequadas, pelo que a interpretação do artigo 20.o da Diretiva 2013/33 assenta na articulação de disposições específicas abrangidas não só por esta diretiva mas também pela Carta (22).

36.      Por conseguinte, proponho abordar o exame destas questões concentrando‑me na situação particular de um menor não acompanhado.

A.      Quanto à primeira questão prejudicial

37.      Através das suas primeira e terceira questões prejudiciais, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, ao Tribunal de Justiça se o artigo 20.o, n.o 4, da Diretiva 2013/33 se opõe a uma legislação nacional que permite excluir do benefício das condições materiais de acolhimento um menor não acompanhado, pelo facto de este ter cometido uma violação grave das regras vigentes no centro de acolhimento onde foi acolhido ou de ter adotado um comportamento violento grave.

38.      O órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se, portanto, sobre a natureza e o alcance das «sanções aplicáveis» que o Estado‑Membro de acolhimento pode adotar com base no artigo 20.o, n.o 4, desta diretiva.

39.      Para responder a esta questão, é necessário expor os termos e a economia do artigo 20.o da referida diretiva, bem como a finalidade desta disposição.

1.      Termos, economia e finalidade do artigo 20.o da Diretiva 2013/33

40.      A natureza e o alcance das «sanções aplicáveis» referidas no artigo 20.o, n.o 4, da Diretiva 2013/33 suscitam dúvidas na medida em que este artigo tem por epígrafe «Limitação ou retirada do benefício das condições materiais de acolhimento» e constitui o único artigo do capítulo III, que tem esta mesma epígrafe. No entanto, a formulação do n.o 4 desta disposição distingue‑se muito claramente da adotada nos números anteriores, uma vez que o legislador da União não indicou expressamente que o Estado‑Membro de acolhimento pode limitar ou retirar o benefício das condições materiais de acolhimento. Limitou‑se a precisar que os Estados‑Membros «podem estabelecer sanções aplicáveis» em caso de violação grave das regras vigentes no centro de acolhimento ou de comportamentos violentos graves.

41.      Esta formulação e a margem de apreciação que implica para o Estado‑Membro de acolhimento justificam‑se à luz da natureza dos fundamentos visados pelo legislador da União.

42.      Contrariamente aos fundamentos previstos no artigo 20.o, n.os 1 a 3, da Diretiva 2013/33, as «violações graves das regras vigentes nos centros de acolhimento» e os «comportamentos violentos graves» referem‑se a atos suscetíveis não só de perturbar a ordem e a segurança na estrutura de acolhimento mas também de constituir uma infração penal. O legislador da União tem assim em vista atos cuja natureza e gravidade só podem ser apreciadas pelas autoridades nacionais competentes, à luz das leis e dos regulamentos do Estado‑Membro de acolhimento. Este legislador refere‑se igualmente a atos cuja prática implicará, segundo o sistema jurídico e a lei aplicável nesse Estado, a adoção de uma medida ou de uma sanção específica de natureza disciplinar, administrativa ou penal, que pode ir além da limitação ou da retirada do benefício das condições materiais de acolhimento.

43.      Assim, contrariamente aos fundamentos previstos no artigo 20.o, n.os 1 a 3, da Diretiva 2013/33, o fundamento referido no n.o 4 desta disposição exige que se reconheça margem de manobra ao Estado‑Membro de acolhimento. Esta permite‑lhe apreciar em que medida um requerente que tenha cometido um incumprimento grave das regras vigentes no centro de acolhimento ou um ato violento grave deve ser sancionado tendo em conta a natureza e o nível de gravidade do ato. Esta margem de manobra permite igualmente ao Estado‑Membro de acolhimento ter em conta as circunstâncias concretas em que o ato em causa foi cometido, bem como a idade, a situação e as necessidades específicas do autor.

44.      No entanto, a margem de apreciação de que dispõe a este respeito tem limites.

45.      Por um lado, o Estado‑Membro de acolhimento deve respeitar os direitos fundamentais, como resulta do considerando 35 da Diretiva 2013/33. Consequentemente, o artigo 20.o da Diretiva 2013/33 deve ser lido e interpretado à luz, nomeadamente, do respeito pela dignidade humana e pelos direitos da criança consagrados, respetivamente, nos artigos 1.o e 24.o da Carta.

46.      Por outro lado, o Estado‑Membro de acolhimento deve respeitar as obrigações previstas no artigo 20.o, n.os 5 e 6, da referida diretiva.

47.      Em conformidade com o artigo 20.o, n.o 5, da Diretiva 2013/33, a decisão relativa à redução ou à retirada do benefício das condições materiais de acolhimento ou a sanção que pode ser aplicada por violação grave das regras vigentes nos centros de acolhimento ou de comportamentos violentos graves deve preencher vários requisitos de fundo e de forma.

48.      Em primeiro lugar, essa decisão ou sanção deve ser adotada com objetividade e imparcialidade e deve ser fundamentada.

49.      Em segundo lugar, deve ser proporcionada e deve ser adotada na sequência de um exame individualizado, tendo em conta a situação particular e as necessidades específicas das pessoas vulneráveis.

50.      Na hipótese de o ato ser cometido por um menor não acompanhado, o Estado‑Membro de acolhimento deverá tomar em primordial consideração o superior interesse da criança, tal como exige o artigo 23.o da Diretiva 2013/33 (23) e o artigo 24.o, n.o 2, da Carta. Em concreto, deve, assim, ter em devida conta o bem‑estar e o desenvolvimento social do menor, bem como considerações relacionadas com a sua segurança e proteção, em especial na falta de uma eventual tomada a cargo pelo titular do exercício da responsabilidade parental. Deve, além disso, assegurar‑se de que a sanção adotada não privará o menor das garantias associadas à proteção dos seus interesses e à satisfação das suas necessidades especiais.

51.      Por conseguinte, estas disposições implicam que, no caso de o comportamento do menor não acompanhado revelar que as condições da sua educação ou do seu desenvolvimento estão comprometidas, o Estado‑Membro de acolhimento está obrigado a recorrer aos dispositivos de direito comum de proteção da infância, para organizar uma tomada a cargo adaptada às suas necessidades. Este dispositivo parece‑me indispensável no caso de um menor não acompanhado, que é uma pessoa particularmente vulnerável em razão do seu percurso migratório por vezes longo e traumatizante, bem como da sua situação precária, devida à falta de apoio familiar e de recursos próprios.

52.      Por último, em terceiro lugar, o artigo 20.o, n.o 5, da Diretiva 2013/33 precisa que a decisão de limitar ou retirar o benefício das condições materiais de acolhimento ou a sanção aplicável deve assegurar «sejam quais forem as circunstâncias» o acesso aos cuidados de saúde e um nível de vida condigno a todos os requerentes.

53.      Esta disposição visa garantir uma tomada a cargo contínua e respeitadora da dignidade do requerente na sequência de uma sanção adotada pelo Estado‑Membro de acolhimento (24).

54.      Esta tomada a cargo justifica‑se na medida em que a adoção dessa sanção não significa que o direito ao acolhimento tenha legalmente terminado. Enquanto o menor estiver autorizado a continuar no território do Estado‑Membro de acolhimento, para efeitos da análise do seu pedido (25), e desde que não disponha de meios próprios para satisfazer suas necessidades básicas (26), esse Estado deverá assegurar as condições de acolhimento que lhe permitam ter acesso aos cuidados de saúde e viver condignamente (27). Ainda que o legislador da União não especifique as medidas que o Estado‑Membro de acolhimento está concretamente obrigado a adotar a fim de garantir um nível de vida digno, estas medidas devem abranger os direitos mais elementares no momento em que o requerente não dispõe de fontes de rendimento, ou seja, a possibilidade de ter um alojamento, de se alimentar e de se vestir (28).

55.      Em conformidade com o considerando 35 da Diretiva 2013/33, o princípio referido no artigo 20.o, n.o 5, desta diretiva é comandado pelo facto de a referida diretiva respeitar os direitos fundamentais e visar, em especial, garantir o pleno respeito da dignidade humana.

56.      Este princípio tem por objetivo garantir a proteção efetiva do requerente no território do Estado‑Membro de acolhimento, contribuindo assim para reduzir o risco de marginalização a que o requerente está exposto e de «movimentos secundários» pelos quais seria tentado (29).

57.      O respeito pelo referido princípio permite ao requerente exercer o seu direito de asilo e participar no processo de exame do seu pedido de proteção internacional, de acordo com os direitos que lhe são reconhecidos e as obrigações que lhe incumbem por força das Diretivas 2011/95/UE (30) e 2013/32. Estes direitos seriam privados de efeito real e aquelas obrigações desprovidas de efeito útil se não fossem acompanhados de uma tomada a cargo contínua das necessidades mais básicas do requerente. Esta tomada a cargo permite igualmente ao Estado‑Membro de acolhimento proceder a um exame diligente do pedido de proteção internacional, uma vez que, apesar da sanção adotada, esse Estado pode localizar o requerente para efeitos da notificação das diferentes convocações e reuniões (31).

58.      O princípio referido no artigo 20.o, n.o 5, da Diretiva 2013/33 é completado pelas disposições processuais previstas no artigo 20.o, n.o 6, desta diretiva, cujo alcance exporei no âmbito da análise da segunda questão prejudicial.

59.      Posto isto, importa agora saber se, e, sendo caso disso, em que modalidades, o Estado‑Membro de acolhimento pode decretar a retirada das condições materiais de acolhimento em circunstâncias como as que estão em causa.

2.      Natureza das medidas aplicáveis no contexto do artigo 20.o, n.o 4, da Diretiva 2013/33

a)      Sentido e alcance da retirada das condições materiais de acolhimento no contexto do artigo 20.o, n.os 1 e 3, da Diretiva 2013/33

60.      A retirada do benefício das condições materiais de acolhimento é uma decisão que o legislador da União prevê de forma estrita no artigo 20.o da Diretiva 2013/33, na medida em que essa decisão leva a privar o requerente totalmente dependente do auxílio público de alojamento, de alimentação, de vestuário e do subsídio para despesas diárias de que beneficia (32).

61.      O legislador da União autoriza o Estado‑Membro de acolhimento a adotar tal decisão em dois casos.

62.      O primeiro caso é o referido no artigo 20.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33 e abrange a situação em que existe um abuso de direito. A retirada do benefício das condições materiais de acolhimento pode ser prevista em situações excecionais e devidamente justificadas, quando o requerente se subtrai às obrigações exigidas para a análise do seu pedido de proteção internacional, porque deixou o local de residência obrigatória ou não se apresenta às autoridades, ou ainda quando o requerente tiver apresentado um pedido subsequente com o único objetivo de beneficiar das condições de acolhimento.

63.      O segundo caso é o previsto no artigo 20.o, n.o 3, da Diretiva 2013/33 e abrange a situação em que o requerente dissimulou os seus recursos financeiros e pode, na realidade, prover às suas próprias necessidades. Esta disposição deve ser lida à luz do artigo 17.o, n.o 3 desta diretiva, que precisa que o Estado‑Membro de acolhimento pode fazer depender a concessão de todas ou de algumas condições materiais de acolhimento e de cuidados de saúde da condição de o requerente não dispor de meios suficientes para ter um nível de vida adequado à sua saúde e para permitir assegurar a sua subsistência.

64.      Por conseguinte, o legislador da União mostrou prudência no que diz respeito aos casos em que o Estado‑Membro de acolhimento pode retirar o benefício das condições materiais de acolhimento.

65.      Há que usar da mesma prudência no âmbito do artigo 20.o, n.o 4, da Diretiva 2013/33, na medida em que, contrariamente aos dois casos acima referidos, o requerente é sempre, a priori, beneficiário do direito ao acolhimento e não dispõe de recursos para prover às suas necessidades básicas. Estas circunstâncias exigem, portanto, que a medida de retirada do benefício das condições materiais de acolhimento ocorra em condições estritas, tendo em conta não apena só a gravidade do ato cometido mas também a idade, a situação e as necessidades especiais do menor não acompanhado.

b)      Sentido e alcance da retirada das condições materiais de acolhimento no contexto do artigo 20.o, n.o 4, da Diretiva 2013/33

66.      Qualquer requerente tem deveres para com o Estado‑Membro a quem solicita proteção internacional. Estes deveres implicam, em particular, que o requerente respeite as leis e os regulamentos desse Estado e que se submeta a todas as medidas que visem manter a segurança e a ordem pública (33). Assim, é legítimo que o Estado‑Membro de acolhimento tome as suas medidas a fim de garantir a segurança física e moral do pessoal e dos residentes no centro de acolhimento, nomeadamente quando o ato cometido gerou riscos caracterizados para a sua segurança e para o respeito da ordem pública nessa estrutura.

67.      Este ato implica a adoção de uma sanção, mas revela sobretudo a necessidade de organizar uma tomada a cargo distinta da que foi proposta no âmbito do acolhimento, ainda mais quando o referido ato é violento e reiterado. Com efeito, independentemente da situação do menor em causa e da gravidade do ato cometido, a sua menoridade justifica que seja protegido.

68.      A limitação do benefício das condições materiais de acolhimento pode não ser uma medida adaptada à situação desse menor nem responder às suas necessidades específicas (34).

69.      A adaptação destas condições pode igualmente não ser uma medida adequada. A este respeito, as disposições conjugadas previstas no artigo 18.o, n.o 9, alínea a) (35), e no artigo 22.o, n.os 1 e 3, da Diretiva 2013/33 (36) têm por destinatários, antes de mais, as pessoas cuja vulnerabilidade possa vir a acentuar‑se devido ao seu estado, como as mulheres grávidas, as pessoas que sofrem de doenças graves ou de perturbações mentais, ou ainda as vítimas de violação ou de tráfico de seres humanos. Na minha opinião, estas disposições não são aplicáveis no caso de um menor não acompanhado relativamente ao qual se pode presumir, atendendo às reiteradas violências que cometeu, que as condições da sua educação ou do seu desenvolvimento estão comprometidas.

70.      Nestas circunstâncias, a retirada do benefício das condições materiais de acolhimento é uma decisão que se pode impor na medida em que a tomada a cargo do menor não acompanhado se revele, em razão dos meios que exige e dos objetivos que prossegue, não poder inscrever‑se no âmbito do dispositivo de acolhimento previsto pela Diretiva 2013/33.

71.      A decisão de revogação do benefício das condições materiais inicialmente concedidas só pode, portanto, ser entendida quando seja acompanhada da intervenção dos serviços de assistência e/ou das autoridades judiciárias encarregadas da proteção da infância. Estes últimos são quem melhor pode apreciar as necessidades específicas desse menor, ordenando, nomeadamente, medidas de assistência executadas por pessoal qualificado no âmbito de um alojamento adaptado.

72.      Esta grelha de análise aplica‑se a fortiori quando o ato cometido em violação das leis e dos regulamentos do Estado‑Membro de acolhimento constitua uma infração penal. Com efeito, a prática de um ato delinquente ou criminoso implica, ipso facto, o recurso às autoridades judiciárias responsáveis pela proteção da infância, bem como a colocação ou a detenção do menor no quadro de uma estrutura adaptada e, concomitantemente, a retirada do benefício das condições materiais de acolhimento. Esta retirada ocorre aqui no contexto de um processo penal que garanta todos os direitos do menor e é acompanhada, por conseguinte, de medidas educativas e coercivas justificadas pela situação do menor e pela gravidade do ato.

B.      Quanto à segunda questão prejudicial

73.      Com as suas segunda e terceira questões prejudiciais, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre as diligências que a autoridade nacional competente deve concretamente empreender com base no artigo 20.o, n.os 5 e 6, da Diretiva 2013/33, a fim de garantir um nível de vida digno ao menor não acompanhado, excluído temporariamente de um centro de acolhimento.

74.      Em especial, esse órgão jurisdicional pergunta ao Tribunal de Justiça se a) a obrigação prevista no artigo 20.o, n.o 5, desta diretiva é cumprida quando a autoridade nacional competente anexa à sua decisão de exclusão do centro de acolhimento uma lista dos locais de acolhimento para pessoas sem‑abrigo, aos quais o requerente se poderia dirigir, ou b) se, em contrapartida, é necessário que essa autoridade encontre uma solução alternativa de alojamento antes da adoção dessa decisão.

75.      A resposta a esta questão decorre do artigo 20.o, n.o 6, da Diretiva 2013/33, nos termos do qual «[o]s Estados‑Membros asseguram que as condições materiais de acolhimento não são retiradas ou reduzidas antes de ser tomada uma decisão nos termos do n.o 5 [da referida disposição]» (37), e impõe‑se à luz da economia geral e da finalidade desta diretiva.

76.      O artigo 20.o, n.o 6, da Diretiva 2013/33 constitui, antes de mais, uma disposição de natureza processual que permite garantir, na sequência de uma sanção que o Estado‑Membro de acolhimento adotou, uma tomada a cargo contínua e respeitadora da dignidade do requerente, em conformidade com os requisitos referidos no artigo 20.o, n.o 5, desta diretiva (38).

77.      O princípio da continuidade da tomada a cargo vê‑se igualmente no considerando 8 da referida diretiva, que precisa que esta «deverá aplicar‑se a todas as fases e todos os tipos de procedimentos relativos a pedidos de proteção internacional, a todos os locais e instalações de acolhimento de requerentes, e enquanto estes sejam autorizados a permanecer no território dos Estados‑Membros na qualidade de requerentes».

78.      Este princípio visa não só garantir o respeito dos direitos fundamentais do requerente mas igualmente assegurar o efeito útil da Diretiva 2013/33. Como já observei, os direitos de que o requerente beneficia e as obrigações que lhe incumbem por força das Diretivas 2011/95 e 2013/32 ficariam privados de efeito real se não fossem acompanhados de uma tomada a cargo das suas necessidades mais básicas, ainda que durante um lapso de tempo muito curto, em especial quando o requerente é um menor não acompanhado.

79.      O Tribunal de Justiça já tinha enunciado este princípio no Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Saciri e o. (39), relativo à interpretação do artigo 13.o da Diretiva 2003/9/CE (40). O Tribunal de Justiça decidiu que «a economia geral e a finalidade da Diretiva 2003/9, bem como o respeito dos direitos fundamentais, nomeadamente as exigências do artigo 1.o da [Carta], segundo o qual a dignidade humana deve ser respeitada e protegida, opõem‑se a que um requerente de asilo seja privado, nem que seja por um período temporário, após a apresentação do pedido de asilo, da proteção das normas mínimas previstas nessa diretiva» (41).

80.      Encontramos também este princípio na jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. No Acórdão Winterstein e o. c. França (42), que dizia respeito à legalidade de um processo de expulsão instaurado contra comunidades itinerantes, o Tribunal de Justiça considerou que as consequências da expulsão e a vulnerabilidade dos recorrentes devem ser tidas em conta pelas autoridades antes do início do processo de expulsão.

81.      O artigo 20.o, n.o 6, da Diretiva 2013/33 não tolera, portanto, nenhuma rutura na continuidade da tomada a cargo do menor, uma vez que exige que este não seja privado, mesmo durante um período muito curto, das garantias que lhe confere o artigo 20.o, n.o 5, desta diretiva.

82.      O respeito destas exigências significa que o Estado‑Membro de acolhimento deve assegurar, ainda antes da adoção de uma decisão de redução ou de retirada do benefício das condições materiais de acolhimento ou de uma sanção a que se refere o artigo 20.o, n.o 4, da Diretiva 2013/33, a tomada a cargo das necessidades básicas do requerente, de maneira a garantir a sua subsistência e um nível de vida digno e adequado para a sua saúde, permitindo‑lhe, nomeadamente, alojar‑se, alimentar‑se, vestir‑se e atender, se for caso disso, às suas necessidades especiais.

83.      No contexto da exclusão de um menor não acompanhado de um centro de acolhimento, a autoridade nacional competente deve, antes da adoção da decisão de exclusão, recorrer aos serviços de assistência e/ou às autoridades judiciárias encarregadas da proteção da infância, de modo a estes poderem colocar o menor numa estrutura adaptada às suas necessidades e, se os factos e a situação do menor o justificarem, ordenar medidas de assistência.

84.      Por conseguinte, não é suficiente, como sugere a Fedasil, juntar à decisão de exclusão uma lista dos locais de acolhimento para as pessoas sem‑abrigo, aos quais o menor não acompanhado ou o seu representante se poderiam dirigir.

85.      Este procedimento não está de acordo com a consideração imposta pelo interesse superior da criança. Implica um risco de rutura na continuidade da tomada a cargo do menor, que é ilustrada pelo processo em causa. Esperar que este encontre um alojamento com base numa lista dos lugares de acolhimento, mesmo com o auxílio do seu tutor, é uma aposta arriscada, pois, ainda que haja possibilidades de alojamento, é necessário que esse alojamento esteja disponível e seja adequado à situação de um menor estrangeiro não acompanhado. Ora, os locais de acolhimento para pessoas sem‑abrigo não permitem garantir que esse menor será alojado, alimentado e vestido durante toda a sua exclusão e também não permitem satisfazer as necessidades específicas que a sua idade, o seu estatuto e a sua situação exigem (43).

86.      A interpretação defendida pela Fedasil perante o órgão jurisdicional de reenvio não tem em conta a situação de precariedade, de vulnerabilidade e de privação em que o menor não acompanhado se poderá encontrar e não garante o respeito dos direitos de que este beneficia nos termos da Diretiva 2013/33 e da Carta.

87.      Tendo em conta o conjunto destes elementos, sou de opinião de que, no caso de um menor não acompanhado cometer uma violação grave das regras vigentes num centro de acolhimento ou adotar um comportamento violento grave, gerando riscos caracterizados para o respeito da ordem pública nesse centro ou para a segurança do pessoal ou dos outros residentes do referido centro, o artigo 20.o, n.os 5 e 6, da Diretiva 2013/33 deve ser interpretado no sentido de que a autoridade nacional competente deve, antes da adoção da decisão de exclusão, recorrer aos serviços de assistência e/ou às autoridades judiciárias encarregadas da proteção da infância, de modo a garantir que esse menor beneficiará de uma tomada a cargo contínua e adaptada às necessidades específicas que a sua idade, o seu estatuto e a sua situação exigem.

V.      Conclusão

88.      Tendo em conta as reflexões precedentes, proponho ao Tribunal de Justiça que responda nos seguintes termos às questões prejudiciais submetidas pelo arbeidshof te Brussel (Tribunal do Trabalho de Bruxelas, Bélgica):

Em circunstâncias como as que estão em causa, em que um menor não acompanhado praticou um ato particularmente violento gerador de riscos caracterizados para o respeito da ordem e da segurança no seio de uma estrutura de acolhimento, o artigo 20.o, n.o 4, da Diretiva 2013/33/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma legislação nacional que permite decretar a retirada das condições materiais de acolhimento, desde que essa decisão seja acompanhada do recurso prévio aos serviços de assistência e/ou das autoridades judiciárias responsáveis pela proteção da infância, de modo a garantir que esse menor beneficiará de uma tomada a cargo contínua e adaptada às necessidades específicas que a sua idade, o seu estatuto e a sua situação exigem.


1      Língua original: francês.


2      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional (JO 2013, L 180, p. 96). A Comissão Europeia propôs a reformulação desta diretiva no âmbito da sua proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional [COM(2016) 465 final].


3      A seguir «Fedasil».


4      C‑179/11, EU:C:2012:594.


5      C‑79/13, EU:C:2014:103.


6      A seguir «requerente».


7      A seguir «Carta».


8      Adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, na sua Resolução 44/25, de 20 de novembro de 1989, e entrada em vigor em 2 de setembro de 1990.


9      Assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950; a seguir «CEDH».


10      JO 2013, L 180, p. 60.


11      Belgisch Staatsblad, 7 de maio de 2007, p. 24027; a seguir «Lei relativa ao Acolhimento».


12      Como precisou o Governo belga na audiência, o tutor deve ser considerado o «representante», na aceção do artigo 2.o, alínea j), da Diretiva 2013/33.


13      Segundo o artigo 45.o, sétimo parágrafo, da Lei relativa ao Acolhimento, a sanção de exclusão temporária de um centro de acolhimento só pode ser pronunciada em caso de incumprimento muito grave do regulamento interno da estrutura de acolhimento que ponha em perigo o pessoal ou os outros residentes da estrutura de acolhimento ou que gira riscos caracterizados para a segurança ou o respeito da ordem pública na estrutura de acolhimento. O Grondwettelijk Hof (Tribunal Constitucional, Bélgica), no seu Acórdão de 27 de julho de 2011, n.o 135/2011, validou a legalidade desta disposição, ao considerar que a sanção prevista não era desproporcionada ao objetivo legítimo prosseguido pelo legislador nacional e não reduzia significativamente o nível de proteção em matéria de assistência social (v., em particular, o ponto B.18.1 e segs. deste acórdão). A este respeito, o Grondwettelijk Hof (Tribunal Constitucional) salientou que, nos termos dos trabalhos preparatórios dessa legislação, «esta medida extrema só [deve ser] tomada se se provar que outras medidas menos atentatórias dos direitos e liberdades do beneficiário do acolhimento (nomeadamente quanto ao respeito da dignidade humana) não permitiram ou não permitem alcançar o objetivo prosseguido, a saber, garantir um acolhimento seguro para todos os residentes do centro».


14      O arbeidsrechtbank (Tribunal do Trabalho, Bélgica) conhece, com efeito, das impugnações relativas a qualquer violação dos direitos garantidos aos beneficiários do acolhimento pelos livros II e III da Lei relativa ao Acolhimento, em conformidade com o artigo 580.o, 8°, alínea f), do Gerechtelijk wetboek (Código Judiciário), bem como da aplicação das sanções administrativas previstas nestes livros, em conformidade com o artigo 583.o, primeiro parágrafo, do Código Judiciário.


15      Contact Committee «Reception Conditions Directive» (2013/33/CE). Numa reunião de 12 de setembro de 2013, este Comité de Contacto considerou que o artigo 20.o, n.os 1 a 3, da Diretiva 2013/33 estabelecia uma lista exaustiva dos motivos que justificavam a limitação ou a retirada das condições materiais de acolhimento. O artigo 20.o, n.o 4, desta diretiva visa, por conseguinte, outros tipos de sanções.


16      A seguir «HCR». Comentários do  HCR  sobre  o anteprojeto de lei que deu origem à wet tot wijziging van 12 januari 2007 betreffende de opvang van asielzoekers en van bepaalde andere categorieën van vreemdelingen (Lei que altera a Lei de 12 de janeiro de 2007 relativa ao Acolhimento dos Requerentes de Asilo e de certas outras Categorias de Estrangeiros), de 6 de julho de 2016 (Belgisch Staatsblad, 5 de agosto de 2016, p. 47647), adotada com vista à transposição parcial da Diretiva 2013/33, disponíveis no seguinte endereço da Internet: https://www.refworld.org/docid/5746b44b4.html, o HCR partilha da tese expressa pelo referido  Comité de Contacto.


17      Parecer de 27 de abril de 2016, n.o 59.196/4.


18      As obrigações que incumbem ao tutor são definidas na Programmawet (Lei‑Programa), de 24 de dezembro de 2002 (Belgisch Staatsblad, 31 de dezembro de 2002, p. 58686). É necessário, em especial, fazer referência aos artigos 9.o a 13.o, contidos no título XIII, capítulo 6, desta lei, com a epígrafe «Tutela de menores estrangeiros não acompanhados». Esta legislação é completada pelas disposições previstas, por um lado, pelo Koninklijk besluit tot uitvoering van Titel XIII, Hoofdstuk 6 «Voogdij over niet‑begeleide minderjarige vreemdelingen» van de programmawet van 24 december 2002 (Decreto Real de Execução do Título XIII, Capítulo 6, «Tutela de menores estrangeiros não acompanhados» da Lei‑Programa de 24 de dezembro de 2002), de 22 de dezembro de 2003 (Belgisch Staatsblad, 29 de janeiro de 2004, p. 5538), e, por outro, pelas diretrizes gerais para os tutores de menores estrangeiros não acompanhados, de 2 de dezembro de 2013, disponíveis no endereço de Internet seguinte: https://justice.belgium.be/sites/default/files/directives_generales_pour_tuteurs__02_12_2013.pdfhttps://justice.belgium.be/sites/default/files/directives_generales_pour_tuteurs__02_12_2013.pdf [v., em particular, ponto 2.8, números 66 a 73, destas diretrizes].


19      Wetsontwerp tot wijziging van de wet van 12 januari 2007 betreffende de opvang van asielzoekers en van bepaalde andere categorieën van vreemdelingen (projeto de lei que altera a Lei de 12 de janeiro de 2007, relativa ao Acolhimento dos Requerentes de Asilo e de certas outras Categorias de Estrangeiros) da Câmara dos Representantes da Bélgica, de 18 de maio de 2016 (Doc 54, 1839/001).


20      Referida na nota 16.


21      Saliento que o considerando 35 da Diretiva 2013/33 se refere aos artigos 1.o, 4.o, 6.o, 7.o, 18.o, 21.o, 24.o e 47.o da Carta.


22      V., a este respeito, a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho, de 12 de abril de 2017, com a epígrafe «A proteção das crianças migrantes» [COM(2017) 211 final], bem como as Orientações do Gabinete Europeu de Apoio em Matéria de Asilo, relativas às condições de acolhimento: normas operacionais e indicadores, setembro de 2016 (disponível no endereço Internet seguinte: https://www.easo.europa.eu/sites/default/files/Guidance‑on‑ReceptionConditions‑FR.pdf), e relativas às condições de acolhimento dos menores não acompanhados: normas operacionais e indicadores, dezembro de 2018 (disponível no endereço Internet seguinte: https://www.easo.europa.eu/sites/default/files/Guidance‑on%20reception‑%20conditions‑%20for‑unaccompanied‑children.pdf).


23      V., igualmente, considerandos 9, 14 e 22 desta diretiva.


24      Este princípio resulta dos considerandos 11 e 25 da Diretiva 2013/33.


25      V., a este respeito, o disposto no artigo 9.o da Diretiva 2013/32.


26      V., a este respeito, o artigo 17.o, n.os 2 e 3, da Diretiva 2013/33.


27      V., a este respeito, Acórdão de 18 de dezembro de 2014, Abdida (C‑562/13, EU:C:2014:2453, n.os 59 a 62), relativo à interpretação do artigo 14.o da Diretiva 2008/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados‑Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular (JO 2008, L 348, p. 98), no qual o Tribunal de Justiça declarou que o Estado‑Membro em causa deve tomar a seu cargo, tanto quanto possível, as necessidades básicas de um nacional de um país terceiro que padeça de uma doença grave, enquanto aguarda o afastamento, quando este não disponha dos meios para prover, ele próprio, às suas necessidades.


28      V., a este respeito, Acórdão de 19 de março de 2019, Jawo (C‑163/17, EU:C:2019:218, n.o 92), no qual o Tribunal de Justiça declarou que as necessidades mais básicas abrangiam, nomeadamente, alimentar‑se, lavar‑se e ter alojamento.


29      V., a este respeito, considerando 12 da Diretiva 2013/33.


30      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, que estabelece normas relativas às condições a preencher pelos nacionais de países terceiros ou por apátridas para poderem beneficiar de proteção internacional, a um estatuto uniforme para refugiados ou pessoas elegíveis para proteção subsidiária e ao conteúdo da proteção concedida (JO 2011, L 337, p. 9).


31      É, aliás, para garantir um tratamento rápido e eficaz do pedido de proteção internacional que o artigo 7.o, n.o 2, da Diretiva 2013/33 permite ao Estado‑Membro de acolhimento decidir sobre o lugar de residência do requerente.


32      Sempre que as condições materiais de acolhimento assumam a forma de subsídio financeiro, a retirada conduz à supressão do pagamento desse subsídio.


33      V., a este respeito, a opinião partilhada pelo HCR no âmbito dos seus comentários referidos na nota 16 das presentes conclusões (https://www.refworld.org/docid/5746b44b4.html, n.o 20).


34      Na Bélgica, onde o apoio material cobre um maior número de serviços do que os abrangidos pelas condições materiais de acolhimento definidas pela Diretiva 2013/33, essa limitação pode dizer respeito ao acesso a certos serviços. O artigo 45.o da Lei relativa ao Acolhimento autoriza, assim, a Fedasil a restringir o acesso a determinados serviços ou ainda a suprimir ou diminuir temporariamente o subsídio diário. Esta sanção diz respeito a atos de menor gravidade do que os que estão em causa.


35      Por força desta disposição, o Estado‑Membro de acolhimento pode, excecionalmente, estabelecer condições materiais de acolhimento diferentes sempre que seja necessário avaliar as necessidades específicas de uma pessoa vulnerável.


36      Em aplicação desta disposição, o Estado‑Membro de acolhimento deve proceder a um acompanhamento adequado da situação do requerente e ter em conta as suas necessidades especiais, se estas surgirem numa fase posterior do procedimento de asilo, a fim de lhe conceder um apoio específico.


37      O sublinhado é meu.


38      V., neste sentido, Acórdão TEDH, 21 de janeiro de 2011, M.S.S. c. Bélgica e Grécia (CE:ECHR:2011:0121JUD003069609, §§ 252 a 263), no qual o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem considerou que a situação de um requerente de asilo que «se encontrou a viver na rua durante meses, sem recursos, sem acesso a sanitários, não dispondo de meios para prover às suas necessidades essenciais», atingiu o limiar de gravidade exigido pelo artigo 3.o da CEDH. V., igualmente, TEDH, 18 de junho de 2009, Budina c. Rússia (CE:ECHR:2009:0618DEC004560305).


39      C‑79/13, EU:C:2014:103.


40      Diretiva do Conselho, de 27 de janeiro de 2003, que estabelece normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados‑Membros (JO 2003, L 31, p. 18).


41      Acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Saciri e o. (C‑79/13, EU:C:2014:103, n.o 35 e jurisprudência referida); o sublinhado é meu.


42      TEDH, 17 de outubro de 2013 (CE:ECHR:2013:1017JUD002701307, § 161).


43      Como resulta do artigo 18.o da Lei relativa ao Acolhimento, a permanência numa estrutura de acolhimento de emergência não pode exceder dez dias e as necessidades básicas do beneficiário do acolhimento devem ser aí satisfeitas. Estas incluem toda a assistência necessária, nomeadamente a alimentação, o alojamento, o acesso a instalações sanitárias e o acompanhamento médico.