Language of document : ECLI:EU:C:2023:1026

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

21 de dezembro de 2023 (*)

«Reenvio prejudicial — Liberdade de estabelecimento — Livre prestação de serviços — Diretiva 2006/123/CE — Artigo 2.o, n.o 2, alínea b) — Âmbito de aplicação — Exclusão dos serviços financeiros — Aluguer de automóveis de longa duração — Artigos 9.o, n.o 1, e 10.o, n.os 1 e 2 — Serviços sujeitos a autorização prévia»

No processo C‑278/22,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Upravni sud u Zagrebu (Tribunal Administrativo de Primeira Instância de Zagrebe, Croácia), por Decisão de 12 de abril de 2022, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 22 de abril de 2022, no processo

AUTOTECHNICA FLEET SERVICES d.o.o., anteriormente ANTERRA d.o.o.,

contra

Hrvatska agencija za nadzor financijskih usluga,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: E. Regan, presidente de secção, L. Bay Larsen, vice‑presidente do Tribunal de Justiça, exercendo funções de juiz da Quinta Secção, M. Ilešič, I. Jarukaitis e D. Gratsias (relator), juízes,

advogado‑geral: M. Szpunar,

secretário: M. Longar, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 1 de março de 2023,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da AUTOTECHNICA FLEET SERVICES d.o.o., por G. Božić, odvjetnik, A. Komninos, dikigoros, D. Simeunović, odvjetnica e J. Tomas, odvjetnik,

–        em representação da Hrvatska agencija za nadzor financijskih usluga, por K. Brkljačić e I. Budiša,

–        em representação do Governo Croata, por G. Vidović Mesarek, na qualidade de agente,

–        em representação do Governo Neerlandês, por M. K. Bulterman e J. Langer, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por C. Auvret, M. Mataija, R. Mrljić A. Nijenhuis e D. Triantafyllou, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 11 de maio de 2023,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 49.o TFUE, do artigo 2.o, n.o 2, da Diretiva 2006/123/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno (JO 2006, L 376, p. 36), e do artigo 4.o, n.o 1, ponto 26, do Regulamento (UE) n.o 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativo aos requisitos prudenciais para as instituições de crédito e para as empresas de investimento e que altera o Regulamento (UE) n.o 648/2012 (JO 2013, L 176, p. 1).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a AUTOTECHNICA FLEET SERVICES d.o.o., anteriormente ANTERRA d.o.o. (a seguir «Autotechnica») à Hrvatska agencija za nadzor financijskih usluga Republike Hrvatske (Agência Croata de Supervisão dos Serviços Financeiros, a seguir «Agência»), a respeito de uma decisão que proíbe a Autotechnica de exercer atividades de leasing sem ter obtido a autorização prévia da Agência.

 Quadro jurídico

 Direito da União

 Diretiva 2006/123

3        Os considerandos 18, 33 e 54 da Diretiva 2006/123 enunciam:

«(18)      Os serviços financeiros deverão ser excluídos do âmbito de aplicação da presente diretiva visto que estas atividades são objeto de legislação comunitária específica que visa realizar, tal como a presente diretiva, um verdadeiro mercado interno dos serviços. Consequentemente, esta exclusão deverá dizer respeito a todos os serviços financeiros, como serviços bancários, de crédito, de seguros, incluindo resseguros, de regimes de pensões profissionais ou individuais, de títulos, de fundos de investimento, de pagamento e de consultoria de investimento e, ainda, aos serviços referidos no Anexo I da Diretiva 2006/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2006, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e ao seu exercício [(JO 2006, L 177, p. 1)].

[…]

(33)      Os serviços abrangidos pela presente diretiva pertencem a um amplo leque de atividades em constante evolução […]. Os serviços abrangidos englobam também os serviços fornecidos simultaneamente às empresas e aos consumidores, como […] o aluguer de automóveis […]

[…]

(54)      A possibilidade de ter acesso a uma atividade de serviços só deverá depender de uma autorização das autoridades competentes se forem observados os critérios de não discriminação, de necessidade e de proporcionalidade. Isto significa, nomeadamente, que uma autorização só deverá ser admissível quando não seja eficaz um controlo a posteriori dada a impossibilidade de constatar a posteriori os defeitos dos serviços em causa e tendo em devida conta os riscos e perigos decorrentes da ausência de controlo a priori. […]»

4        Como enuncia o seu artigo 1.o, n.o 1, esta diretiva estabelece disposições gerais que facilitam o exercício da liberdade de estabelecimento dos prestadores de serviços e a livre circulação dos serviços, mantendo simultaneamente um elevado nível de qualidade dos serviços.

5        O artigo 2.o da referida diretiva prevê nos seus n.os 1 e 2:

«1.      A presente diretiva é aplicável aos serviços fornecidos pelos prestadores estabelecidos num Estado‑Membro.

2. A presente diretiva não se aplica às seguintes atividades:

[…]

b)      Serviços financeiros, como serviços bancários, de crédito, de seguros, de resseguros, de regimes de pensões profissionais ou individuais, de títulos, de investimento, de fundos, de pagamento e de consultoria de investimento, incluindo os serviços enumerados no Anexo I da Diretiva [2006/48/CE];

[…]».

6        O artigo 4.o da Diretiva 2006/123, sob a epígrafe «Definições», tem a seguinte redação:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

1)      “Serviço”: qualquer atividade económica não assalariada prestada geralmente mediante remuneração, referida no artigo [57.o do TFUE];

[…]

6)      “Regime de autorização”: qualquer procedimento que tenha por efeito obrigar um prestador ou um destinatário a efetuar uma diligência junto de uma autoridade competente para obter uma decisão formal ou uma decisão tácita relativa ao acesso a uma atividade de serviço ou ao seu exercício;

[…]

8)      “Razões imperiosas de interesse geral”: razões reconhecidas como tal pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, nomeadamente pelos seguintes motivos: ordem pública; segurança pública e segurança das pessoas; saúde pública; preservação do equilíbrio financeiro do regime de segurança social; defesa dos consumidores, dos destinatários dos serviços e dos trabalhadores; lealdade das transações comerciais; combate à fraude; proteção do ambiente e do ambiente urbano; saúde animal; propriedade intelectual; conservação do património histórico e artístico nacional; objetivos de política social e de política cultural;

[…]»

7        O artigo 9.o da Diretiva 2006/123, sob a epígrafe «Regimes de autorização», dispõe:

«1.      Os Estados‑Membros só podem subordinar a um regime de autorização o acesso a uma atividade de serviços e o seu exercício se forem cumpridas as condições seguintes:

a)      O regime de autorização não ser discriminatório em relação ao prestador visado;

b)      A necessidade de um regime de autorização ser justificada por uma razão imperiosa de interesse geral;

c)      O objetivo pretendido não poder ser atingido através de uma medida menos restritiva, nomeadamente porque um controlo a posteriori significaria uma intervenção demasiado tardia para se poder obter uma real eficácia.

[…]

3.      A presente secção não é aplicável aos aspetos dos regimes de autorização que são regidos, direta ou indiretamente, por outros instrumentos comunitários.»

8        O artigo 10.o dessa diretiva, sob a epígrafe «Condições de concessão da autorização», desta diretiva prevê, nos seus n.os 1 e 2:

«1.      Os regimes de autorização devem basear‑se em critérios que obstem a que as autoridades competentes exerçam o seu poder de apreciação de forma arbitrária.

2.      Os critérios referidos no n.o 1 devem ser:

a)      Não discriminatórios;

b)      Justificados por uma razão imperiosa de interesse geral;

c)      Proporcionados em relação a esse objetivo de interesse geral;

d)      Claros e inequívocos;

e)      Objetivos;

f)      Previamente publicados;

g)      Transparentes e acessíveis.»

9        Os artigos 11.o a 13.o da referida diretiva visam, respetivamente, a duração da autorização, a seleção entre vários candidatos e os procedimentos de autorização.

 Diretiva 2013/36/UE

10      Por força do artigo 163.o da Diretiva 2013/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e à supervisão prudencial das instituições de crédito e empresas de investimento, que altera a Diretiva 2002/87/CE e revoga as Diretivas 2006/48/CE e 2006/49/CE (JO 2013, L 176, p. 338), a Diretiva 2006/48 foi revogada. Resulta desse artigo 163.o, lido em conjugação com o anexo II da Diretiva 2013/36, que as remissões para o anexo I da Diretiva 2006/48 devem entender‑se como sendo feitas para o anexo I da Diretiva 2013/36. Este último anexo I sob a epígrafe «Lista das operações que beneficiam de reconhecimento mútuo» refere‑se, no seu ponto 3, à «[l]ocação financeira».

 O Regulamento n.o 575/2013

11      O artigo 1.o do Regulamento n.o 575/2013 estabelece as regras uniformes em matéria de requisitos prudenciais gerais que todas as instituições sujeitas a supervisão nos termos da Diretiva 2013/36 cumprem.

12      A expressão «Instituição financeira», na aceção desse regulamento, é definida no seu artigo 4.o, n.o 1, ponto 26.

 Direito croata

 Lei relativa à Agência Croata de Supervisão dos Serviços Financeiros

13      O artigo 15.o, n.o 1, da Zakon o Hrvatskoj agenciji za nadzor financijskih usluga (Lei relativa à Agência Croata de Supervisão dos Serviços Financeiros) (Narodne novine, br. 140/05, 154/11 e 12/12; a seguir «Lei relativa à Agência») dispõe que a Agência está autorizada a adotar disposições de execução, a saber, disposições relativas, nomeadamente, aos serviços financeiros. Nos termos do n.o 2 desse artigo 15.o, a Agência está autorizada a fiscalizar as atividades dos organismos sujeitos a supervisão referidos nas disposições enunciadas no n.o 1 desse artigo 15.o e a impor medidas destinadas a sanar as ilegalidades e irregularidades constatadas.

 Lei do Leasing

14      Nos termos do artigo 2.o, n.o 4, da Zakon o leasingu (Lei do Leasing) (Narodne novine, br.141/13), uma «sociedade de leasing» de um Estado‑Membro é uma pessoa coletiva estabelecida num Estado‑Membro que está habilitada, nos termos da legislação desse Estado‑Membro, a exercer atividades de leasing.

15      O artigo 3.o, n.o 1, desta lei define a «sociedade de leasing» como uma sociedade comercial com sede na República da Croácia, inscrita no registo comercial com base numa autorização para exercer a atividade de leasing, emitida pela Agência nas condições previstas nesta lei.

16      O artigo 4.o, n.o 1, da mesma lei prevê que o leasing é um negócio jurídico mediante o qual o locador adquire a coisa objeto do «leasing» através da sua compra ao fornecedor, adquirindo o direito de propriedade sobre a mesma, e autoriza o locatário a utilizar a coisa objeto do leasing durante um certo período temporal, comprometendo‑se este último a pagar um encargo por essa utilização.

17      O artigo 5.o, n.o 1, da lei do leasing prevê que, em função do conteúdo e das especificidades do leasing, este pode ser «leasing financeiro (financijski leasing)» ou «leasing operacional (operativni leasing)».

18      O «leasing financeiro» é definido no n.o 2 deste artigo como um negócio jurídico pelo qual o locatário, durante o período de utilização da coisa objeto de leasing, paga ao locador um encargo que tem em conta o valor total dessa coisa, suporta os custos de depreciação da coisa sujeita a leasing, e, através de uma opção de compra, pode obter o direito de propriedade dessa coisa por um preço determinado que, no momento do exercício dessa opção, é inferior ao valor real da coisa nesse momento, sendo os riscos e benefícios da propriedade da coisa em grande parte transferidos para o locatário.

19      O n.o 3 do referido artigo 5.o dispõe que o «leasing operacional» é um negócio jurídico pelo qual o locatário, durante o período de utilização da coisa objeto de leasing, paga ao locador uma determinada taxa que não tem de ter em conta o valor total da coisa, o locador suporta os custos de depreciação da coisa e o locatário não tem a opção contratual de compra, sendo os riscos e benefícios da propriedade da coisa em grande medida suportados pelo locador, ou seja, não são transferidos para o locatário.

20      O artigo 6.o, n.o 1, da Lei do Leasing prevê que as atividades de leasing podem ser desenvolvidas por uma sociedade de leasing referida no artigo 3.o dessa lei, uma sociedade de leasing de um Estado‑Membro referida no artigo 46.o dessa lei e uma sucursal de uma sociedade de leasing de um país terceiro referida no artigo 48.o dessa lei.

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

21      A Autotechnica é uma sociedade registada na Croácia para o exercício das atividades de «leasing de veículos automóveis», de «aluguer e leasing de veículos ligeiros de passageiros e de veículos pesados (com ou sem condutor)», bem como de «aluguer e leasing de bicicletas, de scooters, e de veículos semelhantes». É a filial de uma sociedade‑mãe estabelecida noutro Estado‑Membro da União Europeia e que presta, nesse Estado‑Membro, serviços do mesmo tipo.

22      No âmbito de uma inspeção à Autotechnica, a Agência verificou que esta sociedade tinha celebrado três contratos de leasing de quatro automóveis de longo prazo e que, posteriormente, a pedido expresso dos seus clientes, tinha comprado estes automóveis ao fornecedor, adquirindo assim a propriedade dos mesmos, e os tinha disponibilizado aos clientes para sua utilização.

23      Tendo isso em conta, a Agência considerou que a Autotechnica exercia uma atividade de leasing, na aceção da lei do leasing, sem autorização válida. Por conseguinte, por Decisão de 14 de fevereiro de 2019, proibiu a Autotechnica de exercer essa atividade.

24      A Autotechnica interpôs recurso de anulação desta decisão no Upravni sud u Zagrebu (Tribunal Administrativo de Primeira Instância de Zagreb, Croácia). Alega uma violação dos direitos que lhe são conferidos pelo direito da União, argumentando que a República da Croácia não podia equiparar o «leasing operacional» a um serviço financeiro, pelo que a prestação destes serviços não tinha que estar sujeita à supervisão da Agência.

25      O órgão jurisdicional de reenvio salienta que o anexo I da Diretiva 2013/36, na sua versão em língua croata, refere‑se exclusivamente ao «financijski lizing (leasing financeiro)» e não abrange o «operativni lizing (leasing operacional)», ao qual as disposições da Diretiva 2006/123 devem, por conseguinte, ser aplicadas a contrario. Resulta do seu considerando 33 e do seu artigo 2.o que esta diretiva abrange um amplo leque de serviços, incluindo o aluguer de automóveis, que podem ser considerados serviços de leasing operacional.

26      O órgão jurisdicional de reenvio acrescenta que a regulamentação croata em causa no processo principal é suscetível de impedir ou dissuadir a Autotechnica e as pessoas de outros Estados‑Membros que pretendam estabelecer‑se na Croácia de exercerem atividades comerciais de aluguer ou de leasing operacional, pelo que essa regulamentação pode ser contrária aos requisitos decorrentes do artigo 49.o TFUE.

27      Neste contexto, o Upravni sud u Zagrebu (tribunal administrativo de Zagreb) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      [a)]      Os serviços de leasing operacional e/ou de aluguer de automóveis de longa duração estão abrangidos pelo âmbito de aplicação da Diretiva [2006/123], como indicado no Manual de Execução da Diretiva [2006/123], de 13 de março de 2008, publicado pela Direção‑Geral do Mercado Interno e Serviços [da Comissão Europeia]? […]

[b)]      Deve um profissional que exerce uma atividade de leasing operacional (mas não de leasing financeiro) e/ou de aluguer de automóveis de longa duração ser considerado uma instituição financeira na aceção do artigo 4.o, n.o 1, ponto 26, do Regulamento (UE) n.o 575/2013?

2)      Em caso de resposta afirmativa à [primeira parte da] primeira questão e de resposta negativa à segunda [parte desta] questão, a atribuição à [Agência] de competência para supervisionar a prestação de serviços de leasing operacional e/ou de aluguer de automóveis de longa duração, nos termos do artigo 6.o, n.o 1, da Lei do Leasing, e para impor requisitos e restrições adicionais às empresas que exercem tais atividades, é compatível com o artigo 49.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, em conjugação com os artigos 9.o a 13.o da Diretiva 2006/123/CE?

3.      Devem o artigo 49.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia e os artigos 9.o a 13.o da Diretiva 2006/123/CE, em circunstâncias como as que estão em causa no presente litígio, em que uma sociedade‑mãe de um Estado‑Membro pretende, por intermédio de uma filial, prestar noutro Estado‑Membro serviços do mesmo tipo dos que presta no Estado‑Membro de origem, ser interpretados no sentido de que permitem que a lei nacional (Lei do Leasing) imponha requisitos e restrições adicionais à filial, assim dificultando/tornando menos atrativo o exercício da atividade em causa?»

 Quanto à admissibilidade do pedido de decisão prejudicial

28      Nas suas observações, a Agência e o Governo Croata manifestaram dúvidas quanto à admissibilidade do pedido de decisão prejudicial pelo facto de, no seu entender, todos os elementos do processo principal se circunscreverem ao interior de um único Estado‑Membro, neste caso, a República da Croácia.

29      Em primeiro lugar, no que respeita ao artigo 49.o TFUE, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a liberdade de estabelecimento, consagrada neste artigo, inclui, de acordo com o artigo 54.o TFUE, o direito as sociedades constituídas nos termos da lei de um Estado‑Membro e cuja sede social, administração central ou estabelecimento principal se situe no interior da União exercerem a sua atividade noutros Estados‑Membros através, nomeadamente, de uma filial (v., neste sentido, Acórdão de 20 de janeiro de 2021, Lexel, C‑484/19, EU:C:2021:34, n.o 33 e jurisprudência referida).

30      Ora, no caso, é facto assente que a Autotechnica é a filial de uma sociedade constituída num Estado‑Membro diferente da República da Croácia. Por conseguinte, não se pode alegar que todos os elementos do litígio no processo principal se circunscrevem ao interior de um único Estado‑Membro nem que as segunda e terceira questões, na parte em que visam o artigo 49.o TFUE, são de natureza hipotética. Consequentemente, o reenvio prejudicial é admissível no que respeita ao artigo 49.o TFUE.

31      Em segundo lugar, o pedido de decisão prejudicial também não pode ser declarado inadmissível na parte em que visa a Diretiva 2006/123. Com efeito, e em todo o caso, os artigos 9.o a 13.o desta diretiva, referidos nas segunda e terceira questões prejudiciais, são igualmente aplicáveis a uma situação em que todos os elementos estão confinados ao interior de um único Estado‑Membro (v., neste sentido, Acórdão de 4 de julho de 2019, Kirschstein, C‑393/17, EU:C:2019:563 n.o 24 e jurisprudência referida).

32      Em terceiro lugar, importa recordar que, para que o Tribunal de Justiça possa fornecer uma interpretação do direito da União que seja útil ao juiz nacional, o pedido de decisão prejudicial, por força do artigo 94.o, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, tem que conter a exposição das razões que conduziram o órgão jurisdicional de reenvio a interrogar‑se sobre a interpretação ou a validade de certas disposições do direito da União e o nexo que estabelece entre essas disposições e a legislação nacional aplicável ao litígio no processo principal [Acórdão de 26 de janeiro de 2023, Ministerstvo na vatreshnite raboti (Registo de dados biométricos e genéticos pela polícia), C‑205/21, EU:C:2023:49, n.o 55 e jurisprudência referida].

33      Ora, no caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio não respeitou essa obrigação, no que respeita à interpretação do artigo 4.o, n.o 1, ponto 26, do Regulamento n.o 575/2013, referido na segunda parte da primeira questão. Com efeito, esse órgão jurisdicional de modo nenhum explicou qual o nexo que estabelece entre esta disposição e a legislação nacional aplicável ao litígio no processo principal.

34      A este respeito, há que recordar que o conceito de «instituição financeira» é definido no artigo 4.o, n.o 1, ponto 26, do Regulamento n.o 575/2013 para efeitos da aplicação deste regulamento, o qual, como enuncia o seu artigo 1.o, estabelece regras uniformes em matéria de requisitos prudenciais gerais que todas as instituições sujeitas a supervisão ao abrigo da Diretiva 2013/36 devem respeitar. Ora, não resulta da decisão de reenvio que o processo principal diga respeito ao cumprimento de tais requisitos.

35      Daqui resulta que a segunda parte da primeira questão é inadmissível.

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira parte da primeira questão

36      A título preliminar, uma vez que a redação da primeira parte da primeira questão visa os «serviços de leasing operacional e/ou de aluguer de automóveis de longa duração», refira‑se que, como resulta da decisão de reenvio, o direito nacional distingue leasing operacional de leasing financeiro. Ao contrário deste último, o leasing operacional constitui uma forma específica de aluguer de veículos automóveis, caracterizada pelo facto de o locador adquirir a coisa objeto de leasing a pedido do locatário e com a finalidade de a alugar a este, mediante o pagamento de encargos, que não tem em conta o valor total da referida coisa, em que os custos da sua depreciação não são suportados pelo locatário, que também não dispõe da opção de compra no termo do período da locação.

37      Com a primeira parte da sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2006/123 deve ser interpretado no sentido de que os serviços prestados nos termos de um contrato de aluguer de longa duração de automóveis adquiridos pelo locador a pedido do locatário com a finalidade de os alugar a este último mediante o pagamento de encargos constituem «serviços financeiros», na aceção dessa disposição.

38      Resulta do seu artigo 2.o, n.o 2, alínea b), que a Diretiva 2006/123 não se aplica aos serviços financeiros como, nomeadamente, os de crédito, incluindo os serviços enumerados no anexo I da Diretiva 2006/48.

39      No que respeita ao conceito de «serviços financeiros», refira‑se que este não é definido nem nesta diretiva nem, indiretamente, por remissão para a regulamentação nacional dos Estados‑Membros. Assim, este conceito deve ser considerado um conceito autónomo do direito da União, que deve ser interpretado uniformemente no território desta última, tendo em conta não só os termos do artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2006/123, mas também o contexto em que se insere e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que faz parte (v., neste sentido, Acórdão de 22 de dezembro de 2022, EUROAPTIEKA, C‑530/20, EU:C:2022:1014, n.o 31 e jurisprudência referida).

40      Primeiro, há que verificar que a Diretiva 2006/123, na parte em que a referida disposição menciona, entre os exemplos que enumera, os serviços de crédito, não contém uma definição do termo «crédito». No entanto, na linguagem jurídica comum, este termo designa a disponibilização de uma quantia em dinheiro, ou a concessão de prazos ou de facilidades de pagamento pelo credor ao devedor para fins de financiamento ou de pagamento diferido, pelo que um contrato de crédito deve ser considerado um contrato por meio do qual um mutuante concede ou promete conceder a um consumidor um crédito sob a forma de pagamento diferido, empréstimo ou qualquer outra facilidade de pagamento semelhante (Acórdão desta data, BMW e o., C‑38/21, C‑47/21 e C‑232/21, n.o 144).

41      Daqui resulta que um contrato de serviços financeiros de crédito é caracterizado pelo facto de se enquadrar numa lógica de financiamento ou de pagamento diferido, por meio de fundos ou da concessão de prazos ou de facilidades de pagamento disponibilizados ao consumidor pelo profissional para esse fim (Acórdão desta data, BMW e o., C‑38/21, C‑47/21 e C‑232/21, n.o 145).

42      Para determinar se um contrato de aluguer de longa duração de um automóvel é um serviço de crédito e, por conseguinte, visa a prestação de serviços financeiros, na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2006/123, há que tomar como referência o seu objeto principal, para verificar se o elemento relativo ao crédito prevalece sobre o elemento relativo ao aluguer ou se é o inverso (v., por analogia, Acórdão desta data, BMW e o., C‑38/21, C‑47/21 e C‑232/21, n.o 147).

43      Assim, não pode ser qualificado de «contrato de prestação de serviços financeiros» um contrato de aluguer de longa duração de um automóvel, nos termos do qual o consumidor deve pagar um aluguer em contrapartida do direito de uso do automóvel, em que não exista uma obrigação de compra do automóvel no termo do período de aluguer, o consumidor não seja responsável pela amortização total das despesas efetuadas pelo locador com a aquisição do veículo e não assuma também os riscos associados ao valor residual do veículo no termo do contrato. A obrigação de o consumidor de compensar a perda de valor se, no momento da devolução do veículo, se verificar que o seu estado não corresponde à sua idade ou que o número máximo acordado de quilómetros foi excedido, também não permite distinguir estes tipos de contratos (v., neste sentido, Acórdão desta data, BMW e o., C‑38/21, C‑47/21 e C‑232/21, n.os 148 e 149).

44      Segundo, há também que ter em conta o anexo I da Diretiva 2013/36, para a qual remete o artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2006/123. Esse anexo I menciona, no seu ponto 3, entre os serviços financeiros, a «[l]ocação financeira».

45      A este respeito, há que verificar que a Diretiva 2013/36 não define o conceito de «[l]ocação financeira», nem remete para o direito dos Estados‑Membros com o objetivo de determinar o sentido ou o alcance deste conceito. Por conseguinte, em conformidade com a jurisprudência referida no n.o 39 do presente acórdão, este conceito deve ser considerado um conceito autónomo do direito da União e ser interpretado de maneira uniforme neste território. Daqui resulta que o simples facto de um contrato de aluguer de longa duração de um automóvel não estar abrangido pelo conceito de «leasing financeiro», na aceção da regulamentação nacional em causa no processo principal, não exclui, por si só, que esse contrato possa constituir um contrato de locação financeira, na aceção do anexo I, ponto 3, da Diretiva 2013/36 e se refira, assim, à prestação de serviços financeiros, na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2006/123.

46      O conceito de «[l]ocação financeira», tal como figura no anexo I, ponto 3, da Diretiva 2013/36 deve, por conseguinte, ser interpretado tendo em conta o sentido do termo na linguagem jurídica comum, no qual o conceito de «contrato de locação financeira» abrange um contrato através do qual uma das partes concede um crédito à outra parte para financiar a utilização de um bem do qual permanece proprietária e que a outra parte pode, no termo do contrato, devolver ou comprar, sendo que a maioria dos benefícios e dos riscos inerentes à propriedade legal são transferidos para esta outra parte durante todo o período de vigência do contrato (Acórdão desta data, BMW e o., C‑38/21, C‑47/21 e C‑232/21, n.o 134 e jurisprudência referida).

47      Terceiro, no que respeita ao contexto em que se insere o artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2006/123, há que mencionar o considerando 33 desta diretiva, do qual resulta que o aluguer de automóveis constitui um serviço abrangido pelo âmbito de aplicação desta diretiva e não pode, por conseguinte, ser qualificado de «serviços financeiros», na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea b), desta diretiva.

48      Quarto, no que respeita ao objetivo prosseguido pela exclusão dos serviços financeiros do âmbito de aplicação da Diretiva 2006/123 em aplicação do seu artigo 2.o, n.o 2, alínea b), resulta do considerando 18 desta diretiva que a referida exclusão é justificada pelo facto de essas atividades serem objeto de uma regulamentação específica da União. Como resulta da Diretiva 2013/36 e do Regulamento n.o 575/2013, que fazem parte desta regulamentação específica, esta última prevê a supervisão da prestação de serviços financeiros por determinados tipos de instituições e fixa requisitos prudenciais que essas instituições devem cumprir.

49      No caso em apreço, resulta da decisão de reenvio que o «leasing», operacional ou financeiro, se distingue, no direito nacional, de um simples contrato de aluguer de longa duração pelo facto de o locador não ser o proprietário original da coisa objeto de leasing, antes a adquirindo a pedido do locatário, precisamente para o alugar a este último.

50      É certo que, no caso do leasing, o locador adquire a propriedade de um bem e, em seguida, aluga‑o ao locatário, sendo os encargos devidos nos termos do contrato de leasing utilizados para reembolsar os fundos disponibilizados pelo locador.

51      No entanto, não se pode presumir que qualquer contrato de aluguer de longa duração de um automóvel que o locador adquiriu a pedido do locatário para o alugar a este último constitui necessariamente um contrato de leasing, que tem por objeto a prestação de um «serviço financeiro», na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2006/123. Com efeito, a aquisição do veículo pelo locador a pedido específico do seu cliente não tem, por si só, impacto na questão de saber se os serviços prestados ao abrigo desse contrato cumprem um ou outro dos critérios relevantes enumerados no n.o 43 do presente acórdão para serem qualificados de «serviços financeiros».

52      Além disso, tendo em conta as indicações que constam no n.o 43 do presente acórdão, há que sublinhar que a inexistência de uma opção de compra no contrato de aluguer de longa duração de um automóvel não pode ser considerada, por si só, suficiente para se conceber que os serviços prestados no âmbito desse contrato não são de natureza financeira.

53      Com efeito, em função da natureza do bem alugado e da sua taxa de depreciação, é possível que, no termo de um aluguer de longa duração, esse bem tenha perdido a quase totalidade do seu valor, de modo que o locatário não terá nenhum interesse em tornar‑se seu proprietário.

54      Em face de todas estas considerações, há que responder à primeira parte da primeira questão que o artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2006/123 deve ser interpretado no sentido de que os serviços prestados ao abrigo de um contrato de aluguer de longa duração de automóveis adquiridos pelo locador a pedido do locatário com o objetivo de os alugar a este último mediante o pagamento de encargos não constituem «serviços financeiros», na aceção desta disposição, a menos que:

–        o contrato de aluguer inclua uma obrigação de compra do veículo no termo do período do aluguer,

–        os encargos pagos pelo locatário nos termos do contrato se destinem a permitir amortizar integralmente as despesas efetuadas pelo locador com a aquisição do veículo, ou

–        o referido contrato implique uma transferência dos riscos associados ao valor residual do veículo no termo desse mesmo contrato.

 Quanto à segunda questão

55      Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça, por um lado, que todas as medidas nacionais num domínio que tenha sido objeto de harmonização completa à escala da União não devem ser apreciadas à luz das disposições do direito primário, mas sim à luz das disposições dessa medida de harmonização e, por outro, que os artigos 9.o a 13.o da Diretiva 2006/123 procedem a uma harmonização exaustiva relativamente aos serviços abrangidos pelo seu âmbito de aplicação (Acórdão de 14 de julho de 2016, Promoimpresa e o., C‑458/14 e C‑67/15, EU:C:2016:558, n.os 59 e 61). Nestas circunstâncias e como o advogado‑geral salientou, em substância, no n.o 64 das suas conclusões, há que examinar a segunda questão à luz desta diretiva, sem que seja necessário remeter para o artigo 49.o TFUE, relativo à liberdade de estabelecimento.

56      Por conseguinte, há que considerar que, com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 9.o, n.o 1, e o artigo 10.o, n.os 1 e 2, da Diretiva 2006/123 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma disposição do direito nacional que institui um regime de autorização, na aceção do artigo 4.o, ponto 6, desta diretiva, para a prestação de serviços de aluguer de automóveis de longa duração e que autoriza a autoridade nacional responsável pela gestão desse regime a impor requisitos e restrições às empresas que prestam esses serviços.

57      Importa especificar, antes de mais, que, tal como confirma a sua redação, a segunda questão visa a prestação de serviços de aluguer de automóveis de longa duração e não a prestação de serviços financeiros prestados nos termos de um contrato relativo a esse aluguer. Estes últimos serviços estão excluídos do âmbito de aplicação da Diretiva 2006/123, por força do seu artigo 2.o, n.o 2, alínea b).

58      Há que recordar que, de acordo com o artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2006/123, os Estados‑Membros só podem subordinar a um regime de autorização o acesso a uma atividade de serviços e o seu exercício se esse regime não for discriminatório, se for justificado por uma razão imperiosa de interesse geral e se o objetivo pretendido não puder ser atingido através de uma medida menos restritiva, nomeadamente porque um controlo a posteriori significaria uma intervenção demasiado tardia para se poder obter uma real eficácia.

59      No caso em apreço, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio apreciar se as referidas condições estão preenchidas no que respeita ao regime de autorização em causa no processo principal, visto que este visa a prestação de serviços de aluguer de automóveis de longa duração que não constituem um serviço financeiro.

60      Para orientar o órgão jurisdicional de reenvio na sua apreciação, há que salientar, primeiro, que, como o advogado‑geral constatou no n.o 55 das suas conclusões, os autos de que o Tribunal de Justiça dispõe não contêm nenhum elemento que permita concluir que o regime em causa no processo principal é discriminatório em relação à Autotechnica. Todavia, incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio proceder, sendo caso disso, às verificações necessárias.

61      Segundo, nas suas observações apresentadas ao Tribunal de Justiça, a Agência e o Governo Croata alegaram que o regime de autorização em causa no processo principal prossegue um objetivo de defesa dos consumidores. Como resulta do artigo 4.o, ponto 8, da Diretiva 2006/123, a defesa dos consumidores constitui uma razão imperiosa de interesse geral, suscetível de ser invocada para justificar um regime de autorização em conformidade com o artigo 9.o, n.o 1, desta diretiva.

62      Não deixa de ser certo que o direito croata não parece submeter a um regime de autorização o exercício de atividades análogas ao aluguer de longa duração de automóveis e, muito particularmente, o aluguer de curta duração desses veículos. A este respeito, há que salientar que nem a Agência nem o Governo Croata invocaram, nas suas observações, motivos suscetíveis de justificar esse tratamento específico apenas dos serviços de aluguer de automóveis de longa duração.

63      Além disso, há que observar que o regime de autorização em causa no processo principal é gerido pela Agência, a qual, ao abrigo do direito nacional, está autorizada a fiscalizar as atividades financeiras. Ora, a Agência e o Governo Croata também não apresentaram, nas suas observações, motivos suscetíveis de justificar a gestão de um regime de autorização que abranja a prestação de serviços não financeiros por essa autoridade nacional.

64      Por conseguinte, incumbirá ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se este regime pode ser considerado justificado pela prossecução do objetivo da defesa dos consumidores, visto que o regime de autorização em causa no processo principal abrange apenas os serviços de aluguer de automóveis de longa duração e não outros serviços análogos e que esse regime é gerido por uma autoridade nacional encarregada da supervisão dos serviços financeiros.

65      Terceiro, admitindo que seja esse o caso, será ainda necessário verificar se, como exige o artigo 9.o, n.o 1, alínea c), da Diretiva 2006/123, lido à luz do seu considerando 54, o objetivo da defesa dos consumidores não pode ser atingido, no caso em apreço, através de uma medida menos restritiva, como o controlo periódico regular das empresas que prestam serviços de aluguer de automóveis de longa duração.

66      Quarto, se se verificar que o regime de autorização em causa no processo principal preenche as condições previstas no artigo 9.o, n.o 1, da Diretiva 2006/123, incumbirá ainda ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se, como exige o artigo 10.o, n.os 1 e 2, desta diretiva, esse regime se baseia em critérios que obstem a que a autoridade competente, neste caso a Agência, exerça o seu poder de apreciação na sua gestão que devem ser claros e inequívocos, transparentes e acessíveis, previamente publicados, objetivos, não discriminatórios, justificados por uma razão imperiosa de interesse geral, como a defesa dos consumidores invocada pela Agência e pelo Governo Croata, e proporcionais em relação a esse objetivo.

67      Atendendo a todas estas considerações, há que responder à segunda questão que o artigo 9.o, n.o 1, e o artigo 10.o, n.os 1 e 2, da Diretiva 2006/123 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação de um Estado‑Membro que, por um lado, institui um regime de autorização, na aceção do artigo 4.o, ponto 6, desta diretiva, para a prestação de serviços de aluguer de automóveis de longa duração no âmbito de um contrato que não visa a prestação de serviços financeiros na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da referida diretiva, e, por outro, autoriza que a autoridade nacional encarregada da gestão desse regime imponha requisitos e restrições às empresas que fornecem esses serviços, a menos que o referido regime preencha os requisitos previstos no artigo 9.o, n.o 1, e no artigo 10.o, n.os 1 e 2, da mesma diretiva.

 Quanto à terceira questão

68      Atento o exposto no n.o 55 do presente acórdão e a resposta dada à segunda questão, não há que responder à terceira questão, uma vez que esta visa uma situação transfronteiriça abrangida pelo artigo 49.o TFUE.

 Quanto às despesas

69      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quinta Secção) declara:

1)      O artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2006/123/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno,

deve ser interpretado no sentido de que:

os serviços prestados ao abrigo de um contrato de aluguer de longa duração de automóveis adquiridos pelo locador a pedido do locatário com o objetivo de os alugar a este último mediante o pagamento de encargos não constituem «serviços financeiros», na aceção desta disposição, a menos que:

–        o contrato de aluguer inclua uma obrigação de compra do veículo no termo do período do aluguer,

–        os encargos pagos pelo locatário nos termos do contrato se destinem a permitir amortizar integralmente as despesas efetuadas pelo locador com a aquisição do veículo, ou

–        o referido contrato implique uma transferência dos riscos associados ao valor residual do veículo no termo do mesmo contrato.

2)      O artigo 9.o, n.o 1, e o artigo 10.o, n.os 1 e 2, da Diretiva 2006/123,

devem ser interpretados no sentido de que:

se opõem a uma regulamentação de um EstadoMembro que, por um lado, institui um regime de autorização, na aceção do artigo 4.o, ponto 6, desta diretiva, para a prestação de serviços de aluguer de automóveis de longa duração no âmbito de um contrato que não visa a prestação de serviços financeiros na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea b), da referida diretiva, e, por outro, autoriza que a autoridade nacional encarregada da gestão desse regime a imponha requisitos e restrições às empresas que fornecem esses serviços, a menos que o referido regime preencha os requisitos previstas no artigo 9.o, n.o 1, e no artigo 10.o, n.os 1 e 2, da mesma diretiva.

Assinaturas


*      Língua do processo: croata.