Language of document : ECLI:EU:T:2013:205

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção)

19 de abril de 2013 (*)

«FSE – Ação de formação – Redução da contribuição financeira inicialmente concedida – Regulamento (CE, Euratom) n.° 2988/95 – Prescrição – Segurança jurídica – Direitos de defesa – Prazo razoável – Dever de fundamentação»

No processo T‑53/11,

Associação de Empresas de Construção e Obras Públicas e Serviços (AECOPS), com sede em Lisboa (Portugal), representada inicialmente por J. da Cruz Vilaça e L. Pinto Monteiro e, em seguida, por L. Pinto Monteiro, P. Farinha Alves e N. Morais Sarmento, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por P. Guerra e Andrade e D. Recchia, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto um pedido de anulação da decisão da Comissão, de 27 de outubro de 2010, que fixa o montante final das despesas elegíveis para a contribuição do Fundo Social Europeu (FSE) atribuída à recorrente para ações de formação pela Decisão C (89) 570, de 22 de março de 1989, para o financiamento de uma ação de formação (dossier 89 0771 P1),

O TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção),

composto por: A. Dittrich, presidente, I. Wiszniewska-Białecka e M. Prek (relator), juízes,

secretário: J. Palacio González, administrador principal,

vistos os autos e após a audiência de 21 de junho de 2012,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        A recorrente, a Associação de Empresas de Construção e Obras Públicas e Serviços (AECOPS), é uma associação patronal que agrupa empresas de construção civil, obras públicas e serviços.

2        Em 19 de outubro de 1988, a República Portuguesa apresentou um pedido de contribuição do Fundo Social Europeu (a seguir «FSE») a favor da recorrente, no montante de 285 549 602 escudos portugueses (PTE). Este pedido dizia respeito a uma ação de formação profissional de 648 jovens, destinada a oferecer‑lhes perspetivas reais de emprego.

3        Pela Decisão C (89) 570, de 22 de março de 1989, a Comissão das Comunidades Europeias aprovou uma contribuição financeira do FSE, no montante de 203 628 799 PTE, destinada à formação de 517 jovens (dossier 89 0771 P1).

4        Em conformidade com o disposto no artigo 5.°, n.° 1, do Regulamento (CEE) n.° 2950/83 do Conselho, de 17 de outubro de 1983, que aplica a Decisão 83/516/CEE relativa às funções do FSE (JO L 289, p. 1; EE 05 F4 p. 22), foi pago à recorrente um adiantamento de 101 814 399 PTE.

5        Em 16 de outubro de 1990, em conformidade com o disposto no artigo 5.°, n.° 4, do Regulamento n.º 2950/83, o Departamento para os Assuntos do Fundo Social Europeu (a seguir «DAFSE»), serviço da Administração portuguesa com competência para gerir as contribuições do FSE em Portugal, apresentou à Comissão um pedido de pagamento do saldo. O DAFSE reavaliou as despesas que, desde então, ascendiam a 254 274 891 PTE, ficando 139 851 190 PTE a cargo do FSE e 114 423 701 PTE a cargo da República Portuguesa. Tendo já sido pago o adiantamento no montante de 101 814 399 PTE, o saldo em dívida ascendia a 38 036 791 PTE.

6        Por ofício recebido em 10 de julho de 1991, o DAFSE informou a Comissão de que, reanalisado o dossier, foi deliberado manter a estrutura de custos e o quadro de financiamento constantes do pedido de pagamento do saldo enviado à Comissão.

7        Em 24 de outubro de 1991, a Comissão informou o DAFSE de que do pedido de pagamento do saldo não constavam as informações relativas ao local de realização dos cursos e à entidade executante, a justificação da taxa de desistências, os métodos de cálculo por subrubrica nem o mapa de rendas e alugueres. A Comissão solicitou ao DAFSE que apresentasse estas informações no prazo de dois meses.

8        A pedido do DAFSE, que suspeitava de irregularidades no quadro da utilização da contribuição do FSE pela recorrente, a Inspeção‑Geral de Finanças (a seguir «IGF») procedeu a uma auditoria das contas da associação, a fim de avaliar a legalidade e a regularidade das ações de formação realizadas entre 1987 e 1989, incluindo despesas realizadas no âmbito do dossier em causa. O relatório de auditoria, datado de 10 de novembro de 1994, revelou várias irregularidades no quadro do referido dossier.

9        Tendo a recorrente recusado exibir vários elementos da sua contabilidade aos inspetores que procederam à auditoria e tendo estes descoberto indícios de fraude, a IGF propôs transmitir o referido relatório de auditoria ao Ministério Público, para efeitos de acusação penal.

10      Em 30 de março de 1995, o DAFSE informou a Comissão, em conformidade com o disposto no artigo 7.° da Decisão 83/673/CEE da Comissão, de 22 de dezembro de 1983, relativa à gestão do FSE (JO L 377, p. 1; EE 05 F4 p. 52), de que, devido à existência de presumidas irregularidades, a ação de formação em causa era objeto de inquérito.

11      Com base nas presumidas irregularidades, o Ministério Público abriu um inquérito por alegado caso de fraude no âmbito da obtenção de subsídio.

12      Em 23 de fevereiro de 2001, o juiz de instrução do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa declarou extinto, por prescrição, o processo penal em causa.

13      Em 27 de setembro de 2004, o Instituto de Gestão do Fundo Social Europeu (a seguir «IGFSE»), que sucedeu ao DAFSE, deu conhecimento à Comissão do despacho do juiz de instrução. O IGFSE precisou que, dado o teor deste despacho, cessavam os efeitos da notificação feita à Comissão em 30 de março de 1995, nos termos do artigo 7.° da Decisão 83/673. Este ofício vinha acompanhado da Informação n.º 32/2004, que continha as conclusões da análise do relatório de auditoria elaborado pela IGF. O IGFSE referiu nesse ofício que considerava que tinham sido realizadas despesas não elegíveis no montante de 162 188 514 PTE, pelo que o custo total da ação era de 92 086 377 PTE, o que correspondia a uma contribuição do FSE de 48 504 201 PTE, e que havia que restituir à Comissão o montante de 53 310 198 PTE. O IGFSE solicitou à Comissão que adotasse uma decisão final no dossier em causa.

14      Em 21 de junho de 2005, a Comissão adotou uma decisão relativa ao dossier em causa, na qual considerou que tinha de lhe ser devolvido o montante de 53 310 198 PTE.

15      Em 6 de janeiro de 2009, o IGFSE pediu à Comissão que adotasse um novo projeto de decisão sobre o pedido de pagamento do saldo, para que este fosse notificado à recorrente.

16      Em 17 de abril de 2009, o IGFSE notificou à recorrente a decisão da Comissão de 21 de junho de 2005.

17      Em 2 de julho de 2009, a recorrente interpôs recurso de anulação da referida decisão da Comissão. Este recurso foi registado sob o número T‑256/09.

18      Em 30 de setembro de 2009, a Comissão revogou a decisão de 21 de junho de 2005.

19      Em 17 de março de 2010, a recorrente desistiu do seu recurso interposto no Tribunal Geral. Por despacho do presidente da Quinta Secção do Tribunal Geral de 12 de abril de 2010, AECOPS/Comissão (T‑256/09, não publicado na Coletânea), o processo foi cancelado no registo do Tribunal Geral.

20      Em 22 de junho de 2010, a Comissão notificou ao IGFSE um novo projeto de decisão de fixação do montante final das despesas elegíveis para o dossier em causa. Em 15 de julho de 2010, este projeto foi notificado à recorrente, que se pronunciou sobre o mesmo em 4 de agosto de 2010.

21      Por ofício de 18 de outubro de 2010, o IGFSE informou a Comissão das suas conclusões segundo as quais as observações apresentadas pela recorrente não traziam nenhum elemento novo e solicitou à Comissão que adotasse uma decisão final.

22      Em 27 de outubro de 2010, a Comissão adotou uma nova decisão de fixação do montante final das despesas elegíveis (a seguir «decisão impugnada»), que foi notificada à recorrente em 11 de novembro de 2010. A decisão impugnada reduziu para 48 504 201 PTE o montante da contribuição do FSE concedida pela Decisão C (89) 570.

 Tramitação processual e pedidos das partes

23      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 24 de janeiro de 2011, a recorrente interpôs o presente recurso.

24      Visto o relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Sétima Secção) decidiu abrir a fase oral do processo.

25      As partes foram ouvidas em alegações e nas respostas às perguntas orais colocadas pelo Tribunal Geral na audiência de 21 de junho de 2012.

26      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        condenar a Comissão a suportar as suas despesas.

27      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        não dar provimento à ação de impugnação;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

28      A título preliminar, há que constatar que, na audiência, a recorrente confirmou, em resposta a uma pergunta colocada por este Tribunal, que não contestava os factos do processo conforme expostos no relatório para audiência.

29      Além disso, há que recordar algumas disposições gerais que regulam o funcionamento do FSE. Segundo o artigo 1.º, n.º 2, alínea a), da Decisão 83/516/CEE do Conselho, de 17 de outubro de 1983, relativa às funções do FSE (JO L 289, p. 38; EE 05 F4 p. 26), o Conselho da União Europeia participa no financiamento de ações de formação e de orientação profissional. Nos termos do artigo 5.º, n.º 1, da mesma decisão, a contribuição do FSE é concedida na base de 50% das despesas elegíveis, sem que, todavia, possa ultrapassar o montante da contribuição financeira das entidades públicas do Estado‑Membro interessado.

30      O Regulamento n.º 2950/83, aplicável no momento dos factos, prevê, no seu artigo 5.º, n.º 1, que a aprovação, por parte do FSE, de um pedido de financiamento acarreta o pagamento de um adiantamento de 50% da contribuição concedida, na data prevista para o início da ação de formação. Nos termos do n.º 4 do mesmo artigo, os pedidos de pagamento do saldo incluirão um relatório pormenorizado sobre o conteúdo, os resultados e os aspetos financeiros da ação em causa. O Estado‑Membro certifica a exatidão factual e contabilística das indicações contidas nos pedidos de pagamento.

31      Em conformidade com o disposto no artigo 6.º, n.º 1, do Regulamento n.° 2950/83, quando a contribuição do FSE não for utilizada nas condições fixadas na decisão de aprovação, a Comissão pode suspender, reduzir ou suprimir essa contribuição, depois de ter dado ao Estado‑Membro em causa a oportunidade de apresentar as suas observações. O n.º 2 do mesmo artigo dispõe que as somas pagas que não tenham sido utilizadas nas condições fixadas pela decisão de aprovação dão lugar a repetição, que o Estado‑Membro em causa é subsidiariamente responsável pelo reembolso das somas indevidamente pagas por ações às quais se aplica a garantia referida no n.º 2 do artigo 2.º da Decisão 83/516 e que, na medida em que este pagar à Comunidade Europeia as somas a reembolsar pelos responsáveis financeiros da ação, o Estado‑Membro fica sub-rogado nos direitos da Comunidade.

32      De acordo com o artigo 7.º, n.º 1, do Regulamento n.° 2950/83, tanto a Comissão como o Estado‑Membro em causa podem controlar a utilização da contribuição.

33      O artigo 7.º da Decisão 83/673 impõe ao Estado‑Membro que informe imediatamente a Comissão, quando proceda a um inquérito devido a presunção de irregularidades.

34      A decisão impugnada foi adotada ao abrigo do artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2950/83.

35      Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca três fundamentos, relativos, em primeiro lugar, à prescrição do procedimento, em segundo lugar, à violação do princípio da segurança jurídica e dos direitos de defesa, bem como à inobservância de um prazo razoável, e, em terceiro lugar, à violação do dever de fundamentação.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à prescrição do procedimento

36      Segundo a recorrente, a decisão impugnada é ilegal e insuscetível de ser executada por haver prescrito o procedimento, nos termos do artigo 3.°, n.° 1, do Regulamento (CE, Euratom) n.° 2988/95 do Conselho, de 18 de dezembro de 1995, relativo à proteção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias (JO L 312, p. 1). Alega que, no âmbito da ação de formação em causa, nenhuma irregularidade pode ter sido cometida depois de 16 de outubro de 1990, data em que o DAFSE apresentou à Comissão um pedido de pagamento do saldo. Ora, a Comissão adotou a decisão impugnada em 27 de outubro de 2010, ou seja, 20 anos depois de a recorrente ter cometido as irregularidades alegadas.

37      O artigo 3.º do Regulamento n.º 2988/95 dispõe:

«1.      O prazo de prescrição do procedimento é de quatro anos a contar da data em que foi praticada a irregularidade referida no n.º 1 do artigo 1.º Todavia, as regulamentações setoriais podem prever um prazo mais reduzido, que não pode ser inferior a três anos.

O prazo de prescrição relativo às irregularidades continuadas ou repetidas corre desde o dia em que cessou a irregularidade. O prazo de prescrição no que se refere aos programas plurianuais corre em todo o caso até ao encerramento definitivo do programa.

A prescrição do procedimento é interrompida por qualquer ato, de que seja dado conhecimento à pessoa em causa, emanado da autoridade competente tendo em vista instruir ou instaurar [um] procedimento por irregularidade. O prazo de prescrição corre de novo a contar de cada interrupção.

Todavia, a prescrição tem lugar o mais tardar na data em que termina um prazo igual ao dobro do prazo de prescrição sem que a autoridade competente tenha aplicado uma sanção, exceto nos casos em que o procedimento administrativo tenha sido suspenso em conformidade com o n.º 1 do artigo 6.º

2.      O prazo de execução da decisão que aplica a sanção administrativa é de três anos. Este prazo corre desde o dia em que a decisão se torna definitiva.

Os casos de interrupção e de suspensão são regidos pelas disposições pertinentes do direito nacional.

3.      Os Estados-Membros conservam a possibilidade de aplicar um prazo mais longo que os previstos respetivamente nos n.os 1 e 2.»

38      Nos termos do artigo 1.º, n.º 2, do referido regulamento, «[c]onstitui irregularidade qualquer violação de uma disposição de direito comunitário que resulte de um ato ou omissão de um agente económico que tenha ou possa ter por efeito lesar o orçamento geral das Comunidades ou orçamentos geridos pelas Comunidades, quer pela diminuição ou supressão de receitas provenientes de recursos próprios cobradas diretamente por conta das Comunidades, quer por uma despesa indevida».

39      De acordo com o artigo 4.°, n.° 1, do mesmo regulamento, «[q]ualquer irregularidade tem como consequência, regra geral, a retirada da vantagem indevidamente obtida […] através da obrigação de pagar os montantes em dívida ou de reembolsar os montantes indevidamente recebidos […]».

40      Deste modo, há que questionar se, no caso concreto, a recorrente pode invocar em seu benefício o prazo de prescrição previsto no artigo 3.º, n.º 1, do Regulamento n.º 2988/95.

41      A este respeito, há que recordar que, segundo a jurisprudência, a regra de prescrição prevista no artigo 3.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2988/95 é aplicável quer às irregularidades que conduzem à aplicação de uma sanção administrativa na aceção do artigo 5.° deste regulamento quer às que são alvo de uma medida administrativa na aceção do artigo 4.° do referido regulamento, medida que tem por objeto a retirada de uma vantagem indevidamente obtida, sem, no entanto, revestir caráter de sanção (acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de janeiro de 2009, Josef Vosding Schlacht-, Kühl- und Zerlegebetrieb e o., C‑278/07 a C‑280/07, Colet., p. I‑457, n.º 22; v. acórdão do Tribunal Geral de 15 de abril de 2011, IPK International/Comissão, T‑297/05, ainda não publicado na Coletânea, n.º 147 e jurisprudência referida).

42      O Tribunal de Justiça também declarou que, ao adotar o Regulamento n.° 2988/95, em particular o seu artigo 3.°, n.° 1, primeiro parágrafo, o legislador da União Europeia pretendeu instituir uma regra geral de prescrição aplicável na matéria e mediante a qual procurava, por um lado, definir um prazo mínimo aplicado em todos os Estados-Membros e, por outro, renunciar à possibilidade de recuperar somas indevidamente recebidas do orçamento da União, depois de decorrido um período de quatro anos sobre a prática da irregularidade que afetou os pagamentos controvertidos. Daqui resulta que, a partir da data de entrada em vigor do Regulamento n.° 2988/95, qualquer vantagem indevidamente recebida do orçamento da União pode, em princípio, com exceção dos setores para os quais o legislador da União previu um prazo inferior, ser recuperada pelas autoridades competentes dos Estados‑Membros, no prazo de quatro anos (v. acórdão Josef Vosding Schlacht‑, Kühl‑ und Zerlegebetrieb e o., referido no n.º 41, supra, n.os 27 e 28).

43      No que respeita às vantagens indevidamente recebidas do orçamento da União em virtude de irregularidades cometidas antes da entrada em vigor do Regulamento n.º 2988/95, o Tribunal de Justiça precisou que, mediante a adoção do artigo 3.°, n.° 1, deste regulamento, e sem prejuízo do n.° 3 deste artigo, o legislador da União definiu, desse modo, uma regra de prescrição geral com a qual reduziu voluntariamente para quatro anos o período durante o qual as autoridades dos Estados‑Membros, atuando em nome e por conta do orçamento da União, deveriam recuperar ou deveriam ter recuperado essas vantagens indevidamente obtidas (acórdão Josef Vosding Schlacht-, Kühl- und Zerlegebetrieb e o., referido no n.º 41, supra, n.º 29, e acórdão IPK International/Comissão, referido no n.º 41, supra, n.º 148).

44      O Tribunal de Justiça inferiu assim que, em aplicação do artigo 3.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.° 2988/95, qualquer soma indevidamente recebida por um operador em razão de uma irregularidade anterior à entrada em vigor do Regulamento n.° 2988/95 devia, em princípio, ser considerada prescrita na falta de um ato interruptivo adotado nos quatro anos seguintes à prática de tal irregularidade, ato interruptivo que, nos termos do artigo 3.°, n.° 1, terceiro parágrafo, do mesmo regulamento, era entendido como um ato dado a conhecer à pessoa em causa, emanado da autoridade competente e tendo em vista instruir ou instaurar um procedimento devido a essa irregularidade (v., neste sentido, acórdão Josef Vosding Schlacht-, Kühl- und Zerlegebetrieb e o., referido no n.º 41, supra, n.º 32, e acórdão IPK International/Comissão, referido no n.º 41, supra, n.º 149).

45      Por outro lado, o Tribunal Geral considerou que estes princípios se aplicam, mutatis mutandis, quando a medida em causa, nos termos do artigo 4.°, n.os 1 a 3, lido em conjugação com o artigo 1.°, n.os 1 e 2, do Regulamento n.° 2988/95, tenha sido adotada pela Comissão, uma vez que o referido regulamento constitui uma regulamentação geral que tem por destinatário qualquer autoridade, tanto nacional como da União, sujeita às obrigações de boa gestão financeira e de controlo da utilização dos meios orçamentais das Comunidades para os fins previstos, como as que são referidas nos considerandos 3 e 13 do mesmo regulamento (acórdão IPK International/Comissão, referido no n.º 41, supra, n.º 150).

46      Decorre da jurisprudência referida nos números anteriores que a autoridade, nacional ou da União, responsável pela recuperação dos montantes indevidamente recebidos dispõe, para o efeito, de um prazo de quatro anos, depois de cometida a irregularidade.

47      Ora, no presente caso, a autoridade responsável pela recuperação dos montantes indevidamente recebidos junto da recorrente não era a Comissão, mas sim a autoridade competente do Estado‑Membro.

48      Com efeito, no momento em que ocorreram os factos controvertidos, o DAFSE e, posteriormente, o IGFSE representavam a República Portuguesa em tudo o que dizia respeito ao FSE. Eram os interlocutores únicos e obrigatórios, por um lado, dos serviços da Comissão responsáveis pelo FSE e, por outro, dos organismos públicos e privados portugueses que pretendiam beneficiar de uma contribuição do FSE (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 14 de dezembro de 2006, Branco/Comissão, T‑162/04, não publicado na Coletânea, n.º 15).

49      Deste modo, enquanto único interlocutor do FSE, o Estado‑Membro responsabilizava‑se na medida em que certificava a exatidão factual e contabilística das indicações contidas nos pedidos de pagamento do saldo e em que podia, inclusivamente, ser obrigado a garantir a boa execução das ações de formação (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de maio de 1991, Interhotel/Comissão, C‑291/89, Colet., p. I‑2257, n.º 16 e jurisprudência referida). No âmbito de tal procedimento, as relações financeiras estabelecem‑se, por um lado, entre a Comissão e o Estado‑Membro em causa e, por outro, entre este Estado‑Membro e o operador económico que beneficia da contribuição financeira (acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de março de 1984, EISS/Comissão, 310/81, Recueil, p. 1341, n.º 15).

50      Foi neste contexto que a decisão impugnada, na qual a Comissão fixou o montante final das despesas elegíveis para o dossier em causa, foi enviada à autoridade nacional, o IGFSE. Resulta da decisão impugnada que, por as autoridades nacionais portuguesas terem constatado a existência de irregularidades cometidas pela recorrente, o montante da contribuição financeira a cargo do FSE, concedida pela Decisão C (89) 570, foi reduzido para 48 504 201 PTE. Há, assim, que constatar que, através da decisão impugnada, a Comissão não exigiu nenhum reembolso à recorrente, tendo apenas fixado o montante final da contribuição financeira do FSE para o dossier em causa. Em 11 de novembro de 2010, o IGFSE notificou a decisão impugnada à recorrente, solicitando‑lhe que reembolsasse os montantes indevidamente recebidos.

51      É certo que, ao reduzir a contribuição financeira que antes havia sido concedida à recorrente por intermédio das autoridades nacionais portuguesas, a decisão impugnada diz direta e individualmente respeito à recorrente. É a este título que ela pode contestar esta decisão perante o órgão jurisdicional da União. No entanto, no âmbito específico do procedimento acima descrito no n.º 49, no qual a Comissão não podia exigir diretamente à recorrente o reembolso dos fundos e, desse modo, «perseguir» as eventuais irregularidades cometidas pela recorrente, esta não pode invocar em seu benefício e contra a Comissão a prescrição dos procedimentos prevista no artigo 3.º, n.º 1, do Regulamento n.º 2988/95.

52      A este respeito, há que observar que, embora, como a recorrente evoca, no acórdão IPK International/Comissão, referido no n.º 41, supra, o Tribunal Geral tenha concluído que as regras previstas no Regulamento n.º 2988/95 têm por destinatário qualquer autoridade, tanto nacional como da União, o dito acórdão tinha, no entanto, na sua origem uma situação de facto distinta da do presente caso. Com efeito, esse processo tinha por objeto uma contribuição financeira para um projeto de turismo ecológico, no âmbito do qual a Comissão, num primeiro momento, atribuiu diretamente o montante acordado à pessoa responsável pelo projeto e, em seguida, recusou pagar‑lhe a segunda parte da mesma contribuição e decidiu recuperar o adiantamento já pago. Tratava‑se, assim, de uma relação direta entre a Comissão e o beneficiário da contribuição, no âmbito da qual foi a Comissão que adotou a medida de reembolso. Por conseguinte, a solução adotada no referido acórdão não é diretamente transponível para o presente caso.

53      Deste modo, há que concluir que a recorrente não pode invocar em seu benefício a prescrição do procedimento prevista no artigo 3.º, n.º 1, do Regulamento n.º 2988/95 e que, por conseguinte, há que julgar improcedente o primeiro fundamento.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do princípio da segurança jurídica e dos direitos de defesa, bem como à inobservância de um prazo razoável

54      A título subsidiário, a recorrente alega que o prazo, em sua opinião, não razoável, no termo do qual a Comissão adotou a decisão impugnada, violou o princípio da segurança jurídica. Assim, a recorrente tinha a convicção de que nenhuma dúvida existia quanto à regularidade das despesas realizadas, o que a levou a não guardar as faturas e demais documentos relativos ao procedimento em causa. A recorrente invoca igualmente o artigo 41.º, n.º 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (JO 2010, C 83, p. 389). Da inobservância de um prazo razoável também decorreu a violação dos seus direitos de defesa.

55      O princípio do prazo razoável, retomado, enquanto componente do princípio da boa administração, no artigo 41.°, n.° 1, da Carta dos Direitos Fundamentais impõe‑se em qualquer procedimento administrativo da União (v. acórdão do Tribunal Geral de 1 de julho de 2008, Compagnie maritime belge/Comissão, T‑276/04, Colet., p. II‑1277, n.º 39 e jurisprudência referida).

56      Deste modo, o respeito de um prazo razoável é exigido em todos os casos em que, devido ao silêncio dos textos legais, os princípios da segurança jurídica ou da proteção da confiança legítima impedem as instituições da União e as pessoas singulares ou coletivas de atuarem sem limites temporais, pondo assim em risco, nomeadamente, a estabilidade de situações jurídicas adquiridas. Para as instituições da União, o respeito de um prazo razoável constitui um aspeto do princípio da boa administração e decorre da exigência fundamental da segurança jurídica (v. acórdão do Tribunal Geral de 5 de outubro de 2004, Sanders e o./Comissão, T‑45/01, Colet., p. II‑3315, n.os 59 e 60 e jurisprudência referida).

57      Segundo jurisprudência constante, o caráter razoável da duração de um procedimento administrativo é apreciado em função das circunstâncias próprias de cada processo, nomeadamente do contexto em que este se inscreve, das diferentes etapas processuais seguidas, da complexidade do processo, bem como da importância que reveste para as diferentes partes interessadas (acórdãos do Tribunal Geral de 22 de outubro de 1997, SCK e FNK/Comissão, T‑213/95 e T‑18/96, Colet., p. II‑1739, n.º 57, e de 16 de setembro de 1999, Partex/Comissão, T‑182/96, Colet., p. II‑2673, n.º 177; v., por analogia, acórdão do Tribunal Geral de 19 de março de 1997, Oliveira/Comissão, T‑73/95, Colet., p. II‑381, n.º 41).

58      No que respeita, mais concretamente, aos financiamentos do FSE, há que recordar que, segundo a jurisprudência, os Estados‑Membros têm não apenas o direito mas também a obrigação de reexaminar os pedidos de pagamento do saldo, mesmo depois de terem procedido à certificação da sua exatidão factual e contabilística, e de transmitir à Comissão pedidos de pagamento revistos, propondo uma redução da contribuição, quando considerem deparar‑se com irregularidades que não se tinham revelado anteriormente. Esta obrigação decorre do artigo 2.º, n.º 2, da Decisão 83/516 e do artigo 7.º da Decisão 83/673, nos termos dos quais os Estados‑Membros garantem a boa execução das ações e têm a obrigação de informar imediatamente a Comissão quando a gestão de uma ação para a qual tenha sido concedida uma contribuição for objeto de inquérito por força de uma presunção de irregularidade. Estas obrigações e poderes dos Estados‑Membros não são limitados por restrições temporais (v. acórdão do Tribunal Geral de 6 de junho de 2007, Mediocurso/Comissão, T‑251/05 e T‑425/05, não publicado na Coletânea, n.º 57 e jurisprudência referida).

59      No presente caso, resulta do dossier que passaram 20 anos entre a receção, em 16 de outubro de 1990, do pedido inicial de pagamento do saldo e a adoção da decisão impugnada. Ora, em grande parte, este lapso de tempo explica‑se por um longo período de incerteza, decorrente do reexame do dossier pela IGF e do respetivo procedimento penal nacional (v., neste sentido, acórdão Branco/Comissão, referido no n.º 48, supra, n.º 139).

60      A este respeito, há que observar que, através do ofício relativo ao pedido inicial de pagamento do saldo, datado de 9 de outubro de 1990 e recebido em 16 de outubro de 1990, o DAFSE informou a Comissão de que «a certificação das indicações contidas neste pedido fica[va] condicionada a auditoria financeira a realizar, de cujos resultados [lhe] será dado conhecimento […]». Ora, na sequência de um ofício do DAFSE, que confirmou o referido pedido e foi recebido pela Comissão em 10 de julho de 1991, esta informou o DAFSE, em 24 de outubro de 1991, de que o pedido de pagamento do saldo não continha todas as informações nem os justificativos necessários.

61      Por outro lado, devido às suspeitas relativas à existência de certas irregularidades, as despesas realizadas no âmbito da ação de formação em causa foram inicialmente objeto de uma auditoria. Além disso, na sequência do relatório de auditoria de 10 de novembro de 1994, foi iniciado um procedimento penal contra a recorrente. A Comissão foi informada do arquivamento do processo penal nacional, por ofício do IGFSE de 27 de setembro de 2004. Este ofício vinha acompanhado das conclusões da análise do relatório de auditoria elaborado pela IGF. O IGFSE pedia à Comissão que adotasse uma decisão final no dossier em causa.

62      Só a partir desta informação é que a Comissão estava obrigada a reiniciar o exame do dossier no plano administrativo (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 30 de junho de 2005, Branco/Comissão, T‑347/03, Colet., p. II‑2555, n.os 117 e 118). Há que observar que a Comissão adotou uma decisão relativa ao dossier em causa, em 21 de junho de 2005, ou seja, cerca de nove meses depois. Este prazo não deve ser considerado excessivo, atendendo às previsíveis dificuldades relacionadas com a retoma e com a prossecução do processo depois de uma interrupção de quase treze anos (v., neste sentido, acórdão de 14 de dezembro de 2006, Branco/Comissão, referido no n.º 48, supra, n.º 140).

63      Ora, em 6 de janeiro de 2009, o IGFSE pediu à Comissão que adotasse um novo projeto de decisão destinado a ser notificado à recorrente, tendo igualmente notificado a esta última, em 17 de abril de 2009, a decisão de 21 de junho de 2005. Em 2 de julho de 2009, a recorrente interpôs recurso de anulação desta última decisão, que a Comissão revogou em 30 de setembro de 2009. Em seguida, em 22 de junho de 2010, a Comissão notificou ao IGFSE um novo projeto de decisão, que foi notificado à recorrente em 15 de julho de 2010. Esta última pronunciou‑se sobre este projeto em 4 de agosto de 2010. Em 18 de outubro de 2010, o IGFSE pediu à Comissão que adotasse uma decisão final.

64      Em 27 de outubro de 2010, a Comissão adotou a decisão impugnada, que foi notificada à recorrente em 11 de novembro de 2010.

65      Resulta do resumo dos factos acima efetuado que foi devido a dificuldades e atrasos a nível nacional que a fase do procedimento administrativo, compreendida entre 21 de junho de 2005 e 27 de outubro de 2010, foi tão comprida. Nomeadamente, há que observar que o período significativamente longo, posterior à informação respeitante ao arquivamento do procedimento penal nacional, compreendido entre a adoção da primeira decisão, em 21 de junho de 2005, e o ofício do IGFSE de 6 de janeiro de 2009, sobre o qual não foi apresentada nenhuma explicação precisa, não pode ser imputado à Comissão. Ora, só as demoras imputáveis a esta última podem levar a concluir pela inobservância do prazo razoável (v., neste sentido, acórdão de 30 de junho de 2005, Branco/Comissão, referido no n.º 62, supra, n.º 122).

66      Por conseguinte, há que concluir que o tempo que a Comissão levou a adotar a decisão impugnada se explica pelo contexto específico do processo e pelas circunstâncias particulares que caracterizaram as diferentes etapas procedimentais, e que o prazo em causa não pode ser considerado excessivo.

67      Há igualmente que rejeitar o argumento da recorrente segundo o qual tinha a convicção de que nenhuma dúvida existia quanto à regularidade das despesas realizadas devido à duração do procedimento. Com efeito, a recorrente tinha conhecimento das dificuldades processuais causadas pelas irregularidades por si originadas, nomeadamente da auditoria efetuada pela IGF e do procedimento penal intentado contra si e que foi arquivado por motivo de prescrição. Além disso, em 17 de abril de 2009, o IGFSE notificou‑lhe a decisão da Comissão de 21 de junho de 2005.

68      Deste modo, há que concluir que a pretensa insegurança jurídica que a recorrente relaciona com o prazo em causa não pode conduzir à anulação da decisão impugnada.

69      Por outro lado, caso houvesse que interpretar os argumentos da recorrente no sentido de que invocam uma pretensa violação do princípio da proteção da confiança legítima, há que recordar que, nos termos do artigo 6.º, n.º 1, do Regulamento n.º 2950/83, a decisão final da Comissão depende de o beneficiário respeitar as condições impostas para a atribuição da contribuição financeira. Deste modo, o princípio da proteção da confiança legítima não pode ser invocado contra a redução de uma contribuição da União, quando as referidas condições não tiverem sido respeitadas (v. acórdão Mediocurso/Comissão, referido no n.º 58, supra, n.º 61 e jurisprudência referida).

70      No que respeita à alegada violação dos direitos de defesa, a recorrente limita‑se a afirmar que o tempo que a Comissão levou a adotar a decisão impugnada compromete as suas possibilidades de fazer prova de que as acusações que lhe são imputadas não procedem. A recorrente alega que ficou irremediavelmente coartado o seu direito de apresentar as suas observações em tempo útil, isto é, numa altura em que ainda dispunha de documentos que lhe teriam permitido justificar as despesas que a Comissão considerou serem não elegíveis.

71      O respeito dos direitos de defesa em qualquer processo intentado contra uma pessoa e suscetível de culminar na adoção de um ato lesivo dos seus interesses constitui um princípio fundamental do direito da União e deve ser assegurado mesmo em caso de inexistência de regulamentação relativa ao processo em causa. Este princípio impõe que a qualquer pessoa contra a qual possa ser tomada uma decisão que afete significativamente os seus interesses deve ser oferecida a possibilidade de dar a conhecer utilmente o seu ponto de vista sobre as acusações que lhe são imputadas para fundamentar essa decisão (v. acórdão do Tribunal Geral de 10 de dezembro de 2009, Cofac/Comissão, T‑158/07, não publicado na Coletânea, n.º 35 e jurisprudência referida).

72      Ora, como foi acima recordado no n.º 69, nos termos do artigo 6.º, n.º 1, do Regulamento n.º 2950/83, a decisão final depende de o beneficiário respeitar as condições impostas para a atribuição da contribuição financeira. Por outro lado, segundo o artigo 7.º, n.º 1, do referido regulamento, tanto as autoridades nacionais como a Comissão têm o direito de controlar que o beneficiário respeita essas condições. Resulta daqui que, para garantirem o pagamento da contribuição, os beneficiários são obrigados a conservar os justificativos que demonstram que satisfizeram essas condições, pelo menos, até à decisão final da Comissão sobre o pedido de pagamento do saldo (acórdão Partex/Comissão, referido no n.º 57, supra, n.º 196).

73      No presente caso, uma primeira decisão sobre o pedido de pagamento do saldo foi adotada em 21 de junho de 2005, notificada à recorrente em 17 de abril de 2009 e revogada em 30 de setembro de 2009. No entanto, nesse contexto e à luz, nomeadamente, dos motivos pelos quais esta decisão foi revogada, a recorrente devia razoavelmente saber que a Comissão ia adotar uma nova decisão no dossier em causa. O projeto desta decisão foi‑lhe efetivamente notificado em 15 de julho de 2010 e a decisão impugnada foi adotada em 27 de outubro de 2010.

74      Por conseguinte, há que julgar improcedente a acusação relativa à violação dos direitos de defesa.

75      Daqui resulta que há que julgar improcedente o segundo fundamento.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação do dever de fundamentação

76      A recorrente sustenta que a decisão impugnada não satisfaz as exigências de fundamentação impostas pelo artigo 296.º TFUE, porque não expõe as razões que levaram a Comissão a reduzir o montante da contribuição financeira concedida ao abrigo do FSE.

77      Segundo jurisprudência constante, o dever de fundamentar uma decisão individual tem por finalidade fornecer ao interessado indicações suficientes para saber se a decisão é legítima ou se, eventualmente, enferma de um vício que permita contestar a sua validade e permitir ao juiz da União o exercício da fiscalização da legalidade da decisão. O âmbito deste dever de fundamentação depende da natureza do ato em causa e do contexto em que foi adotado (v. acórdão do Tribunal Geral de 9 de julho de 2003, Vlaams Fonds voor de Sociale Integratie van Personen met een Handicap/Comissão, T‑102/00, Colet., p. II‑2433, n.º 100 e jurisprudência referida).

78      Dado que uma decisão que reduz o montante de uma contribuição do FSE inicialmente concedida acarreta, designadamente, consequências graves para o beneficiário da contribuição, esta decisão deve revelar claramente os fundamentos que justificam a redução da contribuição em relação ao montante inicialmente aprovado. Além disso, a fundamentação de tal decisão deve permitir que o beneficiário da contribuição tome também conhecimento do modo de cálculo da redução efetuada (acórdão Vlaams Fonds voor de Sociale Integratie van Personen met een Handicap/Comissão, referido no n.º 77, supra, n.º 101).

79      Ora, a questão de saber se a fundamentação de uma decisão preenche estes requisitos deve ser apreciada à luz não somente da sua redação mas também do seu contexto, bem como de todas as regras jurídicas que regem a matéria em causa (v. acórdão Mediocurso/Comissão, referido no n.º 58, supra, n.º 41 e jurisprudência referida).

80      Numa situação em que a Comissão confirma pura e simplesmente a proposta, apresentada por um Estado‑Membro, de reduzir uma contribuição inicialmente concedida, uma decisão da Comissão pode ter-se por devidamente fundamentada, na aceção do artigo 296.° TFUE, quer quando a própria decisão revela claramente os fundamentos que justificam a redução da contribuição quer quando, em vez disso, se refere claramente a um ato das autoridades nacionais competentes do Estado‑Membro em causa, em que estas expõem claramente os fundamentos dessa redução (v. acórdão Mediocurso/Comissão, referido no n.º 58, supra, n.º 42 e jurisprudência referida).

81      É à luz destes princípios que há que verificar se a decisão impugnada está suficientemente fundamentada.

82      Na decisão impugnada, a Comissão confirmou a proposta que lhe foi feita pelo IGFSE, de reduzir para 48 504 201 PTE o montante da contribuição do FSE concedida pela Decisão C (89) 570.

83      Além disso, há que observar que a decisão impugnada, quando aborda os motivos que justificaram a redução da contribuição financeira do FSE, remete claramente para vários documentos elaborados pelas autoridades portuguesas, nomeadamente para o ofício do IGFSE de 27 de setembro de 2004 e para a Informação n.º 32/2004, de 4 de julho de 2004. Há que precisar que estes documentos foram efetivamente comunicados à recorrente.

84      A recorrente alega que resulta do relatório de auditoria e da Informação n.º 32/2004 que a IGF deixou à apreciação do DAFSE uma série de despesas, mas que este não se pronunciou sobre as mesmas.

85      Por ofício de 27 de setembro de 2004, o IGFSE informou a Comissão de que, no âmbito do dossier em causa, o custo total da ação devia ser fixado em 92 086 377 PTE. Com efeito, o IGFSE considerava que as despesas não elegíveis no montante de 162 188 514 PTE deviam ser subtraídas das despesas anteriormente avaliadas no montante de 254 274 891 PTE (v. n.os 5 e 13, supra). Estas conclusões são recordadas na decisão impugnada, que se refere ao dito ofício.

86      Este cálculo e a discriminação dos montantes das despesas não elegíveis foram apresentados no quadro intitulado «Estrutura de custos», que foi anexado à Informação n.º 32/2004. Deste resulta que o DAFSE tinha considerado que um montante total de 117 893 198 PTE correspondente a despesas não elegíveis devia ser adicionado ao montante de 44 295 316 PTE que a IGF já havia considerado não elegível. O montante resultante da soma destes dois montantes ascendia a 162 188 514 PTE. Há que precisar que, no quadro em questão, os montantes em causa estão discriminados e cada número corresponde a uma rubrica precisa, exposta e analisada na mesma Informação n.º 32/2004.

87      Além disso, no que respeita à fixação da contribuição do FSE, há que observar que resulta tanto da decisão impugnada como do ofício de 27 de setembro de 2004 e do quadro acima referido que esta foi obtida através da aplicação de uma taxa de 55% ao montante resultante do custo total da ação em causa (92 086 377 PTE), diminuído do montante correspondente às receitas provenientes da mesma ação (3 896 921 PTE), ou seja, 88 189 456 PTE x 55%, o que corresponde a 48 504 201 PTE. Tal resulta também do quadro relativo ao dossier em causa, que figura no ponto 4 do ofício do IGFSE que notificou a decisão impugnada à recorrente.

88      Deste modo, há que considerar que a decisão impugnada era suficientemente clara no que respeita ao modo de cálculo da redução efetuada.

89      Quanto à decisão das autoridades nacionais de considerarem que certas despesas eram «não elegíveis», a recorrente sustenta que a fundamentação desta decisão é manifestamente insuficiente, porque assenta em meras dúvidas e não em certezas. Por outro lado, relativamente às despesas «potencialmente não elegíveis», há uma total falta de fundamentação.

90      Esta argumentação não pode ser acolhida. Em primeiro lugar, os motivos pelos quais o DAFSE considerou que as despesas que foram deixadas à sua apreciação não eram elegíveis estão expostos no ponto 5 da Informação n.º 32/2004, onde são evocadas as dificuldades relacionadas com a justificação destas despesas, constatadas pela IGF. O DAFSE concluiu, no ponto 5.7 da mesma informação, que, devido a essas dificuldades, essas despesas deviam ser consideradas não elegíveis. Em segundo lugar, no que respeita às despesas que a IGF considerou serem não elegíveis, a fundamentação consta do relatório de auditoria, que precisa claramente as irregularidades cometidas pela recorrente e ao qual a decisão impugnada se refere.

91      Por outro lado, há que afastar o argumento da recorrente segundo o qual esta fundamentação assenta apenas nas dúvidas relacionadas com a documentação que apresentou. Com efeito, tal argumento visa, na realidade, contestar a justeza da decisão impugnada e não pode ser invocado no âmbito de uma pretensa violação do dever de fundamentação. Além disso, a recorrente também não apresentou argumentos nem elementos de prova suscetíveis de demonstrar um eventual erro de apreciação por parte das autoridades.

92      Deste modo, há que julgar improcedente o presente fundamento.

93      Daqui resulta que há que negar provimento ao recurso.

 Quanto às despesas

94      Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que a condenar nas despesas, em conformidade com os pedidos da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A Associação de Empresas de Construção e Obras Públicas e Serviços (AECOPS) é condenada nas despesas.

Dittrich

Wiszniewska-Białecka

Prek

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 19 de abril de 2013.

Assinaturas


* Língua do processo: português.