Language of document : ECLI:EU:T:1998:36

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção Alargada)

17 de Fevereiro de 1998 (1)

«Auxílios de Estado — Acção por omissão — Extinção da instância — Pedido de indemnização — Pedido para que seja imposta a um Estado-Membro uma modificação das modalidades de concessão de um auxílio já atribuído — Circunstâncias de facto — Incompetência da Comissão»

No processo T-107/96,

Pantochim SA, sociedade de direito belga, com sede em Feluy (Bélgica), representada por Jacques Bourgeois, advogado no foro de Bruxelas, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado Marc Loesch, 11, rue Goethe,

demandante,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por Gérard Rozet, consultor jurídico, na qualidade de agente, assistido por Hervé Lehman, advogado no foro de Paris, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Carlos Gómez de la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

demandada,

apoiada por

República Francesa, representada inicialmente por Catherine de Salins, subdirectora na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e Frédéric Pascal, encarregado de missão na mesma Direcção, e posteriormente por Kareen Rispal-Bellanger, subdirectora na mesma Direcção, e M. Pascal, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada de França, 8 B, boulevard Joseph II,

interveniente,

que tem por objecto, por um lado, um pedido de declaração de omissão da Comissão, por ilegalmente se ter abstido de decidir, em conformidade com o artigo 93.°, n.° 2, do Tratado, que a França devia modificar as modalidades de concessão do auxílio que concedia aos biocombustíveis, e, por outro lado, um pedido de indemnização do prejuízo que a referida omissão causou à demandante,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Terceira Secção Alargada),

composto por: B. Vesterdorf, presidente, C. P. Briët, P. Lindh, A. Potocki, e J. D. Cooke, juízes,

secretário: J. Palacio González, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 7 de Outubro de 1997,

profere o presente

Acórdão

Factos na origem do litígio

1.
    A requerente, Pantochim SA, que tem sede social em Feluy (Bélgica), é uma filial da Società italiana serie acetica sintetica SpA (a seguir «SISAS»), com sede em Milão (Itália). A Pantochim tem em Feluy uma unidade de produção de gasóleo de origem vegetal, denominado «Sisoil E». O Sisoil E é um éster metílico de óleos vegetais, que pode ser utilizado, só ou misturado com os gasóleos clássicos, para carburação e para aquecimento doméstico.

2.
    A lei de finanças francesa para 1992 (Lei 91-1322 de 30 de Dezembro de 1991, publicada no Journal officiel de la République française de 31.12.1991, p. 17229), isentou, no seu artigo 32.°, até 31 de Dezembro de 1996, do imposto interno sobre o consumo os ésteres de óleo de colza e de girassol, bem como o álcool etílico elaborado a partir de cereais, topinambo, batata ou beterraba e incorporado nos

supercombustíveis e nas gasolinas, e os derivados desse álcool (a seguir «biocombustíveis»). O decreto de 27 de Março de 1992, para aplicação do artigo 32.°, definiu os critérios a preencher para se beneficiar dessa isenção. Exigia, em especial, que os produtos em causa fossem utilizados no âmbito de um projecto experimental e fossem elaborados em unidades consideradas unidades-piloto.

3.
    O artigo 30.° da lei de finanças francesa rectificativa para 1993 (publicada no Journal officiel de la République française de 31.12.1993, p. 18526), impôs, além disso, que os produtos objecto da isenção fossem obtidos a partir de matérias-primas agrícolas «produzidas em parcelas em situação de 'pousio não alimentar‘, na acepção do Regulamento (CEE) n.° 334/93 da Comissão, de 15 de Fevereiro de 1993».

4.
    Não existindo uma isenção fiscal como a acima descrita, a produção de biocombustíveis não teria qualquer interesse económico, devido aos seus custos de produção importantes.

5.
    Logo em Novembro de 1992, a SISAS manifestou à administração francesa o seu interesse na obtenção da homologação da sua fábrica de Feluy como «unidade-piloto» para a produção de biocombustíveis e requereu oficialmente essa homologação em Março de 1993. Contudo, é pacífico que até ao momento não lhe foi concedida qualquer homologação nesse sentido pela administração francesa. Assim, por ofício de 14 de Junho de 1996, enviado ao advogado da Pantochim, o ministro francês da Agricultura, Pescas e Alimentação fez-lhe notar que, segundo uma averiguação realizada no local, a fábrica de Feluy tinha uma capacidade de produção superior ao volume de homologação solicitado. Ora, dado que a Directiva 92/81/CEE do Conselho, de 19 de Outubro de 1992, relativa à harmonização das estruturas do imposto especial sobre o consumo de óleos minerais (JO L 316, p. 12), apenas autoriza os Estados-Membros a aplicar isenções ou reduções, totais ou parciais, da taxa do imposto no quadro dos «projectos-piloto» definidos pela capacidade de produção das instalações, aquela fábrica não podia ser homologada como unidade-piloto. Além disso, o ministro afirmou que, dado que estava em curso na Comissão um procedimento de verificação da compatibilidade da legislação francesa com o direito comunitário (v. infra), as autoridades francesas estavam impossibilitadas de conceder qualquer nova homologação.

6.
    Em 7 de Dezembro de 1994, a Comissão deu início ao procedimento previsto no artigo 93.°, n.° 2, do Tratado, no que respeita à legislação francesa que isenta os biocombustíveis do imposto interno sobre o consumo e informou disso as autoridades francesas por ofício de 12 de Dezembro de 1994. Foi publicada no Jornal Oficial das Comunidades Europeias de 9 de Junho de 1995 (JO C 143, p. 8) uma comunicação «nos termos do n.° 2 do artigo 93.° do Tratado CE [...] relativa aos auxílios concedidos pela França ao sector dos biocarburantes.»

7.
    No âmbito desse procedimento administrativo, a SISAS apresentou as suas observações em 29 de Junho de 1995. Solicitou, além disso, à Comissão, em primeiro lugar, que «declar[asse] que, em razão das suas modalidades de concessão contrárias ao artigo 95.° do Tratado que institui a Comunidade Europeia, o auxílio concedido pela França à produção de biodiesel não [era] compatível com o mercado comum nos termos do artigo 92.° desse Tratado», em segundo lugar «que decid[isse] que a França [devia] alterar esse auxílio, permitindo ao biodiesel produzido noutros Estados-Membros e fornecido em França beneficiar das mesmas vantagens», e, em terceiro lugar, «que tom[asse] as medidas provisórias que se [impunham], solicitando à França que proced[esse], o mais brevemente possível, à homologação da fábrica da SISAS em Feluy como 'unidade-piloto‘, provisoriamente para uma quantidade de 20 000 toneladas anuais relativamente a 1995».

8.
    Na falta de uma tomada de posição da Comissão a este respeito, a SISAS enviou-lhe, em 29 de Março de 1996, uma carta convidando-a a agir no prazo de dois meses, nos termos do artigo 175.° do Tratado, carta essa em que reiterava os pedidos formulados na carta de 29 de Junho de 1995. Acrescentou ainda que se reservava «o direito de a sua filial Pantochim SA pedir ao Estado francês e à Comunidade Europeia a reparação dos prejuízos económicos consideráveis que a Pantochim [sofrera] devido à sua exclusão ilegal do mercado francês de biodiesel não tributado, desde 1993».

9.
    Por ofício de 24 de Maio de 1996, dirigido ao advogado da SISAS, a Comissão informou que a referida carta de 29 de Março de 1996 fora registada como denúncia destinada a iniciar um procedimento de infracção nos termos do artigo 169.° do Tratado CE.

10.
    A Comissão adoptou em 18 de Dezembro de 1996 a Decisão 97/542/CE relativa às isenções fiscais para os biocombustíveis em França (JO L 222, p. 26, a seguir «decisão de 18 de Dezembro de 1996»), notificada às autoridades francesas em 29 de Janeiro de 1997, que dispõe: «Os auxílios concedidos em França sob forma de isenção fiscal a favor dos biocombustíveis de origem agrícola [...] são ilegais por terem sido concedidos com violação das regras de processo enunciadas no n.° 3 do artigo 93.° do Tratado. Estes auxílios são incompatíveis com o mercado comum na acepção do artigo 93.° do Tratado. A França fica obrigada a suprimir os auxílios a que se refere o artigo 2.° no prazo de dois meses a contar da notificação da presente decisão.»

11.
    Além disso, a Comissão esclareceu no corpo da decisão:

«A exclusão de determinados produtos de base do benefício da isenção da taxa em questão permite afirmar que esta medida configura um auxílio na acepção do n.° 1 do artigo 92.° do Tratado, dado que falseia a concorrência ao favorecer determinadas produções agrícolas e pode, pelas mesmas razões, afectar as trocas comerciais entre Estados-Membros. [... N]ão foi apresentada qualquer explicação

que possa justificar a necessidade de limitar a medida às produções agrícolas cultivadas em terras em pousio.» (Parte IV, n.° 5)

«Tendo em conta que a isenção fiscal visa tão-só os biocombustíveis fabricados a partir de certos produtos de base, a Comissão considerou que o regime consubstancia uma discriminação em relação a outros biocombustíveis que podem ser fabricados a partir de outros produtos de base (de outra espécie, de outra origem, que não as terras retiradas da produção); estes últimos biocombustíveis encontram-se sujeitos, em França, a uma carga normal de imposto especial. A medida de auxílio sob forma de isenção constitui, consequentemente, uma infracção às disposições do artigo 95.° do Tratado por se limitar a biocombustíveis fabricados a partir de um número limitado de produtos de base [..] e por os biocombustíveis importados dos outros Estados-Membros e fabricados a partir de outros produtos de base serem tributados de forma mais pesada.» (Parte V, n.° 4)

«[... Q]ualquer intervenção estatal no domínio abrangido pelo Regulamento (CEE) n.° 1765/92 equivaleria a uma ingerência do Estado no sistema completo e exaustivo das organizações comuns de mercado.

A isenção restrita em certos casos, a partir de 1994, aos produtos cultivados em terras em pousio, constitui, portanto, uma infracção ao Regulamento (CEE) n.° 1765/92.» (Parte VI, n.° 2)

«Assim sendo, os auxílios indirectos aos produtos de base constituem violações das disposições das organizações comuns de mercado, do Regulamento (CEE) n.° 1765/92 e do artigo 95.° do Tratado [...], não podendo, portanto, beneficiar de qualquer das derrogações estabelecidas no n.° 3 do artigo 92.° do Tratado CE [...]» (Parte VI, n.° 4)

«É, portanto, de reter que, do ponto de vista da economia do sistema, o efeito substancial do auxílio transferiu-se dos fabricantes, tecnicamente os destinatários directos, para os produtores da matéria-prima enquanto beneficiários indirectos.

[...]

Tendo em consideração o carácter passageiro da vantagem concedida aos fabricantes de biofuel e a natureza específica da infracção ao nível dos produtores agrícolas, beneficiários finais das vantagens concedidas, a recuperação dos montantes concedidos equivaleria a desferir um rude golpe a uma medida fundamentalmente conforme à política da Comunidade e cuja ilegalidade residia, à parte o aspecto processual, no essencial, numa abordagem demasiado restritiva no que concerne aos beneficiários indirectos do auxílio.» (Parte VII, n.° 3)

12.
    Assim, não foi imposta à República Francesa qualquer obrigação de recuperação do auxílio.

Tramitação processual

13.
    Foi neste contexto que, por petição apresentada na Secretaria do Tribunal em 12 de Julho de 1996, a Pantochim intentou a presente acção.

14.
    Por requerimento separado, que deu entrada na Secretaria do Tribunal em 19 de Julho de 1996, a demandante apresentou, ao abrigo do artigo 186.° do Tratado, um pedido de medidas provisórias destinado a que «a Comissão imponha à França, no âmbito do procedimento do artigo 93.°, n.° 2, primeiro parágrafo, do Tratado, (que lhe) atribua, a título provisório, a quantidade solicitada de biodiesel que possa beneficiar da isenção do imposto especial sobre o consumo aplicável».

15.
    Por despacho de 21 de Outubro de 1996, Pantochim/Comissão (T-107/96 R, Colect., p. II-1361), o presidente do Tribunal de Primeira Instância indeferiu o pedido de medidas provisórias apresentado pela Pantochim e reservou para final a decisão quanto às despesas.

16.
    Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal em 18 de Novembro de 1996, a República Francesa solicitou autorização para intervir em apoio dos pedidos da demandada. Por despacho de 9 de Janeiro de 1997, o presidente da Terceira Secção Alargada do Tribunal de Primeira Instância admitiu a intervenção da República Francesa.

17.
    Com base no relatório preliminar do juiz-relator, o Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção Alargada) decidiu dar início à fase oral, pedindo, em aplicação do artigo 65.° do Regulamento de Processo, a apresentação de determinados documentos. Além disso, o Tribunal convidou as partes a responderem a determinadas perguntas por escrito, e oralmente na audiência. As partes deram seguimento a esses pedidos.

18.
    As partes foram ouvidas em alegações e em resposta às perguntas formuladas pelo Tribunal na audiência de 7 de Outubro de 1997.

Pedidos das partes

19.
    A demandante conclui pedindo que o Tribunal se digne,

—    declarar que, em violação do Tratado, a Comissão se absteve de decidir, em conformidade com o artigo 93.°, n.° 2, primeiro parágrafo, do Tratado, que a França devia modificar as modalidades de concessão do auxílio aos biocombustíveis, tornando-as conformes com as disposições do Tratado;

—    declarar a Comunidade responsável pelo prejuízo resultante dessa omissão da Comissão e condená-la a reparar esse prejuízo, estimado a título provisório em 50 508 729 FF;

—    condenar a demandada nas despesas.

20.
    A Comissão conclui na tréplica pedindo que o Tribunal se digne:

—    julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide na acção por omissão, devido à adopção da decisão de 18 de Dezembro de 1996;

—    negar provimento ao pedido de indemnização apresentado pela Pantochim;

—    condenar a demandante nas despesas.

21.
    O Governo francês conclui pedindo que o Tribunal se digne:

—    julgar extinta a instância por inutilidade superveniente da lide na acção por omissão, uma vez que a Comissão adoptou a decisão de 18 de Dezembro de 1996.

Quanto à acção por omissão

Argumentação das partes

22.
    A demandante salienta que, por carta de 29 de Março de 1996, a SISAS, em conformidade com o artigo 175.° do Tratado, convidou a Comissão, por conta da Pantochim, a tomar posição no prazo de dois meses e que, findo esse prazo, a Comissão não tinha tomado qualquer posição.

23.
    Esclarece que acusa a Comissão de não ter tomado num prazo razoável a decisão, em conformidade com o artigo 93.°, n.° 2, primeiro parágrafo, do Tratado, intimando a França a «modificar as modalidades de concessão do auxílio aos biocombustíveis, tornando-as conformes com as disposições do Tratado». Ora, a Comissão não podia senão proibir as modalidades de concessão do auxílio em causa, uma vez que elas violariam manifestamente o artigo 95.° do Tratado.

24.
    Por fim, considera que, abstraindo de outras eventuais ilegalidades do regime de auxílios em causa, o seu pedido de que se pusesse termo às modalidades de auxílio discriminatórias se justificava porque era «perfeitamente destacável do regime de auxílios». Abrigando-se por trás das outras potenciais ilegalidades, a Comissão abster-se-ia de «prestar os primeiros cuidados a pretexto de ter primeiro que efectuar um diagnóstico profundo». Além disso, uma eventual decisão que implicasse a obrigação de o Governo francês suprimir os auxílios em questão não permitiria restabelecer as relações normais de concorrência.

25.
    A Comissão, na tréplica, e o Governo francês, nas alegações de intervenção, alegam que, devido à adopção da decisão de 18 de Dezembro de 1996, a acção por

omissão ficou desprovida de objecto, pelo que se verifica a inutilidade superveniente da lide.

26.
    Na resposta à carta do Tribunal que a convidava a tomar posição sobre esta alegação, a demandante, recordando que a sua acção por omissão se destina a «obter a declaração de que, em violação do Tratado, a Comissão se absteve de decidir, em conformidade com o artigo 93.°, n.° 2, primeiro parágrafo, do Tratado, que a França devia modificar as modalidades de concessão do auxílio aos biocombustíveis, tornando-as conformes com as disposições do Tratado», alega essencialmente que, embora observando na decisão que a medida de auxílio sob a forma de isenção constitui uma infracção ao disposto no artigo 95.° do Tratado, a Comissão não tomou a decisão cuja omissão se imputa. Efectivamente, em vez de intimar a República Francesa a respeitar o artigo 95.° do Tratado aquando da concessão de auxílios, a Comissão declarou que os auxílios em causa preenchiam as condições previstas no artigo 92.°, n.° 1, do Tratado, sem poderem beneficiar de nenhuma das derrogações previstas nos n.os 2 e 3 desses artigos, e consequentemente declarou-os incompatíveis com o mercado comum.

27.
    Observa também que a República Francesa, ao mesmo tempo que mantém o regime de auxílios declarado ilegal pela Comissão, continua sem lhe conceder o benefício desses auxílios.

Apreciação do Tribunal

28.
    Antes de mais, importa recordar que, segundo jurisprudência assente, a via processual prevista no artigo 175.° do Tratado se baseia na ideia de que a inacção ilegal da instituição permite recorrer ao tribunal comunitário para que este declare que a abstenção de agir é contrária ao Tratado, na medida em que a instituição não tenha obviado a essa abstenção. Essa declaração tem como efeito, nos termos do artigo 176.° do Tratado, que a instituição demandada deve tomar as medidas necessárias à execução do acórdão do tribunal comunitário, sem prejuízo das acções por responsabilidade extracontratual que possam resultar da mesma declaração (acórdão do Tribunal de Justiça de 24 de Novembro de 1992, Buckl e o./Comissão, C-15/91 e C-108/91, Colect., p. I-6061, n.° 14; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 18 de Setembro de 1992, Asia Motor France e o./Comissão, T-28/90, Colect., p. II-2285, n.° 36).

29.
    Ora, caso o acto cuja omissão é objecto do litígio tenha sido adoptado depois da propositura da acção, mas antes da prolação do acórdão, uma declaração, pelo Tribunal, de ilegalidade da abstenção inicial já não pode levar às consequências previstas no artigo 176.° (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 10 de Julho de 1997, Oficemen/Comissão, T-212/95, Colect., p. II-1161, n.os 65 a 68). Daí resulta que, nesse caso, tal como no caso em que a instituição demandada tenha reagido ao convite para agir no prazo de dois meses, o objecto da acção desapareceu.

30.
    Além disso, resulta de jurisprudência constante que o artigo 175.° se refere à omissão por abstenção de decisão ou de tomada de posição e não à adopção de um acto diferente daquele que os interessados tenham pretendido ou considerado necessário (acórdãos do Tribunal de Justiça de 13 de Julho de 1971, Deutscher Komponistenverband/Comissão, 8/71, Colect., p. 705, n.° 2; publicação sumária em língua portuguesa em Colect., p. 247, e de 15 de Dezembro de 1988, Irish Cement/Comissão, 166/86 e 220/86, Colect., p. 6473, n.° 17). Ora, no caso vertente, é inegável que a adopção da decisão de 18 de Dezembro de 1996 constitui uma tomada de posição da Comissão, na acepção do artigo 175.° do Tratado, relativamente ao convite a agir que lhe foi dirigido em 29 de Março de 1996.

31.
    Por conseguinte, o facto de a decisão adoptada pela Comissão em 18 de Dezembro de 1996 se limitar a declarar que os auxílios em questão são ilegais e incompatíveis com o mercado comum, na acepção do artigo 92.° do Tratado, e obrigar a República Francesa a suprimir os auxílios em questão, sem contudo lhe impor a modificação das modalidades de concessão do auxílio, tornando-as conformes com as disposições do Tratado, é indiferente a este respeito.

32.
    Assim, o Tribunal julga extinta a instância na acção por omissão.

Quanto ao pedido de indemnização

Argumentação das partes

33.
    A demandante considera, em substância, que, ao não adoptar a decisão no âmbito do procedimento iniciado nos termos do artigo 93.°, n.° 2, do Tratado, e ao não impor à República Francesa a obrigação de modificar as modalidades ilegais de concessão da isenção em causa, a Comissão cometeu uma ilegalidade susceptível de levar à efectivação da responsabilidade da Comunidade. Com efeito, ao permanecer tanto tempo sem tomar uma decisão, esta instituição, por um lado, impediu-a de dispor do acto necessário para que ela possa fazer valer contra a administração francesa um direito a reparação sobre factos passados e, por outro lado, não lhe evitou o prejuízo futuro, mas certo, resultante da sua exclusão do mercado francês na nova campanha.

34.
    Considera que, no caso vertente, a Comissão deveria ter agido para pôr termo às condições de concessão discriminatórias e que «quem é acusado de omissão de auxílio devido não pode eximir-se à sua responsabilidade civil devida a essa omissão invocando o perigo causado pelo autor do perigo». Recorda, além disso, que a Comissão não intimou a França a suspender o pagamento dos auxílios.

35.
    Salienta, além disso, que o amplo poder de apreciação que o artigo 92.°, n.° 3, do Tratado confere à Comissão não comporta a possibilidade de admitir uma violação manifesta das normas elementares do Tratado.

36.
    No que respeita ao prejuízo sofrido, a demandante considera que ele é duplo, devido aos danos sofridos e ao lucro cessante. Com efeito, por um lado tinha pedido já em Novembro de 1992 para abastecer o mercado francês beneficiando da mencionada isenção e, por outro lado, a administração francesa estava prestes a fixar, para a campanha seguinte, que se iniciaria em 1 de Julho de 1996, a quantidade global de biocombustível que beneficiaria da isenção e a repartir as quotas entre os beneficiários. Daí resultaria, em seu entender, um prejuízo causado por perdas da margem dita «de contribuição» e um lucro cessante, para os anos de 1993 a 1997, que quantifica provisoriamente em 50 508 729 FF.

37.
    Reconhece que, na situação actual, é difícil quantificar com precisão o prejuízocausado pela omissão da Comissão, uma vez que a determinação do prejuízo quanto ao passado «depende do cálculo da indemnização que o tribunal francês teria concedido se a Comissão tivesse decidido [...] que o comportamento da administração francesa para com a demandante [era] ilegal».

38.
    A demandante considera que o nexo de causalidade entre o prejuízo e a omissão da Comissão é evidente, devido à provável impossibilidade em que ela se encontra de fazer valer o seu direito ao ressarcimento contra a administração francesa e devido à inexistência de obrigação para a República Francesa de adoptar um comportamento diferente na campanha iniciada em 1 de Julho de 1996.

39.
    A Comissão alega antes de mais que, como não pode ser-lhe censurada nenhuma omissão, não pode ser-lhe imputado nenhum comportamento ilegal, por um lado, e que, admitindo que venha a ser declarada a existência de uma omissão, a demandante não demonstrou que isso constituía violação de uma norma superior de direito que tutela os particulares ou uma violação grave e manifesta dos limites que se impõem ao exercício dos seus poderes, por outro lado (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Junho de 1991, Stahlwerke Peine-Salzgitter/Comissão, T-120/89, Colect., p. II-279, n.° 74).

40.
    Salienta, a este respeito, que o artigo 92.°, n.° 3, do Tratado confere à Comissão um amplo poder de apreciação para decidir admitir ou não um regime de auxílios, ou ainda para impor modificações a esse regime (acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Julho de 1996, SFEI e o., C-39/94, Colect., p. I-3547, n.° 36).

41.
    Observa ainda que não basta que seja declarada a existência de omissão para que a responsabilidade da Comunidade exista ipso facto, como resultaria do acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 18 de Setembro de 1996, Asia Motor France e o./Comissão (T-387/94, Colect., p. II-961, n.os 107 e 108).

42.
    A Comissão alega em seguida, no que respeita ao prejuízo sofrido, que o convite a agir e uma eventual omissão só poderiam afectar, de qualquer modo, a época de 1996 a 1997, e não as épocas anteriores à interpelação. Assim sendo, o prejuízo dependeria da atitude da administração francesa durante esse período.

43.
    Por outro lado, um prejuízo resultante da impossibilidade de beneficiar de auxílios ilegais não poderia dar direito a uma indemnização.

44.
    A Comissão recorda, por fim, no que respeita ao nexo de causalidade, que o artigo 215.°, segundo parágrafo, do Tratado apenas diz respeito aos prejuízos imputáveis às instituições da Comunidade ou aos seus agentes, com exclusão da eventual responsabilidade dos Estados-Membros (acórdãos do Tribunal de Justiça de 13 de Fevereiro de 1979, Granaria, 101/78, Recueil, p. 623, e de 18 de Outubro de 1984, Eurico/Comissão, 109/83, Recueil, p. 3581).

45.
    Contesta, a este respeito, que a sua pretensa omissão constitua um obstáculo ao direito ao ressarcimento, a invocar contra a administração francesa, quando a demandante tinha a possibilidade de fazer valer os seus direitos num tribunal nacional, invocando o efeito directo do artigo 93.°, n.° 3, do Tratado, uma vez que o regime de auxílios em causa não tinha sido notificado (acórdão SFEI e o., já referido), ou o efeito directo do artigo 95.° do Tratado, que proíbe as medidas de imposição discriminatórias.

46.
    Considera que resulta do n.° 36 do despacho do presidente do tribunal de 21 de Outubro de 1996, já referido, que a Comissão não podia «prestar os primeiros cuidados» no sentido pretendido pela demandante. Considera que podia adoptar uma decisão provisória de suspensão da medida de auxílio, mas que não era isso o que a Pantochim pretendia.

47.
    Conclui que não tinha de se pronunciar sobre a questão de saber se era ilegal o comportamento da administração francesa a respeito da Pantochim, mas que lhe competia simplesmente decidir se o regime de auxílios em causa era, no seu todo, compatível ou não com o mercado comum.

Apreciação do Tribunal

48.
    Segundo jurisprudência assente, só existe responsabilidade extracontratual da Comunidade se estiver reunido um conjunto de condições no que respeita à ilegalidade do comportamento censurado à instituição comunitária, à realidade do dano e à existência de um nexo de causalidade entre o comportamento ilegal e o prejuízo invocado (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 13 de Dezembro de 1995, Exporteurs in Levende Varkens e o./Comissão, T-481/93 e T-484/93, Colect., p. II-2941, n.° 80).

49.
    O Tribunal considera que resulta da leitura da petição, do convite a agir esclarecido pela carta da sociedade-mãe da demandante de 29 de Junho de 1995 (v. n.os 7 e 8 do presente despacho), dos diversos articulados da demandante e das declarações por ela feitas na audiência que o presente pedido de indemnização visa, em substância, obter a declaração de que, em violação do Tratado, a Comissão se absteve de decidir, a título provisório ou definitivo, nos termos do

artigo 93.°, n.° 2, primeiro parágrafo, do Tratado, que a República Francesa devia modificar aquele auxílio, permitindo que o biodiesel produzido noutros Estados-Membros e fornecido em França beneficiasse das mesmas vantagens que são concedidas às sociedades estabelecidas em França que operam no mesmo sector, e que a demandante devia obter das autoridades francesas competentes uma isenção fiscal para o biodiesel fornecido em França, declarando em conformidade existir responsabilidade da Comunidade pelo prejuízo resultante dessa omissão da Comissão.

50.
    Ora, deve observar-se que as medidas exigidas pela demandante vão mais longe que aquelas que a Comissão pode adoptar.

51.
    Com efeito, resulta, em primeiro lugar, da jurisprudência do Tribunal de Justiça e do Tribunal de Primeira Instância que, quando a Comissão verifica, no âmbito de um procedimento nos termos do artigo 93.°, n.° 2, do Tratado, que foi instituído um auxílio sem, contrariamente ao estipulado no artigo 93.°, n.° 3, do Tratado, lhe ter sido previamente notificado, ela pode adoptar como única medida provisória a que consiste na injunção dirigida ao Estado-Membro em causa para suspender imediatamente — ainda que parcialmente, em conformidade com o acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Março de 1977, Ianelli e Volpi ((74/76, Colect., p. 175, n.os 14 a 17) — o pagamento do auxílio e lhe fornecer, no prazo que ela fixar, todos os documentos, informações e dados necessários para examinar a compatibilidade desse auxílio com o mercado comum (v. o acórdão SFEI e o., já referido, n.° 45, e o despacho Pantochim/Comissão, já referido, n.os 35 e 36). Ora, a medida provisória que a demandante solicitou à Comissão, destinada a que, na realidade, esta impusesse à França que isentasse a demandante do imposto interno sobre o consumo, situa-se manifestamente fora das competências que foram reconhecidas à instituição demandada no procedimento administrativo previsto no artigo 93.°, n.° 2, do Tratado.

52.
    Em segundo lugar, resulta da formulação do artigo 93.°, n.° 2, do Tratado que, confrontada com um auxílio incompatível, a Comissão deve ordenar ao Estado-Membro em causa que a «suprima ou modifique» no prazo que ela fixar. Ora, as duas medidas que a demandante pede à Comissão, tal como foram acima explicitadas, situam-se fora das competências que foram reconhecidas à Comissão para encerrar o procedimento administrativo previsto no artigo 93.°, n.° 2, do Tratado, uma vez que tal pedido de obtenção de um auxílio vai para além da supressão ou modificação do auxílio, como permite o artigo 93.°, n.° 2, do Tratado.

53.
    Assim, não pode acusar-se a Comissão de ter adoptado um comportamento ilegal ao recusar-se, com a decisão de 18 de Dezembro de 1996, a adoptar as medidas exigidas pela demandante.

54.
    Resulta do que antecede que a primeira condição para ser efectivada a responsabilidade extracontratual da Comunidade, ou seja, a existência de ilegalidade no comportamento da Comissão, não se verifica no presente caso.

55.
    Consequentemente, deve negar-se provimento ao pedido de indemnização.

Quanto às despesas

56.
    Por força do disposto no n.° 6 do artigo 87.° do Regulamento de Processo, se não houver lugar a decisão de mérito o Tribunal decide livremente quanto às despesas. Além disso, por força do disposto no n.° 2 do artigo 87.° do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se tal tiver sido requerido.

57.
    No caso vertente, o Tribunal observa que, devido à ilegalidade da medida exigida pela demandante à Comissão, verificada no âmbito da apreciação do pedido de indemnização, a acção por omissão não poderia nunca ter vencimento. Assim, a demandante deve ser condenada na totalidade das despesas, incluindo as relativas ao processo de medidas provisórias.

58.
    Em aplicação do artigo 87.°, n.° 4, do Regulamento de Processo, o Governo da República Francesa suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção Alargada),

decide:

1.
    A instância é julgada extinta na acção por omissão.

2.
    O pedido de indemnização é julgado improcedente.

3.
    A demandante é condenada nas despesas, incluindo as relativas ao processo de medidas provisórias.

4.
    O Governo da República Francesa suportará as suas próprias despesas.

Vesterdorf                    Briët                    Lindh

            Potocki                Cooke

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 17 de Fevereiro de 1998.

O secretário

O presidente

H. Jung

B. Vesterdorf


1: Língua do processo: francês.