Language of document : ECLI:EU:T:2009:77

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

24 de Março de 2009 (*)

«Marca comunitária – Processo de declaração de nulidade – Marcas figurativas comunitárias GENERAL OPTICA em diferentes cores – Denominação comercial anterior Generalóptica – Motivo relativo de recusa – Alcance local do sinal anterior – Artigo 8.°, n.° 4, e artigo 52.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento (CE) n.° 40/94»

Nos processos apensos T‑318/06 a T‑321/06,

Alberto Jorge Moreira da Fonseca, Lda, com sede em Santo Tirso (Portugal), representada por M. Oehen Mendes e D. Jeffries, advogados,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por J. Novais Gonçalves, na qualidade de agente,

recorrido,

sendo a outra parte na Câmara de Recurso do IHMI, interveniente no Tribunal de Primeira Instância,

General Óptica,      SA, com sede em Barcelona (Espanha), representada por M. Curell Aguilà e X. Fàbrega Sabaté, advogados,

que tem por objecto quatro recursos interpostos das decisões da primeira Câmara de Recurso do IHMI de 8 de Agosto de 2006 (processos R 944/2005‑1, R 945/2005‑1, R 946/2005‑1 e R 947/2005‑1), relativos a quatro processos de declaração de nulidade entre Alberto Jorge Moreira da Fonseca, Lda e General Óptica, SA,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Segunda Secção),

composto por: I. Pelikánová, presidente, K. Jürimäe e S. Soldevila Fragoso (relator), juízes,

secretário: N. Rosner, administrador,

vistas as petições apresentadas na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 27 de Novembro de 2006,

vistas as contestações do IHMI apresentadas na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 23 de Março de 2007,

vistas as observações da interveniente apresentadas na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 23 de Março de 2007,

após a audiência de 16 de Setembro de 2008,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 10 de Julho de 1997, a interveniente, General Óptica, SA, apresentou dois pedidos de marca comunitária no Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), ao abrigo do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), conforme alterado.

2        As marcas cujo registo foi pedido são os sinais figurativos GENERAL OPTICA a seguir reproduzidos:

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3        Os serviços para os quais o registo foi pedido pertencem à classe 42, na acepção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, conforme revisto e alterado.

4        Em 10 de Setembro de 1999, a interveniente obteve o registo das marcas comunitárias GENERAL OPTICA sob os números 573592 e 573774, para serviços ópticos.

5        Em 5 de Novembro de 2001, a interveniente apresentou, para os mesmos serviços, dois novos pedidos de marca comunitária, que tinham por objecto os sinais figurativos GENERAL OPTICA a seguir reproduzidos. Essas marcas foram registadas em 20 de Novembro de 2002 e 31 de Janeiro de 2003, respectivamente, sob os números 2436798 e 2436723.

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6        A interveniente é também titular da marca internacional n.° 483246, GENERAL OPTICA, para aparelhos, instrumentos e artigos ópticos da classe 9, e para os serviços de promoção e de publicidade dos produtos ópticos fabricados e vendidos pelos respectivos proprietários, pertencentes à classe 35. Depois de ter renunciado à extensão do direito de marca a Portugal em 13 de Fevereiro de 1997, a interveniente requereu novamente essa extensão em 14 de Fevereiro de 1997, a qual foi concedida em 16 de Fevereiro de 1998. Essa marca é a seguinte:

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7        Em 27 de Janeiro de 2004, a recorrente, Alberto Jorge Moreira da Fonseca, Lda, pediu ao IHMI que declarasse a nulidade das marcas figurativas comunitárias GENERAL OPTICA por força do artigo 52.°, n.° 1, alínea c), e do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94, na versão aplicável à data dos factos.

8        A recorrente baseia os seus pedidos de declaração de nulidade na propriedade de um nome de estabelecimento comercial anterior, Generalóptica, pedido em 4 de Setembro de 1987 e concedido em 24 de Abril de 1990, para a importação e a venda a retalho de aparelhos de óptica, de precisão e fotográficos.

9        Com este fundamento, a recorrente intentou igualmente uma acção num tribunal português destinada a obter a declaração de nulidade da extensão a Portugal da marca internacional e da denominação social da interveniente, bem como a proibição da utilização desses sinais. Na audiência, a recorrente apresentou uma decisão do Supremo Tribunal de Justiça, de 10 de Julho de 2008, através da qual este último confirmou as decisões do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa e do Tribunal da Relação de Lisboa que eram a seu favor. Ouvidas as partes sobre esta questão, a decisão do Supremo Tribunal de Justiça foi junta aos autos em 16 de Setembro de 2008, o que ficou registado na acta da audiência.

10      Em 7 de Junho de 2005, a divisão de anulação do IHMI indeferiu os pedidos de declaração de nulidade das quatro marcas figurativas comunitárias GENERAL OPTICA, por ter considerado que a recorrente não tinha demonstrado, relativamente ao sinal invocado, por um lado, uma utilização séria e, por outro, uma utilização que não tivesse apenas um alcance local.

11      Em 1 de Agosto de 2005, a recorrente interpôs recurso de todas as decisões da divisão de anulação, tendo pedido que as referidas decisões fossem anuladas e que os pedidos de declaração de nulidade das marcas comunitárias acima referidas fossem julgados procedentes.

12      Por decisões de 8 de Agosto de 2006 (a seguir «decisões impugnadas»), a primeira Câmara de Recurso do IHMI confirmou as decisões da divisão de anulação e negou provimento aos quatro recursos.

13      A Câmara de Recurso referiu, no essencial, por um lado, que a recorrente não tinha demonstrado ter feito uma utilização séria do sinal em questão e, por outro, que o alcance dessa utilização era local.

 Tramitação processual e pedidos das partes

14      Por despacho do presidente da Segunda Secção do Tribunal de Primeira Instância de 10 de Julho de 2008, os processos T‑318/06 a T‑321/06 foram apensos para efeitos da fase oral e do acórdão, em conformidade com o artigo 50.° do Regulamento de Processo deste Tribunal.

15      A recorrente conclui pedindo, essencialmente, que o Tribunal se digne:

–        suspender a instância até que a decisão dos tribunais portugueses transite em julgado;

–        anular as decisões impugnadas;

–        declarar nulo e sem efeito o registo das marcas figurativas comunitárias GENERAL OPTICA;

–        condenar o IHMI nas despesas.

16      O IHMI e a interveniente concluem pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento aos recursos;

–        condenar a recorrente nas despesas.

17      Na audiência, a recorrente declarou desistir do seu terceiro pedido, o que ficou registado na acta da audiência.

 Questão de direito

 Quanto ao pedido de suspensão da instância

 Argumentos das partes

18      A recorrente alega que uma decisão comunitária contrária à decisão dos tribunais portugueses causaria prejuízo ao princípio da unidade do sistema da marca comunitária, por força do qual esta marca deve produzir os seus efeitos em todos os Estados‑Membros da União, e que este não tem uma autonomia absoluta em relação aos diferentes ordenamentos jurídicos nacionais. Consequentemente, a recorrente invoca a necessidade de suspender a instância até que a decisão dos tribunais portugueses transite em julgado.

19      O IHMI e a interveniente concluem pela rejeição destes argumentos.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

20      Importa observar que, na fase actual do processo no Tribunal de Primeira Instância e na sequência da decisão do Supremo Tribunal de Justiça mencionada no n.° 9, que torna definitiva a decisão dos tribunais portugueses relativa à marca internacional n.° 483246, GENERAL OPTICA, e à denominação social da interveniente, o pedido da recorrente de que a instância seja suspensa até que a decisão dos tribunais portugueses transite em julgado ficou sem objecto.

21      De qualquer forma, há que salientar que a decisão dos tribunais portugueses diz apenas respeito à extensão a Portugal do registo internacional da marca GENERAL OPTICA, bem como à denominação social da interveniente. Tendo em conta que a decisão dos tribunais portugueses não contém uma proibição geral de utilizar em Portugal uma marca que inclua os termos «general optica», as marcas comunitárias GENERAL OPTICA não são afectadas por essa decisão. Assim, e contrariamente aos argumentos invocados pela recorrente na audiência, uma decisão do Tribunal de Primeira Instância que venha a confirmar o registo das marcas comunitárias GENERAL OPTICA não é susceptível de permitir à interveniente eludir a decisão dos tribunais portugueses. Em particular, a confirmação da validade das marcas comunitárias GENERAL OPTICA não tem incidência sobre a obrigação decorrente da decisão do Supremo Tribunal de Justiça de não utilizar em Portugal a marca internacional GENERAL OPTICA e a denominação social da interveniente.

22      Por último, contrariamente ao que afirma a recorrente, uma contradição entre a decisão dos tribunais portugueses e a decisão do Tribunal de Primeira Instância não é susceptível de pôr em causa o carácter unitário do sistema da marca comunitária. O carácter unitário da marca comunitária constitui um princípio que não é absoluto, antes admitindo excepções, como as previstas no artigo 106.°, relativo à proibição da utilização das marcas comunitárias, e no artigo 107.°, relativo aos direitos anteriores de alcance local, do Regulamento n.° 40/94 (acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Junho de 1994, IHT Internationale Heiztechnik e Danzinger, C‑9/93, Colect., p. I‑2789, n.° 55).

23      Por conseguinte, há que indeferir os pedidos de suspensão da instância.

 Quanto aos pedidos de declaração de nulidade

24      A recorrente invoca dois fundamentos de recurso. O primeiro é relativo à violação do artigo 52.°, n.° 1, alínea c), e do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94. O segundo é relativo à violação da regra 22 e da regra 40, n.° 6, do Regulamento (CE) n.° 2868/95 da Comissão, de 13 de Dezembro de 1995, relativo à execução do Regulamento (CE) n.° 40/94 (JO L 303, p. 1).

25      No caso de o pedido de suspensão da instância da recorrente ser de interpretar como um fundamento que põe em causa o facto de o IHMI não ter suspendido o processo enquanto os tribunais portugueses não proferissem uma decisão definitiva, há que referir que esta circunstância não é susceptível de afectar a legalidade das decisões impugnadas. Por conseguinte, não há que acolher este argumento.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 52.°, n.° 1, alínea c), e do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94

 Argumentos das partes

26      Em primeiro lugar, a recorrente alega que o nome de estabelecimento comercial Generalóptica constitui um direito que é anterior ao registo das marcas figurativas comunitárias GENERAL OPTICA. Com efeito, o referido nome de estabelecimento foi registado em 4 de Setembro de 1987, ao passo que o primeiro pedido de registo das marcas figurativas comunitárias GENERAL OPTICA só foi apresentado em 10 de Julho de 1997.

27      Em segundo lugar, a recorrente afirma que o seu direito exclusivo sobre o nome de estabelecimento comercial Generalóptica proíbe o registo posterior de um sinal enquanto marca ou outro sinal utilizado na vida comercial, em conformidade com o artigo 295.°, n.° 2, do Código da Propriedade Industrial.

28      Em terceiro lugar, no que diz respeito à afirmação da Câmara de Recurso segundo a qual a recorrente não fez uma utilização séria do nome de estabelecimento comercial Generalóptica na vida comercial, na acepção do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94, a recorrente sustenta que os nomes de estabelecimento comercial portugueses não se encontram sujeitos a uma disposição comunitária em matéria de utilização, mas apenas ao regime definido no Código da Propriedade Industrial. Em seguida, a recorrente esclarece que, desde 1987 e até hoje, utilizou o sinal Generalóptica enquanto nome de estabelecimento, em conformidade com a legislação portuguesa aplicável na matéria.

29      Em quarto lugar, a recorrente alega que o seu direito exclusivo sobre o nome de estabelecimento comercial Generalóptica tem alcance nacional, uma vez que se estende a todo o território português, em conformidade com o artigo 4.°, n.° 1, do Código da Propriedade Industrial e que, pelo facto de não ter harmonizado o direito relativo aos nomes de estabelecimento, o direito comunitário não é aplicável para determinar qual é a utilização pertinente.

30      Por último, em quinto lugar, a recorrente alega, no âmbito da sua argumentação relativa ao artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94, por um lado, que as suas actividades comerciais e as da interveniente são semelhantes e, por outro, que as marcas figurativas comunitárias GENERAL OPTICA e o nome de estabelecimento comercial Generalóptica contêm exactamente as mesmas palavras e se pronunciam da mesma maneira, de modo que não se conseguem distinguir.

31      O IHMI e a interveniente concluem pela rejeição dos argumentos da recorrente relativos à utilização séria e ao alcance do sinal. O IHMI contesta, além disso, o argumento relativo ao risco de confusão.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

32      Por força do disposto no artigo 52.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, conjugado com o artigo 8.°, n.° 4, do mesmo regulamento, a existência de um sinal que não seja uma marca permite obter a declaração de nulidade de uma marca comunitária se preencher cumulativamente quatro requisitos: esse sinal deve ser utilizado na vida comercial; deve ter um alcance que não seja apenas local; nos termos da legislação do Estado‑Membro no qual esse sinal era utilizado, os direitos dele decorrentes devem ter sido adquiridos antes da data de depósito do pedido de marca comunitária; por último, esse sinal deve conferir ao seu titular o direito de proibir a utilização de uma marca posterior. Estes quatro requisitos limitam o número dos sinais que não sejam marcas que podem ser invocados para contestar a validade de uma marca comunitária em todo o território comunitário, nos termos do artigo 1.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94.

33      Os dois primeiros requisitos, ou seja, os relativos à utilização e ao alcance do sinal invocado, não podendo este último ser apenas local, decorrem da própria redacção do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94 e, por conseguinte, devem ser interpretados à luz do direito comunitário. Assim, o Regulamento n.° 40/94 estabelece padrões uniformes, relativos à utilização dos sinais e ao respectivo alcance, que são coerentes com os princípios que inspiram o sistema instituído por esse regulamento.

34      Em contrapartida, resulta da locução «quando e na medida em que, segundo o direito do Estado‑Membro aplicável a esse sinal», que os dois outros requisitos, enunciados em seguida no artigo 8.°, n.° 4, alíneas a) e b), do Regulamento n.° 40/94, constituem requisitos impostos pelo regulamento que, ao contrário dos precedentes, são apreciados à luz dos critérios fixados pela legislação que regula o sinal invocado. Esta remissão para a legislação que regula o sinal invocado é perfeitamente justificada, dado que o Regulamento n.° 40/94 reconhece a possibilidade de sinais alheios ao sistema da marca comunitária serem invocados contra uma marca comunitária. Consequentemente, só a legislação que regula o sinal invocado permite determinar se este é anterior à marca comunitária e se pode justificar que se proíba a utilização de uma marca mais recente.

35      Por conseguinte, contrariamente aos argumentos invocados pela recorrente, os requisitos relativos à utilização na vida comercial e ao alcance do sinal invocado devem ser interpretados à luz dos padrões uniformes do direito comunitário e não do direito português.

36      No que diz respeito à interpretação do requisito relativo ao alcance do sinal em questão, segundo o qual este não pode ser apenas local, importa salientar antes de mais que a ratio legis desta disposição consiste em limitar os conflitos entre sinais, impedindo que um sinal anterior, que não é suficientemente importante ou significativo, possa permitir que se conteste o registo ou a validade de uma marca comunitária.

37      Por outro lado, há que esclarecer que o alcance de um sinal utilizado para identificar actividades comerciais determinadas deve ser definido em relação à função de identificação desse sinal. Esta consideração exige que seja levada em conta, em primeiro lugar, a dimensão geográfica do alcance do sinal, ou seja, do território em que é utilizado para identificar a actividade económica do respectivo titular, como resulta de uma interpretação literal do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94. Há que levar em conta, em segundo lugar, a dimensão económica do alcance do sinal, que é avaliada em função do período durante o qual preencheu a sua função na vida comercial e da intensidade da respectiva utilização, do círculo de destinatários entre os quais o sinal em causa se tornou conhecido enquanto elemento distintivo, designadamente os consumidores, os concorrentes, ou mesmo os fornecedores, ou ainda da difusão de que o sinal foi objecto, por exemplo, através de publicidade ou na Internet.

38      A pertinência da análise da dimensão económica pode compreender‑se através da interpretação teleológica do requisito relativo ao alcance do sinal invocado. Assim, como já se concluiu no n.° 36, este requisito tem por objectivo limitar as possibilidades de conflito àqueles que podem surgir com sinais que são verdadeiramente importantes. A fim de estabelecer a efectiva e real importância do sinal invocado no território em causa, importa, por conseguinte, não se limitar a apreciações puramente formais, antes examinando o impacto desse sinal no território em causa depois de ter sido utilizado enquanto elemento distintivo.

39      Resulta das considerações precedentes que, contrariamente ao que sustenta a recorrente, o facto de um sinal conferir ao seu titular um direito exclusivo sobre todo o território nacional é insuficiente, em si mesmo, para demonstrar que o seu alcance não é apenas local na acepção do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94.

40      Quanto ao território pertinente, para demonstrar que o alcance do sinal invocado não é apenas local, há que levar em conta o facto de os sinais que podem entrar em conflito com uma marca comunitária constituírem direitos exclusivos que têm origem em normas jurídicas aplicáveis em territórios diferentes. Daqui decorre que o território pertinente para analisar o alcance desses direitos exclusivos é aquele em que cada uma dessas normas jurídicas é aplicável. Com efeito, é nesse território, na sua totalidade ou em parte dele, que uma norma reconhece direitos exclusivos que podem entrar em conflito com uma marca comunitária.

41      Do ponto de vista do direito comunitário, o sinal em questão tem um alcance que não é apenas local no território pertinente quando o seu impacto não se limita a uma parte reduzida do referido território, como acontece geralmente no caso de uma cidade ou de uma província. Não é possível, no entanto, determinar a priori, de modo abstracto, que parte de um território deve ser tomada em consideração para demonstrar que o alcance de um sinal excede uma dimensão local. Assim sendo, a apreciação do alcance do sinal deve ser efectuada in concreto, de acordo com as circunstâncias específicas de cada caso.

42      Em última análise, para poder opor‑se validamente ao registo de uma marca comunitária ou obter a declaração de nulidade dessa marca, é necessário demonstrar que, de acordo com a utilização que dele é feita, o sinal invocado adquiriu uma importância que não é limitada, do ponto de vista dos terceiros interessados, a uma parte reduzida do território pertinente.

43      O Regulamento n.° 40/94 deixa à recorrente a escolha dos meios de prova para demonstrar que o alcance do sinal que invoca não é apenas local. Este alcance pode ser demonstrado pela existência de uma rede de sucursais economicamente activas em todo o território em causa, mas também, de maneira mais simples, por exemplo, apresentando facturas entregues fora da região em que está sedeada, artigos de jornal que realcem o grau de conhecimento pelo público do sinal invocado ou demonstrando que são feitas referências ao estabelecimento em guias de viagens.

44      Ora, não resulta das provas produzidas pela recorrente que o alcance do sinal invocado no caso em apreço não é apenas local na acepção do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94. Como concluiu a Câmara de Recurso no n.° 33 das decisões impugnadas, resulta dos documentos apresentados pela recorrente que, no momento em que foi pedido o registo das duas primeiras marcas comunitárias, o sinal em questão era utilizado havia quase dez anos mas apenas para designar um estabelecimento aberto ao público na localidade portuguesa de Vila Nova de Famalicão, que tem 120 000 habitantes. Não obstante as explicações que deu na audiência, a recorrente não carreou nenhum elemento que permita comprovar o conhecimento desse sinal por parte dos consumidores, nem as suas relações comerciais fora da referida localidade. De igual modo, a recorrente não demonstrou que tivesse desenvolvido uma qualquer actividade publicitária para assegurar a promoção do seu estabelecimento fora da referida cidade. Por conseguinte, há que considerar que o nome de estabelecimento Generalóptica tem um alcance estritamente local na acepção do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94.

45      Esta conclusão não constitui uma violação do princípio da subsidiariedade, contrariamente ao que parece sustentar a recorrente. Nos termos dos segundo e terceiro considerandos do Regulamento n.° 40/94, a existência de um regime comunitário de marcas é uma consequência da atribuição à União Europeia de competências em matéria de mercado interno, o qual se destina a suprimir os obstáculos da territorialidade dos direitos conferidos aos titulares de marcas pelas legislações dos Estados‑Membros. Assim, o princípio da subsidiariedade não é relevante neste contexto. Por outro lado, há que salientar que o regime jurídico da marca comunitária não ignora as legislações nacionais, uma vez que prevê mecanismos que permitem levar em conta a existência dos sinais nacionais anteriores. É o caso, nomeadamente, do artigo 106.° do Regulamento n.° 40/94, para os direitos anteriores, na acepção do artigo 8.°, ou do artigo 52.°, n.° 2, do referido regulamento, e, dentro destes, para os sinais que têm um alcance não apenas local. É igualmente o caso do artigo 107.° do Regulamento n.° 40/94, para os sinais que têm um alcance local. No caso em apreço, a possibilidade de coexistência entre as marcas comunitárias GENERAL OPTICA e o nome de estabelecimento Generalóptica deverá ser examinada no âmbito de outro processo ao abrigo do artigo 107.° do Regulamento n.° 40/94, disposição que permite ao titular de um direito anterior de alcance local opor‑se à utilização de uma marca comunitária no território em que esse direito é protegido.

46      Tendo em conta as considerações precedentes, há que concluir que o nome de estabelecimento Generalóptica não é um sinal que tenha um alcance não apenas local na acepção do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94.

47      Dado que os requisitos impostos pelo artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94 são cumulativos, basta que apenas um deles não se encontre preenchido para que um pedido de declaração de nulidade de marcas comunitárias seja julgado improcedente. Nestas condições, não há que verificar se o sinal invocado foi utilizado na vida comercial.

48      No que diz respeito à existência de um risco de confusão entre o nome de estabelecimento Generalóptica e as marcas comunitárias GENERAL OPTICA, há que observar que esta circunstância só pode ser levada em conta, no âmbito da apreciação a levar a cabo nos termos do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94, no momento da análise da faculdade reconhecida ao titular de um nome de estabelecimento, pelo artigo 239.°, alínea f), do Código da Propriedade Industrial, de se opor à utilização de uma marca posterior semelhante ou idêntica. Esta análise só poderia ser efectuada, porém, se o nome de estabelecimento preenchesse os outros requisitos previstos no artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94, o que não acontece no caso em apreço.

49      Face ao exposto, a Câmara de Recurso não cometeu um erro ao rejeitar os pedidos de declaração de nulidade baseados num direito anterior na acepção do artigo 52.°, n.° 1, alínea c), e do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94. Consequentemente, o primeiro fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação da regra 22 e da regra 40, n.° 6, do Regulamento n.° 2868/95

 Argumentos das partes

50      A recorrente alega que a Câmara de Recurso não respeitou a sua obrigação de a convidar a apresentar provas da utilização anterior do sinal invocado e que as provas suplementares que apresentou ao longo do processo foram ignoradas. Essas provas consistem, nomeadamente, numa nova certidão emitida pela Junta de Freguesia de Vila Nova de Famalicão que atestava que o estabelecimento está aberto de modo contínuo desde 1988, uma cópia da declaração dirigida às autoridades fiscais no momento em que iniciou as suas actividades comerciais e uma declaração do revisor de contas da sociedade que confirmava a data em que o estabelecimento tinha iniciado as suas actividades comerciais, o facto de continuar aberto, bem como o seu volume de negócios anual médio.

51      O IHMI e a interveniente concluem pela rejeição destes argumentos.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

52      Antes de mais, há que referir que, no caso vertente, a Câmara de Recurso não estava obrigada a convidar a recorrente a fazer prova da utilização do nome de estabelecimento Generalóptica. Como já foi salientado no n.° 32, a prova da utilização do sinal invocado é um dos requisitos exigidos para beneficiar da protecção conferida pelo artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 40/94 e só os titulares dos sinais utilizados na vida comercial podem, portanto, aspirar a essa protecção. Isto constitui uma diferença importante em relação às marcas comunitárias e às marcas nacionais referidas no artigo 8.°, n.° 2, alínea a), do Regulamento n.° 40/94, que são invocadas no âmbito de um processo de oposição ou de um processo de declaração de nulidade. Em conformidade com o artigo 43.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 40/94, a regra 22 e a regra 40, n.° 6, do Regulamento n.° 2868/95, a utilização destas marcas só tem de ser demonstrada no caso de o requerente ou o titular da marca comunitária o exigirem. Segundo a regra 22, n.° 1, e a regra 40, n.° 6, do Regulamento n.° 2868/95, nesse caso, o IHMI deve convidar o oponente ou o requerente da declaração de nulidade a fazer prova da utilização num prazo por ele fixado.

53      Por outro lado, há que observar que o fundamento relativo ao erro cometido pela Câmara de Recurso por ter recusado levar em conta documentos apresentados pela primeira vez na fase de recurso deve improceder. Com efeito, resulta do n.° 33 das decisões impugnadas que a Câmara de Recurso examinou os referidos documentos antes de concluir que não eram suficientes para fazer prova de que o nome de estabelecimento Generalóptica tinha um alcance que não era apenas local. Assim, o segundo fundamento deve ser julgado improcedente, devendo, em consequência, ser negado provimento aos recursos na totalidade.

 Quanto às despesas

54      Por força do disposto no artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com o pedido do IHMI e da interveniente.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

decide:

1)      É negado provimento aos recursos.

2)      Alberto Jorge Moreira da Fonseca, Lda é condenada nas despesas.

Pelikánová

Jürimäe

Soldevila Fragoso

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 24 de Março de 2009.

Assinaturas


* Língua do processo: inglês.