Language of document : ECLI:EU:C:2024:469

Edição provisória

CONCLUSÕES DA ADVOGADA‑GERAL

TAMARA ĆAPETA

apresentadas em 6 de junho de 2024(1)

Processos apensos C256/23 e C290/23

Agência Europeia dos Produtos Químicos (ECHA)

contra

Hallertauer Hopfenveredelungsges. m.b.H.,

sendo intervenientes:

Regierung von Niederbayern

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bayerisches Verwaltungsgericht Regensburg (Tribunal Administrativo da Baviera, Regensburgo, Alemanha)]

e

Agência Europeia dos Produtos Químicos (ECHA)

contra

B. GmbH

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Oberverwaltungsgericht des Landes Sachsen‑Anhalt (Tribunal Administrativo Regional Superior do Land Saxónia‑Anhalt, Alemanha)]

«Reenvio prejudicial — Regulamento (CE) n.° 1907/2006 (REACH) — Regulamento (CE) n.° 340/2008 da Comissão — Taxas e emolumentos a pagar à Agência Europeia dos Produtos Químicos (ECHA) — Decisão da ECHA que impõe um emolumento administrativo — Execução — Artigo 299.° TFUE»






I.      Introdução

1.        O que acontece quando uma agência da União toma uma decisão que impõe emolumentos a um particular e este particular se recusa a pagar? Pode a agência da União executar judicialmente o seu crédito pecuniário com base nesta decisão e, em caso afirmativo, de que forma?

2.        Estes são, em substância, os aspetos que estão em causa nas questões prejudiciais submetidas por dois órgãos jurisdicionais alemães nos presentes processos.

II.    Antecedentes dos presentes processos e questões prejudiciais

A.      A ECHA e o quadro REACH relativo às taxas e aos emolumentos

3.        Os presentes processos têm origem em litígios submetidos a dois órgãos jurisdicionais administrativos alemães diferentes, nos quais a Agência Europeia dos Produtos Químicos (a seguir «ECHA») pretende executar os seus créditos pecuniários contra duas empresas diferentes.

4.        A ECHA é uma das mais de trinta agências descentralizadas da União Europeia que participam na execução das políticas da União. Foi criada pelo Regulamento REACH (2), que constitui a legislação geral relativa à regulamentação dos produtos químicos na União. Trata‑se de uma entidade independente encarregada de assegurar a gestão eficaz de certos aspetos administrativos, técnicos e científicos deste regulamento (3).

5.        Nos termos do disposto no Regulamento REACH, os fabricantes e os importadores são obrigados a apresentar à ECHA registos de substâncias químicas. Ao fazê‑lo, devem pagar as taxas exigidas, conforme especificadas no Regulamento n.° 340/2008 da Comissão, que executa o Regulamento REACH (4).

6.        Em conformidade com este quadro, existem taxas reduzidas para as micro, pequenas ou médias empresas (a seguir «PME»), e a ECHA procede a verificações do estatuto de PME para determinar se estão preenchidas as condições para se ter direito a beneficiar de uma redução da taxa com base nesse estatuto.

7.        Se uma pessoa tiver invocado erradamente o direito a uma redução da taxa para as PME, a ECHA decide que essa pessoa não pode beneficiar dessa redução e cobra‑lhe a taxa completa, juntamente com um emolumento administrativo.

8.        A disposição relevante que habilita a ECHA a cobrar as restantes taxas e os emolumentos administrativos é o artigo 13.°, n.° 4, do Regulamento 340/2008 (5), que dispõe, na parte pertinente:

«Se uma pessoa singular ou coletiva invocar o direito a beneficiar de redução ou dispensa de taxa sem o poder comprovar, a Agência cobrará não só a taxa ou o emolumento completos mas também um emolumento administrativo.

Se uma pessoa singular ou coletiva tiver pago taxas ou emolumentos reduzidos por ter invocado o direito a beneficiar dessa redução sem o poder comprovar, a Agência cobrará a diferença em relação à taxa ou ao emolumento completos, bem como um emolumento administrativo.»

9.        A decisão da ECHA que pede o pagamento desse emolumento administrativo é vinculativa para o destinatário, que pode impugná‑la através de um recurso de anulação nos órgãos jurisdicionais da União (6). Se o recurso não for interposto dentro do prazo, a decisão torna‑se definitiva e a validade da obrigação de pagamento deixa de poder ser impugnada.

10.      Se as taxas relacionadas com o registo não forem pagas, a ECHA rejeitará o registo (7).

11.      No entanto, o quadro jurídico da União é omisso quanto às consequências do não pagamento do emolumento administrativo.

12.      Além de ser financiada pelo orçamento geral da União, a ECHA é financiada, em parte, por essas taxas e emolumentos (8).

13.      Nem o Regulamento REACH nem o Regulamento 340/2008 contêm disposições relativas à execução da decisão da ECHA em circunstâncias em que o particular não impugna a decisão perante os órgãos jurisdicionais da União nem paga o emolumento administrativo. Assim, nestas situações, a ECHA procurou executar nos órgãos jurisdicionais nacionais o seu crédito pecuniário com base numa decisão definitiva que impõe um emolumento administrativo.

14.      Foi precisamente o que aconteceu nos presentes processos. Nos pontos seguintes, irei expor sucintamente os factos subjacentes aos dois processos.

B.      Processo C256/23

15.      A Hallertauer Hopfenveredelungsges. m.b.H. (a seguir «Hallertauer») é uma sociedade alemã. Em 2010, apresentou à ECHA um pedido de registo de uma substância química e invocou um direito a beneficiar de uma redução da taxa na qualidade de microempresa.

16.      Em 2013, a ECHA procedeu a uma verificação do estatuto de PME da Hallertauer e pediu a esta sociedade que lhe apresentasse provas documentais (9). A Hallertauer não o fez. No entanto, posteriormente, a Hallertauer enviou à ECHA uma declaração segundo a qual tinha declarado erradamente a sua dimensão como microempresa e que a categoria correta da sua dimensão era a de grande empresa.

17.      Mais tarde, em 2013, a ECHA tomou uma decisão sobre a verificação de PME relativamente à Hallertauer (10). Nesta decisão, a ECHA concluiu que esta sociedade não era elegível para beneficiar da redução da taxa para as PME e que era devedora do saldo da taxa normal de registo, bem como de um emolumento administrativo no montante de 9 950 EUR. Esta decisão fornecia igualmente informações sobre o direito de a impugnar através de um recurso de anulação nos órgãos jurisdicionais da União.

18.      A Hallertauer não pagou o emolumento administrativo nem interpôs recurso desta decisão para os órgãos jurisdicionais da União. Assim, a decisão da ECHA tornou‑se definitiva quanto à obrigação de pagamento.

19.      Em 2019, a ECHA intentou no Bayerisches Verwaltungsgericht Regensburg (Tribunal Administrativo da Baviera, Regensburgo, Alemanha), o órgão jurisdicional de reenvio, uma ação em que pede a condenação da Hallertauer no pagamento do montante do emolumento administrativo.

20.      O órgão jurisdicional de reenvio pergunta se esta ação é da competência dos órgãos jurisdicionais da União, ao abrigo do artigo 94.°, n.° 1, do Regulamento REACH. O mesmo órgão jurisdicional questiona‑se igualmente, a título subsidiário, se a decisão da ECHA está abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 299.° TFUE. Em caso afirmativo, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se a remissão para as normas de processo civil que figura nesta disposição deve ser interpretada de forma lata, abrangendo assim não só o processo de execução, mas também as regras que regulam o órgão de execução competente.

21.      Nestas circunstâncias, o Bayerisches Verwaltungsgericht Regensburg (Tribunal Administrativo da Baviera de Regensburg) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1.      Deve o artigo 94.°, n.° 1, do [Regulamento REACH], nos termos do qual uma decisão da Agência é passível de recurso para o Tribunal Geral da União Europeia, ser interpretado no sentido de que a executoriedade das decisões da Agência também pode ser objeto de recurso?

2.      Em caso de resposta negativa à primeira questão, deve o artigo 299.°, primeiro parágrafo, TFUE, ser interpretado no sentido de que é aplicável não só aos atos adotados pelo Conselho, pela Comissão ou pelo Banco Central Europeu, mas também às decisões da [ECHA] que imponham um emolumento administrativo?

3.      Em caso de resposta afirmativa à segunda questão, deve o artigo 299.°, segundo parágrafo, TFUE, ser interpretado no sentido de que a remissão para as normas de processo civil do Estado‑Membro diz respeito não só às normas processuais mas também às regras que regulam a competência?»

C.      Processo C290/23

22.      A B. GmbH (a seguir «B») é uma sociedade alemã. Em 2010, apresentou à ECHA um pedido de registo de uma substância química e invocou um direito a beneficiar de uma redução da taxa na qualidade de média empresa.

23.      Em 2013, a ECHA procedeu a uma verificação do estatuto de PME da B e pediu a esta sociedade que lhe apresentasse provas documentais (11). A B apresentou documentos em resposta a este pedido.

24.      Em 2014, a ECHA enviou à B um pedido de documentos suplementares. No entanto, a ECHA não recebeu nenhuma resposta a este pedido.

25.      Em 2016, a ECHA tomou uma decisão sobre a verificação de PME relativamente à B (12). Nesta decisão, a ECHA concluiu que esta sociedade não era elegível para beneficiar da redução da taxa para as PME e que era devedora do saldo da taxa normal de registo, bem como de um emolumento administrativo no montante de 17 437 EUR. Esta decisão continha também informações sobre as vias de recurso para os órgãos jurisdicionais da União.

26.      A B não pagou o emolumento administrativo nem interpôs recurso desta decisão para os órgãos jurisdicionais da União. Assim, a decisão da ECHA tornou‑se definitiva quanto à obrigação de pagamento.

27.      Em 2019, a ECHA interpôs recurso no Verwaltungsgericht Halle (Tribunal Administrativo de Halle, Alemanha), pedindo que a B fosse condenada no pagamento do montante do emolumento administrativo. Este órgão jurisdicional julgou o recurso inadmissível, considerando que não é admissível recurso administrativo.

28.      A ECHA interpôs recurso desta decisão para o Oberverwaltungsgericht des Landes Sachsen‑Anhalt (Tribunal Administrativo Regional Superior do Land Saxónia‑Anhalt, Alemanha), o órgão jurisdicional de reenvio.

29.      O órgão jurisdicional de reenvio considera, contrariamente ao órgão jurisdicional de primeira instância, que a ECHA pode reclamar o seu crédito nos órgãos jurisdicionais administrativos porque se trata de um litígio de direito público. Todavia, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se a decisão da ECHA está abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 299.° TFUE. O órgão jurisdicional de reenvio pergunta igualmente se o artigo 13.°, n.° 4, terceiro parágrafo, do Regulamento (CE) n.° 340/2008, em conjugação com o artigo 11.°, n.° 3, segundo parágrafo, do mesmo regulamento, regula de forma definitiva a falta de pagamento das taxas e emolumentos e pode, portanto, considerar‑se que obsta a que a ECHA proponha num órgão jurisdicional uma ação de condenação que visa o pagamento do emolumento administrativo.

30.      Nessas circunstâncias, o Oberverwaltungsgericht des Landes Sachsen‑Anhalt (Tribunal Administrativo Regional Superior do Land Saxónia‑Anhalt) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1.      Deve o artigo 299.°, primeiro parágrafo, in initio, do [TFUE] ser interpretado no sentido de que é exclusivamente aplicável a decisões adotadas pelo Conselho, pela Comissão ou pelo Banco Central Europeu, ou é o mesmo igualmente aplicável a decisões da [ECHA], de cobrança do emolumento administrativo nos termos do artigo 13.°, n.° 4, do [Regulamento n.º 340/2008]?

2.      Caso a decisão da [ECHA] relativa à cobrança do referido emolumento administrativo não constitua um título executivo:

Deve o artigo 13.°, n.° 4, terceiro parágrafo, em conjugação com o artigo 11.°, n.° 3, segundo parágrafo, do [Regulamento n.º 340/2008] ser interpretado no sentido de que não é permitida uma ação de condenação no pagamento do emolumento administrativo?»

III. Tramitação processual no Tribunal de Justiça

31.      Por Decisão do presidente do Tribunal de Justiça de 28 de junho de 2023, os processos C‑256/23 e C‑290/23 foram apensados para efeitos das fases escrita e oral do processo, bem como do acórdão que ponha termo à instância.

32.      Foram apresentadas observações escritas ao Tribunal de Justiça pela ECHA, pela Hallertauer, pelos Governos Grego e Polaco, bem como pela Comissão.

33.      Foi realizada uma audiência em 20 de março de 2024, na qual a ECHA, o Governo Grego e a Comissão Europeia apresentaram alegações orais.

IV.    Análise

34.      Os dois órgãos jurisdicionais de reenvio nos presentes processos têm dúvidas quanto à questão de saber se a execução dos créditos pecuniários da ECHA é da sua competência. Por esta razão, submeteram várias questões prejudiciais ao Tribunal de Justiça.

35.      Como solicitado pelo Tribunal de Justiça, as minhas conclusões abordarão apenas as questões relativas à interpretação do artigo 299.° TFUE (segunda questão no processo C‑256/23 e primeira questão no processo C‑290/23).

36.      Com essas questões pergunta‑se, em substância, se o artigo 299.° TFUE é aplicável à ECHA (13).

37.      A minha análise está estruturada da forma que passo a expor. Em primeiro lugar, apresentarei algumas observações preliminares sobre o artigo 299.° TFUE (A). Em segundo lugar, exporei as razões pelas quais o artigo 299.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que diz respeito apenas às três instituições da União aí expressamente mencionadas (B). Em terceiro lugar, debruçar‑me‑ei sobre o contexto mais amplo do direito derivado da União para efeitos da interpretação do artigo 299.° TFUE (C). Por último, direi algumas palavras sobre as razões pelas quais a interpretação do artigo 299.° TFUE que proponho não obsta à execução dos créditos pecuniários da ECHA (D).

A.      Enquadramento do artigo 299.° TFUE na sistemática dos Tratados

38.      O artigo 299.° TFUE faz parte da sistemática dos Tratados desde a instituição da União Europeia há mais de 70 anos (14). Apesar da sua longevidade, parece experimentar uma «existência fictícia», como indica um comentador (15). Praticamente não consta da jurisprudência do Tribunal de Justiça e mereceu, até agora, pouca atenção por parte da doutrina.

39.      O artigo 299.° TFUE dispõe na íntegra:

«Os atos do Conselho, da Comissão ou do Banco Central Europeu que imponham uma obrigação pecuniária a pessoas que não sejam Estados constituem título executivo.

A execução é regulada pelas normas de processo civil em vigor no Estado em cujo território se efetuar. A ordem de execução é aposta, sem outro controlo além da verificação da autenticidade do título, pela autoridade nacional que o Governo de cada um dos Estados‑Membros designará para o efeito e de que dará conhecimento à Comissão e ao Tribunal de Justiça da União Europeia.

Após o cumprimento destas formalidades a pedido do interessado, este pode promover a execução, recorrendo diretamente ao órgão competente, em conformidade com a legislação nacional.

A execução só pode ser suspensa por força de uma decisão do Tribunal. No entanto, a fiscalização da regularidade das medidas de execução é da competência dos órgãos jurisdicionais nacionais.»

40.      Embora possam surgir algumas dúvidas quando se lê a versão inglesa (16), na minha opinião, o artigo 299.° TFUE não torna executórios os créditos pecuniários abrangidos pelo seu âmbito de aplicação, dizendo antes respeito à forma como esses créditos devem ser executados (17).

41.      Este entendimento é muito mais claro se se consultarem outras versões linguísticas do artigo 299.° TFUE. Assim, por exemplo, a versão francesa utiliza o termo «titre exécutoire», enquanto a versão neerlandesa utiliza o termo «executoriale titel» (18). Estas versões linguísticas implicam a natureza executória direta no sentido de que atribuem força executiva a esses créditos sem nenhuma exigência suplementar.

42.      A este respeito, o artigo 299.° TFUE limita‑se a facilitar e a tornar mais rápida a natureza executória dos atos abrangidos pelo seu âmbito de aplicação, tornando‑os imediatamente executórios, sem que seja necessário reconhecimento suplementar nos Estados‑Membros (19).

43.      Do mesmo modo, nas suas Conclusões no processo ADR Center/Comissão (20), a advogada‑geral J. Kokott considerou que «o objetivo desta disposição consiste, única e exclusivamente, em assegurar que os atos jurídicos adotados pelas instituições da União nos termos do artigo 288.° TFUE e que imponham uma obrigação pecuniária adquiram força executiva imediata. Por conseguinte, o artigo 299.° TFUE limita‑se a facilitar a execução, o que, tendo em vista as exigências do exercício efetivo das funções das instituições da União e da proteção dos interesses financeiros da União, se justifica plenamente.»

44.      Daqui resulta que o artigo 299.° TFUE deve ser entendido no sentido de que estabelece um processo especial cujo objetivo é permitir uma execução mais rápida e mais eficaz dos atos da União que impõem obrigações financeiras aos particulares (21).

45.      No entanto, tal não explica por que razão apenas três instituições da União (o Conselho da União Europeia, a Comissão e o BCE) são mencionadas no artigo 299.° TFUE. Todavia, considero que existem várias razões que militam a favor de uma interpretação desta disposição no sentido de que está limitada aos créditos pecuniários destas três instituições.

B.      O artigo 299.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que diz respeito apenas às três instituições aí expressamente mencionadas

46.      Antes de Lisboa, o atual artigo 299.° TFUE referia‑se às decisões do Conselho e da Comissão (22).

47.      Após Lisboa, o artigo 299.° TFUE menciona os atos do Conselho, da Comissão e do BCE (23), mas o resto desta disposição permaneceu inalterado.

48.      A redação do artigo 299.° TFUE é muito simples e o histórico de alterações do Tratado FUE não sugere que esta disposição deva ser objeto de uma leitura mais ampla.

49.       Como a Comissão indicou, os autores dos Tratados poderiam ter alterado o artigo 299.° TFUE para ser aplicável às outras instituições, órgãos e organismos da União no âmbito do Tratado de Lisboa. Ao invés, esta disposição só foi alterada por este Tratado para lhe aditar uma referência ao BCE.

50.      Nenhuma das outras instituições da União, incluindo o Parlamento Europeu, foi aditada e não foi incluída nenhuma referência aos órgãos e organismos da União. Simultaneamente, outras disposições do Tratado foram alteradas pelo Tratado de Lisboa, a fim de incluir essa referência aos órgãos e organismos da União (24).

51.      Tal não se pode dever ao facto de os autores dos Tratados terem considerado que as outras instituições, órgãos e organismos da União não podem ter créditos pecuniários contra particulares. É evidente, por exemplo, que o Parlamento pode ter créditos pecuniários contra os seus (antigos) membros ou trabalhadores. Todavia, o Parlamento não é mencionado no artigo 299.° TFUE. Com efeito, em alguns processos, o Tribunal Geral considerou que o Parlamento não está abrangido pelo âmbito de aplicação desta disposição (25).

52.      A Comissão alegou que, através do artigo 299.° TFUE, os autores dos Tratados procuraram limitar a força executiva imediata aos atos das instituições da União que detenham competências executivas ou competências normalmente associadas à imposição de obrigações financeiras aos particulares, bem como aos acórdãos dos órgãos jurisdicionais da União nos termos do artigo 280.° TFUE.

53.      No entanto, atualmente, muitos órgãos e organismos da União dispõem de competências executivas e podem impor obrigações financeiras aos particulares, como demonstram os presentes processos. Por conseguinte, a explicação da Comissão baseada em competências de execução não parece ser muito útil.

54.      A Comissão indicou ainda que a natureza imediatamente executória dos atos das instituições da União no território de um Estado‑Membro constitui uma ingerência no exercício do poder público. Esta argumentação pode, com efeito, explicar a intenção de limitar o número de entidades que podem invocar essas competências. Porém, tal continua a não explicar a escolha das três instituições expressamente mencionadas no artigo 299.° TFUE, em especial o Conselho, que raramente exerce competências executivas ou impõe obrigações pecuniárias aos particulares (26).

55.      A ECHA, a Hallertauer, o Governo Polaco e a Comissão defenderam uma posição segundo a qual o artigo 299.° TFUE está limitado às três instituições aí expressamente mencionadas. Apenas o Governo Grego sustentou que o artigo 299.° TFUE poderia ser interpretado no sentido de que se aplica à ECHA.

56.      A este propósito, o Governo Grego alegou que o artigo 299.° TFUE pode ser alargado aos atos de outras instituições, órgãos e organismos da União caso se verifiquem três condições: primeiro, a entidade exerce funções executivas e adota atos administrativos que prosseguem objetivos de interesse público; segundo, os créditos pecuniários devem contribuir para essas funções executivas; e, terceiro, está prevista proteção jurídica para as pessoas singulares e coletivas em causa. Na opinião deste Estado‑Membro, esta posição está em conformidade com o Acórdão «Vendas a descoberto» do Tribunal de Justiça (27) que interpreta a jurisprudência Meroni (28) e é ainda corroborada pelo aumento dos órgãos e organismos da União após Lisboa, pelos objetivos de interesse público por eles prosseguidos e pelo surgimento de disposições análogas ao artigo 299.° TFUE no direito derivado da União, como ilustram as relativas ao Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (a seguir «EUIPO») e ao Conselho Único de Resolução (a seguir «CUR»).

57.      A meu ver, a doutrina Meroni não pode ser invocada para ampliar a redação do artigo 299.° TFUE. Esta doutrina foi elaborada para abordar os limites da delegação de poderes discricionários na União Europeia (29). Contudo, nos presentes processos, não existe nenhum litígio relativo às competências da ECHA para impor obrigações pecuniárias aos particulares. Pelo contrário, a questão é a de saber se esse crédito pecuniário, uma vez que já não pode ser impugnado quanto ao mérito, pode ter força executiva direta num Estado‑Membro sem ter de se instaurar um processo que vise o reconhecimento por um órgão jurisdicional ou outra autoridade competente.

58.      Em resumo, a redação clara e o histórico do artigo 299.° TFUE sugerem que a referência às três instituições que figura nesta disposição é taxativa (30). Assim, a ECHA não pode invocar esta disposição para executar os seus créditos pecuniários.

C.      Contexto jurídico mais amplo

59.      A interpretação que proponho, que limita o artigo 299.° TFUE às três instituições aí expressamente mencionadas, é corroborada pelo contexto jurídico mais amplo, sobre o qual vou agora debruçar‑me.

60.      A Comissão considera que o âmbito de aplicação limitado do artigo 299.° TFUE é demonstrado pelo facto de o artigo 100.°, n.° 2, do Regulamento Financeiro 2018/1046 (31) autorizar excecionalmente as outras instituições da União que não possam adotar elas próprias uma decisão executória por força do artigo 299.° TFUE a solicitar à Comissão que o faça em seu nome relativamente a determinados créditos. Na sua opinião, esta disposição seria inútil se essas outras instituições estivessem abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 299.° TFUE.

61.      A este respeito, tendo a concordar com a advogada‑geral J. Kokott que, nas suas Conclusões no processo ADR Center/Comissão (32), entendeu que o artigo 100.°, n.° 2, do Regulamento Financeiro 2018/1046 não é claro (33). O seu primeiro parágrafo indica que uma «instituição da União» pode cobrar um montante junto de particulares através de uma decisão que constitua título executivo na aceção do artigo 299.° TFUE, ao passo que o seu segundo parágrafo prevê que a Comissão pode, em circunstâncias excecionais, adotar uma decisão executória em benefício de «outras instituições da União», a pedido destas, no que se refere aos créditos apresentados em relação ao pessoal ou em relação aos membros ou antigos membros. A ampla definição de «instituição» que figura neste regulamento (34), parece suscitar a questão de saber por que razão é necessário o segundo parágrafo se o primeiro parágrafo abrange, em todo o caso, essas «outras instituições».

62.      Em meu entender, afigura‑se razoável ler o artigo 100.°, n.° 2, do Regulamento Financeiro 2018/1046 no sentido de que essas «outras instituições da União» são as que não são mencionadas no artigo 299.° TFUE, uma vez que as disposições do direito derivado da União devem ser lidas à luz do direito primário da União, e não o inverso. Este entendimento parece também ser sugerido por documentos institucionais (35).

63.      Por conseguinte, estou de acordo com a Comissão quanto ao facto de que uma interpretação do artigo 299.° TFUE no sentido de que abrange todas as instituições, órgãos e organismos da União teria como consequência que a possibilidade de as «outras instituições da União» referidas no artigo 100.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento Financeiro 2018/1046 recorrerem à Comissão para adotar uma decisão executória ao abrigo do artigo 299.° TFUE não faria sentido.

64.      Consequentemente, o artigo 100.°, n.° 2, do Regulamento Financeiro 2018/1046 milita a favor de uma interpretação do artigo 299.° TFUE limitada às três instituições aí expressamente mencionadas.

65.      O mesmo se aplica ao direito derivado da União relativo a outros órgãos e organismos da União diferentes da ECHA.

66.      Em especial, verifica‑se que, quando se trata da execução das coimas e das sanções pecuniárias aplicadas por certos órgãos e organismos da União (36), existem por vezes disposições na legislação pertinente da União que são análogas ao artigo 299.° TFUE.

67.      Por exemplo, no que diz respeito ao CUR, o artigo 41.°, n.° 3, do Regulamento 806/2014 (37) dispõe:

«As decisões de aplicar coimas e sanções pecuniárias compulsórias ao abrigo dos artigos 38.° e 39.° têm força executiva.

A execução é regulada pelas regras processuais aplicáveis em vigor no Estado‑Membro participante em cujo território é efetuada. A ordem de execução é apensa à decisão, sem qualquer outra formalidade para lá da verificação da autenticidade da decisão pela autoridade que o Governo de cada Estado‑Membro participante designar para esse efeito e da qual deve dar conhecimento ao CUR e ao Tribunal de Justiça.

Após o cumprimento destas formalidades a pedido da parte interessada, esta pode proceder à execução nos termos da lei nacional, mediante apresentação direta do assunto à autoridade competente.

A execução só pode ser suspensa por decisão do Tribunal de Justiça. No entanto, a fiscalização da regularidade das medidas de execução é da competência dos órgãos judiciais do Estado‑Membro participante em causa» (38).

68.      O facto de o legislador da União incluir tais disposições que seguem o modelo do artigo 299.° TFUE relativamente a certos órgãos e organismos da União sugere que os seus atos que impõem obrigações pecuniárias a particulares não estão abrangidos pelo âmbito de aplicação do artigo 299.° TFUE, uma vez que, se estivessem, não haveria necessidade de reproduzir essas disposições no direito da União.

69.      Em contrapartida, afigura‑se que, quando se trata da execução de taxas e emolumentos devidos a certos órgãos e organismos da União, o direito da União não contém, em geral, disposições que sigam o modelo do artigo 299.° TFUE. Em vez disso, as disposições pertinentes parecem estar orientadas no sentido da realização das diligências jurídicas necessárias para obter o pagamento e permitir que o órgão ou organismo da União cesse certas atividades para facilitar esse pagamento.

70.      Por exemplo, no que diz respeito à Agência Europeia de Medicamentos, o artigo 10.°, n.° 3, do Regulamento 297/95 (39) prevê: «Em caso de não pagamento à data de vencimento de uma taxa devida nos termos do presente regulamento, e sem prejuízo da personalidade judiciária reconhecida à Agência ao abrigo do artigo 71.° do Regulamento (CE) n.° 726/2004, o diretor executivo da Agência pode decidir não prestar os serviços solicitados ou suspender o conjunto dos serviços ou procedimentos em curso até ao pagamento da taxa devida» (40).

71.      Qual é a explicação para esta diferença de tratamento entre a execução das coimas e das sanções pecuniárias, por um lado, e a execução das taxas e dos emolumentos, por outro? É possível que as coimas e as sanções pecuniárias sejam normalmente afetadas ao orçamento geral da União (41), pelo que as disposições que reproduzem o artigo 299.° TFUE podem ser consideradas um meio de proteger os interesses financeiros da União, ao passo que as taxas e os emolumentos revertem diretamente para os órgãos e organismos da União em causa.

72.       Em todo o caso, esta abordagem adotada no direito da União parece sustentar ainda mais uma interpretação do artigo 299.° TFUE limitada às três instituições aí expressamente mencionadas.

D.      A ECHA pode executar os seus créditos pecuniários

73.      O facto de os créditos pecuniários da ECHA não estarem abrangidos pelo artigo 299.° TFUE não significa que não sejam executórios. A sua execução deve seguir os procedimentos habituais previstos nos sistemas jurídicos dos Estados‑Membros.

74.      Por força do Regulamento REACH, a ECHA tem personalidade jurídica e goza da mais ampla capacidade jurídica nos Estados‑Membros (42).

75.      Quando o direito da União não prevê os processos adequados, como é o caso quanto à execução dos créditos pecuniários da ECHA, cabe aos Estados‑Membros fazê‑lo.

76.      Ao prever processos de execução adequados, os Estados‑Membros gozam de autonomia processual, sob reserva do cumprimento dos princípios da equivalência e da efetividade (43). Em princípio, por força do princípio da equivalência, devem permitir à ECHA executar os seus créditos pecuniários da mesma forma que créditos semelhantes seriam executados ao abrigo do direito nacional e não podem submeter esses créditos a um tratamento menos favorável do que os créditos semelhantes de direito interno. Além disso, em conformidade com o princípio da efetividade, não podem tornar impossível ou excessivamente difícil a execução pela ECHA dos seus créditos pecuniários.

77.      Por conseguinte, cabe aos órgãos jurisdicionais de reenvio determinar qual seria a situação equivalente ao abrigo do direito nacional e, com base nessa determinação, decidir se estes órgãos jurisdicionais ou outro tipo de órgãos jurisdicionais têm competência relativamente aos créditos pecuniários da ECHA.

78.      O facto de, à luz do direito da União, a ECHA não poder ficar sem possibilidades de execução nos Estados‑Membros constitui uma razão suplementar pela qual a redação do artigo 299.° TFUE não precisa de ser alargada de modo a incluir a ECHA. Tal interpretação criativa simplesmente não se justifica, porque a proteção efetiva dos direitos da ECHA já está garantida pela ordem jurídica da União.

V.      Conclusão

79.       Tendo em conta todas as considerações supra expostas, proponho que o Tribunal de Justiça responda à segunda questão prejudicial submetida pelo Bayerisches Verwaltungsgericht Regensburg (Tribunal Administrativo da Baviera, Regensburgo, Alemanha) e à primeira questão prejudicial submetida pelo Oberverwaltungsgericht des Landes Sachsen‑Anhalt (Tribunal Administrativo Regional Superior do Land Saxónia‑Anhalt, Alemanha) do seguinte modo:

O artigo 299.° TFUE deve ser interpretado no sentido de que é aplicável apenas aos atos do Conselho da União Europeia, da Comissão Europeia e do Banco Central Europeu, e não aos atos da Agência Europeia dos Produtos Químicos que imponham um emolumento administrativo ao abrigo do artigo 13.°, n.° 4, do Regulamento (CE) n.° 340/2008, de 16 de abril de 2008, da Comissão, relativo a taxas e emolumentos a pagar à Agência Europeia dos Produtos Químicos nos termos do Regulamento (CE) n.° 1907/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao registo, avaliação, autorização e restrição dos produtos químicos (REACH).


1      Língua original: inglês.


2      Regulamento (CE) n.º 1907/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro de 2006, relativo ao registo, avaliação, autorização e restrição dos produtos químicos (REACH), que cria a Agência Europeia dos Produtos Químicos, que altera a Diretiva 1999/45/CE e revoga o Regulamento (CEE) n.º 793/93 do Conselho e o Regulamento (CE) n.º 1488/94 da Comissão, bem como a Diretiva 76/769/CEE do Conselho e as Diretivas 91/155/CEE, 93/67/CEE, 93/105/CE e 2000/21/CE da Comissão (JO 2006, L 396, p. 1, e retificação JO 2007, L 136, p. 3; a seguir «Regulamento REACH»).


3      V. Acórdão de 21 de janeiro de 2021, Alemanha/Esso Raffinage (C‑471/18 P, EU:C:2021:48, n.º 89). Para uma descrição detalhada das origens e funções da ECHA, v., por exemplo, Martens, M., «Executive power in the making: The establishment of the European Chemicals Agency», in Busuioc, M., Groenleer, M. e Trondal, J. (eds), The Agency Phenomenon in the European Union — Emergence, institutionalisation and everyday decisionmaking, Manchester University Press, Manchester and New York, 2012, p. 42; Bergkamp, L. (ed.), The European Union REACH Regulation for Chemicals — Law and practice, Oxford University Press, Oxford, 2013, nomeadamente Cap. 2.


4      Regulamento (CE) n.º 340/2008 da Comissão, de 16 de abril de 2008, relativo a taxas e emolumentos a pagar à Agência Europeia dos Produtos Químicos nos termos do [Regulamento REACH] (JO 2008, L 107, p. 6).


5      V. também considerando 11 do Regulamento 340/2008, que afirma: «As reduções previstas no presente regulamento devem aplicar‑se com base numa declaração da entidade que alega ter direito a tais reduções. A apresentação de informações falsas deve ser desencorajada pela imposição de uma taxa administrativa pela Agência e de uma multa dissuasiva pelos Estados‑Membros, se necessário.»


6      V., a este respeito, Acórdão de 22 de janeiro de 2014, Reino Unido/Parlamento e Conselho (C‑270/12, EU:C:2014:18, n.º 81), no qual o Tribunal de Justiça enumerou a ECHA entre os órgãos e organismos da União habilitados a adotar decisões juridicamente vinculativas suscetíveis de fiscalização da legalidade perante os órgãos jurisdicionais da União.


7      V., a este respeito, artigo 20.°, n.º 2, do Regulamento REACH e artigo 3.°, n.º 6, do Regulamento n.º 340/2008.


8      V. artigo 96.° e considerando 107 do Regulamento REACH. V. também Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho e ao Comité Económico e Social Europeu, Relatório Geral da Comissão sobre a aplicação do REACH e o reexame de determinados elementos — Conclusões e Ações, COM(2018) 116 final, de 5 de março de 2018, n.º 3.4.


9      ECHA, verificação de PME — Pedido de documentos, SME(2013) 2197, de 31 de maio de 2013.


10      ECHA, verificação de PME — Decisão SME(2013) 4439, de 20 de novembro de 2013. Além disso, em 22 de novembro de 2013 e em 22 de dezembro de 2013, a ECHA enviou à Hallertauer faturas para pagamento do referido emolumento administrativo.


11      ECHA, verificação de PME — Pedido de documentos, SME(2013) 1059, de 9 de abril de 2013.


12      ECHA, Decisão sobre a verificação de PME, SME(2016) 3729, de 9 de agosto de 2016. Além disso, em 9 de agosto de 2016 e em 8 de setembro de 2016, a ECHA enviou à B faturas para pagamento do referido emolumento administrativo.


13      Foram suscitadas questões semelhantes num reenvio prejudicial anterior, que foi retirado. V. Despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 4 de junho de 2021, ECHA (C‑392/20, EU:C:2021:501). V. também Conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo ADR Center/Comissão (C‑584/17 P, EU:C:2019:941, n.os 40 e 41), que observa que a questão de saber se o artigo 299.° TFUE se aplica aos atos de outras instituições, órgãos e organismos da União ainda não foi respondida pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, mas que considera que a mesma pode ficar por decidir no âmbito deste processo.


14      Inicialmente, ex‑artigo 192.° CEE; posteriormente, ex‑artigo 256.° CE. V. também artigo 92.° Tratado CECA, atualmente caducado, e artigo 164.° Tratado CEEA.


15      Hayden, H., «Enforcement of fines and other pecuniary obligations imposed by the ECB (Part II): national level», European Company and Financial Law Review, vol. 19, n.º 1, 2022, p. 76, em especial p. 84.


16      Na versão inglesa, o artigo 299.°, primeiro parágrafo, TFUE utiliza a expressão «shall be enforceable» [esta expressão foi traduzida, na versão portuguesa, para «constituem título executivo»]. Esta é semelhante a outras versões linguísticas, como, por exemplo, a versão croata («izvršive su») e a versão eslovena («izvršilni»).


17      Por conseguinte, não se pode concluir, com base no artigo 299.° TFUE, como sugere o Governo Polaco, que a omissão dos órgãos e organismos da União, como a ECHA, no texto desta disposição significa que os seus créditos pecuniários não constituem título executivo.


18      V. também, por exemplo, as versões espanhola («títulos ejecutivos») e italiana («titolo esecutivo»).


19      V., a este respeito, Conclusões do advogado‑geral M. Bobek no processo Dimos Zagoriou (C‑217/16, EU:C:2017:385, n.º 29), que observa que o artigo 299.° TFUE «confere essencialmente às decisões de um organismo internacional força executiva direta a nível nacional, sem necessidade de qualquer procedimento de reconhecimento pelo Estado‑Membro».


20      Conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo ADR Center/Comissão (C‑584/17 P, EU:C:2019:941, n.º 54).


21      V., a este respeito, Hayden, H., «Enforcement of fines and other pecuniary obligations imposed by the ECB (Part I): European Level», European Company and Financial Law Review, vol. 18, n.º 6, 2021, p. 1011, em especial pp. 1023 e 1024, que observa que o artigo 299.° TFUE tem por principal objetivo assegurar a execução efetiva das obrigações pecuniárias e que visa igualmente impedir os Estados‑Membros de interferirem no conteúdo e na validade do próprio ato da União.


22      V. ex‑artigo 192.°, primeiro parágrafo, CEE; posteriormente, ex‑artigo 256.°, primeiro parágrafo, CE. Uma disposição distinta, que corresponde atualmente ao artigo 280.° TFUE, fazia referência ao atual artigo 299.° TFUE no que diz respeito à execução dos acórdãos dos órgãos jurisdicionais da União. V. ex‑artigo 187.° CEE; posteriormente, ex‑artigo 244.° CE.


23      Já antes do Tratado de Lisboa, com a introdução da política económica e monetária pelo Tratado de Maastricht, era feita referência ao atual artigo 299.° TFUE no que diz respeito à execução dos regulamentos e decisões do BCE. V. ex‑artigo 108.º‑A, n.º 2, quarto parágrafo, CE e artigo 34.º‑2, quarto parágrafo, do Protocolo, anexo ao Tratado CE, relativo aos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu; posteriormente, ex‑artigo 110.°, n.º 2, quarto parágrafo, CE e artigo 34.º‑2, quarto parágrafo, do Protocolo (n.º 18), anexo ao Tratado CE, relativo aos Estatutos do Sistema Europeu de Bancos Centrais e do Banco Central Europeu.


24      Uma referência aos órgãos e organismos da União consta, nomeadamente, dos artigos 263.°, 265.°, 266.°, 267.° e 277.° TFUE. 


25      V., a título de exemplo, Conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo ADR Center/Comissão (C‑584/17 P, EU:C:2019:941, n.º 40, nota 26). V. também, mais recentemente, Despacho de 28 de julho de 2021, SN/Parlamento (T‑249/21 R, EU:T:2021:496, n.º 38), que indica que, ao contrário do Conselho, da Comissão e do BCE, «o Parlamento não é competente, ao abrigo do artigo 299.° TFUE, para adotar decisões com força executiva que imponham uma obrigação pecuniária às pessoas que sejam as suas destinatárias. Por conseguinte, o Parlamento não tem outra opção a não ser intentar uma ação judicial distinta para obter uma decisão com força executiva por parte dos órgãos jurisdicionais nacionais competentes, que poderá posteriormente utilizar para recuperar a quantia reclamada.» Para considerações semelhantes relativas a uma empresa comum da União (que pode ser estabelecida ao abrigo do artigo 187.° TFUE), v. Acórdão de 5 de julho de 2023, Entreprise commune «Aviation propre»/NG (T‑649/20, T‑721/20 e T‑767/20, EU:T:2023:379, n.º 65).


26      A Comissão sugeriu, na audiência, que a inclusão do Conselho no artigo 299.° TFUE podia ser explicada pela evolução histórica.


27      V. Acórdão de 22 de janeiro de 2014, Reino Unido/Parlamento e Conselho (270/12, EU:C:2014:18, nomeadamente n.os 41 a 55).


28      V. Acórdãos de 13 de junho de 1958, Meroni/Alta Autoridade (9/56, EU:C:1958:7, nomeadamente pp. 151 e 152), e de 13 de junho de 1958, Meroni/Alta Autoridade (10/56, EU:C:1958:8, nomeadamente pp. 172 e 173).


29      V. minhas Conclusões no processo Comissão/CUR (C‑551/22 P, EU:C:2023:846, n.ºs 75 a 93).


30      Embora, até à data, o Tribunal de Justiça não tenha abordado especificamente esta questão, a natureza taxativa do artigo 299.° TFUE parece também ser indiretamente sugerida pela sua jurisprudência. No Acórdão de 16 de julho de 2020, ADR Center/Comissão (C‑584/17 P, EU:C:2020:576, n.º 52), o Tribunal de Justiça observou que o artigo 299.° TFUE «é aplicável a todos os atos que estabeleçam uma obrigação pecuniária das instituições da União aí mencionadas» (o sublinhado é meu).


31      Regulamento (UE, Euratom) 2018/1046 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de julho de 2018, relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento geral da União, que altera os Regulamentos (UE) n.º 1296/2013, (UE) n.º 1301/2013, (UE) n.º 1303/2013, (UE) n.º 1304/2013, (UE) n.º 1309/2013, (UE) n.º 1316/2013, (UE) n.º 223/2014 e (UE) n.º 283/2014, e a Decisão n.º 541/2014/UE, e revoga o Regulamento (UE, Euratom) n.º 966/2012 (JO 2018, L 193, p. 1; a seguir «Regulamento Financeiro 2018/1046»).


32      V. Conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo ADR Center/Comissão (C‑584/17 P, EU:C:2019:941, n.º 41, nota 28), que observa que acontecia o mesmo com a disposição que antecedeu o artigo 79.°, n.º 2, do Regulamento (UE, Euratom) n.º 966/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2012, relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento geral da União e que revoga o Regulamento (CE, Euratom) n.º 1605/2002 (JO 2012, L 298, p. 1; a seguir «Regulamento Financeiro 966/2012»).


33      Esta disposição mantém‑se inalterada na recente proposta de reformulação do Regulamento Financeiro 2018/1046 [v. proposta da Comissão de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento geral da União (reformulação), COM (2022) 223 final, de 16 de maio de 2022].


34      O artigo 2.°, ponto 67, do Regulamento Financeiro 2018/1046 define «Instituição da União» como «o Parlamento Europeu, o Conselho Europeu, o Conselho, a Comissão, o Tribunal de Justiça da União Europeia, o Tribunal de Contas, o Comité Económico e Social Europeu, o Comité das Regiões, o Provedor de Justiça Europeu, a Autoridade Europeia para a Proteção de Dados e o Serviço Europeu para a Ação Externa (“SEAE”); o Banco Central Europeu não é considerado uma instituição da União».


35      V., a este respeito, artigo 85.°, n.º 2, do Regulamento Delegado (UE) n.º 1268/2012 da Comissão, de 29 de outubro de 2012, sobre as normas de execução do [Regulamento Financeiro 966/2012] (JO 2012, L 362, p. 1), que dispõe que «as instituições em causa, que não as enumeradas ao abrigo do artigo 299.° TFUE, podem solicitar à Comissão que adote uma decisão executória.» Este regulamento foi posteriormente revogado pela Decisão (UE) 2018/1520 da Comissão, de 9 de outubro de 2018 (JO 2018, L 256, p. 67). V. também Relatório do Parlamento Europeu sobre a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento anual da União, A7‑0325/2011, de 4 de outubro de 2011, alteração 133, pp. 89 e 90, que propõe a alteração do antecessor do artigo 100.°, n.º 2, primeiro parágrafo, com o fundamento de que «só o Conselho, a Comissão e o Banco Central Europeu têm poderes para adotar decisões que constituam título executivo ao abrigo do artigo 299.° TFUE».


36      No que respeita ao EUIPO, existem disposições análogas ao artigo 299.° TFUE respeitantes à execução das decisões que fixam o montante das custas. V. artigo 110.° do Regulamento (UE) 2017/1001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2017, sobre a marca da União Europeia (JO 2017, L 154, p. 1); artigo 71.° do Regulamento (CE) n.º 6/2002 do Conselho, de 12 de dezembro de 2001, relativo aos desenhos ou modelos comunitários (JO 2002, L 3, p. 1). V. também, no que respeita ao Instituto Comunitário das Variedades Vegetais, artigo 86.° do Regulamento (CE) n.º 2100/94 do Conselho, de 27 de julho de 1994, relativo ao regime comunitário de proteção das variedades vegetais (JO 1994, L 227, p. 1). Tal parece ter tido por finalidade o estabelecimento de regras da União que divergiam das convenções internacionais pertinentes na matéria. V., a este respeito, proposta da Comissão de regulamento do Conselho sobre a marca comunitária, COM (80) 635 final, de 19 de novembro de 1980, exposição de motivos, p. 74.


37      Regulamento (UE) n.º 806/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de julho de 2014, que estabelece regras e um procedimento uniformes para a resolução de instituições de crédito e de certas empresas de investimento no quadro de um Mecanismo Único de Resolução e de um Fundo Único de Resolução bancária e que altera o Regulamento (UE) n.º 1093/2010 (JO 2014, L 225, p. 1).


38      Para disposições análogas, v. também, por exemplo, no que respeita à Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados, artigo 68.°, n.º 4, do Regulamento (UE) n.º 648/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de julho de 2012, relativo aos derivados do mercado de balcão, às contrapartes centrais e aos repositórios de transações (JO 2012, L 201, p. 1); no que respeita às três Autoridades Europeias de Supervisão em geral, artigo 35.°, n.º 9, do Regulamento (UE) 2022/2554 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de dezembro de 2022, relativo à resiliência operacional digital do setor financeiro e que altera os Regulamentos (CE) n.º 1060/2009, (UE) n.º 648/2012, (UE) n.º 600/2014, (UE) n.º 909/2014 e (UE) 2016/1011 (JO 2022, L 333, p. 1); no que diz respeito à recentemente proposta Autoridade para o Combate ao Branqueamento de Capitais e ao Financiamento do Terrorismo da União, artigo 24.°, n.º 2, da proposta da Comissão de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que cria a Autoridade para o Combate ao Branqueamento de Capitais e ao Financiamento do Terrorismo e altera os Regulamentos (UE) n.ºs 1093/2010, (UE) 1094/2010 e (UE) 1095/2010, COM(2021) 421 final, de 20 de julho de 2021 (a seguir «proposta»).


39      Regulamento (CE) n.º 297/95 do Conselho, de 10 de fevereiro de 1995, relativo às taxas cobradas pela Agência Europeia de Avaliação dos Medicamentos (JO 1995, L 35, p. 1), com a última redação que lhe foi dada pelo Regulamento (UE) 2024/848 da Comissão, de 14 de março de 2024 (JO L 2024, 848, p. 1). Este regulamento será revogado a 1 de janeiro de 2025 pelo Regulamento (UE) 2024/568 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de fevereiro de 2024, relativo às taxas e aos emolumentos cobrados pela Agência Europeia de Medicamentos, que altera os Regulamentos (UE) 2017/745 e (UE) 2022/123 do Parlamento Europeu e do Conselho e revoga o Regulamento (UE) n.º 658/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho e o Regulamento (CE) n.º 297/95 do Conselho (JO L 2024, 568), que contém uma disposição análoga no artigo 9.°, n.º 2, e introduz disposições relativas à imposição de emolumentos administrativos em caso de apresentação de informação incorreta pelos requerentes de reduções de taxas no anexo IV, ponto 6.1. Saliento que, também aqui, como no caso do Regulamento 340/2008, não existem disposições específicas relativas à execução desses encargos administrativos.


40      Para disposições semelhantes, v. também, por exemplo, artigo 6.° do Regulamento de Execução (UE) 2018/764 da Comissão, de 2 de maio de 2018, relativo às taxas e imposições a pagar à Agência Ferroviária da União Europeia e respetivas condições de pagamento (JO 2018, L 129, p. 68), com a última redação que lhe foi dada pelo Regulamento de Execução (UE) 2021/1903 da Comissão, de 29 de outubro de 2021 (JO 2021, L 387, p. 126); artigos 5.°, 8.°, 11.° e 15.° e considerando 10 do Regulamento de Execução (UE) 2019/2153 da Comissão, de 16 de dezembro de 2019, relativo às taxas e honorários cobrados pela Agência da União Europeia para a Segurança da Aviação, e que revoga o Regulamento (UE) n.º 319/2014 (JO 2019, L 327, p. 36); artigo 7.° da Decisão (UE) 2020/2152 da Comissão, de 17 de dezembro de 2020, relativa às taxas devidas à Agência da União Europeia de Cooperação dos Reguladores da Energia pela recolha, tratamento, processamento e análise das informações comunicadas ao abrigo do Regulamento (UE) n.º 1227/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2020, L 428, p. 68).


41      V., por exemplo, artigo 68.°, n.º 5, do Regulamento n.º 648/2012, artigo 35.°, n.º 9, do Regulamento 2022/2554 e artigo 24.°, n.º 3, da proposta, referida na nota 38 das presentes conclusões.


42      V. artigo 100.° do Regulamento REACH. V. também considerando 99 do mesmo regulamento, que afirma: «A Agência deverá dispor dos meios para executar todas as tarefas necessárias que lhe permitam desempenhar as suas funções.»


43      V., por exemplo, Acórdão de 19 de dezembro de 2019, Deutsche Umwelthilfe (C‑752/18, EU:C:2019:1114, n.º 33), no qual o Tribunal de Justiça declarou que, «na falta de harmonização dos mecanismos nacionais de execução coerciva, as modalidades da sua aplicação são abrangidas pela ordem jurídica interna dos Estados‑Membros por força do princípio da autonomia processual destes últimos. No entanto, estas modalidades devem preencher o duplo requisito de não serem menos favoráveis do que as que regulam situações semelhantes submetidas ao direito interno (princípio da equivalência) e de não tornarem impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pelo direito da União (princípio da efetividade)».