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Edição provisória

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção)

27 de junho de 2024 (*)

«Reenvio prejudicial — Política social — Medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde das trabalhadoras grávidas, puérperas ou lactantes no trabalho — Diretiva 92/85/CEE — Proibição de despedimento — Trabalhadora que teve conhecimento da sua gravidez após o termo do prazo para intentar uma ação contra o seu despedimento — Possibilidade de intentar essa ação subordinada à apresentação de um pedido de admissão da ação fora de prazo num prazo de duas semanas — Direito a uma proteção jurisdicional efetiva — Princípio da efetividade»

No processo C‑284/23,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.° TFUE, pelo Arbeitsgericht Mainz (Tribunal do Trabalho de Mainz, Alemanha), por Decisão de 24 de abril de 2023, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 2 de maio de 2023, no processo

TC

contra

Firma Haus Jacobus Alten und Altenpflegeheim gGmbH,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção),

composto por: F. Biltgen, presidente de secção, N. Wahl e M. L. Arastey Sahún (relatora), juízes,

advogado‑geral: J. Richard de la Tour,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da Firma Haus Jacobus Alten‑ und Altenpflegeheim gGmbH, por I. Michalis, Rechtsanwalt,

–        em representação da Comissão Europeia, por B.‑R. Killmann, D. Recchia e E. Schmidt, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação da Diretiva 92/85/CEE do Conselho, de 19 de outubro de 1992, relativa à implementação de medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde das trabalhadoras grávidas, puérperas ou lactantes no trabalho (décima diretiva especial na aceção do n.° 1 do artigo 16.° da Diretiva 89/391/CEE) (JO 1992, L 348, p. 1).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe TC à Firma Haus Jacobus Alten‑ und Altenpflegeheim gGmbH (a seguir «Haus Jacobus»), uma sociedade de direito alemão que gere uma casa de repouso para pessoas idosas, a respeito do despedimento de TC, que estava grávida à data do mesmo.

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        Nos termos do artigo 2.°, alínea a), da Diretiva 92/85, uma «[t]rabalhadora grávida» é definida como «toda a trabalhadora grávida que informe o empregador do seu estado, em conformidade com as legislações e/ou práticas nacionais».

4        O artigo 10.° desta diretiva, sob a epígrafe «Proibição de despedimento», prevê:

«A fim de garantir às trabalhadoras, na aceção do artigo 2.°, o exercício dos direitos de proteção da sua segurança e saúde reconhecidos no presente artigo, prevê‑se que:

1.      Os Estados‑Membros tomem as medidas necessárias para proibir que as trabalhadoras, na aceção do artigo 2.°, sejam despedidas durante o período compreendido entre o início da gravidez e o termo da licença de maternidade referida no n.° 1 do artigo 8.°, salvo nos casos excecionais não relacionados com o estado de gravidez admitidos pelas legislações e/ou práticas nacionais e, se for caso disso, na medida em que a autoridade competente tenha dado o seu acordo.

2.      Quando uma trabalhadora, na aceção do artigo 2.°, for despedida durante o período referido no n.° 1, o empregador deve justificar devidamente o despedimento por escrito.

3.      Os Estados‑Membros tomem as medidas necessárias para proteger as trabalhadoras, na aceção do artigo 2.°, contra as consequências de um despedimento que fosse ilegal por força do n.° 1.»

5        O artigo 12.° da referida diretiva, sob a epígrafe «Defesa dos direitos», dispõe:

«Os Estados‑Membros introduzirão na sua ordem jurídica interna as medidas necessárias para permitir que qualquer trabalhador que se considere lesado pela não observância das obrigações decorrentes da presente diretiva exerça os seus direitos por via judicial e/ou, consoante as legislações e/ou práticas nacionais, por recurso a outras instâncias competentes.»

 Direito alemão

6        O § 17 da Gesetz zum Schutz von Müttern bei der Arbeit, in der Ausbildung und im Studium (Mutterschutzgesetz) [Lei relativa à Proteção das Mães que Exercem uma Atividade Profissional, que Seguem uma Formação ou Prosseguem Estudos (Lei da Proteção da Maternidade)], de 23 de maio de 2017 (BGBl. 2017 I, p. 1228, a seguir «MuSchG»), sob a epígrafe «Proibição de despedimento», tem a seguinte redação:

«(1)      É inadmissível o despedimento de uma mulher

1.      durante a sua gravidez,

2.      nos quatro meses subsequentes a um aborto espontâneo ocorrido após a décima segunda semana de gravidez e

3.      até ao termo do período de proteção após o parto e, pelo menos até que tenham decorrido quatro meses do parto,

se à data do despedimento o empregador tiver conhecimento da gravidez, do aborto espontâneo ocorrido após as doze semanas de gravidez ou do parto ou se tais eventos lhe forem comunicados nas duas semanas subsequentes à notificação do despedimento. O incumprimento deste prazo é irrelevante se se ficar a dever a um motivo não imputável à mulher e a comunicação for efetuada logo que possível. Os n.os 1 e 2 aplicam‑se com as devidas adaptações aos atos preparatórios adotados pelo empregador com vista a um despedimento da mulher.

2.      A autoridade suprema do Land responsável pela segurança e a saúde no trabalho ou o organismo por ela designado, pode, em casos especiais não relacionados com o estado da mulher durante a gravidez, com o seu estado depois de um aborto espontâneo ocorrido após a décima segunda semana de gravidez ou com o seu estado pós‑parto, declarar válido o despedimento. O despedimento deve ser comunicado por escrito e a comunicação deve indicar o motivo do despedimento.

[...]»

7        A Kündigungsschutzgesetz (Lei da Proteção em Matéria de Despedimentos), de 25 de agosto de 1969 (BGBl 1969 I, p. 1317), na sua versão aplicável ao litígio no processo principal (a seguir «KSchG»), dispõe, no seu § 4, sob a epígrafe «Propositura de ação no [Arbeitsgericht (Tribunal do Trabalho, Alemanha)]»:

«Se um trabalhador pretender invocar que o seu despedimento é socialmente injustificado ou inválido por outros motivos, deve intentar no prazo de três semanas a contar da comunicação escrita do despedimento uma ação no [Arbeitsgericht (Tribunal do Trabalho)] destinada à declaração de que a relação laboral não cessou com o despedimento. No caso do § 2, a ação declarativa destinar‑se‑á à declaração de que a alteração das condições de trabalho é socialmente injustificada ou inválida por outros motivos. Se o trabalhador tiver apresentado reclamação ao conselho de empresa (§ 3), deverá anexar à sua petição a tomada de posição do conselho de empresa. No caso de o despedimento exigir o consentimento de uma autoridade, o prazo para intentar a ação no [Arbeitsgericht (Tribunal do Trabalho)] só começa a correr depois da notificação ao trabalhador da decisão dessa autoridade.»

8        O § 5 da KSchG, sob a epígrafe «Admissão de ações fora de prazos», enuncia:

«(1)      Se apesar de ter atuado com toda a diligência exigível, um trabalhador não tiver logrado, após a concretização do despedimento, intentar a ação no prazo de três semanas a contar da comunicação escrita do despedimento, a ação poderá ser admitida posteriormente a seu pedido. O mesmo se aplica quando por razões que não lhe sejam imputáveis, uma mulher só adquira conhecimento da sua gravidez após o decurso do prazo previsto no § 4, primeira frase.

(2)      O pedido deve ser apresentado juntamente com a petição inicial; se a ação já tiver sido intentada, a mesma deverá ser mencionada no pedido. O pedido deve igualmente indicar as circunstâncias que justifiquem a admissão posterior da ação e conter os elementos que as comprovem.

(3)      O pedido só é admissível nas duas semanas após a cessação do impedimento. Decorridos seis meses do termo do prazo para intentar a ação, o pedido já não poderá ser apresentado.

[...]»

9        O § 7 da KSchG, sob a epígrafe «Produção de efeitos do despedimento», prevê:

«Se a nulidade jurídica de um despedimento não for invocada em tempo útil (§ 4, primeira frase, §§ 5 e 6), considera‑se que o despedimento produz efeitos desde o início [...]»

 Litígio no processo principal e questão prejudicial

10      TC foi contratada, a partir de 1 de agosto de 2022, ao abrigo de um contrato de trabalho a termo de um ano, como ajudante de lar pela Haus Jakobus.

11      Por carta de 6 de outubro de 2022, a Haus Jakobus despediu TC com efeitos a 21 de outubro de 2022.

12      Em 9 de novembro de 2022, constatou‑se que TC estava grávida de sete semanas. Esta informou a Haus Jakobus desse facto em 10 de novembro de 2022.

13      Por carta de 13 de dezembro de 2022, TC intentou uma ação no Arbeitsgericht Mainz (Tribunal do Trabalho de Mainz, Alemanha), que é o órgão jurisdicional de reenvio, contra o seu despedimento, com o fundamento de que, à data deste, estava grávida.

14      O órgão jurisdicional de reenvio salienta que, em conformidade com a jurisprudência do Bundesarbeitsgericht (Supremo Tribunal do Trabalho Federal, Alemanha), o § 4, quarta frase, da KSchG, que prevê que, no caso de o despedimento estar sujeito à aprovação de uma autoridade, o prazo de propositura de ação no Arbeitsgericht (Tribunal do Trabalho) só começa a correr a partir da notificação da decisão da autoridade ao trabalhador, não é aplicável quando a entidade patronal é informada da gravidez após o despedimento, pelo que, em conformidade com o § 7 da KSchG, o despedimento se considera válido após o termo do prazo de três semanas previsto no § 4, primeira frase, desta lei, apesar da proteção especial contra o despedimento prevista no § 17 da MuSchG, salvo se for apresentado um pedido de admissão da ação fora de prazo em conformidade com o § 5 da KSchG.

15      Assim, uma vez que TC não apresentou esse pedido, há que julgar improcedente a sua ação, em conformidade com estas disposições da KSchG. No entanto, o órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas quanto à conformidade destas com o direito da União, em especial tendo em conta o Acórdão de 29 de outubro de 2009, Pontin (C‑63/08, a seguir «Acórdão Pontin», EU:C:2009:666), no qual o Tribunal de Justiça declarou que as vias de impugnação judicial à disposição de uma mulher grávida devem ser objeto de uma regulamentação que respeite o princípio da efetividade.

16      A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio salienta, por um lado, que, segundo uma parte da doutrina alemã, a regulamentação nacional em causa no processo principal tornaria a proteção jurisdicional das mulheres grávidas excessivamente difícil, devido à coexistência de diferentes prazos particularmente curtos, podendo cada um dos quais conduzir à exclusão da proteção contra o despedimento, e que são tanto mais curtos quando a interessada só toma conhecimento da gravidez após o seu despedimento, ou ainda em razão das obrigações a cumprir tanto junto da entidade patronal como do Arbeitsgericht (Tribunal do Trabalho).

17      Por outro lado, o órgão jurisdicional de reenvio afirma que o § 17 da MuSchG permite, em conformidade com o direito da União, que uma trabalhadora grávida invoque a proteção especial contra o despedimento comunicando a sua gravidez à sua entidade patronal posteriormente ao seu despedimento, mesmo após o decurso do prazo de três semanas para impugnar este despedimento, previsto no § 4 da KSchG, e ao prazo de duas semanas previsto no § 17 da MuSchG. Neste caso, o órgão jurisdicional de reenvio considera que nada parece justificar, à luz do princípio da proteção jurisdicional efetiva dos direitos conferidos aos particulares pelo direito da União, que uma trabalhadora grávida seja obrigada a respeitar o procedimento previsto no § 5 da KSchG para que a sua ação judicial seja admitida. Com efeito, quando uma trabalhadora informa a sua antiga entidade patronal, após o decurso do referido prazo de duas semanas, de que estava grávida no momento em que foi despedida, o empregador só o pode entender como uma forma de invocar a nulidade do seu despedimento.

18      Nestas condições, o Arbeitsgericht Mainz (Tribunal do Trabalho de Mainz) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«[...] [A]s disposições nacionais alemãs dos §§ 4 e 5 da [KSchG], nos termos das quais uma mulher que enquanto grávida beneficia de uma proteção especial contra o despedimento também deve obrigatoriamente intentar uma ação nos prazos ali previstos para manter essa proteção, são compatíveis com a [Diretiva 92/85?]»

 Quanto à admissibilidade do pedido de decisão prejudicial

19      A Haus Jacobus sustenta que o pedido de decisão prejudicial é inadmissível porquanto a resposta à questão submetida não é pertinente para a solução do litígio no processo principal.

20      Esta sociedade alega, primeiro, que, com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta‑se se uma trabalhadora grávida está obrigada a utilizar uma via de recurso de direito nacional, no caso em apreço, a prevista no § 5 da KSchG, para exercer os direitos que lhe confere a diretiva 92/85. Ora, a resposta a esta questão decorre diretamente do artigo 12.° desta diretiva, que prevê que qualquer trabalhadora que se considere lesada pela não observância das obrigações decorrentes desta diretiva deve exercer os seus direitos por vias de recurso previstas pelo direito nacional.

21      Segundo, não tendo a trabalhadora em causa no processo principal apresentado um pedido de admissão da ação fora de prazo, na aceção do § 5 da KSchG, não é necessário examinar, para efeitos da resolução do litígio no processo principal, a questão submetida, relativa à efetividade da via de recurso prevista neste artigo.

22      Terceiro, a posição do órgão jurisdicional de reenvio de que os Estados‑Membros são obrigados a permitir a qualquer trabalhadora grávida invocar a inobservância das obrigações decorrentes da Diretiva 92/85 sem terem de utilizar uma via de recurso de direito nacional, como a prevista no § 5 da KSchG, vai além da proteção prevista no artigo 10.°, n.° 3, e no artigo 12.° desta diretiva.

23      A este respeito, é jurisprudência constante que, no âmbito do processo instituído pelo artigo 267.° TFUE, o juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão judicial a tomar, tem competência exclusiva para apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submete ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, desde que as questões submetidas sejam relativas à interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar‑se (Acórdão de 9 de março de 2023, Vapo Atlantic, C‑604/21, EU:C:2023:175, n.° 31 e jurisprudência referida).

24      No caso em apreço, importa, por um lado, salientar que os argumentos da Haus Jacobus mencionados nos n.os 20 e 22 do presente acórdão dizem respeito ao mérito da questão submetida e não à admissibilidade do pedido de decisão prejudicial. Por outro lado, o caráter alegadamente evidente da resposta a esta questão não pode justificar uma declaração de inadmissibilidade. Com efeito, mesmo admitindo que se trata de uma questão cuja resposta, no entender de uma das partes no processo principal, não deixa lugar a nenhuma dúvida razoável, um pedido de decisão prejudicial que comporta tal questão não se torna, por isso, inadmissível. (v., neste sentido, Acórdão de 9 de março de 2023, Vapo Atlantic, C‑604/21, EU:C:2023:175, n.° 33 e jurisprudência referida).

25      Por outro lado, no que respeita ao argumento mencionado no n.° 21 do presente acórdão, há que constatar que a questão submetida não incide sobre a efetividade da via de recurso prevista no § 5 da KSchG, mas sobre a questão de saber se a obrigação de utilizar essa via de recurso para exercer os direitos conferidos pela Diretiva 92/85 é compatível com as exigências que decorrem do princípio da efetividade.

26      Daqui resulta que o pedido de decisão prejudicial é admissível.

 Quanto à questão prejudicial

27      Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 10.° e 12.° da Diretiva 92/85 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional por força da qual uma trabalhadora grávida que só tenha tido conhecimento da sua gravidez após o decurso do prazo previsto para intentar uma ação contra o seu despedimento está obrigada, para poder intentar tal ação, a apresentar um pedido de admissão da ação fora de prazo num prazo de duas semanas.

28      Cumpre recordar a este respeito que, em conformidade com o artigo 10.°, ponto 1, da Diretiva 92/85, os Estados‑Membros devem tomar as medidas necessárias para proibir que as trabalhadoras, na aceção do artigo 2.° desta diretiva, sejam despedidas durante o período compreendido entre o início da gravidez e o termo da licença de maternidade referida no seu n.° 1 do artigo 8.°, salvo nos casos excecionais não relacionados com o estado de gravidez admitidos pelas legislações e/ou práticas nacionais e, se for caso disso, desde que a autoridade competente tenha dado o seu acordo.

29      Em conformidade com o artigo 12.° da Diretiva 92/85, os Estados‑Membros são também obrigados a introduzir na sua ordem jurídica interna as medidas necessárias para permitir que qualquer trabalhador que se considere lesado pela não observância das obrigações decorrentes desta diretiva, incluindo as que decorrem do seu artigo 10.°, exerça os seus direitos por via judicial. O ponto 3 deste artigo 10.° prevê especificamente que os Estados‑Membros devem tomar as medidas necessárias para proteger as trabalhadoras grávidas contra as consequências de um despedimento que seja ilegal por força do n.° 1 do referido artigo.

30      Estas disposições, em especial o artigo 12.° da Diretiva 92/85, constituem uma expressão específica, no contexto desta diretiva, do princípio da proteção jurisdicional efetiva dos direitos conferidos aos cidadãos pelo direito da União (Acórdão Pontin, n.° 41).

31      Também decorre da jurisprudência que, embora os Estados‑Membros não estejam obrigados, por força do artigo 12.° da Diretiva 92/85, a adotar uma medida determinada, não é menos certo que a medida escolhida deve assegurar uma proteção jurisdicional efetiva e eficaz, produzir um efeito dissuasivo real relativamente ao empregador e, em qualquer caso, ser adequada ao prejuízo sofrido (v. Acórdão Pontin, n.° 42 e jurisprudência referida).

32      No que respeita ao princípio da proteção jurisdicional efetiva dos direitos conferidos aos cidadãos pelo direito da União, é jurisprudência constante que as modalidades processuais das ações destinadas a garantir a salvaguarda dos direitos que decorrem para os particulares do direito da União, não devem ser menos favoráveis do que as das ações análogas de direito interno (princípio da equivalência) e não devem tornar impossível na prática ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (princípio da efetividade) (Acórdão Pontin, n.° 43 e jurisprudência referida).

33      Quanto ao princípio da equivalência, não resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que a regulamentação nacional em causa no processo principal não seja conforme com este princípio.

34      No que respeita ao princípio da efetividade, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que cada caso em que se coloque a questão de saber se uma disposição processual nacional torna impossível ou excessivamente difícil a aplicação do direito da União deve ser analisado tendo em conta o lugar que essa disposição ocupa no processo, visto como um todo, e a tramitação e as especificidades deste último perante as várias instâncias nacionais. Nesta perspetiva, há que tomar em consideração, sendo caso disso, os princípios que estão na base do sistema jurisdicional nacional, como a proteção dos direitos de defesa, o princípio da segurança jurídica e a boa tramitação processual (Acórdão de 21 de dezembro de 2023, BMW Bank e o., C‑38/21, C‑47/21 e C‑232/21, EU:C:2023:1014, n.° 304 e jurisprudência referida).

35      A este respeito, o Tribunal de Justiça reconheceu assim a compatibilidade com o direito da União da fixação de prazos razoáveis para a propositura de ações, sob pena de caducidade, por razões de segurança jurídica, se esses prazos não forem suscetíveis de tornar impossível na prática ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica da União (v., neste sentido, Acórdão de 12 de fevereiro de 2008, Kempter, C‑2/06, EU:C:2008:78, n.° 58 e jurisprudência referida). Quanto aos prazos de caducidade, o Tribunal de Justiça também já declarou que no que respeita às regulamentações nacionais abrangidas pelo âmbito de aplicação do direito da União, cabe aos Estados‑Membros fixar os prazos em função, designadamente, da importância que as decisões a tomar têm para os interessados, da complexidade dos procedimentos e da legislação a aplicar, do número de pessoas que podem ser afetadas e dos outros interesses públicos ou privados que devem ser tomados em consideração [v., neste sentido, Acórdão Pontin, n.° 48 e jurisprudência referida, e Acórdão de 27 de fevereiro de 2020, Land Sachsen‑Anhalt (Remuneração dos funcionários e juízes), C‑773/18 a C‑775/18, EU:C:2020:125, n.° 69].

36      Assim, tendo em conta, nomeadamente, o princípio da segurança jurídica, as exigências do princípio da efetividade não se opõem, em princípio, quando se trata de uma ação destinada a obter a reinserção na empresa em causa de uma trabalhadora ilicitamente despedida, à fixação de um prazo de caducidade relativamente curto. Com efeito, tanto as trabalhadoras grávidas despedidas como os empregadores podem ter um interesse, relacionado com a segurança jurídica, em que a faculdade de intentar essa ação seja limitada no tempo, tendo em conta, em particular, as consequências que podem resultar da reintegração para todos os atores envolvidos, quando esta ocorra após um lapso de tempo significativo (v., neste sentido, Acórdão Pontin, n.os 60 e 61).

37      Todavia, tratando‑se de uma regulamentação nacional que prevê um prazo de caducidade de quinze dias aplicável à ação de declaração da nulidade de um despedimento, o Tribunal de Justiça declarou, por um lado, que esse prazo deve ser considerado particularmente curto, tendo especialmente em conta, a situação em que se encontra uma mulher no início da gravidez e, por outro, que será muito difícil, a uma trabalhadora despedida durante a sua gravidez ser aconselhada de modo útil, assim como, se for caso disso, redigir uma petição inicial e intentar uma ação, com observância desse prazo (Acórdão Pontin, n.os 62 e 65).

38      O Tribunal de Justiça também sublinhou, à luz da regulamentação nacional em causa no processo que deu origem ao Acórdão Pontin, que uma trabalhadora grávida que, por qualquer razão, deixe expirar esse prazo de quinze dias deixa de dispor de uma ação judicial para fazer valer os seus direitos na sequência do seu despedimento (v., neste sentido, Acórdão Pontin, n.° 66).

39      Com base, nomeadamente, nestas constatações, o Tribunal de Justiça declarou que modalidades processuais como as que caracterizam a referida regulamentação nacional, ao gerarem inconvenientes processuais suscetíveis de tornar excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos às mulheres grávidas pelo artigo 10.° da Diretiva 92/85, não respeitavam as exigências do princípio da efetividade, o que compete, porém, ao tribunal de reenvio verificar (v., neste sentido, Acórdão Pontin, n.os 67 e 69).

40      No caso em apreço, decorre da decisão de reenvio que, em conformidade com o § 4, primeira frase, da KSchG, uma ação destinada a impugnar um despedimento deve ser intentada no prazo de três semanas que corre depois da notificação por escrito do despedimento. No entanto, por força do § 5 da KSchG, uma ação intentada posteriormente a esse prazo por uma trabalhadora grávida pode, no entanto, ser admitida se esta, só tendo tido conhecimento da gravidez após o decurso do referido prazo de três semanas, apresentar um pedido nesse sentido. Este pedido deve ser apresentado nas duas semanas após a cessação do impedimento.

41      O órgão jurisdicional de reenvio constata que a trabalhadora em causa no processo principal, que não intentou uma ação contra o seu despedimento no prazo de três semanas a contar da comunicação por escrito do mesmo, também não apresentou esse pedido, pelo que a sua ação deve ser julgada improcedente, salvo se, como esta tende a considerar, a regulamentação nacional em causa no processo principal for contrária ao princípio da efetividade.

42      Este órgão jurisdicional salienta que o prazo de recurso de três semanas previsto no § 4, primeira frase, da KSchG visa garantir o respeito da segurança jurídica e que o mesmo parece acontecer no que respeita ao prazo de duas semanas para apresentar um pedido de admissão da ação fora de prazo previsto no § 5, n.° 3, da KSchG.

43      Dito isto, como foi recordado no n.° 35 do presente acórdão, no âmbito da determinação dos prazos de caducidade, os Estados‑Membros não devem apenas ter em conta a segurança jurídica. Outros parâmetros, como a importância para os interessados das decisões a tomar ou ainda de outros interesses públicos ou privados, devem igualmente ser tomados em consideração.

44      A este respeito, a proteção contra o despedimento das trabalhadoras grávidas, conforme garantida pelo artigo 10.° da Diretiva 92/85, constitui um parâmetro importante que os Estados‑Membros devem ter em conta.

45      Com efeito, foi tendo em conta o risco que um eventual despedimento implica para o estado físico e psíquico de uma trabalhadora grávida que o legislador da União previu, por força do artigo 10.° da Diretiva 92/85, uma proteção especial em benefício da mulher ao instituir essa proibição de despedimento (v., neste sentido, Acórdão de 22 de fevereiro de 2018, Porras Guisado, C‑103/16, EU:C:2018:99, n.° 46 e jurisprudência referida).

46      É certo que resulta da decisão de reenvio que o § 5 da KSchG permite, através de um pedido de admissão, intentar uma ação fora de prazo quando o prazo normal de três semanas para intentar uma ação contra o despedimento tenha expirado sendo que a mulher, por um motivo que não lhe é imputável, ainda não tinha tido conhecimento da sua gravidez.

47      Todavia, cumpre salientar, em primeiro lugar, que este pedido de admissão da ação fora de prazo deve ser apresentado no prazo de duas semanas após a cessação do impedimento de apresentar a ação, o que, segundo o Tribunal de Justiça, constitui um prazo particularmente curto, tendo em conta, designadamente, a situação em que se encontra uma mulher no início da gravidez (Acórdão Pontin, n.° 62).

48      Em segundo lugar, importa sublinhar que este prazo de duas semanas é mais curto do que o prazo normal de três semanas, previsto no § 4, primeira frase, da KSchG, para intentar uma ação contra um despedimento.

49      Assim, uma trabalhadora grávida que tenha conhecimento, no momento do seu despedimento, do seu estado de gravidez dispõe de um prazo de três semanas para intentar essa ação. Em contrapartida, uma trabalhadora que não tenha conhecimento da sua gravidez antes do termo desse prazo, e por um motivo que não lhe é imputável, dispõe de apenas duas semanas para pedir a admissão à apresentação de tal ação, o que pressupõe uma redução considerável do prazo para ser aconselhada de modo útil e, se for caso disso, para redigir e apresentar não só esse pedido de admissão da ação fora de prazo mas também a ação propriamente dita. Com efeito, como observa a Comissão nas suas observações escritas, o § 5, n.° 2, da KSchG prevê que esta ação é, em princípio, intentada ao mesmo tempo que o referido pedido.

50      A este respeito, a Haus Jacobus afirma, nas suas observações escritas, que o pedido de admissão da ação fora de prazo não está sujeito a requisitos formais especiais e que pode mesmo ser apresentado oralmente na secretaria de qualquer órgão jurisdicional, incluindo um órgão jurisdicional incompetente. A Comissão afirma, por seu turno, que, embora o simples facto de apresentar uma ação contra o despedimento não seja suficiente para considerar que esse pedido foi apresentado, este pode, no entanto, ser formulado tacitamente.

51      Dito isto, mesmo que essas precisões fossem corretas, na sequência das verificações que incumbem ao órgão jurisdicional de reenvio, não é menos verdade que, quando uma trabalhadora toma conhecimento, como no caso em apreço, de que está grávida após o decurso do prazo de três semanas após o seu despedimento, está obrigada, sob pena de caducidade, não só a intentar a ação mas também a formular um pedido de admissão dessa ação fora de prazo dentro de duas semanas, ou seja, um prazo menor do que aquele de que esta trabalhadora teria à sua disposição se tivesse tido conhecimento da sua gravidez no momento do seu despedimento. Assim, este prazo de duas semanas pode ter por efeito que seja muito difícil, para a referida trabalhadora, ser aconselhada de modo útil, assim como, se for caso disso, redigir e apresentar o pedido de admissão e a ação propriamente dita.

52      Em terceiro lugar, como também observa a Comissão nas suas observações escritas, o início do prazo de duas semanas previsto no § 5, n.° 3, da KSchG, ou seja, o momento da «cessação do impedimento [de apresentar a ação]», não parece desprovido de qualquer ambiguidade, o que pode contribuir para tornar mais difícil o exercício dos direitos garantidos pela Diretiva 92/85.

53      Por último, em quarto lugar, resulta da decisão de reenvio que, em conformidade com o § 17, n.° 1, segunda frase, da MuSchG, a trabalhadora despedida deve informar logo que possível a sua entidade patronal do seu estado de gravidez. Tendo em conta esta obrigação, esse órgão jurisdicional interroga‑se sobre se a exigência adicional segundo a qual essa trabalhadora deve apresentar, num órgão jurisdicional, um pedido de admissão da ação fora de prazo deve ser considerada incompatível com as exigências do princípio da proteção jurisdicional efetiva.

54      A este respeito, há que constatar que é certo que o facto de a trabalhadora ser obrigada não só a informar logo que possível a sua entidade patronal do seu estado de gravidez mas também a apresentar, no prazo de duas semanas, um pedido de admissão da ação fora de prazo num órgão jurisdicional, bem como, em princípio, a ação propriamente dita, contribui para demonstrar a complexidade do sistema instituído pela regulamentação nacional em causa no processo principal, que prevê várias obrigações concorrentes, a executar no respeito de prazos distintos que se sobrepõem, quer junto da entidade patronal, quer de um órgão jurisdicional.

55      Todavia, uma simples informação da entidade patronal não pode, em princípio, ser considerada equivalente à apresentação, num órgão jurisdicional, de um ato exigido pela regulamentação processual nacional para impugnar um despedimento ou, no mínimo, para suspender o prazo de caducidade para impugnar esse despedimento.

56      Daqui resulta que a exigência de apresentar, num órgão jurisdicional, um pedido de admissão de uma ação fora de prazo não pode, enquanto tal, ser considerada incompatível com as exigências do princípio da proteção jurisdicional efetiva, mesmo quando a regulamentação nacional preveja, além disso, a obrigação de a trabalhadora em causa informar logo que possível a sua entidade patronal do seu estado de gravidez.

57      Em contrapartida, as modalidades processuais que regulam esse pedido de admissão de uma ação fora de prazo podem, se for caso disso, revelar‑se incompatíveis com as exigências do princípio da proteção jurisdicional efetiva.

58      No caso em apreço, importa constatar que o prazo de duas semanas previsto no § 5 da KSchG parece, sob reserva das verificações que incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio efetuar, gerar inconvenientes processuais suscetíveis de desrespeitar o princípio da efetividade e, por conseguinte, o princípio da proteção jurisdicional efetiva dos direitos conferidos aos particulares pela Diretiva 92/85. Com efeito, este prazo, que é sensivelmente mais curto do que o prazo normal previsto no § 4 desta lei, parece, tendo em consideração a situação em que se encontra uma mulher no início da gravidez, particularmente curto e suscetível de tornar muito difícil, para a trabalhadora grávida, aconselhar‑se de modo útil e, se for caso disso, redigir e apresentar um pedido de admissão da ação fora de prazo e da ação propriamente dita, e tanto mais que as incertezas não se podem excluir quanto ao início do referido prazo de duas semanas e à acumulação de obrigações, que correspondem, cada uma, a prazos distintos, a executar junto ora da entidade patronal, ora de um órgão jurisdicional.

59      Tendo em conta todas as razões precedentes, há que responder à questão submetida que os artigos 10.° e 12.° da Diretiva 92/85 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação nacional por força da qual uma trabalhadora grávida que só tenha tido conhecimento da sua gravidez após o decurso do prazo previsto para intentar uma ação contra o seu despedimento está obrigada, para poder intentar essa ação, a apresentar um pedido de admissão da ação fora de prazo num prazo de duas semanas, desde que as modalidades processuais subjacentes a esse pedido de admissão, na medida em que acarretem inconvenientes suscetíveis de tornar excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos às trabalhadoras grávidas pelo artigo 10.° desta diretiva, não respeitem as exigências do princípio da efetividade.

 Quanto às despesas

60      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sétima Secção) declara:

Os artigos 10.° e 12.° da Diretiva 92/85/CEE do Conselho, de 19 de outubro de 1992, relativa à implementação de medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde das trabalhadoras grávidas, puérperas ou lactantes no trabalho (décima diretiva especial na aceção do n.° 1 do artigo 16° da Diretiva 89/391/CEE),

devem ser interpretados no sentido de que:

se opõem a uma regulamentação nacional por força da qual uma trabalhadora grávida que só tenha tido conhecimento da sua gravidez após o decurso do prazo previsto para intentar uma ação contra o seu despedimento está obrigada, para poder intentar essa ação, a apresentar um pedido de admissão da ação fora de prazo num prazo de duas semanas, desde que as modalidades processuais subjacentes a esse pedido de admissão, na medida em que acarretem inconvenientes suscetíveis de tornar excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos às trabalhadoras grávidas pelo artigo 10.° desta diretiva, não respeitem as exigências do princípio da efetividade.

Assinaturas


*      Língua do processo: alemão.