ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)
22 de Abril de 1999 (1)
«Regulamento (CEE) n.° 2377/90 Pedido de inclusão de uma somatotropina
bovina recombinante (BST) na lista das substâncias não sujeitas a um limite
máximo de resíduos Indeferimento pela Comissão Recurso de anulação
Admissibilidade»
No processo T-112/97,
Monsanto Company, sociedade de direito do Estado de Delaware, com sede em
Saint-Louis, Missouri (Estados-Unidos da América), representada por Clive
Stanbrook QC, barrister, e Robert MacLean, solicitor, com domicílio escolhido no
Luxemburgo no escritório do advogado Arsène Kronshagen, 22, Rue
Marie-Adélaïde,
contra
Comissão das Comunidades Europeias, representada inicialmente por Richard
Wainwright, consultor jurídico principal, e Fernando Castillo de la Torre, membro
do Serviço Jurídico e, em seguida, apenas por R. Wainwright, na qualidade de
agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de Carlos Gómez de
la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,
apoiada por
República Francesa, representada por Kareen Rispal-Bellanger, subdirectora na
Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Frédéric
Pascal, assessor da Administração central e Régine Loosli-Surrans, encarregada de
missão, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo, na
Embaixada de França, 8, boulevard Joseph II,
que tem por objecto um pedido de anulação da decisão C (97) 148 final, da
Comissão, de 14 de Janeiro de 1997, que indeferiu o pedido apresentado por
Monsanto Europe SA/NV de inclusão da sometribove, uma somatotropina bovina
recombinante (BST), no Anexo II do Regulamento (CEE) n.° 2377/90 do Conselho,
de 26 de Junho de 1990, que prevê um processo comunitário para o
estabelecimento de limites máximos de resíduos de medicamentos veterinários nos
alimentos de origem animal (JO L 224, p. 1),
O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Segunda Secção),
composto por: A. Potocki, presidente, C. W. Bellamy e A. W. H. Meij, juízes,
secretário: A. Mair, administrador
vistos os autos e após a audiência de 16 de Dezembro de 1998,
profere o presente
Acórdão
- 1.
- Em 26 de Junho de 1990, o Conselho adoptou o Regulamento (CEE) n.° 2377/90
do Conselho, que prevê um processo comunitário para o estabelecimento de limites
máximos de resíduos de medicamentos veterinários nos alimentos de origem animal
(JO L 224, p. 1, a seguir «Regulamento n.° 2377/90»).
- 2.
- Nos termos deste regulamento, a Comissão fixa os limites máximos de resíduos (a
seguir «LMR»). O artigo 1.°, n.° 1, alínea b), define LMR como a concentração
máxima de resíduos resultante da utilização de um medicamento veterinário que
a Comunidade pode aceitar como legalmente autorizada ou que é reconhecida
como aceitável «à superfície ou no interior de um alimento».
- 3.
- O Regulamento n.° 2377/90 prevê a elaboração de quatro anexos nos quais uma
substância farmacologicamente activa, destinada a ser utilizada em medicamentos
veterinários a administrar a «animais para produção de alimentos», pode ser
incluída:
o Anexo I reservado às substâncias para as quais pode ser fixado um LMR
após avaliação dos riscos que essa substância apresenta para a saúde
humana;
o Anexo II, reservado às substâncias não sujeitas a um LMR;
o Anexo III, reservado às substâncias relativamente às quais não é possível
fixar definitivamente um LMR, mas para as quais, sem pôr em risco a saúde
humana, pode ser fixado um LMR provisório por um período determinado
calculado em função do tempo necessário para completar estudos científicos
adequados, período este que só pode ser prolongado uma única vez;
o Anexo IV, reservado às substâncias, relativamente às quais não pode ser
fixado nenhum LMR, por constituirem, independentemente de qualquer
consideração de ordem quantitativa, um risco para a saúde do consumidor.
- 4.
- O artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2377/90 estabelece:
«Para obter a inclusão nos anexos I, II ou III de uma nova substância
farmacologicamente activa que seja;
- destinada à utilização em medicamentos veterinários para administrar a
animais para produção de alimentos
e
- destinada a ser comercializada em um ou mais Estados-Membros que ainda
não tenham autorizado a utilização da substância em causa nos animais
para produção de alimentos,
o responsável pela comercialização deverá apresentar à Comissão um pedido...»
- 5.
- Nos termos do n.° 2 do artigo 6.°, depois de verificar, num prazo de 30 dias, que
o pedido foi correctamente apresentado, a Comissão remetê-lo-á
[«imediatamente»], para análise, ao Comité dos Medicamentos Veterinários (a
seguir «CMV»).
- 6.
- Nos termos do n.° 3 do mesmo artigo 6.°, a Comissão elaborará um projecto das
medidas a tomar, no prazo de 120 dias a contar da data de apresentação do pedido
ao CMV, tendo em conta as observações formuladas pelos membros deste.
- 7.
- Nos termos do n.° 5 do mesmo artigo, a Comissão apresentará o projecto das
medidas ao Comité para a Adaptação ao Progresso Técnico das directivas relativas
aos medicamentos veterinários (a seguir «comité regulador»), para efeitos do
procedimento previsto no artigo 8.°.
- 8.
- Nos termos do artigo 8.°, n.° 2, este comité emite o seu parecer sobre o projecto
de medidas num prazo fixado pelo seu presidente, em função da urgência da
questão em causa.
- 9.
- O artigo 8.°, n.° 3, descreve o processo através do qual a Comissão ou, se for caso
disso, o Conselho, adopta as medidas previstas, tendo em conta o parecer expresso
pelo comité regulador.
- 10.
- O Regulamento (CEE) n.° 2309/93 do Conselho, de 22 de Julho de 1993, que
estabelece procedimentos comunitários de autorização e fiscalização de
medicamentos de uso humano e veterinário e institui uma Agência Europeia de
Avaliação dos Medicamentos (JO L 214, p. 1, a seguir «Regulamento n.° 2303/93»)
regula o procedimento de emissão da autorização comunitária de introdução no
mercado (a seguir «AIM») de um medicamento veterinário.
- 11.
- Resulta do artigo 31.°, n.° 3, alínea b), deste regulamento que, no caso dos
medicamentos veterinários para administração a animais destinados ao consumo
humano, a indicação do LMR para a sua substância farmacologicamente activa em
conformidade com o disposto no Regulamento (CEE) n.° 2377/90, é uma das
condições para obtenção da AIM.
- 12.
- Segundo o artigo 34.°, n.° 2, do mesmo regulamento, a recusa de uma AIM para
a Comunidade constitui proibição em toda a Comunidade da introdução no
mercado do medicamento veterinário em questão.
- 13.
- A Directiva 87/22/CEE do Conselho, de 22 de Dezembro de 1986, relativa à
aproximação das medidas nacionais respeitantes à colocação no mercado dos
medicamentos de alta tecnologia, nomeadamente dos resultantes da biotecnologia
(JO 1987 L 15, p. 38, a seguir «Directiva 87/22») prevê no seu artigo 2.°, n.° 1, que,
logo que recebam um pedido de autorização de colocação no mercado relativo a
um medicamento de alta tecnologia, as autoridades competentes devem, a pedido
do responsável pela colocação do produto no mercado, pedir o parecer do Comité
das Especialidades Farmacêuticas ou do CMV, em função das competências
respectivas.
- 14.
- Pela Decisão 90/218/CEE do Conselho, de 25 de Abril de 1990, relativa à
administração de somatotrofina bovina (BST) (JO L 116, p. 27), alterada, pela
última vez, pela Decisão 94/936/CE do Conselho, de 20 de Dezembro de 1994 (JO
L L 366, p. 19), foi instituída uma moratória para a introdução no mercado da
somatotropina bovina recombinante (a seguir «BST»), uma hormona de
crescimento.
- 15.
- Segundo o primeiro parágrafo do artigo 1.° da Decisão 90/218, de 25 de Abri de
1990, acima referida, na redacção que lhe foi dada pela Decisão 94/936, de 20 de
Dezembro de 1994, igualmente já referida, os Estados-Membros não devem
autorizar, até 31 de Dezembro de 1999, a colocação no mercado da BST com vista
à sua comercialização nem a sua administração a vacas leiteiras, seja por que meio
for, no respectivo território.
Matéria de facto subjacente ao litígio
- 16.
- A Monsanto Company inventou e desenvolveu um medicamento veterinário
designado «somatech». A substância farmacologicamente activa deste produto é
a «sometribove», uma BST destinada a ser administrada a vacas leiteiras para
aumentar a produção de leite.
- 17.
- A Monsanto Europe SA/NV, uma sociedade de direito belga (a seguir «Monsanto
Europe») é uma filial a 100% da Monsanto Company. Ocupa-se de determinados
aspectos da gestão comercial da sometribove na Comunidade, sob a égide da
Monsanto Company, o coordenador mundial dessa gestão.
- 18.
- Em 1987, a pedido da Monsanto Europe, e em cumprimento do disposto no artigo
2.°, n.° 1, da Directiva 87/22, as autoridades competentes da República Francesa
submeteram ao CMV um pedido de parecer sobre a sometribove.
- 19.
- Na sequência da entrada em vigor do Regulamento n.° 2377/90, a Comissão
informou a Monsanto Europe que não era necessária a apresentação de um novo
pedido de inclusão da sometribove no Anexo II do Regulamento n.° 2377/90 (a
seguir «Anexo II»), dado que já tinha sido submetido um processo ao CMV, nos
termos da Directiva 87/22.
- 20.
- Em 27 de Janeiro de 1993, o CMV emitiu o seu parecer.
- 21.
- Neste parecer, afirma-se nomeadamente:
«[...] O Comité considera que a protecção da saúde pública não exige a fixação de
limites máximos de resíduos para a sometribove, o princípio activo do produto, e
recomenda, portanto, que a sometribove seja incluída na lista das substâncias não
sujeitas a LMR constantes do Anexo II [...]»
- 22.
- Por carta de 20 de Abril de 1995, O Veterinary Medicines Directorate do Reino
Unido informou a Monsanto Europe de que a Comissão tinha preparado um
projecto de regulamento que incluía a sometribove no Anexo II. Este projecto
devia então ser submetido ao comité regulador, nos termos dos artigos 6.°, n.° 5,
e 8.° do Regulamento n.° 2377/90.
- 23.
- Porém, em 17 de Outubro de 1995, numa reunião com funcionários da Comissão,
a recorrente foi informada de que a Comissão tinha «retirado esse projecto da
agenda» devido à existência da moratória sobre a BST.
- 24.
- Nestas circunstâncias, um dos advogados da recorrente, interpelou oficialmente a
Comissão, por carta de 6 de Novembro de 1996, nos termos do artigo 175.° do
Tratado CE, convidando-a «a tomar as medidas necessárias a fim de remeter o
processo sem mais demoras ao comité regulador, em cumprimento do disposto no
Regulamento n.° 2377/90.»
- 25.
- Na sequência desta interpelação, a Comissão adoptou, em 14 de Janeiro de 1997,a decisão C (97) 148, final (a seguir «decisão impugnada»).
- 26.
- Os quarto, quinto, sexto e sétimo considerandos e o dispositivo desta decisão têm
o seguinte teor:
«Considerando que nos termos do artigo 6.° do Regulamento n.° 2377/90, para que
uma nova substância farmacologicamente activa possa ser incluída numa das listas
do regulamento, essa substância deve destinar-se a ser utilizada em medicamentos
veterinários e a ser colocada no mercado de um ou mais Estados-Membros;
Considerando que em 20 de Dezembro de 1994 o Conselho adoptou a Decisão
94/936, que altera a Decisão 90/218, de 25 de Abril de 1990, relativa à colocação
no mercado e à administração da somatotrofina bovina (BST);
Considerando que o artigo 1.° desta decisão estabelece: 'Os Estados-Membros não
devem autorizar, até 31 de Dezembro de 1999, a colocação no mercado de
somatotrofina bovina com vista à comercialização nem a sua administração a vacas
leiteiras, seja por que meio for, no respectivo território, e que, por conseguinte,
a somatotrofina bovina nñao pode ser comercializada nem administrada na
Comunidade, visto que esta substância só é administrada a vacas leiteiras;
Considerando que uma das condições a que está sujeito o pedido de inclusão nos
anexos do Regulamento n.° 2377/90 do Conselho não está satisfeita e que não há
interesse nessa inclusão, a Comissão considera que não deve deferir o pedido
apresentado em 6 de Novembro de 1996, sem prejuízo de vir a reavaliar a situação,
se se verificar uma alteração das circunstâncias;
decide:
Artigo 1.°
O pedido de inclusão da sometribove (somatotrofina bovina) no Anexo II do
Regulamento n.° 2377/90... é indeferido.
Artigo 2.°
A presente decisão tem por destinatário a Companhia Monsanto, avenue de
Tervuren, 270-272, 1040 Bruxelles, Bélgica.»
- 27.
- Em 23 de Janeiro de 1997, a decisão impugnada foi notificada à Monsanto Europe
em Bruxelas.
Tramitação processual e pedidos das partes
- 28.
- Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em
14 de Abril de 1997, a Monsanto Company interpôs o presente recurso.
- 29.
- Por requerimento que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância
em 12 de Agosto de 1997, a República Francesa pediu para se constituir como
interveniente em apoio da recorrida. A intervenção foi admitida por despacho do
Presidente da Terceira Secção do Tribunal de Primeira Instância em 29 de
Setembro de 1997.
- 30.
- A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:
anular a decisão impugnada;
condenar a Comissão nas despesas.
- 31.
- A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:
a título principal, declarar o recurso inadmissível;
a título subsidiário, negar-lhe provimento;
condenar a recorrente nas despesas.
- 32.
- A República Francesa apoia os pedidos da Comissão.
Factos supervenientes à abertura do processo e continuação do processo
- 33.
- Em 25 de Junho de 1998, o Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção)
proferiu o acórdão Lilly Industries/Comissão (T-120/96, Colect., p. II-2571, a seguir
«acórdão Lilly»).
- 34.
- O n.° 1 do dispositivo deste acórdão determina:
«A decisão da Comissão, de 22 de Maio de 1996, que indefere o pedido de
inclusão do somidobove (somatotrofina bovina) no Anexo II ao Regulamento [...]
n.° 2377/90 [...] é anulada.»
- 35.
- Não tendo a Comissão recorrido do acórdão Lilly no prazo legal, o acórdão
transitou em julgado.
- 36.
- O Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção), verificando a semelhança do
contexto factual e jurídico dos dois processos, convidou as partes a apresentarem
eventuais alegações sobre as consequências desse acórdão para o presente
processo.
- 37.
- A Comissão e a recorrente responderam a esse convite por cartas datadas
respectivamente de 3 e 6 de Julho de 1998. O Governo francês não apresentou
observações no prazo fixado.
- 38.
- Tendo a composição das secções do Tribunal de Primeira Instância sido modificada
com o início do novo ano judicial, o juiz-relator foi colocado na Segunda Secção,
para a qual transitou, em consequência, o presente processo.
- 39.
- Com base no relatório preliminar do juiz-relator, o Tribunal de Primeira Instância
(Segunda Secção) decidiu iniciar a fase oral do processo sem instrução. A audiência
pública, na qual foram ouvidas as alegações das partes e as respostas destas às
questões colocadas pelo Tribunal, teve lugar em 16 de Dezembro de 1998.
Quanto à admissibilidade
- 40.
- Na audiência, a recorrente confirmou, em resposta a uma questão do Tribunal, que
tinha interposto o presente recurso à sua própria conta e não por conta da
Monsanto Europe.
Argumentos das partes
- 41.
- A Comissão, apoiada pela República Francesa, observa que, se em certas
circunstâncias, designadamente no domínio do direito da concorrência, pode
parecer inútil efectuar uma distinção entre uma sociedade-mãe e uma sua filial, já
não se pode dizer o mesmo num caso como o presente, do sector dos
medicamentos veterinários, em que a Monsanto Company e a Monsanto Europe
ocupam posições muito diferentes em termos de direitos e obrigações.
- 42.
- Designadamente, os direitos processuais decorrentes da Directiva 87/22 e dos
Regulamentos n.os 2377/90 e 2309/93 só beneficiariam a Monsanto Europe, visto
que foi esta última que apresentou os pedidos nos procedimentos administrativos
previstos para esses actos. O facto de a Monsanto Europe ser uma filial da
Monsanto Company em nada alteraria a situação, visto que esse facto não garante
à Monsanto Company qualquer direito nem lhe impõe qualquer obrigação.
- 43.
- Nestas circunstâncias, só a Monsanto Europe, destinatária da decisão impugnada,
seria afectada por esta. Só esta sociedade poderia eventualmente interpor um
recurso de anulação da decisão.
- 44.
- Em contrapartida, não sendo a Monsanto Company destinatária da decisão
impugnada nem afectada directa e individualmente por esta, não poderia ser
admitido o recurso de anulação por ela interposto.
- 45.
- No que se refere mais especificamente à susceptibilidade de ser directamente
afectada, a Comissão sublinha que, ao contrário da Monsanto Europe, a Monsanto
Company não pode ser titular do direito de inclusão da sometribove no Anexo II
e, portanto, a fortiori, não pode ser titular potencial de uma autorização de
colocação dessa substância no mercado.
- 46.
- Por todas estas razões, a Comissão entende que o recurso deve ser julgado
inadmissível.
- 47.
- A recorrente contesta a argumentação da Comissão.
Apreciação do Tribunal
- 48.
- Deve observar-se liminarmente que a Monsanto Company inventou e desenvolveu
o somatech. É a sociedade-mãe da Monsanto Europe e o coordenador mundial da
exploração comercial do somatech. Nesta qualidade, tem um interesse económico
evidente em que seja satisfeita uma das condições necessárias à comercialização do
somatech pela Monsanto Europe na Comunidade.
- 49.
- Note-se a seguir que, se é verdade que a decisão impugnada indica como
destinatária «a companhia Monsanto», foi, no entanto, endereçada à sede social
da Monsanto Europe em Bruxelas. Além disso, através desta decisão, a Comissão
pronunciou-se sobre o pedido apresentado pela Monsanto Europe de inclusão da
sometribove no Anexo II. Nestas circunstâncias, a Monsanto Europe deve ser
considerada destinatária da decisão impugnada.
- 50.
- Para efeitos de análise da admissibilidade do presente recurso, tem, assim, que se
verificar se a recorrente, não sendo destinatária da decisão impugnada, é directa
e individualmente afectada por esta, na acepção do artigo 173.°, quarto parágrafo
do Tratado.
- 51.
- Em primeiro lugar, quanto à questão de saber se a recorrente é directamente
afectada pela decisão impugnada, há que notar desde logo que a decisão não deixa
qualquer poder de apreciação a uma qualquer autoridade quanto à sua aplicação.
- 52.
- Registe-se, a seguir, que a decisão impugnada, ao indeferir o pedido apresentado
pela Monsanto Europe de inclusão da sometribove no Anexo II, teve como
consequência directa a não fixação para a sometribove de um LMR.
- 53.
- Recorde-se, a este propósito, que a fixação de um LMR para a sometribove, nos
termos do Regulamento n.° 2377/90, constitui uma condição sine qua non da
emissão de uma AIM para o somatech, segundo o disposto no artigo 31.°, n.° 3,
alínea b), do Regulamento n.° 2309/93.
- 54.
- Sendo certo que a fixação de um LMR para a sometribove não tem
automaticamente como consequência que o somatech possa ser legalmente lançado
no mercado (v. a este propósito o acórdão Lilly, n.os 88 a 90), a recusa de fixação
desse LMR implica, por si só, a recusa de uma AIM para a Comunidade do
somatech, recusa esta que constitui, por sua vez, uma proibição de lançamento no
mercado do somatech em toda a Comunidade, em aplicação do artigo 34.°, n.° 2,
do mesmo regulamento.
- 55.
- Nestas circunstâncias, a decisão impugnada tem directamente como efeito, caso as
outras condições de comercialização o permitam, designadamente, caso seja
levantada a moratória sobre a BST (v. a este respeito os n.os 65 a 67 do acórdão
Lilly), que o somatech não poderá ser comercializado na Comunidade.
- 56.
- Nestas condições, a recorrente deve ser considerada directamente afectada pela
decisão impugnada.
- 57.
- Relativamente à questão de saber se a recorrente é individualmente afectada pela
decisão impugnada, deve observar-se que, segundo a jurisprudência, uma pessoa
singular ou colectiva só é considerada individualmente afectada por um acto
comunitário se for atingida por esse acto devido a determinadas qualidades que lhe
são próprias ou de uma situação de facto que a caracterize relativamente a
qualquer outra pessoa, individualizando-a, por isso, de forma idêntica à do
destinatário (v., a título de exemplo, o despacho do Tribunal de Primeira Instância
de 9 de Agosto de 1995, Greenpeace e o./Comissão, T-585/93, Colect., p. II-2205,
n.° 48, confirmado pelo acórdão, proferido sobre recurso para o Tribunal de
Justiça, de 2 de Abril de 1998, Greenpeace Council e o./Comissão, C-321/95 P,
Colect., p. I-1651).
- 58.
- No presente caso, basta constatar que a recorrente detem todas as acções da
Monsanto Europe e que, por conseguinte, é proprietária a 100% desta empresa.
Esta qualidade individualiza a recorrente, em relação à decisão impugnada,
relativamente a qualquer outra pessoa e, designadamente, em relação a qualquer
outro operador económico no mercado em causa.
- 59.
- Nestas condições, a recorrente deve ser considerada individualmente afectada pela
decisão impugnada.
- 60.
- Sendo a recorrente directa e individualmente afectada pela decisão impugnada, o
recurso é admissível.
Quanto ao mérito
Argumentos das partes
- 61.
- Na sua carta de 6 de Julho de 1998 (v. supra, n.° 37), a recorrente observou que,
pela sua similitude com o processo que deu origem ao acórdão Lilly, o presente
processo devia chegar a idêntico resultado, isto é, que a decisão impugnada deveria
ser anulada.
- 62.
- Na sua carta de 3 de Julho de 1998 (v. supra, n.° 37), a Comissão reconhece que
o contexto factual e jurídico dos dois processos é muito similar («very similar»). Na
hipótese de o Tribunal declarar o presente recurso admissível, a Comissão admite
que a decisão impugnada deverá ser anulada pelos mesmos motivos que levaram
o Tribunal a anular a decisão impugnada no acórdão Lilly.
Apreciação do Tribunal
- 63.
- É assim questão pacífica entre as partes que a decisão impugnada deve ser anulada
pelos mesmos motivos que levaram o Tribunal a anular a decisão contestada no
processo Lilly.
- 64.
- Não tendo o Tribunal verificado a existência de nenhum elemento de facto ou de
direito que imponha uma conclusão diferente, remete-se para os fundamentos do
acórdão Lilly e anula-se em consequência a decisão ora impugnada.
Quanto às despesas
- 65.
- Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida deve
ser condenada nas despesas, se tal tiver sido pedido. Porém, nos termos do n.° 4
do mesmo artigo, os Estados-Membros intervenientes no processo no Tribunal
devem suportar as suas próprias despesas.
- 66.
- Em consequência, tendo a Comissão sido vencida e tendo em conta o pedido da
recorrente, há que condená-la nas suas próprias despesas, bem como nas despesas
da recorrente.
- 67.
- A República Francesa, interveniente, deverá suportar as suas próprias despesas.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção),
decide:
1) A decisão C (97) 148, final, da Comissão, de 14 de Janeiro de 1997, que
indeferiu o pedido da Monsanto Europe SA/NV de inclusão da sometribove
no Anexo II do Regulamento n.° 2377/90 do Conselho, de 26 de Junho de
1990, que prevê um processo comunitário para o estabelecimento de limites
máximos de resíduos de medicamentos veterinários nos alimentos de
origem animal, é anulada.
2) A Comissão é condenada a suportar as suas próprias despesas, bem como
as despesas da recorrente.
3) A República Francesa suportará as suas próprias despesas.
Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 22 de Abril de 1999.
O secretário
O presidente
H. Jung
A. Potocki