Language of document : ECLI:EU:C:1999:430

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

21 de Setembro de 1999 (1)

«Inscrição obrigatória num fundo de pensões sectorial — Compatibilidade com as regras da concorrência — Qualificação dum fundo de pensões sectorial como empresa»

No processo C-67/96,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177.° do Tratado CE (actual artigo 234.° CE), pelo Kantongerecht te Arnhem (Países Baixos), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Albany International BV

e

Stichting Bedrijfspensioenfonds Textielindustrie,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos artigos 85.°, 86.° e 90.° do Tratado CE (actuais artigos 81.° CE, 82.° CE e 86.° CE),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, J.-P. Puissochet, G. Hirsch e P. Jann, presidentes de secção, J. C. Moitinho de Almeida (relator), C. Gulmann, J. L. Murray, D. A. O. Edward, H. Ragnemalm, L. Sevón e M. Wathelet, juízes,

advogado-geral: F. G. Jacobs,


secretário: D. Louterman-Hubeau, administradora principal,

vistas as observações escritas apresentadas:

—    em representação da Albany International BV, por T. R. Ottervanger, advogado no foro de Roterdão, e H. van Coeverden, advogado no foro de Haia,

—    em representação do Stichting Bedrijfspensioenfonds Textielindustrie, por E. Lutjens, advogado no foro de Amesterdão, e O. Meulenbelt, advogado no foro de Utreque,

—    em representação do Governo neerlandês, por A. Bos, consultor jurídico no Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente,

—    em representação do Governo alemão, por E. Röder, Ministerialrat no Ministério Federal da Economia, e C.-D. Quassowski, Regierungsdirektor no mesmo ministério, na qualidade de agentes,

—    em representação do Governo francês, por Kareen Rispal-Bellanger, subdirectora do direito económico internacional e direito comunitário na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e Claude Chavance, secretário dos Negócios Estrangeiros na mesma direcção, na qualidade de agentes,

—    em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por W. Wils, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações da Albany International BV, representada por T. R. Ottervanger, do Stichting Bedrijfspensioenfonds Textielindustrie, representado por E. Lutjens e O. Meulenbelt, do Governo neerlandês, representado por M. A. Fierstra, chefe do serviço de direito europeu no Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, do Governo francês, representado por C. Chavance, do Governo sueco, representado por A. Kruse, departementsråd no secretariado jurídico do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, e da Comissão, representada por W. Wils, na audiência de 17 de Novembro de 1998,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 28 de Janeiro de 1999,

profere o presente

Acórdão

1.
    Por decisão de 4 de Março de 1996, que deu entrada na Secretaria em 11 de Março seguinte, o Kantongerecht te Arnhem submeteu ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177.° do Tratado CE (actual artigo 234.° CE), três questões prejudiciais relativas à interpretação dos artigos 85.°, 86.° e 90.° do Tratado CE (actuais artigos 81.° CE, 82.° CE e 86.° CE).

2.
    Estas questões foram suscitadas num litígio que opõe a Albany International BV (a seguir «Albany») ao Stichting Bedrijfspensioenfonds Textielindustrie (fundo de pensões sectorial da indústria têxtil, a seguir «Fundo»), quanto à recusa da Albany a pagar ao Fundo as contribuições respeitantes ao ano de 1999, invocando o facto de a inscrição obrigatória no Fundo, por força da qual tais contribuições lhe são reclamadas, ser contrária aos artigos 3.°, alínea g), do Tratado CE [que passou, após alteração, a artigo 3.°, n.° 1, alínea g) CE], 85.°, 86.° e 90.° do Tratado.

A legislação nacional

3.
    O sistema de pensões neerlandês assenta em três pilares.

4.
    O primeiro é constituído por uma pensão de base legal, concedida pelo Estado nos termos da Algemene Ouderdomswet (lei geral neerlandesa sobre a protecção na velhice, a seguir «AOW») e da Algemene Nabestaandenwet (lei relativa ao seguro generalizado dos sobreviventes). Este regime legal obrigatório confere à generalidade da população o direito a uma pensão de montante reduzido, independente do salário efectivamente recebido anteriormente e calculado por referência ao salário mínimo legal.

5.
    O segundo pilar compreende as pensões complementares, concedidas em conexão com uma actividade profissional, por conta de outrem ou por conta própria, que completam, na maioria dos casos, a pensão de base. Estas pensões complementares são geralmente geridas no âmbito de regimes colectivos que se aplicam a um sector da economia, a uma profissão ou aos trabalhadores de uma empresa, por fundos de pensões nos quais a inscrição se tornou obrigatória, nomeadamente, como no processo principal, nos termos da Wet van 17 maart 1949 houdende vaststelling van en regeling betreffende verplichte deelneming in een bedrijfspensioenfonds (lei de 17 de Março de 1949 que estabelece as regras relativas à inscrição obrigatória num fundo de pensões sectorial, a seguir «BPW»).

6.
    O terceiro pilar é constituído pelos contratos individuais de seguro de pensão ou seguro de vida que podem contratar-se facultativamente.

7.
    A Wet op de loonbelasting (lei relativa à tributação dos salários), prevê que os prémios destinados à constituição duma pensão só são dedutíveis quando essa pensão não exceda um nível «razoável». Os prémios não são dedutíveis quando a pensão constituída ultrapasse esse nível. Para uma carreira de 40 anos, esse nível eleva-se a 70% do vencimento individual em fim de carreira. Esta regulamentação fiscal implica que a norma actual nos Países-Baixos em matéria de constituição de pensões, corresponde a uma pensão, incluindo a pensão ao abrigo da AOW, igual a 70% do último salário.

8.
    O artigo 1.°, n.° 1, da BPW, na redacção que resultou da lei de 11 de Fevereiro de 1988, dispõe:

«1.    Para efeitos da presente lei e das disposições que nela se fundamentam, deve entender-se por:

    ...

    b.    um fundo de pensões sectorial: um fundo que opera num sector de actividade, no qual os fundos são reunidos seja apenas em benefício das pessoas que exercem uma actividade por conta de outrem no sector em questão ou também em benefício de pessoas que exercem uma actividade no referido sector noutra qualidade.

    ...

    f.    nosso ministro: o ministro dos Assuntos Sociais e do Emprego.»

9.
    O artigo 3.° da BPW, após alteração, prevê:

«1.    O nosso ministro pode, a pedido de uma organização profissional sectorial que considere suficientemente representativa da estrutura da vida económica de um sector de actividade, e após concertação com o chefe do departamento da administração geral interessado em cuja competência se incluam os assuntos do sector de actividade em questão, e após consulta do Sociaal-Economische Raad [Conselho Económico e Social] e da Verzekeringskamer [Câmara dos Seguros], tornar obrigatória a inscrição num fundo de pensões sectorial para todos os trabalhadores ou para certas categorias de trabalhadores desse sector de actividade.

2.    No caso referido no número anterior, todas as pessoas que relevem das categorias abrangidas pelas disposições do número anterior, e bem assim, se se tratar de trabalhadores por conta de outrem, as suas entidades patronais, são obrigadas a respeitar as disposições previstas a seu respeito pelos estatutos e regulamentos do fundo de pensões sectorial ou nos termos destes. O respeito

destas disposições pode ser objecto de acções judiciais, no que respeita, nomeadamente, ao pagamento de contribuições.»

10.
    O artigo 5.°, n.° 2, da BPW, após alteração, enumera várias condições para o que ministro dos Assuntos Sociais e do Emprego possa aprovar um pedido de inscrição obrigatória como o referido no artigo 3.°, n.° 1. Assim, em conformidade com o artigo 5.°, n.° 2, pontos III e IV, da BPW, após alteração, os estatutos e regulamentos do fundo de pensões sectorial devem garantir de forma suficiente os interesses dos inscritos, e os representantes das associações patronais e das associações de trabalhadores do sector em questão devem ter assento em número igual no comité de gestão do fundo.

11.
    O artigo 5.°, n.° 2, ponto II, alínea l), da BPW, após alteração, prevê também que os estatutos e os regulamentos do fundo de pensões sectorial devem conter disposições respeitantes aos casos em que e as condições por força das quais os trabalhadores abrangidos pelo sector em questão não são obrigados a inscrever-se no referido fundo ou podem ser dispensados de certas obrigações em relação a ele.

12.
    O artigo 5.°, n.° 3, da BPW, após alteração, precisa:

«O nosso ministro dos Assuntos Sociais e do Emprego, ouvida a Câmara dos Seguros e o Conselho Económico e Social, emitirá instruções relativas às questões referidas no n.° 2, ponto II, alínea l). Para efeitos de elaboração destas instruções, deve partir-se do princípio de que os trabalhadores abrangidos que já estavam inscritos num fundo de pensões de uma empresa ou que tinham constituído seguros numa companhia de seguros de vida pelo menos seis meses antes da introdução do pedido referido no artigo 3.°, n.° 1, não são obrigados a estar inscritos neste fundo de pensões sectorial ou estão dispensados, inteiramente ou numa medida razoável, da obrigação de contribuir para ele, desde que possam demonstrar que, no decurso do período relativamente ao qual não são obrigados a inscrever-se ou estão dispensados da obrigação de pagar contribuições, na totalidade ou relativamente a uma parte razoável delas, adquirem direitos a pensão que são pelo menos equivalentes às que adquiririam no caso de inscrição no fundo de pensões sectorial e durante todo o tempo em que possam fazer esta demonstração. O nosso ministro pode também emitir instruções relativas a outras partes do n.° 2.»

13.
    Pela Beschikking van 29 december 1952 betreffende de vaststelling van de richtlijnen voor de vrijstelling van deelneming in een bedrijfspensioenfonds wegens een bijzondere pensioenvoorziening (decisão de 29 de Dezembro de 1952 que adopta instruções relativas à dispensa de inscrição num fundo de pensões sectorial, em razão da inscrição num regime especial de pensões, na sua versão alterada pela decisão de 15 de Agosto de 1988, a seguir «instruções relativas à dispensa de inscrição»), o ministro dos Assuntos Sociais e do Emprego emitiu as instruções referidas no artigo 5.°, n.° 3, da BPW, após alteração.

14.
    O artigo 1.° das instruções relativas à dispensa de inscrição, após as alterações, prevê:

«Um fundo de pensões sectorial pode conceder dispensa da obrigação de inscrição e da obrigação de pagar contribuições para esse fundo, a pedido de qualquer pessoa interessada, desde que o trabalhador no sector em questão beneficie de um regime especial de pensões, que responda às condições seguintes:

a.    Este regime deve depender de um fundo de pensões de empresa, de outro fundo de pensões sectorial ou de uma companhia de seguros titular de uma certificação prevista pelo artigo 10.° da Wet toezicht verzekeringsbedrijf (lei relativa ao controlo das companhias de seguros, Stb. 1986, 638) ou basear-se na Algemene burgerlijke pensioenwet (lei geral relativa às pensões civis da função pública, Stb. 1986, 540), na Spoorwegenpensioenwet (lei relativa às pensões dos empregados dos caminhos-de-ferro neerlandeses e dos seus familiares, Stb. 1986, 541) ou na Algemene Militaire pensioenwet (lei geral relativa às pensões militares, Stb. 1979, 305);

b.    Os direitos que este regime pode proporcionar devem, no seu conjunto, ser pelo menos equivalentes aos que decorrem do fundo de pensões sectorial;

c.    Os direitos do trabalhador em questão e o respeito das suas obrigações devem estar suficientemente garantidos;

d.    Se a dispensa implicar a retirada do fundo, deve ser proposta uma compensação julgada razoável pela Câmara dos Seguros relativa ao eventual prejuízo sofrido pelo fundo, do ponto de vista da técnica dos seguros, como consequência da retirada.»

15.
    O artigo 5.° das referidas instruções, após alterações, acrescenta:

«1.    Deve ser concedida dispensa quando estão reunidas as condições referidas no artigo 1.°, alíneas a, b, e c, quando o regime especial de pensões se aplicava pelo menos seis meses antes da apresentação do pedido mediante o qual a inscrição no fundo de pensões sectorial foi tornada obrigatória e se tenha demonstrado que, no decurso do período relativo ao qual o trabalhador do sector interessado não é obrigado a inscrever-se ou está dispensado da obrigação de pagar contribuições, na totalidade ou relativamente a uma parte razoável destas, o mesmo adquire direitos a pensão que são pelo menos equivalentes aos que adquiriria se estivesse inscrito no fundo sectorial.

2.    Se, no momento referido no n.° 1, o regime especial de pensões não responder à condição referida no artigo 1.°, alínea b), deve ser concedido um prazo suficiente para permitir uma adaptação a essa condição, antes que seja tomada uma decisão sobre o pedido.

3.    A dispensa nos termos do presente artigo deve entrar em vigor no momento em que a inscrição no fundo sectorial de pensões se tornou obrigatória.»

16.
    O artigo 9.° das referidas instruções, após alterações, precisa:

«1.    As decisões referidas no artigo 8.° podem ser objecto de reclamações apresentadas na Câmara de Seguros no prazo de 30 dias após o interessado ter recebido a decisão. O fundo de pensões sectorial deve levar ao conhecimento do interessado, por escrito, a frase precedente, simultaneamente com a decisão.

2.    A Câmara dos Seguros leva ao conhecimento do fundo de pensões sectorial bem como das pessoas que apresentaram as referidas reclamações a sua decisão quanto às mesmas.»

17.
    A apreciação formulada pela Câmara dos Seguros constitui uma tentativa de conciliação. Não se trata de uma decisão que tenha força vinculativa no quadro de um litígio. A apreciação da Câmara dos Seguros não pode ser objecto de reclamação nem de recurso.

18.
    Além das disposições da BPW, os fundos de pensões sectoriais nos quais a inscrição foi tornada obrigatória estão sujeitos à aplicação da Wet van 15 mei 1962 houdende regelen betreffende pensioen- en spaarvoorzieningen (lei de 15 de Maio de 1962 relativa aos fundos de pensões e aos fundos de poupança, modificada várias vezes em seguida, a seguir «PSW»).

19.
    A PSW tem por finalidade garantir, em toda a medida do possível, que os compromissos em matéria de pensões assumidos em relação aos trabalhadores sejam efectivamente cumpridos.

20.
    Para este efeito, o artigo 2.°, n.° 1, da PSW obriga as entidades patronais a escolherem um de três regimes destinados a separar os fundos recolhidos para efeitos de pensão do resto dos activos da empresa. A entidade patronal pode aderir a um fundo de pensões sectorial, constituir um fundo de pensões de empresa ou subscrever apólices de seguro de grupo ou individuais junto de uma companhia de seguros.

21.
    O artigo 1.°, n.° 6, da PSW precisa que a mesma se aplica também aos fundos de pensões sectoriais relativamente aos quais foi tornada obrigatória a inscrição nos termos da BPW.

22.
    A PSW prevê também uma série de condições a que devem obedecer os estatutos e os regulamentos de um fundo de pensões sectorial. O artigo 4.° da PSW dispõe, assim, que a constituição de um fundo dessa natureza deve ser notificada ao ministro dos Assuntos Sociais e do Emprego bem como à Câmara dos Seguros. O artigo 6.°, n.° 1, da PSW confirma que os representantes das organizações de

entidades patronais e os representantes das organizações de trabalhadores do sector interessado tomam assento de forma paritária no seio do comité de gestão de um fundo de pensões sectorial.

23.
    Além disso, a PSW define, nos seus artigos 9.° e 10.°, as modalidades de gestão dos fundos recolhidos. A regra geral nesta matéria é enunciada no artigo 9.°, que impõe aos fundos de pensões a obrigação de transferirem o risco relativo aos compromissos ligados às pensões ou de ressegurar esse risco. Por derrogação a esta última regra, o artigo 10.° permite aos fundos de pensões gerirem ou investirem eles próprios, correndo os seus próprios riscos, os capitais recolhidos. Para ser autorizado a proceder assim, o fundo de pensões deve apresentar às autoridades responsáveis um plano de gestão que exponha com precisão a forma como se propõe fazer face ao risco actuarial e ao risco financeiro. O plano deve ser aprovado pela Câmara dos Seguros. Além disso, a vigilância exercida sobre os fundos de pensões é permanente. As contas actuariais de resultados do regime devem ser regularmente submetidas para aprovação à Câmara dos Seguros.

24.
    Finalmente, os artigos 13.° a 16.° da PSW enunciam as regras relativas ao investimento dos montantes recolhidos. Nos termos do artigo 13.°, os activos do regime aumentados das previsões de receitas devem ser suficientes para cobrir os compromissos em matéria de pensões. O artigo 14.° precisa que os investimentos devem ser efectuados com toda a prudência.

O litígio no processo principal

25.
    O Fundo foi criado nos termos da BPW. A inscrição foi tornada obrigatória por decreto do Ministro dos Assuntos Sociais e do Emprego de 4 de Dezembro de 1975 (a seguir «decreto que torna a inscrição obrigatória».

26.
    A Albany explora uma empresa têxtil que está inscrita no Fundo desde 1975.

27.
    Até 1989, o regime de pensões do Fundo era um regime de montante fixo. A pensão concedida aos trabalhadores não era proporcional ao respectivo salário, mas representava um montante fixo para cada trabalhador. Considerando este regime de pensões como muito pouco generoso, a Albany contratou, em 1981, com uma companhia de seguros, um regime complementar de pensões para os seus trabalhadores, a fim de que a pensão global a que terão direito após os 40 anos de actividade se eleve a 70% do seu último salário.

28.
    Com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1989, o Fundo modificou o seu regime de pensões. Este regime atribui agora aos trabalhadores um montante que representa também 70% do último salário.

29.
    Posteriormente à modificação do regime de pensões do Fundo, a Albany pediu, em 22 de Julho de 1989, dispensa de inscrição. Este pedido foi indeferido pelo Fundo em 28 de Dezembro de 1990. Com efeito, este considerou que, nos termos das

instruções relativas à dispensa de inscrição, essa dispensa só deveria ser concedida quando as condições fixadas pelas referidas instruções fossem respeitadas e as disposições particulares em matéria de pensão já fossem aplicáveis pelo menos seis meses antes da apresentação do pedido dos parceiros sociais, mediante a qual a inscrição no fundo de pensões sectorial tinha sido declarada obrigatória.

30.
    A Albany reclamou da decisão do Fundo para a Câmara dos Seguros. Por decisão de 18 de Março de 1992, esta considerou que, embora o Fundo não fosse obrigado neste caso concreto a conceder a dispensa solicitada, devia pedir-se-lhe que fizesse uso do seu poder discricionário de conceder a dispensa, ou, pelo menos, um prazo de aviso prévio, na medida em que a Albany tinha convencionado um regime complementar de pensões para o seu pessoal há vários anos e este regime era, desde 1 de Janeiro de 1989, semelhante ao instituído pelo Fundo.

31.
    O Fundo não seguiu o parecer da Câmara dos Seguros e mandou notificar à Albany, em 11 de Novembro de 1992, uma injunção para que esta lhe pagasse o montante de 36 700,29 HFL correspondente ao montante das contribuições regulamentares de 1989, acrescidas de juros, às despesas de cobrança, às despesas judiciais e de patrocínio.

32.
    A Albany deduziu oposição a injunção no Kantongerecht te Arnhem, invocando, nomeadamente, que a inscrição obrigatória no Fundo era contrária aos artigos 3.°, alínea g), do Tratado, 52.° e 59.° do Tratado CE (que passaram, após alteração, a artigos 43.° CE e 49.° CE), 85.°, 86.° e 90.° do Tratado.

    

33.
    Segundo a Albany, a recusa do Fundo de lhe conceder dispensa teria consequências prejudiciais para ela. A sua companhia de seguros passaria a conceder-lhe, com efeito, condições menos favoráveis, uma vez que devia contratar o regime complementar de pensões instituído pelo Fundo. Além disso, contrariamente ao que afirma o Fundo, outros fundos de pensões sectoriais, tais como o Bedrijfspensioenfonds voor de Bouwnijverheid e o Bedrijfspensioenfonds voor het Schildersbedrijf, concederam dispensas às empresas que tinham anteriormente contratado um regime complementar de pensões.

34.
    O Fundo manteve que, nesse caso, não existia qualquer obrigação legal de conceder a dispensa pedida. Por isso, o tribunal só podia exercer a esse respeito um controlo marginal. Em conformidade com o artigo 5.°, n.° 3, da BPW, a dispensa só devia ser obrigatoriamente concedida quando uma empresa tivesse posto em prática um regime de pensões equivalente pelo menos seis meses antes de a inscrição se ter tornado obrigatória. Essa obrigação de dispensa só existia no momento da primeira inscrição no Fundo e não produzia efeitos em caso de modificação do regulamento de pensões. O Fundo insistiu, além disso, na importância da manutenção de um regime de pensões correcto fundado na solidariedade a favor de todos os trabalhadores e das empresas do sector têxtil e

sublinhou a esse propósito que a concessão de uma dispensa à Albany significaria o abandono de 110 dos 8 800 membros que conta.

35.
    O Kantongerecht acolheu a opinião da Câmara dos Seguros, segundo a qual o regime complementar da Albany era, desde 1 de Janeiro de 1989, semelhante ao regime de pensões instituído pelo Fundo. Sublinhou que as relações entre um fundo de pensões sectorial e um dos seus membros são regidas pelas exigências da razão e da equidade, bem como pelos princípios gerais de uma administração sã. Por conseguinte, um fundo de pensões sectorial devia ter em conta em larga medida o parecer de uma instância especializada independente designada pela lei, como a Câmara dos Seguros, quando é levado a decidir sobre a concessão de uma dispensa.

36.
    O Kantongerecht observou que, no acórdão de 14 de Dezembro de 1995, Van Schijndel e Van Veen (C-430/93 e C-431/93, Colect., p. I-4705), as três últimas questões relativas à compatibilidade do sistema neerlandês de inscrição obrigatória num regime profissional de pensões com as regras comunitárias da concorrência não tinham sido apreciadas pelo Tribunal de Justiça.

37.
    Nestas condições, o Kantongerecht te Arnhem decidiu, fazendo referência às suas anteriores decisões de 19 de Abril de 1993, 17 de Janeiro de 1994 e 9 de Janeiro de 1995, suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as questões prejudiciais seguintes:

    «1)    Um fundo sectorial de pensões, como o contemplado no artigo 1.°, n.° 1, alínea b), da [BPW] é uma empresa na acepção dos artigos 85.°, 86.° ou 90.° do Tratado CE?

    2)    Em caso de resposta afirmativa à questão 1), a obrigação de filiação imposta às empresas industriais constitui uma medida tomada por um Estado-Membro, que anula o efeito útil das normas de concorrência aplicáveis às empresas?

    3)    No caso de se dever responder de modo negativo à questão 2), podem outras circunstâncias fazer com que a referida obrigatoriedade seja incompatível com o disposto no artigo 90.° do Tratado e, em caso afirmativo, quais?»

Quanto à admissibilidade

38.
    Os governos neerlandês e francês e a Comissão põem em dúvida a admissibilidade das questões colocadas, por estar ausente na decisão de reenvio a definição suficientemente precisa do quadro factual e regulamentar em que se inscreve o litígio. Na falta de exposição pormenorizada pelo órgão jurisdicional de reenvio da regulamentação aplicável ao litígio, das circunstâncias em que o Fundo foi criado

e das regras da sua gestão, o Tribunal de Justiça não pode fazer uma interpretação útil do direito comunitário e os Estados-Membros, bem como as demais partes interessadas, não têm a possibilidade de apresentar observações escritas propondo uma resposta às questões prejudiciais.

39.
    Deve recordar-se que, segundo jurisprudência constante, a necessidade de se chegar a uma interpretação do direito comunitário que seja útil ao órgão jurisdicional nacional exige que este defina o quadro factual e legal em que se inscrevem as questões que coloca ou que, pelo menos, explique as hipóteses factuais em que assentam essas questões. Estas exigência são particularmente válidas em certos domínios, como o da concorrência, caracterizados por situações de facto e de direito complexas (v., designadamente, acórdão de 26 de Janeiro de 1993, Telemarsicabruzzo e o., C-320/90 a C-322/90, Colect., p. I-393, n.os 6 e 7; de 14 de Julho de 1998, Safety Hi-Tech, C-284/95, Colect. p. I-4301, n.os 69 e 70, e Bettati, C-341/95, Colect. p. I-4355, n.os 67 e 68).

40.
    As informações fornecidas nas decisões de reenvio não servem apenas para permitir ao Tribunal de Justiça dar respostas úteis, mas também para dar aos Governos dos Estados-Membros, bem como às demais partes interessadas, a possibilidade de apresentarem observações nos termos do artigo 20.° do Estatuto CE do Tribunal de Justiça. Incumbe ao Tribunal garantir que esta possibilidade seja salvaguardada, tendo em conta o facto de, por força da disposição acima referida, apenas as decisões de reenvio serem notificadas às partes interessadas (ver, nomeadamente, despachos de 30 de Abril de 1998, Testa e Modesti, C-128/97 e C-137/97, Colect. p. I-2181, n.° 6, e de 11 de Maio de 1999, Anssens, C-325/98, ainda não publicado, n.° 8).

41.
    No caso vertente, resulta das observações apresentadas, nos termos do artigo 20.° do Estatuto CE do Tribunal de Justiça, pelos Governos dos Estados-Membros e pelas outras partes interessadas que as informações contidas nas decisões de reenvio lhes permitiram tomar posição de forma útil quanto às questões submetidas ao Tribunal de Justiça.

42.
    Além disso, nas suas observações, o Governo francês remete para as observações que apresentou nos processos Brentjens (acórdão hoje proferido, C-115/97 a C-117/97, ainda não publicado na Colectânea), nas quais se refere expressamente ao processo Drijvende Bokken (acórdão proferido neste mesmo dia, C-219/97, ainda não publicado na Colectânea), enquanto a Comissão evoca directamente este último processo nas suas observações. Ora, o despacho de reenvio no processo Drijvende Bokken, já referido, que diz respeito também à compatibilidade com as regras comunitárias da concorrência da inscrição obrigatória num fundo de pensões sectorial, contém uma exposição detalhada da regulamentação aplicável aos litígios do processo principal.

43.
    Além disso, embora os Governo neerlandês e francês tenham podido neste caso considerar que as informações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio não lhes permitiam tomar posição sobre certos aspectos das questões colocadas ao Tribunal de Justiça, importa sublinhar que estas informações foram completadas pelos elementos que resultavam do processo transmitido pelo órgão jurisdicional nacional, das observações escritas e das respostas às questões colocadas pelo Tribunal de Justiça. O conjunto destes elementos, referidos no relatório para audiência, foi levado ao conhecimento dos Governos dos Estados-Membros e das partes interessadas com vista à audiência, no decurso da qual essas entidades puderam, se o entendessem, completar as suas observações.

44.
    Finalmente, convém concluir que as informações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, completadas, na medida do necessário, pelos elementos já referidos, proporcionam ao Tribunal de Justiça um conhecimento bastante do quadro factual e regulamentar do litígio no processo principal para poder interpretar as regras comunitárias da concorrência com referência à situação que é objecto deste litígio.

45.
    Resulta do exposto que as questões são admissíveis.

Quanto à segunda questão

46.
    Pela segunda questão, que convém apreciar em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta essencialmente se os artigos 3.°, alínea g), do Tratado, 5.° do Tratado CE (actual 10.° CE) e 85.° do Tratado, se opõem a que as autoridades públicas tornem obrigatória, a pedido de organizações representativas de entidades patronais e de trabalhadores dum determinado sector, a inscrição num fundo de pensões sectorial.

47.
    A Albany alega que o pedido dos parceiros sociais no sentido de ser tornada obrigatória a inscrição num fundo de pensões sectorial constitui um acordo entre as empresas que operam no sector em questão, contrário ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.

48.
    Um acordo dessa natureza restringe a concorrência de dois pontos de vista. Por um lado, ao confiar a execução de um regime obrigatório a um único gestor, priva as empresas activas nesse sector de actividade da possibilidade de se inscreverem num regime de pensões alternativo gerido por outras companhias de seguros. Por outro lado, esse acordo exclui estas companhias de seguros de uma parte substancial do mercado do seguro de pensões.

49.
    As consequências de tal acordo para a concorrência são «sensíveis» na medida em que o mesmo respeita à totalidade do sector neerlandês dos têxteis. Estas consequências são reforçadas pelo efeito cumulativo ligado ao facto de a inscrição em regimes de pensões ter sido tornada obrigatória em vários sectores da economia e para todas as empresas destes sectores.

50.
    Além disso, tal acordo afecta o comércio entre os Estados-Membros, na medida em que respeita a empresas que têm uma actividade transfronteiriça e na medida em que priva as companhias de seguros estabelecidas noutros Estados-Membros da possibilidade de oferecerem nos Países Baixos um regime completo de pensões através ou de uma prestação de serviços transfronteiriça ou de filiais ou sucursais.

51.
    Por isso, entende a Albany que, ao criar um quadro legal e ao anuir ao pedido dos parceiros sociais para tornar obrigatória a inscrição num fundo de pensões sectorial, as autoridades públicas favoreceram ou reforçaram a aplicação e o funcionamento de acordos entre as empresas que operam nos sectores interessados, contrários ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, de forma que violaram os artigos 3.°, alínea g), 5.° e 85.° do Tratado.

52.
    A fim de responder à segunda questão, há que averiguar antes de mais se a decisão tomada pelas organizações representativas das entidades patronais e dos trabalhadores dum determinado sector, no quadro duma convenção colectiva, nos termos da qual é criado um único fundo de pensões encarregado da gestão dum regime complementar de pensões e se pede às autoridades que tornem obrigatória a inscrição neste fundo para todos os trabalhadores do referido sector é contrária ao artigo 85.° do Tratado.

53.
    Deve recordar-se desde já que o artigo 85.°, n.° 1, do Tratado proíbe todos os acordos entre empresas, todas as decisões de associações de empresas e todas as práticas concertadas que sejam susceptíveis de afectar o comércio entre os Estados-Membros e que tenham por objectivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado comum. A importância desta regra levou os autores do Tratado a prever expressamente, no n.° 2 do artigo 85.° do Tratado, que são nulos os acordos ou decisões proibidos pelo presente artigo.

54.
    Importa recordar em seguida que, nos termos do artigo 3.°, alíneas g) e i), do Tratado CE [que passou, após alteração, a artigo 3.°, n.° 1, alíneas g) e j), CE], a acção da Comunidade comporta não apenas um «regime que garanta que a concorrência não seja falseada no mercado interno», mas também «uma política social». O artigo 2.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 2.° CE) declara que a Comunidade tem como missão, nomeadamente, «promover o desenvolvimento harmonioso e equilibrado das actividades económicas» e «um elevado nível de emprego e de protecção social».

55.
    A este propósito, o artigo 118.° do Tratado CE (os artigos 117.° a 120.° do Tratado foram substituídos pelos artigos 136.° CE a 143.° CE) dispõe que cabe à Comissão promover uma colaboração estreita entre os Estados-Membros no domínio social, designadamente nas matérias relativas ao direito sindical e às negociações colectivas entre entidades patronais e trabalhadores.

56.
    O artigo 118.°-B (os artigos 117.° a 120.° do Tratado foram substituídos pelos artigos 136.° CE a 143.° CE) acrescenta que a Comissão se esforça por desenvolver o diálogo entre parceiros sociais a nível europeu, que pode conduzir, se estes últimos o entenderem desejável, a relações convencionais.

57.
    Além disso, o artigo 1.° do acordo sobre a política social (JO 1992, C 191, p. 91, a seguir «acordo sobre a política social») enuncia que a Comunidade e os Estados-Membros terão por objectivos, nomeadamente, a melhoria das condições de vida e de trabalho, uma protecção social adequada, diálogo entre parceiros sociais, o desenvolvimento dos recursos humanos tendo em vista um nível de emprego elevado e duradouro e a luta contra as exclusões.

58.
    Nos termos do artigo 4.°, n.os 1 e 2, do acordo sobre a política social, o diálogo entre parceiros sociais ao nível comunitário pode conduzir, se estes o entenderem desejável, a relações contratuais, incluindo acordos, cuja aplicação ocorre ou de acordo com os procedimentos e práticas próprios dos parceiros sociais e dos Estados-Membros, ou a pedido do conjunto das partes signatárias, com base numa decisão adoptada pelo Conselho, sob proposta da Comissão.

59.
    É verdade que alguns efeitos restritivos da concorrência são inerentes aos acordos colectivos concluídos entre organizações representativas das entidades patronais e dos trabalhadores. Todavia, os objectivos de política social prosseguidos por esses acordos ficariam seriamente comprometidos se os parceiros sociais estivessemsujeitos ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado na busca em comum de medidas destinadas a melhorar as condições de emprego e de trabalho.

60.
    Resulta, assim, de uma interpretação útil e coerente das disposições do Tratado, no seu conjunto, que acordos concluídos no âmbito de negociações colectivas entre parceiros sociais com vista a atingir esses objectivos devem ser consideradas, em razão da sua natureza e do seu objecto, como não abrangidas pelo artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.

61.
    Deve por isso apreciar-se se a natureza e o objecto do acordo em questão no processo principal justificam que o mesmo seja subtraído ao âmbito de aplicação do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.

62.
    No caso vertente, deve reconhecer-se, por um lado, que, a exemplo da categoria dos acordos acima referidos, gerados pelo diálogo social, o acordo em questão no processo principal foi concluído sob a forma de uma convenção colectiva e constitui o resultado de uma negociação colectiva entre as organizações representativas das entidades patronais e dos trabalhadores.

63.
    Por outro lado, no que toca ao seu objecto, o acordo em questão no processo principal aplica, num determinado sector, um regime complementar de pensões gerido por um fundo de pensões, no qual a inscrição pode ser tornada obrigatória. Esse regime visa, no seu conjunto, garantir um certo nível de pensão a todos os

trabalhadores deste sector e contribui, por isso, de forma indirecta, para a melhoria de uma das condições de trabalho dos trabalhadores, a saber, a sua remuneração.

64.
    Deve, pois, concluir-se que o acordo em questão no processo principal não é abrangido, em virtude da sua natureza e do seu objecto, pelo artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.

65.
    Convém recordar seguidamente que, tal como o Tribunal de Justiça já decidiu, designadamente no acórdão de 21 de Setembro de 1988, Van Eycke, (267/86, Colect., p. 4769, n.° 16), o artigo 85.° do Tratado, em si mesmo, apenas diz respeito ao comportamento das empresas e não visa as medidas legislativas ou regulamentares que emanam dos Estados-Membros. Resulta, todavia, de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que o artigo 85.° do Tratado, entendido em conjugação com o artigo 5.°, impõe aos Estados-Membros a obrigação de não tomarem ou não manterem em vigor medidas, de natureza legislativa ou regulamentar, susceptíveis de eliminar o efeito útil das regras da concorrência aplicáveis às empresas. É esse o caso, nos termos dessa jurisprudência, quando um Estado-Membro imponha ou favoreça a conclusão de acordos contrários ao artigo 85.° do Tratado ou reforce os efeitos de tais acordos, ou retire à sua própria regulamentação o seu carácter estatal delegando em operadores privados a responsabilidade de tomarem decisões de intervenção em matéria económica (v., também, acórdãos de 17 de Novembro de 1993, Meng, C-2/91, Colect., p. I-5751, n.° 14; de 17 de Novembro de 1993, Reiff, C-185/91, Colect., p. I-5801, n.° 14; de 17 de Novembro de 1993, Ohra Schadeverzekeringen, C-245/91, Colect., p. I-5851, n.° 10; de 18 de Junho de 1998, Comissão/Itália, C-35/96, Colect., p. I-3851, n.os 53 e 54, e Corsica Ferries France, C-266/96, Colect., p. I-3949, n.os 35, 36 e 49).

66.
    A este propósito, convém observar que o pedido feito às autoridades públicas pelos organismos representativos das entidades patronais e dos trabalhadores no sentido de tornar obrigatória a inscrição num fundo de pensões sectorial que eles instituíram se insere no regime previsto em vários direitos nacionais que visam o exercício do poder regulamentar no domínio social. Na medida em que o acordo em questão no processo principal não é abrangido pela disciplina do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, tal como resulta dos números 52 a 64 do presente acórdão, os Estados-Membros são livres de o tornar obrigatório a pessoas que não estão vinculadas por este.

67.
    Diga-se de passagem que o artigo 4.°, n.° 2, do acordo relativo à política social consagra expressamente, a nível comunitário, a possibilidade de os parceiros sociais pedirem conjuntamente ao Conselho a aplicação de acordos sociais.

68.
    A decisão das autoridades públicas de tornarem obrigatória a inscrição num tal fundo não pode, por isso, ser considerada como impondo ou favorecendo a

conclusão de acordos contrários ao artigo 85.° do Tratado ou reforçando os efeitos de tais acordos.

69.
    Resulta das considerações precedentes que a decisão das autoridades públicas de tornarem obrigatória a inscrição num fundo de pensões sectorial não é abrangida pelas categorias de medidas regulamentares que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, ofendem o efeito útil dos artigos 3.°, alínea g), 5.° e 85.° do Tratado.

70.
    Deve, por isso, responder-se à segunda questão que os artigos 3.°, alínea g), 5.° e 85.° do Tratado não se opõem a que as autoridades públicas tornem obrigatória, a pedido de organizações representativas de entidades patronais e de trabalhadores, a inscrição num fundo de pensões sectorial.

Quanto à primeira questão

71.
    Pela primeira questão, que convém apreciar em segundo lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta essencialmente se um fundo de pensões encarregado da gestão dum regime complementar de pensões, instituído por uma convenção colectiva celebrada entre as organizações representativas das entidades patronais e dos trabalhadores dum determinado sector de actividade e no qual foi tornada obrigatória a inscrição pelas autoridades para todos os trabalhadores deste sector, é uma empresa para efeitos do artigo 85.° do Tratado e seguintes.

72.
    Segundo o Fundo e os Governos intervenientes, um fundo desta natureza não constitui uma empresa na acepção dos artigos 85.° e seguintes do Tratado. A este propósito, recordam as diversas características do fundo de pensões sectorial e do regime complementar de pensões que o mesmo gere.

73.
    Em primeiro lugar, a inscrição obrigatória de todos os trabalhadores dum determinado sector num regime complementar de pensões tem uma função social essencial no sistema de pensões aplicável nos Países Baixos, em razão do montante extremamente reduzido da pensão legal, calculado com base no salário mínimo legal. Uma vez que um regime complementar de pensões foi estabelecido por convenção colectiva num determinado quadro pela lei e que a inscrição neste regime foi tornada obrigatória pelas autoridades públicas, o mesmo constitui um elemento do sistema neerlandês de protecção social e o fundo sectorial de pensões encarregado da sua gestão deve ser considerado como concorrendo para a gestão do serviço público de segurança social.

74.
    Em segundo lugar, o fundo de pensões sectorial não tem fins lucrativos. É gerido conjuntamente pelos parceiros sociais representados de forma paritária no seio do comité de gestão. O fundo de pensões sectorial recebe uma quotização média fixada pelo comité em função do equilíbrio ao nível colectivo entre o montante dos prémios, a importância das prestações e a extensão dos riscos. Além disso, as contribuições não podem ser inferiores a um certo nível, a fim de constituir

reservas adequadas e não pode exceder, a fim de preservar a ausência de fins lucrativos, um limite superior cujo respeito é assegurado pelos parceiros sociais e pela Câmara dos Seguros. Mesmo que as quotizações recebidas sejam aplicadas segundo o sistema de capitalização, esses investimentos são efectuados sob o controlo da Câmara dos Seguros e em conformidade com as disposições da PSW e do estatuto do fundo de pensões sectorial.

75.
    Em segundo lugar, o fundo de pensões sectorial funciona com base no princípio da solidariedade. Esta solidariedade manifesta-se pela obrigação de aceitar todos os trabalhadores sem exame médico prévio, pela continuação da constituição da pensão com dispensa de pagamento de contribuições em caso de incapacidade para o trabalho, pela tomada a cargo pelo fundo das contribuições atrasadas devidas pela entidade patronal em caso de falência desta última, bem como pela indexação do montante das pensões a fim de manter o seu valor. O princípio da solidariedade resulta também da ausência de equivalência a nível individual entre a contribuição paga, que é uma contribuição média e independente dos riscos, e os direitos a pensão, para cuja determinação é tomado em conta um salário médio. Essa solidariedade torna indispensável a inscrição obrigatória no regime complementar de pensões. Na falta dessa obrigatoriedade, o afastamento dos «bons» riscos teria um efeito de espiral negativa que poria em risco o equilíbrio financeiro do regime.

76.
    Tendo em conta o que precede, o Fundo e os Governos intervenientes consideram que o fundo de pensões sectorial constitui um organismo encarregado da gestão de um regime de segurança social, a exemplo dos organismos de que se tratava no acórdão de 17 de Fevereiro de 1993, Poucet e Pistre (C-159/91 e C-160/91, Colect., p. I-637), e contrariamente ao organismo em questão no acórdão de 16 de Novembro de 1995, Fédération française des sociétés d'assurance e o. (C-244/94, Colect., p. I-4013), que tinha sido considerado como uma empresa na acepção dos artigos 85.° e seguintes do Tratado.

77.
    Deve recordar-se que, no âmbito do direito da concorrência, o Tribunal de Justiça decidiu que o conceito de empresa abrange qualquer entidade que exerça uma actividade económica, independentemente do seu estatuto jurídico e modo de financiamento (ver, nomeadamente, acórdãos de 23 de Abril de 1991, Höfner e Elser, C-41/90, Colect. p. I-1979 , n.° 21; Poucet e Pistre, já referido, n.° 17, e Fédération Française des societés d'assurance e o., já referido, n.° 14).

78.
    Além disso, no referido acórdão Poucet e Pistre, o Tribunal de Justiça excluiu deste conceito os organismos encarregados da gestão de determinados regimes de segurança social obrigatórios, baseados no princípio da solidariedade. No regime de seguro de doença e de maternidade do sistema que lhe foi presente, as prestações eram, efectivamente, idênticas para todos os beneficiários, mas as contribuições eram proporcionais aos rendimentos; no regime de seguro de velhice, o financiamento das pensões de reforma era assegurado pelos trabalhadores em actividade; além disso, os direitos à pensão, fixados na lei, não eram proporcionais

às contribuições pagas no regime de seguro de velhice; por último, os regimes excedentários participavam no financiamento dos regimes que tinham dificuldades financeiras estruturais. Esta solidariedade implicava necessariamente que os diversos regimes fossem geridos por um organismo único e que a inscrição nos mesmos fosse obrigatória.

79.
    Pelo contrário, no acórdão Fédération Française des societés d'assurance e o., já referido, o Tribunal declarou que um organismo sem fins lucrativos, que gere um regime de seguro de velhice destinado a completar um regime de base obrigatório, instituído pela lei a título facultativo e funcionando segundo o princípio da capitalização, constitui uma empresa na acepção dos artigos 85.° e seguintes do Tratado. A inscrição facultativa, a aplicação do princípio da capitalização e o facto de as prestações dependerem unicamente do montante das contribuições pagas pelos beneficiários, bem como dos resultados financeiros dos investimentos efectuados pelo organismo gestor implicavam que esse organismo exercia uma actividade económica em concorrência com as companhias de seguros de vida. Nem a prossecução de uma finalidade de carácter social, nem a ausência de fins lucrativos, nem as exigências de solidariedade, nem as outras regras relativas designadamente às restrições que sofre o organismo gestor na realização dos investimentos retiravam à actividade exercida por esse organismo a natureza de actividade económica.

80.
    É à luz destas considerações que deve ser apreciada a questão de saber se o conceito de empresa, na acepção dos artigos 85.° e seguintes do Tratado, se refere a um organismo como o que está em causa no processo principal.

81.
    A este propósito, convém observar que o fundo de pensões sectorial determina ele próprio o montante das contribuições e das prestações e que o fundo funciona segundo o princípio da capitalização.

82.
    Por isso, contrariamente às prestações fornecidas pelos organismos encarregados da gestão dos regimes obrigatórios de segurança social a que se refere o acórdão Poucet e Pistre, já referido, o montante das prestações fornecidas pelo fundo depende dos resultados financeiros das aplicações que efectua e relativamente às quais está sujeito, a exemplo de uma companhia de seguros, ao controlo da Câmara dos Seguros.

83.
    Além disso, tal como resulta do artigo 5.° BPW e dos artigos 1.° e 5.° das instruções relativas à dispensa de inscrição, um fundo de pensões sectorial tem a obrigação de conceder uma dispensa a uma empresa quando esta já assegurava aos seus trabalhadores, pelo menos seis meses antes da apresentação do pedido mediante o qual a inscrição no fundo foi tornada obrigatória, um regime de pensões que lhes conferia direitos pelo menos equivalentes aos que adquiririam no caso de inscrição no fundo. Além disso, nos termos do artigo 1.° das instruções já referidas, este fundo tem também a faculdade de conceder uma dispensa a uma empresa quando esta assegura aos seus trabalhadores um regime de pensões que lhes confere

direitos pelo menos equivalentes aos que decorrem do fundo, desde que, em caso de retirada do fundo, seja proposta uma compensação julgada razoável pela Câmara dos Seguros para o eventual prejuízo sofrido pelo fundo, do ponto de vista da técnica dos seguros, como consequência dessa retirada.

84.
    Daí resulta que um fundo de pensões sectorial, como o que está em causa no processo principal, exerce uma actividade económica em concorrência com as companhias de seguros.

85.
    Nestas condições, a ausência de fins lucrativos bem como os elementos de solidariedade avançados pelo Fundo e pelos Governos intervenientes não são suficientes para retirar ao fundo de pensões sectorial a sua qualidade de empresa na acepção das regras da concorrência do Tratado.

86.
    É certo que a prossecução de uma finalidade social, os elementos de solidariedade já referidos, bem como as restrições ou controlos relativos aos investimentos realizados pelo fundo de pensões sectorial podem tornar o serviço fornecido por este fundo menos competitivo que o serviço comparável fornecido pelas companhias de seguros. Embora esses obstáculos não impeçam que se considere a actividade exercida pelo fundo como uma actividade económica, podem justificar o direito exclusivo desse organismo de gerir um regime complementar de pensões.

87.
    Deve, pois, responder-se à primeira questão que um fundo de pensões encarregado da gestão dum regime complementar de pensões, instituído por uma convenção colectiva celebrada entre as organizações representativas das entidades patronais e dos trabalhadores dum determinado sector e no qual a inscrição foi tornada obrigatória pelas autoridades para todos os trabalhadores deste sector é uma empresa na acepção do artigo 85.° e seguintes do Tratado.

Quanto à terceira questão

88.
    Através da terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 86.° e 90.° do Tratado se opõem a que as autoridades públicas confiram a um fundo de pensões o direito exclusivo de gerir num determinado sector um regime complementar de pensões.

89.
    O Governo neerlandês alega que o decreto que torna a inscrição obrigatória tem por único efeito obrigar os trabalhadores do sector em questão a inscreverem-se no Fundo. Este decreto não confere ao fundo o direito exclusivo no domínio das pensões complementares. O Fundo também não dispõe de uma posição dominante na acepção do artigo 86.° do Tratado.

90.
    Convém observar antes de mais que a decisão das autoridades públicas de tornar obrigatória, como no caso dos autos, a inscrição num fundo de pensões sectorial implica necessariamente a concessão a este fundo do direito exclusivo de recolher

e gerir as contribuições pagas com vista à constituição dos direitos a pensão. Esse fundo deve por isso ser considerado como uma empresa, investida pelas autoridades públicas de direitos exclusivos, na acepção do artigo 90.°, n.° 1, do Tratado.

91.
    Deve recordar-se em seguida que é jurisprudência constante que uma empresa que beneficie de um monopólio legal sobre uma parte substancial do mercado comum pode ser considerada como ocupando uma posição dominante na acepção do artigo 86.° do Tratado (v. acórdãos de 10 de Dezembro de 1991, Merci convenzionali porto di Genova, C-179/90, Colect., p. I-5889, n.° 14, e de 13 de Dezembro de 1991, GB-Inno-BM, C-18/88, Colect., p. I-5941, n.° 17).

92.
    Um fundo de pensões sectorial, como o que está em causa no processo principal, que dispõe do direito exclusivo de gerir um regime complementar de pensões num sector industrial num Estado-Membro e, por essa via, numa parte substancial do mercado comum, pode, por conseguinte, ser considerado como ocupando uma posição dominante na acepção do artigo 86.° do Tratado.

93.
    Deve, contudo, acrescentar-se que o simples facto de criar uma posição dominante através da concessão de direitos exclusivos, na acepção do artigo 90.°, n.° 1, do Tratado, não é, por si só, incompatível com o artigo 86.° do Tratado. Um Estado-Membro só viola as proibições estabelecidas nestas duas disposições quando a empresa em causa seja levada, pelo simples exercício dos direitos exclusivos que lhe foram atribuídos, a explorar a sua posição dominante de modo abusivo ou quando esses direitos possam criar uma situação em que essa empresa seja levada a cometer esses abusos (acórdãos Höfner e Elser, já referido, n.° 29; de 18 de Junho de 1991, ERT, C-260/89, Colect. p. I-2925, n.° 37; Merci convenzionali porto di Genova, já referido, n.os 16 e 17; de 5 de Outubro de 1994, Centre d'insémination de la Crespelle, C-323/93, Colect., p. I-5077, n.° 18, e de 12 de Fevereiro de 1998, Raso e o., C-163/96, Colect. p. I-533, n.° 27).

94.
    A Albany alega a este propósito que o sistema de inscrição obrigatória num regime complementar de pensões gerido pelo Fundo é contrário às disposições conjugadas dos artigos 86.° e 90.° do Tratado. As prestações de pensões oferecidas pelo Fundo não correspondem ou já não correspondem às necessidades das empresas. Estas prestações são muito baixas, não têm relação com os salários e, por conseguinte, estão sistematicamente inadequadas. As entidades patronais devem, por isso, prever outras disposições em matéria de pensões. Ora, o sistema de inscrição obrigatória privaria estas entidades patronais da possibilidade de subscreverem junto de uma companhia de seguros uma cobertura global em matéria de pensões. A subscrição de vários regimes de pensões junto de várias companhias de seguros acresceria os encargos administrativos e diminuiria a eficácia.

95.
    Deve recordar-se que, no acórdão Höfner e Elser, já referido, n.° 34, O Tribunal de Justiça decidiu que um Estado-Membro que tenha conferido a um organismo público o direito exclusivo ao exercício da actividade de colocação de mão-de-obra

viola o artigos 90.°, n.° 1, do Tratado, no caso de daí resultar uma situação em que o referido organismo é necessariamente levado a transgredir o artigo 86.° do Tratado, nomeadamente porque o mesmo não está manifestamente em condições de satisfazer a procura existente no mercado para este género de actividades.

96.
    No caso vertente, importa observar que o regime complementar de pensões proposto pelo Fundo se baseia na norma actual nos Países Baixos, a saber, que todo o trabalhador que tenha pago contribuições durante o período máximo de inscrição no referido regime obtém uma pensão, incluindo a que é concedida ao abrigo da AOW, igual a 70% do seu último salário.

97.
    É verdade que certas empresas do sector podiam querer assegurar aos seus trabalhadores um regime de pensões que vá além do proposto pelo Fundo. A impossibilidade destas empresas de confiarem a gestão de tal regime de pensões a uma única seguradora e a restrição da concorrência que daí resulta decorrem, todavia, directamente do direito exclusivo conferido ao fundo sectorial de pensões.

98.
    Deve, pois, apreciar-se se, tal como sustenta o Fundo, o Governo neerlandês e a Comissão, o direito exclusivo do fundo de pensões sectorial de gerir pensões complementares num sector determinado e a restrição da concorrência que daí resulta podem justificar-se nos termos do artigo 90.°, n.° 2, do Tratado, enquanto medida necessária ao cumprimento de uma missão social particular de interesse geral de que este fundo está encarregado.

99.
    A Albany alega que a inscrição obrigatória no fundo de pensões sectorial não é necessária para assegurar um nível adequado de pensão para os trabalhadores. Esse objectivo podia ser atingido pela fixação de exigências mínimas a que as pensões deveriam obedecer, seja pelos parceiros sociais sob instigação das autoridades públicas, seja directamente pelas autoridades públicas. As convenções colectivas de trabalho prevêem regularmente a obrigação de as entidades patronais assegurarem um regime mínimo de pensões, deixando-lhes ao mesmo tempo a liberdade de instituírem um fundo de pensões próprio de cada empresa, de se inscreverem num fundo de pensões sectorial ou de se dirigirem a uma companhia de seguros.

100.
    Segundo a Albany, o pagamento de um «prémio médio» também não justifica a inscrição obrigatória. Por um lado, nem a BPW nem o decreto que torna a inscrição obrigatória exigem um sistema baseado num prémio dessa natureza. Por outro lado, diversos fundos de pensões sectoriais em que a inscrição não é obrigatória funcionam perfeitamente com base num sistema de «prémio médio».

101.
    Quanto à aceitação de todos os trabalhadores do mesmo sector de actividade sem exame médico prévio a fim de os «maus» riscos não poderem ser recusados, a Albany observa que, na prática, os contratos de seguro de pensões concluídos com seguradoras prevêem a obrigação de a entidade patronal declarar todos os seus

trabalhadores bem como a da seguradora de aceitar sem exame médico prévio qualquer trabalhador declarado.

102.
    Importa recordar antes de mais que, nos termos do artigo 90.°, n.° 2, do Tratado, as empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral estão sujeitas às regras da concorrência, na medida em que a aplicação destas regras não constitua obstáculo ao cumprimento, de direito ou de facto, da missão particular que lhes foi confiada.

103.
    Ao permitir, sob certas condições, desvios às regras gerais do Tratado, o n.° 2 do artigo 90.° do Tratado visa conciliar os interesses dos Estados-Membros em utilizar certas empresas, nomeadamente do sector público, como instrumentos de política económica ou social, com o interesse da Comunidade em que sejam respeitadas as regras da concorrência e preservada a unidade do mercado comum (acórdãos de 19 de Março de 1991, França/Comissão, C-202/88, Colect., p. I-1223, n.° 12, e de 23 de Outubro de 1997, Comissão/Países Baixos, C-157/94, Colect. p. I-5699, n.° 39).

104.
    Tendo em conta o interesse dos Estados-Membros definido nestes termos, não pode ser-lhes proibido terem em consideração, quando definem os serviços de interesse económico geral que confiam a determinadas empresas, objectivos próprios da sua política nacional, nem que tentem realizá-los através de obrigações e imposições a cargo dessas mesmas empresas (acórdão Comissão/Países Baixos, já referido, n.° 40).

105.
    Ora, o regime complementar de pensões em causa no processo principal preenche uma função social essencial no sistema de pensões nos Países Baixos, em virtude do montante reduzido da pensão legal, calculado com base no salário mínimo legal.

106.
    Além disso, a importância da função social reconhecida às pensões complementares foi recentemente reconhecida pela adopção, pelo legislador comunitário, da Directiva 98/49/CE do Conselho, de 29 de Junho de 1998, relativa à salvaguarda dos direitos a pensão complementar dos trabalhadores assalariados e independentes que se deslocam no interior da Comunidade (JO L 209, p. 46).

107.
    Convém recordar seguidamente que, para que as condições de aplicação do artigo 90.°, n.° 2, do Tratado se encontrem reunidas, não é necessário que o equilíbrio financeiro ou a viabilidade económica da empresa encarregada da gestão de um serviço de interesse económico geral sejam ameaçados. Basta que, sem os direitos contestados, se obste ao cumprimento das missões particulares confiadas à empresa, tal como estas são definidas pelas obrigações e imposições que sobre ela impendem (acórdão Comissão/Países Baixos, já referido, n.° 52), ou que a manutenção de tais direitos seja necessária para permitir ao seu titular cumprir as missões de interesse geral que lhe foram confiadas, em condições economicamente aceitáveis (acórdãos de 19 de Maio de 1993, Corbeau, C-320/91, Colect. p. I-2533, n.os 14 a 16, e Comissão/Países Baixos, já referido, n.° 53).

108.
    Ora, em caso de supressão do direito exclusivo do fundo de gerir o regime complementar de pensões para todos os trabalhadores de um determinado sector, as empresas que empregam pessoal jovem e de boa saúde, que exerça actividades que não são perigosas, procurariam condições de seguro mais vantajosas junto de seguradoras privadas. O abandono progressivo dos «bons» riscos deixaria ao fundo de pensões sectorial a gestão de uma parte crescentes de «maus» riscos, provocando assim uma alta do custo das pensões dos trabalhadores, nomeadamente dos das pequenas e médias empresas que dispõem de pessoal já idoso que exerce actividades perigosas, às quais o fundo já não poderia propor pensões a um custo aceitável.

109.
    Seria tanto mais este o caso quanto, como acontece no processo principal, o regime complementar de pensões gerido exclusivamente pelo Fundo se caracteriza por um elevado grau de solidariedade, em razão, nomeadamente, da independência das contribuições em relação ao risco, da obrigação de aceitar todos os trabalhadores sem exame médico prévio, da continuação da constituição da pensão com dispensa do pagamento de contribuições em caso de incapacidade para o trabalho, da tomada a cargo pelo Fundo das contribuições atrasadas devidas pela entidade patronal em caso de falência desta última bem como da indexação dos montantes das pensões a fim de manter o seu valor.

110.
    Com efeito, estas contrariedades que tornam o serviço fornecido pelo Fundo menos competitivo do que um serviço comparável fornecido por companhias de seguros contribuem para justificar o direito exclusivo desse Fundo de gerir um regime de pensões complementar.

111.
    Resulta do exposto que a supressão do direito exclusivo conferido ao Fundo poderia conduzir à impossibilidade de um Fundo dessa natureza cumprir as missões de interesse económico geral que lhe foram atribuídas em condições economicamente aceitáveis e pôr em risco o seu equilíbrio financeiro.

112.
    Referindo-se ao acórdão GB-Inno-BM, já referido, a Albany considera, todavia, que o facto de o Fundo ter a dupla qualidade de gestor do regime de pensões e de autoridade titular do poder de conceder as dispensas, poderia dar lugar ao exercício injusto do poder de dispensa.

113.
    Deve notar-se que, no acórdão GB-Inno-BM, já referido, n.° 28, o Tribunal de Justiça declarou que os artigos 3.°, alínea g), 86.° e 90.° do Tratado se opõem a que um Estado-Membro confira à empresa que explora a rede pública de telecomunicações o poder de estabelecer normas relativas aos aparelhos telefónicos e verificar o seu cumprimento pelos operadores económicos, quando ela seja concorrente destes operadores no mercado desses aparelhos.

114.
    No n.° 25 deste último acórdão, o Tribunal de Justiça considerou, com efeito, que a acumulação, no âmbito de uma tal sociedade, dos poderes, por um lado, de

autorizar ou recusar a ligação dos aparelhos telefónicos à rede e, por outro lado, de estabelecer as normas técnicas que deviam ser preenchidas por estes equipamentos e verificar se os aparelhos não produzidos por ela estavam em conformidade com as especificações que ela tinha adoptado equivalia conferir-lhe o poder de determinar, à sua discrição, os aparelhos terminais que eram susceptíveis de ser ligados à rede pública e conceder-lhe assim uma vantagem evidente sobre os concorrentes.

115.
    Ora, a situação em causa no processo principal apresenta diferenças em relação à que foi objecto do acórdão GB-Inno-BM, já referido.

116.
    Com efeito, convém observar, antes de mais, que, por força do artigo 5.°, n.° 1, das instruções relativas à dispensa de inscrição, um fundo de pensões sectorial tem a obrigação de conceder dispensa a uma empresa quando esta já assegurava aos seus trabalhadores, pelo menos seis meses antes da apresentação do pedido mediante o qual a inscrição no fundo foi tornada obrigatória, um regime de pensões que lhes conferia direitos pelo menos equivalentes aos que adquiririam em caso de inscrição no fundo.

117.
    Uma vez que a disposição já referida vincula o fundo de pensões sectorial quando ao exercício do seu poder de dispensa, a mesma já não pode ser considerada como susceptível de conduzir o fundo a abusar deste poder. O fundo limita-se, com efeito, neste caso, a verificar que as condições decididas pelo ministro competente estão reunidas (v., neste sentido, o acórdão de 27 de Outubro de 1993, Lagauche e o., C-46/90 e C-93/91, Colect., p. I-5267, n.° 49).

118.
    Convém em seguida observar que, nos termos do artigo 1.° das instruções relativas à dispensa de inscrição, um fundo de pensões sectorial tem a faculdade de conceder uma dispensa a uma empresa quando esta assegura aos seus trabalhadores um regime de pensões que lhes confere direitos pelo menos equivalentes aos que decorrem do fundo, desde que, no caso de afastamento do fundo, seja proposta uma compensação julgada razoável pela Câmara dos Seguros, relativa ao eventual prejuízo sofrido pelo fundo, do ponto de vista da técnica dos seguros, como consequência desse afastamento.

119.
    A disposição referida permite, assim, ao fundo de pensões sectorial dispensar da obrigação de inscrição uma empresa que assegure aos seus trabalhadores um regime de pensões equivalente ao que ele gere, se tal dispensa não puser em perigo o seu equilíbrio financeiro. O exercício deste poder de dispensa comporta uma avaliação complexa dos dados relativos aos regimes de pensão em presença e ao equilíbrio financeiro do fundo, que implica necessariamente um largo poder discricionário.

120.
    Tendo em conta a complexidade desta avaliação bem como os riscos que a concessão de dispensas comporta para o equilíbrio financeiro do fundo de pensões sectorial e, portanto, para o cumprimento da missão social que lhe foi atribuída,

um Estado-Membro pode considerar que o poder de dispensa não deve ser atribuído a uma entidade distinta.

121.
    Convém, todavia, observar que os órgãos jurisdicionais nacionais a quem seja submetido, como no caso presente, uma impugnação relativa a uma obrigação de pagar contribuições devem exercer um controlo sobre a decisão do fundo que recusa uma dispensa de inscrição, que lhes permita pelo menos verificar que este fundo não fez um uso arbitrário da sua faculdade de conceder uma dispensa e que o princípio da não discriminação bem como as outras condições ligadas à legalidade desta decisão foram respeitadas.

122.
    Finalmente, quanto ao argumento da Albany segundo o qual um nível adequado de pensão para os trabalhadores podia ser assegurado pela fixação de exigências mínimas a que as pensões oferecidas pelas companhias de segurança deveriam obedecer, deve sublinhar-se que, dada a função social dos regimes complementares de pensões e a margem de apreciação de que dispõem os Estados-Membros, segundo jurisprudência constante, para organizar os seus sistemas de segurança social (acórdãos de 7 de Fevereiro de 1984, Duphar e o., 238/82, Recueil, p. 523, n.° 16; Poucet e Pistre, já referido, n.° 6, e de 17 de Junho de 1997, Sodemare e o., C-70/95, Colect., p. I-3395, n.° 27), compete a cada Estado-Membro apreciar se, tendo em conta as particularidades do seu sistema nacional de pensões, a fixação de exigências mínimas lhe permitiria ainda assegurar o nível de pensões que visa garantir num sector ao tornar obrigatória a inscrição num fundo de pensões.

123.
    Deve, pois, responder-se à terceira questão que os artigos 86.° e 90.° do Tratado não se opõem a que as autoridades confiram a um fundo de pensões o direito exclusivo de gerir, em determinado sector de actividade, um regime complementar de pensões.

Quanto às despesas

124.
    As despesas efectuadas pelos governos neerlandês, alemão, francês e sueco, e pela Comissão, apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Kantongerecht te Arnhem, por decisão de 4 de Março de 1996, declara:

1.
    Os artigos 3.°, alínea g), do Tratado CE [que passou, após alteração, a artigo 3.°, n.° 1, alínea g), CE], 5.° e 85.° do Tratado CE (actuais artigos 10.° CE e 81.° CE) não se opõem a que as autoridades públicas tornem obrigatória, a pedido das organizações representativas das entidades patronais e dos trabalhadores dum determinado sector, a inscrição num fundo de pensões sectorial.

2.
    Um fundo de pensões encarregado da gestão dum regime complementar de pensões, instituído por uma convenção colectiva celebrada entre as organizações representativas das entidades patronais e dos trabalhadores dum determinado sector e no qual a inscrição foi tornada obrigatória pelas autoridades para todos os trabalhadores deste sector, é uma empresa na acepção do artigo 85.° e seguintes do Tratado.

3.
    Os artigos 86.° e 90.° do Tratado CE (actuais artigos 82.° CE e 86.° CE) não se opõem a que as autoridades confiram a um fundo de pensões o direito exclusivo de gerir, em determinado sector de actividade, um regime complementar de pensões.

Rodríguez Iglesias
Puissochet
Hirsch

Jann

Moitinho de Almeida
Gulmann

Murray

Edward
Ragnemalm

        Sevón                        Wathelet

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 21 de Setembro de 1999.

O secretário

O presidente

R. Grass

G. C. Rodríguez Iglesias


1: Língua do processo: neerlandês.