Language of document : ECLI:EU:C:2023:651

CONCLUSÕES DA ADVOGADA‑GERAL

LAILA MEDINA

apresentadas em 7 de setembro de 2023 (1)

Processo C291/22 P

Debregeas et associés Pharma (D & A Pharma)

contra

Comissão Europeia,

Agência Europeia de Medicamentos (EMA)

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Medicamentos para uso humano — Pedido de autorização de introdução no mercado — Tramitação do procedimento na Agência Europeia de Medicamentos (EMA) — Comité dos medicamentos para uso humano (CHMP) — Consulta de um grupo de aconselhamento científico (GAC) ou de um grupo de peritos ad hoc — Regulamento n.o 726/2004 — Artigos 56.o e 62.o — Orientações sobre o procedimento de revisão — Independência dos peritos — Artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Direito a uma boa administração — Exigência de imparcialidade objetiva — Critérios para verificar a inexistência de conflitos de interesses — Serviços de consultoria para outra empresa farmacêutica»






I.      Introdução

1.        As presentes conclusões são respeitantes a um recurso interposto pela sociedade farmacêutica D & A Pharma, recorrente no presente processo, destinado à anulação do Acórdão de 2 de março de 2022, D & A Pharma/Comissão e EMA (T‑556/20, a seguir «acórdão recorrido», EU:T:2022:111).

2.        Com este acórdão, o Tribunal Geral negou provimento ao recurso em que a recorrente pedia a anulação da Decisão de Execução da Comissão, de 6 de julho de 2020, que recusa a autorização de introdução no mercado do medicamento para uso humano Hopveus — oxibato de sódio, ao abrigo do Regulamento (CE) n.o 726/2004 (2) (a seguir «decisão controvertida»).

3.        Em particular, o Tribunal Geral considerou, por um lado, que a decisão controvertida não tinha sido adotada no termo de um procedimento irregular na Agência Europeia de Medicamentos (EMA), nomeadamente no que se refere à escolha do grupo de peritos responsável pela revisão do pedido de autorização de introdução no mercado apresentado pela recorrente. Por outro lado, o Tribunal Geral considerou que o procedimento não tinha sofrido nenhum vício decorrente de uma dúvida legítima quanto à imparcialidade dos peritos no decurso da referida revisão.

4.        O presente recurso dá ao Tribunal de Justiça a oportunidade de precisar a margem de apreciação de que dispõe o Comité dos Medicamentos para Uso Humano (CHMP) da EMA para convocar grupos de aconselhamento científico (a seguir «GAC») ou, em alternativa, grupos de peritos ad hoc durante o procedimento de revisão de um pedido de autorização de introdução no mercado (a seguir «AIM»). Este procedimento permite igualmente que o Tribunal de Justiça se pronuncie sobre as condições de imparcialidade objetiva aplicáveis aos membros dos grupos envolvidos na revisão dos pedidos de AIM, especialmente quando prestam serviços de consultoria para outras empresas farmacêuticas (3).

II.    Factos na origem do litígio e processo principal

A.      Antecedentes do litígio

5.        O Tribunal Geral expôs os antecedentes do litígio nos n.os 2 a 12 do acórdão recorrido e estes podem, para efeitos das presentes conclusões, ser resumidos do seguinte modo.

6.        Em 26 de junho de 2018, a recorrente apresentou um pedido de AIM condicional à EMA para o medicamento Hopveus — oxibato de sódio (a seguir «medicamento Hopveus») ao abrigo do Regulamento (CE) n.o 507/2006 (4), no âmbito de um procedimento centralizado.

7.        O medicamento Hopveus, que contém como substância ativa o oxibato de sódio, visa tratar a dependência do álcool, uma doença que, nos termos dos antecedentes descritos pelo Tribunal Geral, é geralmente definida como uma perturbação psiquiátrica com efeitos adversos no domínio físico, mental e psicológico, com graves repercussões sociais e probabilidade de recidiva crónica.

8.        Em 17 de outubro de 2019, o CHMP emitiu um parecer inicial desfavorável sobre o pedido supramencionado, com o fundamento de que a eficácia do medicamento Hopveus não se encontrava suficientemente demonstrada.

9.        Em 29 de outubro de 2019, na sequência do parecer negativo emitido pelo CHMP, a recorrente requereu a revisão do mesmo, em conformidade com o artigo 9.o, n.o 2, do Regulamento n.o 726/2004.

10.      Em resposta às observações do CHMP, a recorrente apresentou as seguintes indicações terapêuticas revistas: por um lado, a manutenção da abstinência em pacientes viciados em álcool sob estrita vigilância médica, apoio psicossocial e reinserção social contínua e, por outro, o tratamento da síndrome de abstinência alcoólica, simples ou com perturbações do conhecimento.

11.      A recorrente também requereu formalmente a consulta do grupo de aconselhamento científico especializado na área da psiquiatria (a seguir «GAC Psiquiatria») pelo CHMP. Todavia, para efeitos da revisão, o CHMP convocou um grupo de peritos ad hoc em vez desse GAC Psiquiatria.

12.      Na sequência de um novo parecer desfavorável do CHMP, datado de 30 de abril de 2020, o pedido de AIM da recorrente foi indeferido pela decisão controvertida, com fundamento, nomeadamente, na falta de demonstração da eficácia do medicamento Hopveus.

B.      Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

13.      A recorrente interpôs recurso de anulação da decisão controvertida contra a Comissão Europeia e contra a EMA.

14.      Em apoio do seu recurso, invocou seis fundamentos. Os três primeiros fundamentos eram relativos a irregularidades processuais por parte da EMA, ao passo que o quarto a sexto fundamentos eram relativos a um erro de direito, a erros manifestos de apreciação e a violações do princípio da igualdade de tratamento.

15.      No acórdão recorrido, o Tribunal Geral julgou esses fundamentos improcedentes e negou provimento ao recurso na íntegra.

16.      Nos n.os 21 e 22 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral constatou que a decisão controvertida provinha da Comissão e que, consequentemente, o recurso era inadmissível, uma vez que era dirigido contra a EMA. Por conseguinte, embora o Tribunal Geral não tenha apreciado os fundamentos do recurso a não ser na medida em que este era dirigido contra a Comissão, analisou, todavia, a regularidade do procedimento na EMA, dado que a Comissão se baseou no parecer do CHMP, que é parte integrante da EMA.

17.      Quanto ao primeiro fundamento do recurso, relativo a uma irregularidade processual resultante de o CHMP ter convocado um grupo de peritos ad hoc e não o GAC Psiquiatria, o Tribunal Geral começou por indicar, no n.o 49 do acórdão recorrido, que, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a EMA, ao adotar as orientações sobre o procedimento de revisão dos pareceres do CHMP (5), se autolimitou no exercício do seu poder de apreciação.

18.      Em seguida, o Tribunal Geral constatou, nos n.os 50 e 51 do acórdão recorrido, que resulta do ponto 6.1 das orientações sobre o procedimento de revisão, em conjugação com o artigo 11.o do Regulamento Interno do CHMP (6), e com os artigos 56.o, n.o 2, e 62.o, n.o 1, último período, do Regulamento n.o 726/2004, que o CHMP deve consultar um GAC quando, no âmbito de um procedimento de revisão, o requerente de AIM faça esse pedido, o que não implica, no entanto, que o requerente tenha o direito de escolher o tipo de grupo de peritos. Esta escolha depende da disponibilidade ou indisponibilidade de um GAC no setor em causa e da questão de saber se o contributo científico deste é o mais adequado.

19.      O Tribunal Geral acrescentou, no n.o 58 do acórdão recorrido, que, de qualquer modo, a recorrente não tinha demonstrado em que medida a consulta do GAC Psiquiatria, eventualmente complementada por outros peritos, em vez da convocação de um grupo de peritos ad hoc que inclui, nomeadamente, membros deste GAC, poderia ter conduzido a um resultado diferente do procedimento de revisão.

20.      No que respeita ao segundo fundamento do recurso, relativo a uma falta de imparcialidade de dois membros (A e B) do grupo de peritos ad hoc, o Tribunal Geral, nos n.os 88 a 92 do acórdão recorrido, recordou a jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre o direito a uma boa administração, consagrado no artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que inclui, nomeadamente, a exigência de imparcialidade.

21.      Nos n.os 93 a 96 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral recordou o texto do artigo 63.o, n.o 2, do Regulamento n.o 726/2004 e constatou que, em conformidade com esta disposição, a EMA adotou a Política de 6 de outubro de 2016 (7), que, no que se refere à avaliação de produtos farmacêuticos, precisa o alcance da exigência de imparcialidade com vista a um justo equilíbrio entre a prevenção de conflitos de interesses e a prestação dos melhores serviços de peritagem. Além disso, no n.o 97 do referido acórdão, o Tribunal Geral constatou que a recorrente não alegava que os dois peritos em causa tinham manifestado ideias preconcebidas ou um juízo antecipado pessoal. O Tribunal Geral considera, assim, que o segundo fundamento deve ser visto como visando demonstrar uma inobservância da exigência de imparcialidade objetiva, resultante de conflitos de interesses. Ora, o Tribunal Geral, nos n.os 99 a 123 do acórdão recorrido, julgou improcedentes as alegações de um conflito de interesses relativo respetivamente a A e a B nos termos da Política da EMA.

22.      Por último, uma vez que a recorrente alegava igualmente que a Política de 6 de outubro de 2016 era insuficiente para garantir a imparcialidade dos peritos participantes no procedimento de revisão, o Tribunal Geral precisou, nos n.os 124 a 136 do acórdão recorrido, que, independentemente desta questão, as atividades de A e B não eram suscetíveis de criar uma dúvida legítima quanto à sua imparcialidade. A este respeito, o Tribunal Geral acrescentou que as conclusões do grupo de peritos ad hoc convocado para a revisão relativa ao medicamento Hopveus foram adotadas colegialmente por dez membros e que, segundo a jurisprudência, a colegialidade constitui uma garantia de imparcialidade, mais ainda quando, como no presente caso, os peritos cuja imparcialidade era posta em causa não exerciam funções de direção ou de coordenação que lhes permitissem ter uma influência preponderante na tramitação ou no resultado do procedimento.

III. Pedidos das partes

23.      Com o seu recurso, a recorrente conclui pedindo que o Tribunal de Justiça se digne:

–        anular o acórdão recorrido;

–        decidir definitivamente o recurso interposto no Tribunal Geral, anulando a decisão controvertida; e

–        condenar a Comissão e a EMA nas despesas.

24.      A Comissão e a EMA concluem pedindo ao Tribunal de Justiça se digne:

–        negar provimento ao presente recurso, e

–        condenar a recorrente nas despesas.

IV.    Análise jurídica

25.      Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca dois fundamentos destinados a pôr em causa a apreciação do Tribunal Geral quanto à regularidade do procedimento de revisão conduzido pela EMA na adoção da decisão controvertida. O primeiro fundamento é relativo a um erro de direito do Tribunal Geral ao declarar que a decisão de não convocar o GAC Psiquiatria não era ilegal; o segundo, a um erro de direito do Tribunal Geral na análise relativa à exigência de imparcialidade objetiva dos peritos A e B.

26.      A título preliminar, recorde‑se, à semelhança dos n.os 25 a 30 do acórdão recorrido, que a EMA, instituída pelo Regulamento n.o 726/2004, tem como missão principal a proteção e a promoção da saúde pública e animal através da avaliação e da supervisão dos medicamentos para uso humano e veterinário. Segundo o artigo 57.o, n.o 1, deste regulamento, a EMA fornece aos Estados‑Membros e às instituições da União os «melhores pareceres científicos possíveis» sobre qualquer questão relativa à avaliação da qualidade, da segurança e da eficácia dos medicamentos para uso humano ou veterinário que lhe seja apresentada. É, nomeadamente, responsável pela coordenação da avaliação científica da qualidade, da segurança e da eficácia dos medicamentos objeto de procedimentos de AIM na União.

27.      No que se refere aos pedidos de AIM de medicamentos para uso humano na União, apresentados ao abrigo do procedimento centralizado previsto pelo Regulamento n.o 726/2004, este procedimento pressupõe que a sociedade farmacêutica interessada apresente um pedido que é objeto de análise e de parecer por parte da EMA, bem como uma decisão da Comissão sobre a AIM.

28.      Quanto ao parecer da EMA, resulta do artigo 5.o, n.o 2, do Regulamento n.o 726/2004, lido à luz do considerando 23 do mesmo regulamento, que a «responsabilidade exclusiva» pela sua elaboração é atribuída ao CHMP, instituído pelo artigo 121.o da Diretiva 2001/83/CE (8).

29.      Ora, ao abrigo do artigo 56.o, n.o 2, do Regulamento n.o 726/2004, o CHMP pode criar grupos de trabalho permanentes ou temporários e criar grupos de aconselhamento científico para efeitos de avaliação de tipos específicos de medicamentos ou terapias, nos quais pode delegar determinadas tarefas relacionadas com a elaboração dos pareceres científicos respeitantes aos pedidos de AIM (9). Segundo esta disposição, quando cria este tipo de grupos, o CHMP deve prever no seu regulamento interno a que se refere o artigo 61.o, n.o 8, do Regulamento n.o 726/2004, as modalidades de consulta desses grupos.

30.      O parecer inicial do CHMP sobre um pedido de AIM pode ser objeto de revisão se o requerente o solicitar nos termos do artigo 9.o, n.o 2, do Regulamento n.o 726/2004. As Orientações sobre o procedimento de revisão, referidas no n.o 17 das presentes conclusões, descrevem a forma pela qual este procedimento deve ser conduzido e fornecem orientações para a revisão dos diversos tipos de parecer do CHMP, incluindo o que se refere à consulta dos GAC permanentes ou, em alternativa, dos grupos de peritos ad hoc (10) constituídos para uma única ocasião. Além disso, a EMA adotou um documento que define o mandato, os objetivos e o regulamento interno aplicáveis a esses grupos (11). No momento da revisão do pedido AIM do medicamento Hopveus, existiam oito GAC permanentes, cada um composto por doze membros, designadamente nos setores dos produtos cardiovasculares, produtos anti‑infecciosos, diabetes/endocrinologia, doenças virais, neurologia, oncologia, psiquiatria e vacinas.

31.      O parecer definitivo do CHMP, acompanhado de um relatório que descreve a sua avaliação do medicamento e expõe as razões que fundamentam as suas conclusões, é comunicado à Comissão, aos Estados‑Membros e ao requerente, em conformidade com o artigo 9.o, n.o 3, do Regulamento n.o 726/2004.

32.      Nos termos do artigo 10.o do Regulamento n.o 726/2004, a Comissão, assistida pelo CHMP, elabora um projeto de decisão no prazo de quinze dias a contar da receção do parecer do CHMP. Este projeto de decisão é enviado aos Estados‑Membros e ao requerente. Em seguida, a Comissão aprova uma decisão definitiva em conformidade com o procedimento previsto no artigo 87.o, n.o 3, do referido regulamento, a qual pode diferir do aviso supramencionado. Nesta hipótese, deve fundamentar pormenorizadamente num anexo as razões das divergências.

33.      É à luz das observações anteriores que há que analisar os dois fundamentos invocados pela recorrente.

A.      Quanto ao primeiro fundamento, relativo a um erro de direito do Tribunal Geral ao declarar que a decisão de não convocar o GAC Psiquiatria não era ilegal

34.      Com o seu primeiro fundamento, a recorrente alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao declarar que a decisão do CHMP de não convocar o GAC Psiquiatria estava em conformidade com as disposições aplicáveis ao procedimento de revisão e, por conseguinte, não podia ser imputada à EMA nenhuma violação das formalidades essenciais no referido processo.

35.      Este primeiro fundamento está dividido em duas partes, relativas, por um lado, a um erro de direito do Tribunal Geral ao declarar que a decisão de consultar um grupo de peritos ad hoc, em vez do GAC Psiquiatria, não enfermava de nenhuma irregularidade e, por outro, a um erro de direito do Tribunal Geral ao considerar que, de qualquer modo, a recorrente devia demonstrar que a referida irregularidade poderia ter influenciado o conteúdo da decisão controvertida.

1.      Quanto à primeira parte, relativa a um erro de direito do Tribunal Geral ao declarar que a consulta de um grupo de peritos ad hoc, em vez do GAC Psiquiatria, não enfermava de nenhuma irregularidade.

36.      No âmbito da primeira parte, a recorrente alega que o Tribunal Geral decidiu erradamente que a decisão de consultar um grupo de peritos ad hoc em vez do GAC Psiquiatria, no procedimento de revisão relativo ao medicamento Hopveux, não enfermava de nenhuma irregularidade. Em substância, alega que, ao chegar a tal conclusão, o Tribunal Geral infringiu o artigo 62.o, n.o 1, do Regulamento n.o 726/2004, o artigo 11.o do Regulamento Interno do CHMP e o ponto 6.1 das Orientações sobre a revisão.

37.      Antes de mais, segundo a recorrente, o erro do Tribunal Geral resulta do entendimento de que o CHMP dispõe de uma margem de apreciação para determinar que grupo de peritos consultar na fase dessa revisão, mesmo quando existe um GAC permanente no domínio terapêutico abrangido pelo medicamento em análise. A recorrente salienta, a este respeito, que, em conformidade com o ponto 6.1 das Orientações sobre a revisão, se um pedido de consulta do GAC é proveniente do requerente, o CHMP consulta «sistematicamente» o GAC solicitado.

38.      Em seguida, a recorrente considera que, mesmo o que o CHMP disponha de uma margem de apreciação para consultar um GAC por ela escolhido, o Tribunal Geral concluiu erradamente que a consulta do GAC Psiquiatria não era adequada no presente caso, à luz das características específicas do medicamento objeto da revisão e da natureza das questões suscitadas pelo CHMP.

39.      Por último, a recorrente critica o Tribunal Geral por este não ter tido em conta o seu argumento de que os GAC permanentes e os grupos de peritos ad hoc não oferecem ao requerente de AIM garantias processuais equivalentes.

40.      A Comissão e a EMA contestam estes argumentos.

41.      Antes de mais, a Comissão e a EMA alegam que a convocação do grupo de peritos ad hoc para efeitos da revisão do medicamento Hopveux foi efetuada em conformidade com as regras aplicáveis a este procedimento. A este respeito, salientam que foram escolhidos peritos de renome e que os membros do GAC Psiquiatria foram igualmente chamados a nele participar. Acrescentam que as regras aplicáveis ao procedimento de revisão não conferem aos requerentes de AIM o direito de impor ao CHMP o GAC que escolherem, o que está em conformidade com o objetivo destas regras, que é a proteção da saúde pública.

42.      Em seguida, quanto ao ponto 6.1 das Orientações sobre o procedimento de revisão, que deve ser lido em conjugação com o artigo 62.o, n.o 1, último período, do Regulamento n.o 726/2004, a Comissão e a EMA observam que não pode haver consulta sistemática de um GAC se o mesmo não existir no domínio terapêutico em causa. Além disso, embora a dependência do álcool possa ser caracterizada como uma perturbação psiquiátrica, trata‑se de uma patologia transversal às especialidades médicas, o que justifica, na sua opinião, a consulta de um grupo de peritos ad hoc, complementada pelo convite enviado a membros do GAC Psiquiatria.

43.      Por último, a Comissão e a EMA salientam que o medicamento Hopveux, em causa no presente processo, se destina a lutar contra uma perturbação que necessita de um contributo especializado de peritos no domínio da aditologia, mais do que da psiquiatria, visto que a própria substância ativa do referido medicamento cria dependência.

44.      A título preliminar, recorde‑se que, conforme decorre dos n.os 45 a 48 do acórdão recorrido, em aplicação do artigo 56.o, n.o 2, do Regulamento n.o 726/2004, o CHMP pode criar GAC para efeitos de avaliação de tipos específicos de medicamentos ou de terapias, nos quais pode delegar determinadas tarefas relacionadas com a elaboração dos pareceres científicos a que se referem os artigos 5.o e 30.o deste regulamento.

45.      Nos termos do artigo 62.o, n.o 1, quarto parágrafo, último período, do Regulamento n.o 726/2004, «[o] requerente pode pedir que o [CHMP] consulte um [GAC] para efeitos da revisão».

46.      O artigo 11.o, n.o 2, do Regulamento Interno do CHMP precisa a este respeito que «[o] requerente pode pedir que o comité consulte um [GAC] (se e quando existir) para efeitos da revisão» e que, «[n]este caso, o comité solicite o parecer de peritos adicionais disponíveis».

47.      O ponto 6.1 das Orientações sobre o procedimento de revisão dispõe o seguinte:

«A decisão de consulta de um GAC para efeitos de um pedido de revisão depende, nomeadamente, do CHMP ou do pedido de consulta do GAC pelo CHMP [formulado pelo requerente].

O requerente que efetue um pedido de [consulta de] um GAC, deve, logo que possível, dar conhecimento do mesmo ao CHMP. Este pedido deve ser cabalmente fundamentado […]. Caso o requerente efetue um pedido de consulta do GAC, este é consultado sistematicamente pelo CHMP.

Num domínio terapêutico em que não exista nenhum GAC, é solicitado o parecer de peritos adicionais disponíveis sob a forma de consulta de um grupo de peritos ad hoc.

Na reunião do CHMP que se segue à receção do parecer escrito do requerente na Agência ou da fundamentação pormenorizada do requerimento de revisão do parecer, o CHMP decide da consulta do GAC e da respetiva composição (no que se refere aos peritos que não pertençam ao núcleo duro do GAC), e o CHMP aprova uma lista de questões para o GAC.

Se a lista de questões para o GAC não for aprovada na reunião do CHMP, é adotada por procedimento escrito.

[…]».

48.      No n.o 50 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral declarou que, em conformidade com o texto das disposições supramencionadas, o CHMP é obrigado a consultar um GAC se o requerente de AIM o pedir para efeitos do procedimento de revisão. O Tribunal Geral acrescentou, no entanto, que não decorre destas disposições que as mesmas confiram ao requerente o direito de escolher, quando faz o pedido, qual o tipo de grupo que o CHMP deve consultar, a saber, GAC permanente ou grupo de peritos ad hoc.

49.      Na minha opinião, essa interpretação das regras aplicáveis ao procedimento de revisão deve ser acolhida.

50.      Com efeito, como o Tribunal Geral declara no n.o 51 do acórdão recorrido, a escolha de um GAC de caráter permanente depende, por um lado, segundo a leitura conjunta do artigo 11.o, n.o 2, do Regulamento interno do CHMP e do ponto 6.1 das Orientações sobre o procedimento de revisão, da disponibilidade do referido GAC no setor em causa. Por outro lado, como se referiu no n.o 26 das presentes conclusões, o artigo 57.o, n.o 1, do Regulamento n.o 726/2004 obriga a EMA a fornecer aos Estados‑Membros e às instituições da União os melhores pareceres científicos possíveis sobre qualquer questão relativa à avaliação da qualidade, da segurança e da eficácia dos medicamentos para uso humano que lhe seja apresentada (12).

51.      Neste contexto, apesar de o ponto 6.1 das Orientações sobre o procedimento de revisão prescrever que o CHMP deve consultar «sistematicamente» o GAC requerido na hipótese de um pedido de consulta neste sentido, como alega a recorrente, há que considerar que o CHMP beneficia de uma margem de apreciação para efeitos de determinar se contributo científico a fornecer pelo GAC requerido é o mais pertinente relativamente ao domínio terapêutico abrangido pelo medicamento que é objeto do procedimento de revisão.

52.      Antes de mais, esta interpretação é corroborada, de um ponto de vista literal, pelo primeiro período do ponto 6.1 das Orientações sobre o procedimento de revisão, que evidencia, ao utilizar o termo «nomeadamente», que a decisão de consultar um GAC permanente para efeitos de um procedimento de revisão não depende apenas do facto de essa consulta ser pedida pelo requerente.

53.      Por outro lado, o ponto 6.1 das Orientações sobre o procedimento de revisão exige que o requerente da revisão fundamente devidamente o pedido de consulta de um GAC permanente. Tal obrigação de fundamentação seria desprovida de sentido se não pudesse ser submetida à apreciação posterior do CHMP, particularmente quanto à pertinência do GAC solicitado relativamente ao domínio terapêutico abrangido pelo medicamento que é objeto de revisão.

54.      Por último, é igualmente evidente, à luz do princípio da hierarquia das normas, que o Regulamento Interno do CHMP e as Orientações sobre o procedimento de revisão adotadas pela EMA não podem de modo algum condicionar as obrigações que são impostas a esta agência por força de uma norma regulamentar superior como o artigo 57.o, n.o 1, do Regulamento n.o 726/2004. Seria este o caso se a possibilidade de consultar um GAC permanente reconhecida pelo artigo 11.o, n.o 2, do Regulamento Interno do CHMP, por um lado, e o termo «sistematicamente» decorrente do ponto 6.1 das Orientações sobre o procedimento de revisão, por outro, devessem ser interpretados no sentido de impedir que o CHMP adapte ao domínio terapêutico mais adequado ao medicamento objeto da revisão o pedido de um requerente de AIM quanto ao GAC permanente que este pretende.

55.      Daqui resulta que, contrariamente ao alegado pela recorrente, se deve considerar que o CHMP dispõe de uma margem de apreciação para decidir consultar um GAC permanente ou um grupo de peritos ad hoc, mesmo no caso de o requerente da revisão do parecer inicial do CHMP apresentar um pedido específico neste sentido. Não se afigura que o Tribunal Geral tenha cometido nenhum erro a este respeito.

56.      Ora, embora possa concordar com as premissas estabelecidas no acórdão recorrido, no que se refere especialmente à margem de apreciação quanto à escolha do grupo responsável pela revisão de um pedido de AIM, as consequências retiradas pelo Tribunal Geral no âmbito do presente processo parecem‑me erradas.

57.      Com efeito, conforme resulta do n.o 49 do acórdão recorrido, há que recordar, antes de mais, que as instituições ou agências em causa, no presente caso a EMA, podem autolimitar‑se no exercício do seu poder de apreciação pela adoção de orientações. Nestes casos, essas instituições ou agências não se podem afastar dessas orientações sob pena de poderem ser sancionadas, eventualmente, a título de uma violação dos princípios gerais do direito, como os princípios da igualdade de tratamento, da segurança jurídica ou da proteção da confiança legítima (13).

58.      No acórdão recorrido, o Tribunal Geral afirma, no n.o 53, que, «mesmo que o tratamento da dependência do álcool esteja abrangido, em princípio, pelo domínio da psiquiatria, domínio em que o GAC Psiquiatria [era] competente, as questões formuladas pelo CHMP para efeitos do procedimento de revisão eram de caráter especializado, abrangendo designadamente os domínios da medicina geral, da psiquiatria, da gastroenterologia e da adição».

59.      Daqui resulta que, segundo declara o Tribunal Geral, e como é igualmente reconhecido pela Comissão e pela EMA nos seus articulados, a psiquiatria é normalmente o domínio pertinente para a avaliação de um medicamento como o Hopveux (14), ainda que haja outros domínios que devam igualmente ser tomados em consideração para efeitos da concessão de uma AIM para o referido medicamento. Esta declaração está em conformidade com o exposto pelo Tribunal Geral no n.o 2 do acórdão recorrido, no âmbito dos antecedentes do litígio, que descreve a dependência do álcool como uma doença geralmente definida como uma «perturbação psiquiátrica» com efeitos adversos nos domínios físico, mental e psicológico.

60.      A este respeito, importa salientar que, segundo o já referido artigo 11.o, n.o 2, do Regulamento interno do CHMP, quando um requerente pede a consulta de um GAC permanente existente, é possível pedir igualmente o parecer de peritos adicionais disponíveis.

61.      A este respeito, a secção IV do Regulamento interno dos GAC dispõe que um GAC permanente inclui simultaneamente um grupo principal, que assegure a continuidade e a coerência no interior do grupo, e, caso seja necessário, peritos adicionais que podem ser chamados a participar numa ou em várias sessões relativas a um problema específico sobre o qual têm títulos académicos, formação e experiência profissionais pertinentes. Segundo esta mesma secção, esses peritos devem fornecer, caso a caso, uma peritagem adicional em domínios específicos.

62.      Por sua vez, a secção VII, ponto 4, do Regulamento interno dos GAC, sob a epígrafe «Participação de peritos adicionais nas reuniões do GAC», precisa que as propostas para peritos adicionais devem ser efetuadas com base na sua competência específica no domínio terapêutico ou no domínio a tratar pelo GAC durante a sua reunião, nos termos da lista de questões do CHMP para o GAC.

63.      A leitura das regras anteriormente expostas leva‑me a considerar que, quando o domínio normalmente pertinente para a avaliação da revisão de um medicamento é da competência de um dos GAC permanentes instituídos pela EMA, é o GAC permanente criado para este domínio que deve ser consultado, mesmo que seja possível propor membros adicionais especializados noutros domínios, designadamente quando tal se torne necessário a fim de apresentar a contribuição científica mais pertinente para o medicamento que é objeto da revisão.

64.      No presente caso, parece‑me que a intervenção do GAC Psiquiatria, complementada por peritos em domínios adicionais, em conformidade com a secção IV do Regulamento interno dos GAC, estava mais de acordo com a declaração efetuada pelo Tribunal Geral no n.o 53 do acórdão recorrido, uma vez que a luta contra a dependência do álcool, normalmente abrangida pelo domínio da psiquiatria, deve ser analisada pelo GAC permanente existente neste domínio, reservassem prejuízo de outras questões, especificamente relativas à medicina geral, à gastroenterologia e à adição, poderem necessitar igualmente que sejam chamados peritos adicionais para garantir uma avaliação completa do medicamento em causa (15).

65.      Essa declaração respeita o entendimento segundo o qual, mesmo que as disposições aplicáveis ao procedimento em causa não confiram ao requerente de AIM o direito de escolher o tipo de GAC que deve ser consultado, a margem de apreciação do CHMP, justificada pela obrigação de fornecer o contributo científico mais adequado, em conformidade com o artigo 57.o do Regulamento n.o 724/2006, não pode ir ao ponto de frustrar as expectativas criadas aos requerentes da revisão. De outro modo, como a recorrente alega com razão, as Orientações sobre o procedimento de revisão ficariam privadas de qualquer sentido e a escolha do grupo de peritos responsável pela revisão de uma AIM corria o risco de se tornar completamente discricionária.

66.      A conclusão precedente não pode ser infirmada, primeiro, pela declaração do Tribunal Geral, no n.o 55 do acórdão recorrido, de que todos os membros do GAC Psiquiatria foram «chamados a participar» na reunião do grupo de peritos ad hoc e de que três deles nela participaram efetivamente. A este respeito, basta referir que essa formação ou composição do grupo de peritos responsáveis pela revisão não corresponde à prescrita no caso concreto, segundo a minha análise, pelas disposições aplicáveis a esse procedimento.

67.      Segundo, não considero que o argumento da EMA e da Comissão, segundo o qual o alcoolismo é abrangido no domínio da aditologia e não no da psiquiatria, o que justificaria a convocação de um grupo de peritos ad hoc, deva ser acolhido. A este respeito, refira‑se que tal declaração não decorre do n.o 53 do acórdão recorrido, de modo que, a não ser que se verifique que o Tribunal Geral desvirtuou os factos, o que não é invocado pelas partes no recurso para o Tribunal de Justiça, a referida declaração não pode servir de base às conclusões jurídicas do presente processo.

68.      Terceiro, também não me convence o argumento da EMA e da Comissão de que a lista das questões elaboradas pelo CHMP justificava a escolha de um grupo de peritos ad hoc em vez do GAC Psiquiatria. A este respeito, não pode deixar de se constatar que, como já se referiu, o ponto 6.1 das Orientações sobre o procedimento de revisão prevê que «[n]a reunião do CHMP que se segue à receção do parecer escrito do requerente na Agência […], o CHMP decide sobre a consulta do GAC e a respetiva composição […], e o CHMP aprova uma lista de questões para o GAC». Daqui resulta que a decisão sobre a escolha do grupo responsável pela revisão de um requerimento de AIM é anterior à determinação da lista das questões a analisar por esse grupo, o que também está em conformidade com o facto de, segundo o mesmo ponto das Orientações sobre o procedimento de revisão, se a lista das questões para o GAC não tiver sido aprovada na reunião do CHMP, a mesma ser adotada posteriormente, e, por conseguinte, após ter sido escolhido o GAC, mediante um procedimento escrito.

69.      À luz do anteriormente exposto, proponho, assim, ao Tribunal de Justiça que declare que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, dado que concluiu, no n.o 56 do acórdão recorrido, que a decisão de consultar um grupo de peritos ad hoc, em vez do GAC Psiquiatria, era conforme às regras aplicáveis ao procedimento de revisão dos pedidos de AIM e que, consequentemente, a referida decisão não enfermava de nenhuma irregularidade. Como alega a recorrente a título exaustivo, não há necessidade de verificar se os GAC permanentes e os grupos de peritos ad hoc oferecem ou não ao requerente de AIM garantias processuais equivalentes.

70.      A primeira parte do primeiro fundamento deve, na minha opinião, ser julgada procedente.

2.      Quanto à segunda parte, relativa a um erro de direito do Tribunal Geral ao considerar que, de qualquer modo, a recorrente devia demonstrar que a irregularidade praticada pelo CHMP pode ter influenciado o sentido da decisão controvertida

71.      No âmbito da segunda parte, a recorrente alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao considerar que, mesmo admitindo a irregularidade processual praticada pelo CHMP na revisão do seu parecer inicial, a recorrente não tinha conseguido demonstrar que a consulta do GAC Psiquiatria, em vez de um grupo de peritos ad hoc, poderia ter conduzido a um resultado diferente no termo do procedimento.

72.      Por um lado, a recorrente alega que o CHMP tinha de consultar o GAC Psiquiatria quanto ao medicamento Hopveus tal como tinha consultado este GAC quanto ao medicamento Selincro. A recorrente acrescenta que, se o CHMP tivesse consultado o GAC Psiquiatria, como o fez na avaliação do medicamento Selincro, o resultado da decisão controvertida poderia ter sido diferente. A recorrente critica ainda o Tribunal Geral por ter considerado que os medicamentos Selincro e Hopveus não eram comparáveis para este efeito.

73.      Por outro lado, a recorrente alega que, mesmo que se devesse determinar que os medicamentos Hopveus e Selincro não eram comparáveis, o Tribunal Geral cometeu, todavia, um erro de direito ao não reconhecer as irregularidades processuais respeitantes à organização e atividade do grupo de peritos ad hoc responsável pela revisão do medicamento Hopveus.

74.      A Comissão e a EMA contestam estes argumentos.

75.      Na sua opinião, não deve proceder a alegação da recorrente relativa à errada qualificação jurídica da influência, sobre o parecer do CHMP, da decisão de convocar um grupo de peritos ad hoc em vez do GAC Psiquiatria. Em particular, a Comissão e a EMA salientam que na reunião do grupo de peritos ad hoc participaram três membros do GAC Psiquiatria e que todos eles concordaram com as respostas deste grupo às questões do CHMP. Nestas condições, não se pode admitir que a decisão controvertida teria tido um conteúdo diferente se o GAC Psiquiatria tivesse sido consultado.

76.      A título preliminar, recorde‑se que, no n.o 59 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral demonstrou que, em conformidade com jurisprudência constante, uma irregularidade processual apenas acarreta a anulação da decisão tomada no termo do procedimento administrativo em causa se, caso não se verificasse tal irregularidade, esse procedimento pudesse conduzir a um resultado diferente. Com base nisto, o Tribunal Geral concluiu, no n.o 65 do mesmo acórdão, que, mesmo que se admita que o CHMP tenha, erradamente, convocado o grupo de peritos ad hoc, em vez de consultar o GAC Psiquiatria, esta consulta não teria conduzido a um resultado diferente à luz dos argumentes formulados pela recorrente. Em particular, o Tribunal Geral considerou que a consulta do GAC Psiquiatria para o medicamento Hopveus não era justificada pelo mero facto de esse mesmo GAC permanente ter sido consultado para o medicamento Selincro, dado que estes dois medicamentos não eram comparáveis para efeitos do procedimento de revisão.

77.      O Tribunal de Justiça declarou reiteradamente, incluindo no Acórdão de 18 de junho de 2020, Comissão/RQ (C‑831/18 P, EU:C:2020:481), referido pelo Tribunal Geral, que uma violação dos direitos de defesa, particularmente do direito de ser ouvido, apenas acarreta a anulação da decisão tomada no termo do procedimento administrativo em causa se, não se verificando tal irregularidade, esse procedimento pudesse conduzir a um resultado diferente. A este respeito, o Tribunal de Justiça também precisou que não se pode impor a um recorrente que invoca a violação dos seus direitos de defesa que demonstre que a decisão da instituição da União em causa teria tido um conteúdo diferente, mas apenas que tal hipótese não está inteiramente excluída (16). A apreciação desta questão deve, além disso, ser efetuada em função das circunstâncias de facto e de direito específicas do caso concreto (17).

78.      No entanto, no presente caso, não pode deixar de se constatar que a crítica formulada pela recorrente quanto ao procedimento de revisão do medicamento Hopveus não é relativa à violação dos seus direitos de defesa, mais precisamente do seu direito de ser ouvida. Pelo contrário, a recorrente alegou, em substância, no âmbito do seu recurso de anulação no Tribunal Geral, que o que CHMP violou foram as formalidades essenciais no processo, designadamente no que respeita à escolha e à composição do grupo responsável pela revisão do parecer inicial do seu pedido de AIM, ao decidir ilegalmente, na sua opinião, consultar um grupo de peritos ad hoc em vez do GAC Psiquiatria.

79.      A este respeito, devo recordar que, como explicou e ilustrou o advogado‑geral N. Fennelly nas suas conclusões nos processos Comissão/ICI (18), as condições processuais que estão intrinsecamente ligadas à formação e à expressão da intenção da autoridade que adota o ato são formalidades essenciais, sendo do interesse geral que as mesmas sejam respeitadas. Estas condições, que vão além dos direitos ou interesses subjetivos de uma parte no procedimento administrativo, constituem normas objetivas de legalidade do direito da União, de modo que qualquer violação das mesmas acarreta a anulação do ato subsequente, independentemente de o resultado do procedimento poder ter sido diferente se tivessem sido respeitadas (19). O mesmo se aplica particularmente às regras processuais que as instituições ou agências da União adotaram elas mesmas ou que lhes foram impostas (20).

80.      Devo observar que a argumentação precedente decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça, que declarou, reiteradamente, que o incumprimento das regras processuais relativas à adoção de um ato lesivo constitui uma violação das formalidades essenciais. Em relação a este género de casos, o Tribunal de Justiça declarou que se o juiz da União verificar, ao examinar o ato que lhe é apresentado, que este não foi regularmente adotado, cabe‑lhe tirar as consequências da violação de uma formalidade essencial e, por conseguinte, anular o ato afetado por tal vício (21).

81.      Daqui resulta que, se a conduta da instituição ou agência europeia em causa configura uma violação das formalidades essenciais no processo, conforme previsto na regulamentação aplicável, não pode ser exigido à recorrente que demonstre que seria possível um resultado diferente se as regras fossem cumpridas.

82.      No presente caso, mesmo que a abordagem adotada possa ser acolhida, em minha opinião, seria necessário considerar que, tendo em conta que a formação do grupo de peritos consultados no procedimento de revisão teria sido diferente em caso de convocação do GAC Psiquiatria, tanto do ponto de vista do número de membros como da respetiva identidade (22), o resultado dessa revisão poderia ter sido distinto, não sendo necessário verificar, como fez o Tribunal Geral no acórdão recorrido, se os medicamentos Hopveus ou Selincro eram ou não comparáveis. Uma demonstração mais exigente por parte da recorrente quanto ao resultado potencialmente diferente do procedimento de revisão poderia desvirtuar a jurisprudência referida no n.o 80, supra, que apenas requer a prova da mera probabilidade de tal resultado.

83.      De qualquer modo, considero que, ao alargar uma jurisprudência relativa, nomeadamente, aos direitos das partes envolvidas num procedimento administrativo, como os direitos de defesa, a uma irregularidade relativa à formação do grupo de peritos responsável pela avaliação científica efetuada no procedimento de revisão dos pedidos de AIM, o Tribunal Geral não apreciou a irregularidade invocada pela recorrente como uma violação das formalidades essenciais do referido procedimento.

84.      A este respeito, cumpre recordar que a falta de consulta ou a consulta irregular de uma entidade ou de um comité — como, no caso em análise, o GAC Psiquiatria — foi geralmente considerada pelo Tribunal de Justiça como a violação de uma exigência processual essencial (23), uma vez que é suscetível de viciar o conteúdo do ato em causa e de privar, ao mesmo tempo, da possibilidade de assegurar a respetiva legalidade (24). É assim quando, como no presente caso e como expus nos n.os 29 a 32 das presentes conclusões, a consulta efetuada ao grupo de peritos, seja com base numa formação permanente ou num grupo ad hoc, se repercute no parecer científico que apoia a apreciação do CHMP no final do procedimento de revisão e, em última instância, na decisão de aceitar ou recusar um pedido de AIM.

85.      Daqui resulta que a irregularidade alegada pela recorrente no âmbito do seu recurso de anulação, a propósito da consulta irregular do grupo de peritos ad hoc, devia conduzir, se tivesse fundamento, à anulação da decisão controvertida sem nenhuma demonstração adicional da sua parte. De novo, neste contexto, torna‑se igualmente supérfluo o raciocínio relativo à comparação dos procedimentos de revisão respetivamente aplicados aos medicamentos Hopveus e Selincro.

86.      Tendo em conta o que precede, proponho pois ao Tribunal de Justiça que considere desprovida de fundamento a crítica formulada pela recorrente no âmbito da presente parte e que decida que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, no n.o 58 do acórdão recorrido, ao considerar que, mesmo que o CHMP tivesse decidido erradamente consultar o grupo de peritos ad hoc em vez do GAC Psiquiatria para efeitos da revisão do seu parecer inicial, a recorrente continuava a não demonstrar em que medida essa irregularidade poderia ter levado a que o procedimento de revisão chegasse a um resultado diferente no presente caso.

87.      Em minha opinião, a segunda parte do primeiro fundamento do recurso deve ser julgada procedente, bem como o primeiro fundamento na sua totalidade.

B.      Quanto ao segundo fundamento, relativo a um erro de direito cometido pelo Tribunal Geral na apreciação da exigência de imparcialidade objetiva dos peritos A e B

88.      Com o seu segundo fundamento, a recorrente acusa o Tribunal Geral de ter considerado que a tramitação do procedimento de revisão, através do grupo de peritos ad hoc, não enfermava de uma falta de imparcialidade objetiva, designadamente no que respeita aos peritos A e B.

89.      Antes de mais, a recorrente considera que o Tribunal Geral aplicou um critério jurídico incorreto, mais precisamente, o da imparcialidade subjetiva, ao apreciar o seu segundo fundamento de anulação, relativo a uma violação do princípio da imparcialidade objetiva. Em seguida, a recorrente alega que o Tribunal Geral avaliou incorretamente a conformidade das atividades dos peritos A e B com o princípio da imparcialidade objetiva. Por último, considera que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, visto que não constatou que a Política de 6 de outubro de 2016 era insuficiente para garantir a imparcialidade objetiva dos peritos que participam no procedimento de revisão de um medicamento.

90.      A Comissão e a EMA contestam estes argumentos.

91.      Em seu entender, a EMA procedeu a uma ponderação muito pormenorizada entre a necessidade de imparcialidade e a necessidade de uma perícia de alto nível. O anexo I da Política de 6 de outubro de 2016 traduz essa ponderação. Além disso, foi com razão que o Tribunal Geral declarou que as conclusões do grupo de peritos ad hoc foram adotadas coletivamente por todos os seus membros e que o princípio da colegialidade é uma garantia de imparcialidade objetiva. Por último, o Tribunal Geral também tinha razão ao concluir que nenhuma das atividades de A e B postas em causa pela recorrente era suscetível de configurar um conflito de interesses, na aceção da Política de 6 de outubro de 2016.

92.      Nos termos do artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais, todas as pessoas têm direito a que os seus assuntos sejam tratados pela União com imparcialidade.

93.      Segundo jurisprudência constante, esta exigência de imparcialidade abrange, por um lado, a imparcialidade subjetiva, no sentido de que nenhum membro da instituição em causa encarregada do processo deve manifestar ideias preconcebidas ou um juízo antecipado pessoal e, por outro, a imparcialidade objetiva, no sentido de que a instituição deve oferecer garantias suficientes para excluir a este respeito todas as dúvidas legítimas (25).

94.      Quanto à imparcialidade objetiva do CHMP, o Tribunal de Justiça declarou na sua jurisprudência que ela pode ser afetada quando um conflito de interesses relativo a um dos seus membros seja suscetível de resultar numa sobreposição de funções, e isto independentemente da conduta pessoal do referido membro (26). Visto que o CHMP pode, em conformidade com o artigo 56.o, n.o 2, do Regulamento n.o 726/2004, delegar determinadas tarefas relacionadas com a elaboração dos pareceres científicos respeitantes aos pedidos de AIM, essa jurisprudência deve ser entendida como sendo aplicável mutatis mutandis aos peritos dos grupos de aconselhamento científico instituídos para este efeito.

95.      Por outro lado, como refere o Tribunal Geral nos n.os 93 a 96 do acórdão recorrido, a EMA adotou, em conformidade com o artigo 63.o, n.o 2, do Regulamento n.o 726/2004, a Política de 6 de outubro de 2016, um documento global que se aplica indistintamente a todos os medicamentos (27) e que é aplicável aos membros dos comités e aos peritos dos GAC e dos grupos ad hoc (28). Esta política tem por objetivo encontrar um justo equilíbrio entre a prevenção de conflitos de interesses e a prestação dos melhores serviços de peritagem para efeitos de avaliação e supervisão dos medicamentos na União (29).

96.      Para este efeito, são definidas, em conformidade com um amplo poder de apreciação (30), restrições à participação de uma pessoa nos trabalhos da EMA atendendo a três critérios, a saber, a natureza dos interesses declarados, o período durante o qual se verificou a existência de cada um desses interesses e o tipo de atividades em que o perito participa (31). Este último critério implica a tomada em consideração tanto do grupo em que a pessoa participa (comité científico, como o CHMP, grupo de trabalho ou GAC) como das respetivas funções (nomeadamente presidente ou vice‑presidente, membro ou perito). Estas restrições são apresentadas num quadro que figura em anexo à Política de 6 de outubro de 2016.

97.      Em particular, este quadro (em língua inglesa) prevê, em relação a um perito que tenha um interesse atual («current interest») na prestação de serviços de consultoria a uma empresa farmacêutica sobre um medicamento individual («consultancy to company, individual medicinal product») (32), que esse perito não pode ser membro do CHMP, mas pode, em contrapartida, ser membro de um GAC permanente ou de um grupo de peritos ad hoc para a avaliação de produtos farmacêuticos. A única exceção aplicável a este respeito refere‑se à avaliação do produto em relação ao qual o perito presta os seus serviços de consultoria («No involvement with respect to procedures involving the relevant medicinal product […]»).

98.      Em contrapartida, segundo o referido quadro, um perito que tenha um interesse atual («current interest») na prestação de serviços gerais de consultoria ou de aconselhamento estratégico a uma ou mais empresas farmacêuticas («consultancy to company, cross medicinal products/general» ou «strategic advisory role for company, cross medicinal products/general»), não pode participar em nenhum GAC ou grupo de peritos ad hoc.

99.      Por último, importa salientar que, em conformidade com o quadro anexo à Política de 6 de outubro de 2016, quando um perito tem um interesse atual («current interest») enquanto investigador principal («principal investigator») do estudo clínico de um medicamento (33), pode fazer parte de um GAC ou de um grupo de peritos ad hoc para efeitos de um procedimento de revisão, incluindo relativo ao medicamento envolvido nas suas funções de investigação, apesar de não poder participar nas deliberações e votações finais respeitantes a este medicamento.

100. No presente caso, em primeiro lugar, quanto ao perito A, o Tribunal Geral concluiu, no n.o 117 do acórdão recorrido, o seguinte:

«[D]as respostas do [perito] A aos pedidos de esclarecimentos da EMA, datados de 5 de fevereiro e de 2 de abril de 2020, decorre que os serviços de consultoria em causa terminaram em janeiro de 2016 quanto à Servier e em fevereiro de 2015 quanto à Sanofi Pasteur. Em contrapartida, afigura‑se que os referidos serviços de consultoria se mantinham quanto às sociedades Janssen e Lundbeck aquando da reunião do grupo de peritos ad hoc de 6 de abril de 2020. A este respeito, como alega a recorrente, o facto de [o perito] A ter indicado à EMA, no seu correio eletrónico de 2 de abril de 2020, que a data da sua última atividade de consultoria para esta duas últimas sociedades remontava a março de 2020 não pode significar necessariamente que estas atividades tenham terminado em março de 2020 e que este não tinha qualquer interesse atual na indústria farmacêutica à data da referida reunião.»

101. Contrariamente ao alegado pela Comissão e pela EMA na audiência, a conclusão do Tribunal Geral no n.o 117 do acórdão recorrido leva a classificar o perito A, em conformidade com o quadro anexo à Política de 6 de outubro de 2016, como prestador de serviços gerais de consultoria a uma ou mais empresas farmacêuticas («consultancy to company, cross medicinal products/general»), designadamente às sociedades Janssen e Lundbeck, e não como prestador de serviços de consultoria a uma empresa farmacêutica sobre um medicamento individual («consultancy to company, individual medicinal product»).

102. Por força da Política de 6 de outubro de 2016, essa conclusão deveria, assim, ter levado o Tribunal Geral a concluir que, enquanto exercia essa atividade, o perito A não podia fazer parte de nenhum grupo de peritos responsável pela revisão de um pedido de AIM.

103. No entanto, não pode deixar de se constatar, por um lado, que, no n.o 118 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral chegou à conclusão de que a atividade exercida pelo perito A não o impedia de ser membro do grupo de peritos ad hoc instituído para efeitos da revisão do pedido de AIM do medicamento Hopveus, visto que os serviços de consultoria prestados por esse perito à indústria farmacêutica não diziam respeito a produtos concorrentes.

104. Por outro lado, o Tribunal Geral acrescentou, no n.o 119 do acórdão recorrido, que, mesmo que se demonstrasse que o perito A prestava serviços de consultoria para produtos concorrentes do Hopveus, este estava autorizado a integrar o grupo de peritos ad hoc responsável pela revisão relativa ao medicamento Hopveus, uma vez que não lhe tinha sido atribuída nesse grupo uma função de direção ou de coordenação, isto é, presidente, vice‑presidente, relator ou outro.

105. Devo observar que as consequências retiradas pelo Tribunal Geral da constatação efetuada no n.o 117 do acórdão recorrido não correspondem às enunciadas na Política de 6 de outubro de 2016, designadamente em relação aos peritos que prestam serviços gerais de consultoria a uma ou mais empresas farmacêuticas. Com efeito, como indicado no n.o 98 das presentes conclusões, esta Política proíbe a participação desses peritos no procedimento de revisão de produtos farmacêuticos na EMA, enquanto o seu interesse na indústria farmacêutica for atual, quer seja na função de diretor/coordenador, quer de simples membro.

106. Nestas condições, há que referir que o acórdão recorrido não segue as regras constantes da Política de 6 de outubro de 2016, devendo o Tribunal Geral ter concluído que as referidas regras proibiam a participação do perito A no procedimento de revisão do pedido de AIM relativo ao Hopveus.

107. Por outro lado, basta acrescentar que o conceito de «produto concorrente» (34), por força da Política de 6 de outubro de 2016, só é pertinente em determinadas situações, diferentes da referida pelo Tribunal Geral no acórdão recorrido. Daqui resulta que, ao considerar que, para avaliar a imparcialidade do perito A, era necessário verificar se o Selincro, fabricado e comercializado pela sociedade Lundbeck, era um produto concorrente do medicamento Hopveus, o Tribunal Geral aditou um critério à sua análise que não era pertinente para o presente caso.

108. As alegações da recorrente quanto à falta de imparcialidade objetiva do perito A devem, por conseguinte, ser acolhidas.

109. Em segundo lugar, quanto ao perito B, nos n.os 103 a 112 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral declara, por um lado, que a atividade deste como investigador principal do produto intitulado «AD 04» não impedia a sua participação na avaliação do medicamento Hopveus, uma vez que estes dois produtos tinham objetivos clínicos e se destinavam a grupos de pacientes diferentes, não sendo, por conseguinte, produtos concorrentes. Por outro lado, o Tribunal Geral considerou que os interesses do perito B apontados pela recorrente já não eram atuais à data da reunião do grupo de peritos ad hoc e que, de qualquer modo, diziam respeito a produtos não concorrentes do medicamento Hopveus.

110. Há que referir, à luz do quadro anexo à Política de 6 de outubro de 2016, que é correta a apreciação do Tribunal Geral quanto ao alegado conflito de interesses do perito B.

111. Com efeito, quanto ao produto «AD 04», a atividade do perito B não era proibida na aceção da política de 6 de outubro de 2016, uma vez que, conforme referido no n.o 99 das presentes conclusões, esta política só proíbe a participação de um membro de um grupo de peritos ad hoc nas deliberações finais e na votação quando o procedimento de revisão tem por objeto o mesmo produto que a atividade deste perito como investigador principal, o que não acontece no presente caso, sem necessidade de verificar se os dois medicamentos eram ou não produtos concorrentes. Em relação às restantes atividades apontadas pela recorrente, basta constatar que, desde que as mesmas já não fossem atuais à data da reunião do grupo de peritos ad hoc, também já não seriam suscetíveis de configurar um conflito de interesses por força da Política de 6 de outubro de 2016.

112. Daqui resulta que as acusações formuladas pela recorrente no que se refere ao perito B não têm fundamento e, por conseguinte, não devem ser acolhidas.

113. Tendo em conta o que precede, dado que as alegações apresentadas pela recorrente quanto à falta de imparcialidade objetiva do perito B devem ser acolhidas, há que considerar que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao considerar que a tramitação do procedimento de revisão, através do grupo de peritos ad hoc, não estava afetada por falta de imparcialidade. Neste contexto, não é necessário analisar o argumento formulado pela requerente, a título subsidiário, quanto ao caráter bastante da Política de 6 de outubro de 2016 para garantir o respeito do princípio da imparcialidade objetiva, tal como este resulta do artigo 41.o da Carta.

114. Por conseguinte, o segundo fundamento do recurso deve ser julgado procedente.

C.      Observações finais

115. Nos n.os 69 e 114 das presentes conclusões, proponho ao Tribunal de Justiça que julgue procedentes os fundamentos invocados pela recorrente, baseados, primeiro, no facto de não ter sido consultado o GAC Psiquiatria e, segundo, na inobservância da exigência de imparcialidade objetiva quanto ao perito A que integra o grupo de peritos ad hoc responsável pela revisão do pedido de AIM apresentado pela recorrente. Por conseguinte, o acórdão recorrido deve ser anulado, seja com base nos dois fundamentos, seja com base, em alternativa, num dos dois fundamentos.

116. Nos termos do artigo 61.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, quando a decisão do Tribunal Geral for anulada, o Tribunal de Justiça pode decidir definitivamente o litígio se estiver em condições de ser julgado. Como decorre da análise que efetuei relativamente aos dois fundamentos invocados pela recorrente em apoio do seu recurso, essa é a minha posição no caso em apreço.

117. Por último, nos termos do artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, se o recurso for julgado procedente e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas. Por força do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, que aplica ao recurso os procedimentos nos termos do seu artigo 184.o, n.o 1, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. No presente caso, uma vez que a recorrente pediu que a Comissão e a EMA sejam condenadas nas despesas do processo no Tribunal Geral e no Tribunal de Justiça, e uma vez que a Comissão e a EMA devem, a meu ver, ser vencidas na causa, devem ser condenadas no pagamento das despesas da recorrente e das suas próprias despesas.

V.      Conclusão

118. À luz das considerações precedentes, proponho que o Tribunal de Justiça se digne:

–        anular o Acórdão de 2 de março de 2022, D & A Pharma/Comissão e EMA (T‑556/20, EU:T:2022:111);

–        dar provimento ao recurso de anulação interposto em primeira instância pela D & A Pharma da Decisão de Execução da Comissão, de 6 de julho de 2020, que recusa a autorização de introdução no mercado do medicamento para uso humano Hopveus — oxibato de sódio ao abrigo do Regulamento (CE) n.o 726/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, que estabelece procedimentos comunitários de autorização e de fiscalização de medicamentos para uso humano e veterinário e que institui uma Agência Europeia de Medicamentos e anular a referida decisão;

–        condenar a Comissão Europeia e a Agência Europeia de Medicamentos nas despesas.


1      Língua original: francês.


2      Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, que estabelece procedimentos comunitários de autorização e de fiscalização de medicamentos para uso humano e veterinário e que institui uma Agência Europeia de Medicamentos (JO 2004, L 136, p. 1).


3      Sobre este mesmo assunto, v. o recente Acórdão de 22 de junho de 2023, Alemanha e Estónia/Pharma Mar e Comissão (C‑6/21 P e C‑16/21 P, EU:C:2023:502).


4      Regulamento da Comissão, de 29 de março de 2006, relativo à autorização condicional de introdução no mercado de medicamentos para uso humano abrangidos pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.o 726/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2006, L 92, p. 6).


5      Procedural Advice on the Reexamination of CHMP Opinions (Orientações relativas ao procedimento de revisão dos pareceres do CHMP; a seguir «Orientações sobre o procedimento de revisão»), disponíveis no seguinte endereço Internet: www.ema.europa.eu/en/documents/regulatory‑procedural‑guideline/procedural‑advice‑re‑examination‑chmp‑opinions_en.pdf.


6      Comittee for Medicinal Products for Human Use — Rules of Procedure (Comité dos Medicamentos para Uso Humano — Regulamento Interno, a seguir «Regulamento Interno do CHMP»), disponíveis em www.ema.europa.eu/documents/other/chmp‑rules‑procedure_en.pdf.


7      European Medicines Agency policy on the handling of competing interests of scientific committees’ members and experts [Política da (EMA) relativa ao Tratamento dos Interesses Concorrentes dos Membros dos Comités Científicos e dos Peritos, a seguir «Política de 6 de outubro de 2016»], disponível no seguinte endereço Internet: www.ema.europa.eu/en/documents/other/policy‑44‑european‑medicines‑agency‑policy‑handling‑declarations‑interests‑scientific‑committees_en.pdf. Foi adotada uma nova versão da Política da EMA, não aplicável ratione temporis a este processo, em 15 de dezembro de 2022 e entrou em vigor em 1 de janeiro de 2023.


8      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de novembro de 2001, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos para uso humano (JO 2001 L 311, p. 67).


9      V., igualmente, considerando 25 do Regulamento n.o 726/2004.


10      V. ponto 1 das Orientações sobre o procedimento de revisão.


11      Mandate, objectives and rules of procedure for the scientific advisory groups (SAGs) and adhoc experts groups (Mandato, objetivos e regulamento interno dos GAC e grupo de peritos ad hoc), disponível no seguinte endereço Internet: www.ema.europa.eu/en/documents/other/mandate‑objectives‑rules‑procedure‑scientific‑advisory‑groups‑sags‑ad‑hoc‑experts‑groups_en.pdf (a seguir «Regulamento interno dos GAC»). Estas regras foram adotadas ao abrigo do artigo 56.o, n.o 2, do Regulamento no 726/2004, em conjugação com o artigo 61.o, n.o 8, do mesmo regulamento


12      V., igualmente, considerando 19 do Regulamento n.o 726/2004.


13      V., por analogia, Acórdão de 8 de março de 2016, Grécia/Comissão (C‑431/14 P, EU:C:2016:145, n.o 69 e jurisprudência referida).


14      V., igualmente, como salienta a recorrente, a «Classificação internacional de doenças», estabelecida pela Organização Mundial da Saúde, que inclui a dependência do álcool entre os «Transtornos mentais, comportamentais ou de desenvolvimento neurológico», disponível no seguinte endereço Internet: https://icd.who.int/browse11/l‑m/fr#/http%3a%2f%2fid.who.int%2ficd%2fentity%2f1580466198.


15      Importa precisar que, ainda que a margem de apreciação de que dispõe o CHMP a fim de determinar se o GAC solicitado por um requerente pode apresentar o contributo científico mais pertinente possa ser objeto de uma fiscalização pelo juiz da União (v., por analogia, Acórdão de 8 de julho de 2010, Afton Chemical, C‑343/09, EU:C:2010:419, n.o 34), esta questão não se coloca no presente caso, uma vez que a recorrente não põe em causa a constatação efetuado no n.o 53 do acórdão recorrido, mas critica as consequências jurídicas que o Tribunal Geral retirou de tal constatação à luz das regras aplicáveis ao procedimento de revisão.


16      V., entre outros, Acórdão de 1 de outubro de 2009, Foshan Shunde Yongjian Housewares & Hardware/Conselho (C‑141/08 P, EU:C:2009:598, n.o 94 e jurisprudência referida).


17      V., entre outros, Acórdão de 10 de setembro de 2013, G. e R. (C‑383/13 PPU, EU:C:2013:533, n.o 40 e jurisprudência referida).


18      Conclusões do advogado‑geral N. Fennelly nos processos Comissão/ICI (C‑286/95 P e C‑287/95 P, EU:C:1999:578, n.os 22 a 26).


19      Conclusões do advogado‑geral N. Fennelly nos processos Comissão/ICI (C‑286/95 P e C‑287/95 P, EU:C:1999:578, n.o 28). V. igualmente conclusões da advogada‑geral E. Sharpston no processo Espanha/Comissão (C‑114/17 P, EU:C:2018:309, n.o 95).


20      Conclusões do advogado‑geral N. Fennelly nos processos Comissão/ICI (C‑286/95 P e C‑287/95 P, EU:C:1999:578, n.o 28).


21      Acórdão de 20 de setembro de 2017, Tilly‑Sabco/Comissão (C‑183/16 P, EU:C:2017:704, n.o 115 e jurisprudência referida).


22      A este respeito, basta salientar, à luz do n.o 130 do Acórdão recorrido, que o grupo de peritos ad hoc convocado para avaliar a revisão do medicamento Hopveus era composto por dez membros — dos quais apenas três do GAC Psiquiatria —, quando o referido GAC permanente era composto, no momento da sua constituição, por doze membros.


23      V, a este respeito, Acórdão de 20 de setembro de 2017, Tilly‑Sabco/Comissão (C‑183/16 P, EU:C:2017:704, n.o 115), e Conclusões do advogado‑geral N. Fennelly nos processos Comissão/ICI (C‑286/95 P e C‑287/95 P, EU:C:1999:578, n.o 24).


24      V. Gnes, M., «Administrative Procedure and Judicial Review in the European Union», Judicial Review of Administration in Europe, Oxford University Press, 2021, p. 49.


25      V. Acórdão de 11 de julho de 2013, Ziegler/Comissão (C‑439/11 P, EU:C:2013:513, n.o 155 e jurisprudência referida).


26      Acórdão de 27 de março de 2019, August Wolff e Remedia/Comissão (C‑680/16 P, EU:C:2019:257, n.o 30).


27      Acórdão de 22 de junho de 2023, Alemanha e Estónia/Pharma Mar e Comissão (C‑6/21 P e C‑16/21 P, EU:C:2023:502, n.o 46).


28      V. Política de 6 de outubro de 2016, secção 2, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação».


29      V. Política de 6 de outubro de 2016, ponto 4.1.


30      Acórdão de 22 de junho de 2023, Alemanha e Estónia/Pharma Mar e Comissão (C‑6/21 P e C‑16/21 P, EU:C:2023:502, n.o 52).


31      V. Política de 6 de outubro de 2016, ponto 4.2.1.2.


32      Para uma definição dos termos «consultancy to company, individual medicinal product», v. Política de 6 de outubro de 2016, ponto 3.2.1.1.


33      Para uma definição dos termos «principal investigator», v. Política de 6 de outubro de 2016, ponto 3.2.1.2.


34      Para uma definição dos termos «rival product», v. Política de 6 de outubro de 2016, ponto 3.2.2.