Language of document : ECLI:EU:T:2016:495

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

15 de setembro de 2016 (*)

«Regime linguístico — Anúncios de concursos gerais para o recrutamento de administradores — Escolha da segunda língua entre três línguas — Regulamento n.° 1 — Artigo 1.°‑D, n.° 1, artigo 27.° e artigo 28.°, alínea f), do Estatuto — Princípio da não discriminação — Proporcionalidade»

Nos processos T‑353/14 e T‑17/15,

República Italiana, representada por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por P. Gentili, avvocato dello Stato,

recorrente,

apoiada por:

República da Lituânia, representada por D. Kriaučiūnas e V. Čepaitė, na qualidade de agentes,

interveniente no processo T‑17/15,

contra

Comissão Europeia, representada inicialmente, nos processos T‑353/14 e T‑17/15, por J. Currall e G. Gattinara e, no processo T‑17/15, por F. Simonetti, e em seguida por G. Gattinara e F. Simonetti, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto, no processo T‑353/14, um pedido baseado no artigo 263.° TFUE de anulação do anúncio de concurso geral EPSO/AD/276/14, para a constituição de uma lista de reserva de administradores (JO 2014, C 74 A, p. 4), e, no processo T‑17/15, um pedido baseado no artigo 263.° TFUE de anulação do anúncio de concurso geral EPSO/AD/294/14, para a constituição de uma lista de reserva de administradores no domínio da proteção de dados nos quadros da Autoridade Europeia para a Proteção de Dados (JO 2014, C 391 A, p. 1),

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção),

composto por: D. Gratsias (relator), presidente, M. Kancheva e C. Wetter, juízes,

secretário: J. Palacio González, administrador principal,

vistos os autos e após a audiência de 17 de março de 2016,

profere o presente

Acórdão ?(1)

 Antecedentes do litígio

1        O Organismo Europeu de Seleção de Pessoal (EPSO) é um organismo interinstitucional, criado ao abrigo da Decisão 2002/620/CE do Parlamento Europeu, do Conselho, da Comissão, do Tribunal de Justiça, do Tribunal de Contas, do Comité Económico e Social, do Comité das Regiões e do Provedor de Justiça, de 25 de julho de 2002, que cria o EPSO (JO 2002, L 197, p. 53). Nos termos do artigo 2.°, terceiro parágrafo, do Estatuto dos Funcionários da União Europeia (a seguir «Estatuto»), na sua versão anterior ao Regulamento (CE, Euratom) n.° 723/2004 do Conselho, de 22 de março de 2004, que altera o Estatuto (JO 2004, L 124, p. 1), as instituições signatárias dessa decisão, através do seu artigo 2.°, n.° 1, atribuíram ao EPSO o exercício dos poderes de seleção que são conferidos, pelo artigo 30.°, primeiro parágrafo, do Estatuto e pelo anexo III do Estatuto, às respetivas autoridades investidas do poder de nomeação. Por outro lado, segundo o artigo 2.°, n.° 2, dessa decisão, quando os poderes previstos no n.° 1 estiverem atribuídos à entidade competente para proceder a nomeações de um organismo, órgão ou agência instituído pelos Tratados, ou com base nestes, o EPSO pode exercer os referidos poderes a pedido desse organismo, órgão ou agência. O artigo 4.° da mesma decisão prevê que, não obstante, nos termos do artigo 91.°‑A do Estatuto, os pedidos e as reclamações relativas ao exercício dos poderes atribuídos ao EPSO serem apresentados junto deste, qualquer recurso nestes domínios será interposto contra a Comissão Europeia.

2        Em 1 de março de 2014, o EPSO publicou no Jornal Oficial da União Europeia (JO 2014, C 60 A, p. 1) as Disposições gerais aplicáveis aos concursos gerais (a seguir «disposições gerais»).

3        No ponto 1.3 das disposições gerais, intitulado «Elegibilidade», refere‑se, sob o título «Conhecimentos linguísticos», o seguinte:

«Dependendo do concurso, ser‑lhe‑á pedido que demonstre o seu conhecimento das línguas oficiais da UE. Regra geral, deve ter um profundo conhecimento de uma das línguas oficiais da UE e um conhecimento satisfatório de outra dessas línguas, mas o anúncio de concurso pode impor condições mais rigorosas (particularmente no caso de perfis de linguistas). Salvo indicação em contrário no anúncio de concurso, a escolha da segunda língua está normalmente limitada ao alemão, francês ou inglês.»

4        Na nota de pé de página n.° 7 das disposições gerais, precisa‑se que, «[e]m conformidade com o acórdão proferido pelo [Tribunal de Justiça] no processo C‑566/10 P, Itália/Comissão, as instituições da União Europeia são obrigadas, no âmbito do presente processo de seleção, a indicar os motivos para limitarem a escolha da segunda língua a um número restrito de línguas oficiais da União».

5        No mesmo ponto 1.3 das disposições gerais, refere‑se ainda o seguinte:

«Na organização dos concursos gerais, o EPSO aplica as ‘Orientações gerais sobre a utilização das línguas nos concursos do EPSO’ adotadas pelo Colégio dos Chefes de Administração em 15 de maio de 2013.

Segundo a prática habitual das instituições da União Europeia, o inglês, o francês e o alemão são as línguas mais utilizadas na comunicação interna, sendo igualmente as mais frequentemente utilizadas na comunicação externa e no tratamento dos processos.

As opções para a segunda língua dos concursos foram definidas de acordo com o interesse do serviço, que determina que os colegas recentemente recrutados devem estar imediatamente operacionais e ser capazes de comunicar eficientemente no seu trabalho quotidiano. Caso contrário, o funcionamento eficaz das instituições ficaria gravemente comprometido.

A fim de assegurar condições equitativas para todos os candidatos, é exigido a todos, inclusive aos cuja primeira língua oficial seja uma destas três, que realizem certas provas na sua segunda língua, selecionada de entre estas três. A avaliação das competências específicas, segundo esta modalidade, permite às instituições avaliar a capacidade dos candidatos para desempenharem imediatamente as suas funções num ambiente semelhante à realidade do local de trabalho. Esta disposição aplica‑se sem prejuízo de uma formação linguística posterior, destinada a adquirir capacidade para trabalhar numa terceira língua, em conformidade com o artigo 45.°, n.° 2, do Estatuto dos Funcionários.

[…]»

6        As orientações acima referidas no n.° 5 estão anexas às disposições gerais (anexo 2), conforme resulta da nota de pé de página n.° 8 destas disposições.

7        No ponto 2.1.4 das disposições gerais, intitulado «Preencha a sua candidatura eletrónica», precisa‑se que «[t]odas as partes do formulário de inscrição eletrónica, incluindo a secção ‘O avaliador de talento’ (talent screener), devem ser preenchidas em alemão, francês ou inglês, salvo indicação em contrário no anúncio de concurso».

8        No ponto 3.1.1 das disposições gerais, intitulado «EPSO: comunicação com os candidatos», o n.° 1 refere o seguinte:

«A comunicação dos seus resultados, bem como todas as convocatórias, ser‑lhe‑ão enviadas unicamente através da sua conta EPSO em alemão, francês ou inglês.»

9        O ponto 3.1.2 das disposições gerais, intitulado «Candidatos: comunicação com o EPSO», tem a seguinte redação:

«Antes de contactar o EPSO, verifique se leu atentamente todas as informações constantes do anúncio de concurso, das presentes regras gerais e do sítio Internet do EPSO, incluindo as ‘Perguntas mais frequentes […]’.

As informações de contacto estão disponíveis no sítio Internet [...]. Toda a correspondência relativa a uma candidatura apresentada num determinado nome deve mencionar esse nome, o número do concurso e o seu número de candidato.

O EPSO vela pela aplicação dos princípios do Código de Boa Conduta Administrativa [...]. No entanto, em virtude destes princípios, o EPSO reserva‑se o direito de cessar qualquer troca de correspondência se a que receber dos candidatos for abusiva, pelo facto de ser repetitiva, ofensiva e/ou carecer de objeto.»

10      No ponto 4 do Código de Boa Conduta Administrativa para o pessoal da Comissão nas suas relações com o público, anexo à Decisão 2000/633/CE, CECA, Euratom da Comissão, de 17 de outubro de 2000, que altera o seu regulamento interno (JO 2000, L 267, p. 63), acima referido no n.° 9 (a seguir «Código de Boa Conduta Administrativa»), precisa‑se, sob a epígrafe «Correspondência», o seguinte:

«Nos termos do artigo 21.° do Tratado que institui a Comunidade Europeia, os cidadãos que se dirijam à Comissão por escrito receberão uma resposta na língua por eles utilizada, desde que se trate de uma das línguas oficiais da Comunidade Europeia.»

11      O anexo 2 das disposições gerais, intitulado «Orientações gerais do Colégio dos Chefes de Administração sobre a utilização das línguas nos concursos do EPSO» (a seguir «orientação geral»), refere o seguinte:

«Confirma‑se que, regra geral, a utilização das línguas nos concursos organizados pelo EPSO segue as seguintes regras:

–        Os elementos estáveis no sítio web do EPSO são publicados em todas as línguas oficiais,

–        Os anúncios de concurso, incluindo dos concursos para linguistas e dos concursos relacionados com o alargamento, bem como as regras gerais aplicáveis aos concursos gerais são publicados em todas as línguas oficiais,

–        Os seguintes testes são realizados em todas as línguas oficiais:

–        testes de acesso (raciocínio verbal e numérico),

–        testes linguísticos de concursos para tradutores,

–        testes preliminares de tradução de concursos para juristas‑linguistas,

–        testes intermédios de interpretação (em computador) de concursos para intérpretes,

–        testes de competência (tradução ou de interpretação) de concursos para linguistas.

–        […]

–        A fase do centro de avaliação terá lugar apenas na segunda língua dos candidatos, escolhida de entre o francês, o inglês e o alemão.

Do mesmo modo, os convites à manifestação de interesse nos procedimentos de seleção de agentes contratuais organizados pelo EPSO são publicados em todas as línguas oficiais.

Vários fatores justificam a limitação da escolha da segunda língua.

Em primeiro lugar, o interesse do serviço exige que os novos recrutados estejam imediatamente operacionais e capazes de desempenhar eficazmente as funções para que foram recrutados no domínio ou função objeto do concurso.

O inglês, o francês e o alemão são as línguas mais utilizadas nas instituições. Tradicionalmente, são as línguas utilizadas nas reuniões dos membros das instituições. São também as línguas mais frequentemente utilizadas na comunicação tanto a nível interno como com o mundo exterior. Este facto é confirmado pelas estatísticas sobre as línguas de partida dos textos traduzidos pelos serviços de tradução das instituições.

Dadas as necessidades linguísticas efetivas das instituições para a comunicação interna e externa, um critério de seleção conforme com o artigo 27.°, n.° 1, primeiro parágrafo, do Estatuto, deve ser um conhecimento satisfatório de uma destas três línguas, que deve ser testado através da simulação realista de uma situação de trabalho. O conhecimento de uma terceira língua, previsto no artigo 45.°, n.° 2, do Estatuto, não pode substituir o conhecimento de uma destas três línguas no momento do recrutamento.

Em segundo lugar, a limitação das línguas nas fases subsequentes dos concursos é justificada pela natureza dos testes em causa. De acordo com o artigo 27.° do Estatuto, a partir de 2010 as entidades competentes para proceder a nomeações das instituições decidiram alterar os procedimentos de seleção, tendo introduzido métodos de avaliação baseados nas competências para permitir prever melhor se os candidatos são capazes de desempenhar as suas funções.

Um conjunto substancial de estudos demonstrou que os centros de avaliação, com a simulação de situações de trabalho reais, permitem prever melhor o desempenho real, sendo utilizados em todo o mundo como o método mais eficaz de avaliação. Dada a duração das carreiras e o grau de mobilidade no seio das instituições, este tipo de avaliação é crucial. Com a ajuda de um quadro de competências definido pelas entidades competentes para proceder a nomeações, são escolhidos uma série de exercícios para avaliar as competências pretendidas. Para assegurar que os candidatos são avaliados de forma leal e podem comunicar diretamente com os avaliadores e os outros candidatos que participam nos exercícios, a aplicação deste método requer, em especial, que as provas do centro de avaliação se realizem numa língua franca ou, em determinadas circunstâncias, na língua principal do concurso. No primeiro caso, a língua franca deve ser escolhida entre as línguas que os candidatos sejam mais suscetíveis de conhecer.

Partindo desta premissa, tudo deve ser feito para evitar uma discriminação entre os candidatos; assim, todos devem ser examinados na sua segunda língua. Contudo, como esta língua deve ser igualmente uma língua franca, devendo a escolha da segunda língua ser limitada. Como o uso tradicional acima referido continua a ser a prática corrente a nível interno, a escolha deve efetuar‑se entre o francês, o inglês e o alemão. Os centros de avaliação não implicam a apreciação do nível de conhecimentos linguísticos; um conhecimento satisfatório de uma destas três como segunda língua é suficiente para realizar os testes (em conformidade com os requisitos mínimos estabelecidos no artigo 28.° do Estatuto). Este nível de conhecimentos linguísticos não é de modo algum desproporcionado, tendo em conta as necessidades reais do serviço, como acima se descreveu.

A utilização do inglês, do francês ou do alemão como escolha de segunda língua nas fases posteriores dos concursos não implica qualquer discriminação em razão da língua materna. Não estabelece uma restrição relativa à utilização da língua materna. A obrigação de os candidatos escolherem uma segunda língua (inglês, francês ou alemão) diferente da sua primeira língua (normalmente a língua materna ou equivalente), garante que estes podem ser comparados em pé de igualdade. Deve salientar‑se que a obtenção de um conhecimento suficiente da segunda língua depende essencialmente do esforço pessoal dos candidatos.

Em todo caso, este requisito é proporcionado tendo em conta as necessidades reais do serviço. Limitar as opções de escolha da segunda língua reflete os atuais conhecimentos linguísticos dos europeus. O inglês, o francês e o alemão não são apenas as línguas de vários Estados‑Membros da União Europeia, são também as línguas estrangeiras mais geralmente conhecidas. São as línguas mais frequentemente aprendidas como línguas estrangeiras e as línguas cuja aprendizagem é considerada mais útil. Assim, as necessidades reais do serviço parecem um reflexo razoável das competências linguísticas que se podem esperar dos candidatos, sobretudo tendo em conta que o conhecimento de uma língua em sentido estrito (erros de ortografia, gramática ou vocabulário) não é avaliado nos testes de competência. A limitação das possibilidades de escolha da segunda língua ao inglês, francês ou alemão, por conseguinte, não constitui um obstáculo desproporcionado para a participação nos concursos. Com efeito, segundo as informações disponíveis, corresponde sensivelmente ao que as pessoas estão habituadas e esperam.

As estatísticas relevantes corroboram a conclusão de que a limitação da escolha da segunda língua em determinadas fases dos concursos é proporcionada e não discriminatória. Por exemplo, o inglês, o francês ou o alemão foram as escolhas mais frequentes quando os candidatos tiveram a possibilidade de escolher a sua segunda língua entre as onze línguas oficiais nos principais concursos gerais da UE‑25 para administradores e assistentes em 2005. As estatísticas dos concursos realizados após a reforma de 2010 não apresentam qualquer distorção a favor dos cidadãos dos países onde o inglês, o francês ou o alemão são línguas oficiais. Além disso, as estatísticas dos concursos AD 2010 mostram que um número significativo de candidatos ainda escolhe uma das três como sua segunda língua.

Pelos mesmos motivos, parece razoável exigir aos candidatos que escolham uma destas três línguas para comunicar com o EPSO e preencher o ‘avaliador de talento’.

Por conseguinte, na procura de um equilíbrio entre os interesses do serviço e as capacidades dos candidatos, determinados testes devem realizar‑se num número limitado de línguas da União Europeia, para assegurar que os candidatos aprovados possuem um conhecimento adequado de uma combinação de línguas que lhes permita executar a sua missão de forma eficaz e para que possam ser aplicados métodos de seleção com base numa avaliação do desempenho. Como os anúncios de concurso e os guias dos candidatos são publicados nas 24 línguas da União e uma vez que os candidatos podem realizar a importante primeira fase dos concursos numa dessas 24 línguas que escolham como sua língua materna, parece estar assegurado um justo equilíbrio entre os interesses do serviço e o princípio do multilinguismo e da não discriminação em função da língua.

A escolha em cada caso deve, por conseguinte, ser efetuada de acordo com o regime linguístico adotado pelo Conselho de Administração do EPSO e a necessidade específica de as instituições poderem recrutar candidatos que estejam imediatamente operacionais.

Assim, são possíveis dois casos gerais:

–        Em primeiro lugar, perfis gerais ou específicos em que o principal fator de seleção, para além das competências gerais, sejam as competências especializadas ou a experiência num determinado domínio ou funções. Neste caso, o requisito essencial é serem capazes de trabalhar e comunicar num contexto multilingue, em que a necessidade de conhecer as línguas mais utilizadas nas instituições justifica a limitação da escolha das línguas da União Europeia no processo de seleção.

–        Em segundo lugar, perfis em que o conhecimento de uma ou mais línguas assume especial importância, por exemplo linguistas ou outros perfis cujos procedimentos de seleção são organizados por língua. Neste caso, para além da avaliação das competências gerais referida no primeiro cenário, devem ser realizados outros testes de competências específicas na(s) língua(s) em questão.

Mesmo seguindo esta abordagem, qualquer decisão de limitar o número de línguas nos concursos deve permitir uma análise da questão relativamente a cada concurso, de modo a refletir as necessidades específicas das instituições no que respeita ao(s) perfil(s) em questão.»

12      Em 13 de março de 2014, o EPSO publicou no Jornal Oficial da União Europeia o anúncio de concurso geral EPSO/AD/276/14, para a constituição de uma lista de reserva de administradores (JO 2014, C 74 A, p. 4). Em 6 de novembro de 2014, o EPSO publicou no Jornal Oficial da União Europeia o anúncio de concurso geral EPSO/AD/294/14, para a constituição de uma lista de reserva de administradores no domínio da proteção de dados nos quadros da Autoridade Europeia para a Proteção de Dados (JO 2014, C 391 A, p. 1). Trata‑se dos anúncios de concurso cuja anulação foi pedida no âmbito dos presentes recursos (a seguir, em conjunto, «anúncios impugnados»).

13      Na parte introdutória de cada um dos anúncios impugnados refere‑se que as disposições gerais fazem «parte integrante» deles.

14      Nos termos das condições de admissão aos concursos abrangidos pelos anúncios impugnados, estes últimos exigem um conhecimento aprofundado ou o domínio perfeito de uma das línguas oficiais da União, sendo essa língua designada «língua 1» do concurso, e um conhecimento satisfatório de uma segunda língua, designada «língua 2» do concurso, que deve ser escolhida por cada candidato de entre o alemão, o inglês ou o francês, sendo precisado que deve ser obrigatoriamente diferente da língua escolhida pelo mesmo candidato como língua 1 (parte III, ponto 2.3, dos anúncios impugnados).

15      No ponto 2.3 da parte III dos anúncios impugnados são feitas precisões respeitantes à limitação da escolha da língua 2 a apenas três das línguas acima referidas. O anúncio de concurso geral EPSO/AD/276/14 salienta, a este respeito, o seguinte:

«Em conformidade com o acórdão [de 27 de novembro de 2012, Itália/Comissão (C‑566/10 P, Colet., EU:C:2012:752)], as instituições da UE pretendem, no âmbito do presente concurso, indicar os motivos para limitar a escolha da segunda língua a um número restrito de línguas oficiais da UE.

Os candidatos são, por conseguinte, informados de que as opções para a segunda língua no presente concurso foram definidas de acordo com os interesses dos serviços, que determinam que os colegas recentemente recrutados devem estar imediatamente operacionais e ser capazes de comunicar eficientemente no âmbito do seu trabalho quotidiano. Caso contrário, o funcionamento eficaz das instituições ficaria gravemente comprometido.

Com base na prática habitual das instituições da UE relativamente às línguas utilizadas na comunicação interna e tendo igualmente em conta as necessidades dos serviços em matéria de comunicação externa e tratamento dos processos, o inglês, o francês e o alemão são as línguas mais amplamente utilizados. Além disso, o inglês, o francês e o alemão constituem as segundas línguas mais amplamente utilizadas na União Europeia e as mais estudadas como segundas línguas. Isto confirma as atuais normas académicas e profissionais, segundo as quais se considera que os candidatos a vagas na União Europeia dominam pelo menos uma dessas línguas. Por conseguinte, ao ponderar o interesse do serviço e as necessidades e as capacidades dos candidatos, ao ter também em conta o domínio especial do presente concurso, é legítimo organizar testes nestas três línguas, a fim de garantir que, independentemente da sua primeira língua oficial, todos os candidatos dominam, pelo menos, uma destas três línguas oficiais a nível profissional. A avaliação de competências específicas, segundo esta modalidade, permite às instituições avaliar a capacidade dos candidatos para desempenharem imediatamente as suas funções num ambiente rigorosamente equivalente à realidade que enfrentariam no local de trabalho.

Pelos mesmos motivos, deve limitar‑se a língua de comunicação entre os candidatos e a instituição, incluindo a língua na qual as candidaturas devem ser redigidas. Além disso, esta exigência garante a homogeneidade da comparação e o controlo dos candidatos em relação às suas próprias candidaturas.

Além disso, no interesse de um tratamento equitativo de todos os candidatos, todos, inclusive aqueles cuja primeira língua oficial é uma destas três, devem realizar as provas na sua segunda língua selecionada de entre estas três.

Esta disposição aplica‑se sem prejuízo de uma posterior formação linguística destinada a adquirir capacidade para trabalhar numa terceira língua, em conformidade com o artigo 45.°, n.° 2, do Estatuto dos Funcionários.»

16      Em substância, o anúncio de concurso geral EPSO/AD/294/14 dá as mesmas precisões.

17      A parte IV do anúncio de concurso geral EPSO/AD/276/14 prevê a organização de testes de acesso realizados em computador. São provas de raciocínio verbal [teste a)], de raciocínio numérico [teste b)], de raciocínio abstrato [teste c)] e de teste situacional [teste d)]. No ponto 3 dessa parte do anúncio, precisa‑se que a língua dos testes a) a c) é a língua 1 do concurso, ao passo que a língua do teste d) é a língua 2 do concurso.

18      Por outro lado, a parte IV do anúncio de concurso geral EPSO/AD/294/14 prevê igualmente a organização de testes de acesso. Trata‑se de provas de raciocínio verbal [teste a)], de raciocínio numérico [teste b)] e de raciocínio abstrato [teste c)]. No ponto 3 dessa parte do anúncio, precisa‑se que a língua dos testes a) a c) é a língua 1 do concurso.

19      A parte V do anúncio de concurso geral EPSO/AD/294/14 define a admissão ao concurso e a seleção documental. Aí se precisa que o exame das condições gerais e específicas e a seleção documental são efetuados, «numa primeira fase», com base nas declarações prestadas pelos candidatos no ato de candidatura. As respostas às perguntas relativas às condições gerais e específicas são analisadas a fim de determinar se os candidatos são inscritos na lista dos candidatos que preenchem todas as condições de admissão ao concurso, de acordo com o previsto no título III do anúncio EPSO/AD/294/14. Em seguida, em relação aos candidatos que preenchem as condições de admissão ao concurso, o júri procede a uma seleção documental, para identificar os candidatos que possuem as qualificações mais pertinentes (nomeadamente à luz de diplomas e da experiência profissional) para as funções e à luz dos critérios de seleção descritos no anúncio EPSO/AD/294/14. Essa seleção é feita unicamente com base nas declarações dos candidatos prestadas na secção «avaliador de talento», em função de uma pontuação estabelecida na parte V, ponto 1, alínea b), do anúncio EPSO/AD/294/14.

20      Os critérios de seleção tidos em consideração pelo júri na seleção documental são definidos da seguinte forma no ponto 2 da parte V do anúncio EPSO/AD/294/14:

«1)      Um diploma universitário em Direito Europeu;

2)      Um diploma universitário que inclua uma especialização no domínio da proteção de dados;

3)      Uma formação certificada em matéria de proteção de dados [...], para além dos títulos e diplomas exigidos para acesso ao concurso;

4)      Experiência profissional de pelo menos um ano e meio em matéria de proteção de dados adquirida nas instituições europeias, numa autoridade nacional de proteção de dados ou na administração pública nacional, para além da experiência exigida para acesso ao concurso;

5)      Experiência profissional em matéria de redação de pareceres, decisões ou conclusões junto do Tribunal de Justiça da União Europeia, relativos à legislação europeia no domínio da proteção de dados;

6)      Experiência profissional na redação de relatórios relativos aos controlos prévios, consultas e queixas em matéria de proteção de dados;

7)      Experiência profissional na redação de pareceres relativos à legislação europeia em matéria de proteção de dados […];

8)      Experiência profissional em matéria de inquéritos ou de auditoria para fins de avaliação da conformidade do tratamento dos dados pessoais com a regulamentação em vigor;

9)      Experiência profissional no domínio das novas tecnologias da informação e das comunicações (TIC) a fim de poder avaliar o impacto da sua utilização no domínio da proteção de dados.»

21      A última etapa dos processos de seleção a que se referem os anúncios impugnados consiste num «Centro de Avaliação» (parte V do anúncio EPSO/AD/276/14; parte VI do anúncio EPSO/AD/294/14).

22      No ponto 3 da parte V do anúncio EPSO/AD/276/14, refere‑se que a língua do Centro de Avaliação é a língua 2 do concurso.

23      Segundo o ponto 2 da parte VI do anúncio EPSO/AD/294/14, no âmbito da prova do Centro de Avaliação, os candidatos serão sujeitos a três tipos de exercícios, destinados a avaliar:

–        as suas aptidões em matéria de raciocínio, por meio de um teste de raciocínio verbal [teste a)], de um teste de raciocínio numérico [teste b)] e de um teste de raciocínio abstrato [teste c)];

–        as suas competências específicas, através de uma entrevista estruturada nas competências nesse domínio [teste d)];

–        as suas competências gerais, através de um estudo de caso [teste e)], de um exercício de grupo [teste f)] e de uma entrevista estruturada [teste g)].

24      Refere‑se ainda, no ponto 3 da mesma parte do anúncio EPSO/AD/294/14, que as línguas do Centro de Avaliação serão a língua 1 do concurso para os testes a) a c) e a língua 2 do concurso para os testes d) a g).

 Tramitação do processo e pedidos das partes

25      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 23 de maio de 2014, a República Italiana interpôs o recurso no processo T‑353/14. Conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular o anúncio EPSO/AD/276/14;

–        condenar a Comissão nas despesas.

26      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        julgar improcedente o recurso;

–        condenar a República Italiana nas despesas.

27      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 15 de janeiro de 2015, a República Italiana interpôs o recurso no processo T‑17/15.

28      Em requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 30 de abril de 2015, a República da Lituânia pediu para intervir em apoio dos pedidos da República Italiana. Por despacho de 1 de junho de 2015, o presidente da Oitava Secção do Tribunal Geral admitiu essa intervenção. A República da Lituânia apresentou as suas alegações de intervenção em 13 de julho de 2015.

29      No processo T‑17/15, a República Italiana conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular o anúncio EPSO/AD/294/14;

–        condenar a Comissão nas despesas.

30      A República da Lituânia apoia os pedidos da República Italiana de anulação do anúncio impugnado no processo T‑17/15.

31      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        julgar improcedente o recurso;

–        condenar a República Italiana nas despesas;

–        condenar a República da Lituânia nas suas próprias despesas.

32      Mediante proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Oitava Secção) deu abertura à fase oral nos presentes processos e apensou‑os para efeitos dessa fase. No quadro das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, o Tribunal Geral pediu à Comissão que respondesse por escrito a certas questões. A Comissão deu cumprimento a esse pedido no prazo fixado.

33      Foram ouvidas as alegações das partes principais e as suas respostas às questões orais colocadas pelo Tribunal Geral na audiência de 17 de março de 2015, na qual a República de Lituânia não participou.

 Questão de direito

34      Ouvidas as partes principais na audiência a esse respeito, o Tribunal Geral apensou os presentes processos para efeitos de decisão que ponha termo à instância, de acordo com o artigo 68.° do Regulamento de Processo.

35      A República Italiana invoca sete fundamentos de recurso, relativos, o primeiro, à violação dos artigos 263.°, 264.° e 266.° TFUE; o segundo, à violação do artigo 342.° TFUE e dos artigos 1.° e 6.° do Regulamento n.° 1 do Conselho, de 15 de abril de 1958, que estabelece o regime linguístico da Comunidade Económica Europeia (JO 1958, 17, p. 385; EE 01 F1 p. 8), conforme alterado; o terceiro, à violação do artigo 6.°, n.° 3, UE, do artigo 18.° TFUE, do artigo 22.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, dos artigos 1.° e 6.° do Regulamento n.° 1, do artigo 1.°‑D, n.os 1 e 6, do artigo 27.°, segundo parágrafo, e do artigo 28.°, alínea f), do Estatuto e ainda do artigo 1.°, n.os 2 e 3, do anexo III do Estatuto; o quarto, à violação do artigo 6.°, n.° 3, UE e do princípio da proteção da confiança legítima; o quinto, a desvio de poder e violação das «normas substantivas inerentes à natureza e à finalidade dos anúncios de concurso», em particular do artigo 1.°‑D, n.os 1 e 6, do artigo 27.°, segundo parágrafo, do artigo 28.°, alínea f), do artigo 34.°, n.° 3, e do artigo 45.°, n.° 1, do Estatuto e ainda do princípio da proporcionalidade; o sexto, à violação do artigo 18.° TFUE, do artigo 24.°, quarto parágrafo, TFUE, do artigo 22.° da Carta dos Direitos Fundamentais, do artigo 2.° do Regulamento n.° 1 e do artigo 1.°‑D, n.os 1 e 6, do Estatuto; e, o sétimo, à violação do artigo 296.°, segundo parágrafo, TFUE, dos artigos 1.° e 6.° do Regulamento n.° 1, do artigo 1.°‑D, n.os 1 e 6, e do artigo 28.°, alínea f), do Estatuto, do artigo 1.°, n.° 1, alínea f), do anexo III do Estatuto, do princípio da proporcionalidade e ainda a uma «desvirtuação dos factos».

36      Há que observar que, com os seus fundamentos, a República Italiana contesta a legalidade de duas componentes do regime linguístico dos concursos a que se referem os anúncios impugnados, conforme por eles instituído, segundo a República Italiana. Contesta, assim, as disposições dos anúncios impugnados que afirma limitarem ao alemão, ao inglês e ao francês, por um lado, a escolha da segunda língua desses concursos e, por outro, a escolha da língua que pode ser utilizada nos contactos entre os candidatos e o EPSO.

37      Antes de analisar, à luz dos fundamentos invocados pela República Italiana, a legalidade das duas componentes dos anúncios impugnados por ela contestados, há que analisar a causa de não conhecimento de mérito oposta pela Comissão, nas contestações, contra cada um dos presentes recursos, sem, contudo, arguir formalmente uma exceção de inadmissibilidade.

 Quanto à admissibilidade

38      A Comissão alega, nas contestações, que, no caso, a República Italiana não teve em conta a publicação, no Jornal Oficial da União Europeia, da orientação geral que a parte III dos anúncios impugnados mais não faz do que executar e que a República Italiana nunca impugnou, nem a título principal nem a título incidental, essa orientação geral. Entende, assim, que as alegações da República Italiana devem ser julgadas inadmissíveis, «uma vez que a orientação geral não foi impugnada em tempo útil».

39      Nas réplicas, a República Italiana alega que tanto a orientação geral como as disposições gerais constituem atos internos por natureza, não fazendo parte de nenhuma das categorias de atos recorríveis autonomamente, na aceção do artigo 263.° TFUE. A esse respeito, as disposições gerais não diferem do «guia dos concursos» que as precederam. O seu conteúdo só tem, pois, valor juridicamente vinculativo uma vez integrado efetivamente num anúncio de concurso. Mais especificamente, a base jurídica das disposições gerais, publicadas na série C do Jornal Oficial da União Europeia, não é aí indicada, apesar de essa indicação ser indispensável para atos de direito derivado que produzam efeitos vinculativos imediatos. Conclui que as disposições em causa não têm valor jurídico vinculativo independentemente dos anúncios de concurso que nelas se baseiam.

40      Por outro lado, com efeito, na orientação geral, precisa‑se que é só «regra geral» que a segunda língua dos candidatos dever ser escolhida entre o inglês, o alemão e o francês. A República Italiana conclui que, consequentemente, uma vez que o regime linguístico do concurso a que se refere o anúncio é fixado por este último, ela não poderia tê‑lo impugnado pedindo a anulação da orientação geral.

41      A Comissão alega, nas tréplicas, que os critérios referidos pela República Italiana são relativos a aspetos puramente formais e não têm qualquer ligação com os efeitos dos anúncios impugnados. Salienta que existe uma única regulamentação juridicamente vinculativa do regime linguístico dos concursos, totalmente autónoma dos anúncios impugnados, a que consta da orientação geral nas disposições gerais. Afirma que os anúncios impugnados foram adotados «em estrita execução» da orientação geral e mais não fazem do que «confirmar as disposições» desta última.

42      O Tribunal Geral infere da argumentação da Comissão nas contestações e explicitada nas tréplicas e na audiência que a causa de não conhecimento de mérito que invoca se baseia na premissa de que os anúncios impugnados ou constituem atos confirmativos ou constituem atos de mera execução das disposições gerais e da orientação geral. Para responder à argumentação da Comissão, é necessário, consequentemente, analisar a natureza e o alcance jurídico desses textos.

 Quanto à natureza e ao alcance jurídico das disposições gerais e da orientação geral

43      Na audiência, a República Italiana alegou que as disposições gerais e a orientação geral constituíam simples comunicações com efeito vinculativo unicamente para o seu autor, o EPSO, ao fixar um limite ao seu poder discricionário. A República Italiana alegou ainda que, se fosse de considerar que as disposições gerais e a orientação geral aprovavam normas vinculativas, aplicáveis de forma geral e abstrata aos concursos organizados pelo EPSO, seriam atos adotados por uma autoridade sem competência para as aprovar.

44      Por seu turno, a Comissão precisou na audiência que, ao adotar as disposições gerais e a orientação geral, o EPSO, representando todas as instituições da União, tinha definido critérios claros, objetivos e previsíveis quanto à escolha da segunda língua nos concursos por ele organizados, na aceção do n.° 91 do acórdão de 27 de novembro de 2012, Itália/Comissão (C‑566/10 P, EU:C:2012:752). Afirma que o EPSO adotou os atos acima referidos com base nos artigos 29.° e 30.° do Estatuto e do anexo III do Estatuto que lhe reconhecem a competência para organizar os processos de concurso. Esses textos contêm ainda uma apreciação das necessidades linguísticas das instituições no momento.

45      Da leitura das disposições gerais e da orientação geral o Tribunal Geral observa, tal como a Comissão, que resultam delas os critérios relativos à escolha da segunda língua dos concursos organizados pelo EPSO e da língua de comunicação entre os candidatos e este. Com efeito, pode‑se inferir das disposições gerais que essa escolha deve ser feita levando em conta a prática das instituições da União em matéria de comunicação interna e externa e de tratamento dos processos, o interesse do serviço e as necessidades ligadas à organização dos concursos e à avaliação dos candidatos (v. n.° 5, supra).

46      O mesmo acontece com a orientação geral. Aí se faz, mais em particular, referência ao interesse do serviço, à prática das instituições da União, às necessidades reais dos seus serviços, à natureza das provas que garantem a avaliação ótima dos candidatos, aos conhecimentos linguísticos da população europeia em geral e, por último, às escolhas já feitas em matéria linguística pelos candidatos aos concursos anteriormente organizados pelo EPSO (v. n.° 11, supra).

47      Contudo, não se pode deixar de observar que os textos acima referidos não se limitam a enunciar esses critérios. As disposições gerais e a orientação geral incluem igualmente uma série de apreciações segundo as quais a escolha da segunda língua dos concursos organizados pelo EPSO e da língua de comunicação entre este e os candidatos se restringe ao alemão, ao inglês e ao francês. A Comissão alega, em substância, que essas apreciações referem o regime linguístico que deveria, em princípio, ser o desses concursos, se os critérios anunciados nas disposições gerais e na orientação geral fossem aplicados no momento da sua adoção, sem se referirem a processos de concurso específicos.

48      Assim, há que responder à questão de saber se, em face das apreciações acima referidas no n.° 47, as disposições gerais e a orientação geral devem ser interpretadas no sentido de que aprovam normas vinculativas que constituem o regime linguístico de todos os concursos organizados pelo EPSO.

49      Essa interpretação desses textos não pode ser aceite. Segundo a jurisprudência, para apreciar se esses textos se destinam a aprovar tais normas vinculativas, há que analisar o seu conteúdo (v., neste sentido e por analogia, acórdão de 20 de maio de 2010, Alemanha/Comissão, T‑258/06, Colet., EU:T:2010:214, n.° 27 e jurisprudência aí referida). Na falta da fixação de obrigações específicas e novas, a simples publicação de uma comunicação não é suficiente para concluir que esta constitui um ato suscetível de produzir efeitos jurídicos obrigatórios (v., neste sentido e por analogia, acórdão de 20 de maio de 2010, Alemanha/Comissão, T‑258/06, Colet., EU:T:2010:214, n.° 31).

50      Ora, resulta da própria redação desses textos que, quando os publicou, o EPSO não aprovou de forma definitiva o regime linguístico de todos os concursos que lhe cabe organizar. Com efeito, não obstante as apreciações acima referidas no n.° 47, as disposições gerais e a orientação geral reservam expressamente a escolha do regime linguístico de cada concurso ao anúncio de concurso que será adotado no momento da abertura do respetivo processo.

51      Assim, é certo que, no ponto 1.3 das disposições gerais, se indica que a escolha da segunda língua e da língua em que serão redigidos os atos de candidatura «está normalmente limitada ao alemão, francês ou inglês». Contudo, aí se indica igualmente que será esse o caso «[s]alvo indicação em contrário no anúncio de concurso» (v. n.os 3 e 4, supra).

52      A orientação geral está formulada em termos análogos. Embora aí se indique que, regra geral, a segunda língua dos concursos e a língua de comunicação entre o EPSO e os candidatos será o inglês, o francês ou o alemão, aí se precisa que, mesmo nesse contexto, «qualquer decisão de limitar o número de línguas nos concursos deve permitir uma análise da questão relativamente a cada concurso, de modo a refletir as necessidades específicas das instituições» (v. n.° 11, supra). Assim, não se pode considerar que os textos aqui em causa criem obrigações específicas ou novas, na aceção da jurisprudência (v., neste sentido e por analogia, acórdão de 20 de maio de 2010, Alemanha/Comissão, T‑258/06, Colet., EU:T:2010:214, n.° 28 e jurisprudência aí referida).

53      Por outro lado e de qualquer forma, as apreciações acima mencionadas no n.° 47 não podem ser interpretadas no sentido de que instituem um regime linguístico aplicável a todos os concursos organizados pelo EPSO, visto que nenhuma disposição lhe conferiu ou ao colégio dos chefes de administração a competência para aprovarem esse regime de aplicação geral ou para aprovarem, a esse respeito, regras de princípio às quais um anúncio de concurso só se pudesse subtrair a título excecional (v., neste sentido e por analogia, acórdão de 29 de novembro de 2011, Birkhoff/Comissão, T‑10/11 P, Colet., EU:T:2011:699, n.os 30, 31 e jurisprudência aí referida).

54      A esse respeito, como recordado no n.° 1 do presente acórdão, segundo o artigo 2.°, n.os 1 e 2, da Decisão 2002/620, o EPSO exerce os poderes de seleção conferidos pelo artigo 30.°, primeiro parágrafo, do Estatuto e pelo anexo III do Estatuto às autoridades investidas do poder de nomeação (a seguir «AIPN») das instituições signatárias da decisão em causa e dos organismos, órgãos ou agências da União, a pedido destes.

55      Ora, nenhuma destas disposições ou das invocadas pela Comissão (v. n.° 44, supra) atribui ao EPSO o poder de impor regras vinculativas gerais e abstratas que venham a reger no futuro os concursos organizados com base nas disposições do Estatuto.

56      É certo que, nos termos do artigo 7.°, n.° 1, do anexo III do Estatuto, as instituições, após consulta do Comité do Estatuto, confiam ao EPSO a responsabilidade de tomar todas as medidas necessárias para garantir a aplicação de normas uniformes nos processos de seleção dos funcionários. Contudo, por um lado, no n.° 2, alíneas a) e b), desse artigo, precisa‑se que as funções do EPSO, em processos de seleção dos funcionários, se limitam a organizar concursos gerais e a prestar apoio técnico aos concursos internos organizados pelas instituições, a pedido destas. Por outro lado, não se pode deixar de observar que a disposição acima referida só permite confiar ao EPSO a responsabilidade de tomar medidas de aplicação de normas uniformes e não a de adotar normas vinculativas gerais e abstratas. De qualquer forma, mesmo admitindo que fosse esse o caso, nem nos articulados nem na audiência a Comissão fez referência a um ato das instituições pelo qual, após consulta do Comité do Estatuto, estas tivessem confiado ao EPSO a responsabilidade de aprovar normas vinculativas gerais e abstratas em matéria de regime linguístico dos concursos por ele organizados.

57      Embora as disposições acima referidas nos n.os 54 a 56 não atribuam ao EPSO a competência de aprovar normas vinculativas sobre o regime linguístico dos concursos por ele organizados, o EPSO, para garantir a igualdade de tratamento e a segurança jurídica, não está impedido de adotar e publicar atos como as disposições gerais e a orientação geral que se destinem a anunciar como tenciona, em certas situações, fazer uso do poder de apreciação que essas disposições lhe reconhecem. Contudo, o EPSO só está vinculado por esses textos na medida em que não se afastem das regras de alcance geral que enquadram as suas atribuições e desde que, quando os adote, não renuncie ao exercício do poder que lhe é reconhecido na apreciação das necessidades das instituições e dos órgãos da União, incluindo as suas necessidades linguísticas, no momento da organização dos diversos concursos (v., neste sentido e por analogia, acórdão de 8 de março de 2016, Grécia/Comissão, C‑431/14 P, EU:C:2016:145, n.os 69, 71 e jurisprudência aí referida).

58      Em face do exposto, há que concluir que as disposições gerais e a orientação geral devem ser interpretadas no sentido de que constituem, quando muito, comunicações, na aceção do n.° 91 do acórdão de 27 de novembro de 2012, Itália/Comissão (C‑566/10 P, EU:C:2012:752), que anunciam critérios segundo os quais o EPSO tenciona proceder à escolha do regime linguístico dos concursos que esteja encarregado de organizar.

59      É à luz destas considerações que se deve analisar a natureza jurídica dos anúncios impugnados a fim de decidir da admissibilidade dos presentes recursos.

 Quanto à natureza jurídica dos anúncios impugnados

60      Conforme acima exposto no n.° 42, a Comissão considera que os anúncios impugnados constituem atos confirmativos ou então atos de mera execução das disposições gerais e da orientação geral.

61      A esse respeito, há que recordar, em primeiro lugar, que, como resulta do primeiro parágrafo do artigo 263.° TFUE, cabe recurso de anulação de todas as disposições adotadas pelas instituições da União, qualquer que seja a natureza ou a forma, que se destinem a produzir efeitos jurídicos (v. acórdão de 6 de abril de 2000, Espanha/Comissão, C‑443/97, EU:C:2000:190, n.° 27 e jurisprudência aí referida), isto é, que introduzam uma modificação da situação jurídica existente antes da sua adoção (v., neste sentido, acórdão de 29 de junho de 1995, Espanha/Comissão, C‑135/93, EU:C:1995:201, n.° 21).

62      Resulta dessa jurisprudência que não está sujeito à fiscalização jurisdicional prevista no artigo 263.° TFUE qualquer ato que não produza efeitos jurídicos obrigatórios suscetíveis de afetar os interesses do sujeito de direito, tais como os atos confirmativos e os atos de mera execução [v., neste sentido, despacho de 14 de maio de 2012, Sepracor Pharmaceuticals (Ireland)/Comissão, C‑477/11 P, não publicado, EU:C:2012:292, n.° 52 e jurisprudência aí referida].

63      Mais especificamente, quanto aos atos confirmativos, resulta de jurisprudência constante que um ato é considerado puramente confirmativo de um ato individual anterior quando não contenha nenhum elemento novo face a este e não tenha sido precedido de um reexame da situação do seu destinatário (v., neste sentido, acórdãos de 7 de fevereiro de 2001, Inpesca/Comissão, T‑186/98, EU:T:2001:42, n.° 44; de 6 de maio de 2009, M/EMEA, T‑12/08 P, EU:T:2009:143, n.° 47; e de 15 de setembro de 2011, CMB e Christof/Comissão, T‑407/07, não publicado, EU:T:2011:477, n.° 89). Por outro lado, esta jurisprudência é transponível para os casos de atos que não possam ser considerados atos individuais (v., neste sentido, acórdão de 13 de novembro de 2014, Espanha/Comissão, T‑481/11, EU:T:2014:945, n.os 28, 29 e jurisprudência aí referida), tais como um regulamento ou um anúncio de concurso (v. acórdão de 17 de dezembro de 2015, Itália/Comissão, T‑295/13, não publicado, EU:T:2015:997, n.° 76 e jurisprudência aí referida).

64      Quanto aos atos de mera execução, há que considerar que não criam direitos e obrigações para terceiros, antes intervêm no quadro da execução de um ato anterior que se destina a produzir efeitos jurídicos vinculativos, quando todos os elementos da norma imposta por este ato já estão definidos e decretados (v., neste sentido, acórdão de 20 de novembro de 2008, Itália/Comissão, T‑185/05, EU:T:2008:519, n.os 51 a 53 e jurisprudência aí referida; v. ainda, neste sentido e por analogia, conclusões do advogado‑geral P. Cruz Villalón no processo Comissão/Parlamento e Conselho, C‑427/12, EU:C:2013:871, n.° 63).

65      Em segundo lugar, há que recordar que, por força do artigo 1.°, n.° 1, alínea e), do anexo III do Estatuto, um anúncio de concurso, como os anúncios impugnados, deve especificar, num caso de concurso com provas, a natureza dos exames e a respetiva cotação. Com efeito, segundo jurisprudência constante, os termos do anúncio de concurso constituem tanto o quadro da legalidade como o quadro da apreciação para o júri de concurso. Por outro lado, o papel essencial de um anúncio de concurso é informar os interessados de forma tão exata quanto possível da natureza dos requisitos exigidos para ocupar o lugar em causa, para lhes dar a possibilidade de apreciarem se devem apresentar uma candidatura (v. acórdão de 17 de dezembro de 2015, Itália/Comissão, T‑295/13, não publicado, EU:T:2015:997, n.° 49 e jurisprudência aí referida).

66      Assim, cada anúncio de concurso é adotado com o objetivo de instituir as regras do processo de um ou mais concursos específicos, cujo quadro normativo assim decreta em função do objetivo fixado pela AIPN. É esse quadro normativo, eventualmente instituído de acordo com as regras de alcance geral aplicáveis à organização dos concursos, que rege o processo do concurso em causa, desde o momento da publicação do anúncio em causa até à publicação da lista de reserva com os nomes dos laureados do concurso (v., neste sentido, acórdão de 17 de dezembro de 2015, Itália/Comissão, T‑295/13, não publicado, EU:T:2015:997, n.° 50).

67      Em face do exposto, não se pode deixar de observar que um anúncio de concurso, como os anúncios impugnados, que, tendo em conta as necessidades específicas das instituições ou dos órgãos da União em causa, institui o quadro normativo de um concurso específico, incluindo o seu regime linguístico, assim contendo efeitos jurídicos autónomos, não pode, em princípio, ser considerado um ato confirmativo ou um ato de mera execução de atos anteriores. Embora a AIPN deva eventualmente, no exercício das suas funções de adoção de um anúncio de concurso, respeitar ou aplicar normas contidas em atos de alcance geral anteriores, não deixa de ser verdade que o quadro normativo de cada concurso é instituído e especificado pelo anúncio de concurso correspondente que assim precisa os requisitos necessários para ocupar o lugar ou lugares em causa.

68      De qualquer forma e mesmo admitindo que um anúncio de concurso pudesse, em princípio, ser um ato confirmativo ou um ato de mera execução de atos anteriores, resulta da jurisprudência referida nos n.os 62 e 63 do presente acórdão que um ato só pode ser considerado confirmativo ou meramente executório de um ato anterior se este se destinar a produzir efeitos jurídicos. Ora, como acima se expôs nos n.os 48 a 57, não é esse o caso das disposições gerais e da orientação geral.

69      Com efeito, já acima se concluiu no n.° 58 que as disposições gerais e a orientação geral devem ser interpretadas no sentido de que, quando muito, constituem comunicações, na aceção do n.° 91 do acórdão de 27 de novembro de 2012, Itália/Comissão (C‑566/10 P, EU:C:2012:752), que anunciam critérios segundo os quais o EPSO tenciona proceder à escolha do regime linguístico de cada um dos concursos que está encarregado de organizar.

70      Em face do exposto, há que concluir que os anúncios impugnados constituem atos que produzem efeitos jurídicos obrigatórios quanto ao regime linguístico dos concursos em causa, assim constituindo atos recorríveis. O facto de, na sua adoção, o EPSO ter tido em conta os critérios previstos nas disposições gerais e na orientação geral, para as quais os anúncios impugnados remetem expressamente (v. n.° 13, supra), não põe esta consideração em causa.

71      Assim, há que julgar improcedente a causa de não conhecimento de mérito oposta pela Comissão e proceder à análise dos presentes recursos quanto ao mérito.

[omissis]

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção)

decide:

1)      Os processos T‑353/14 e T‑17/15 são apensados para efeitos de acórdão.

2)      São anulados o anúncio de concurso geral EPSO/AD/276/14, para a constituição de uma lista de reserva de administradores, e o anúncio de concurso geral EPSO/AD/294/14, para a constituição de uma lista de reserva de administradores no domínio da proteção de dados nos quadros da Autoridade Europeia para a Proteção de Dados.

3)      A Comissão Europeia suportará as suas próprias despesas e as despesas da República Italiana.

4)      A República de Lituânia suportará as suas próprias despesas relativas à sua intervenção no processo T‑17/15.

Gratsias

Kancheva

Wetter

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 15 de setembro de 2016.

Assinaturas


* Língua do processo: italiano.


1?      Apenas são reproduzidos os números do presente acórdão cuja publicação o Tribunal considera útil.