Language of document : ECLI:EU:C:2020:516

CONCLUSÕES DA ADVOGADA‑GERAL

JULIANE KOKOTT

apresentadas em 2 de julho de 2020 (1)

Processos apensos C245/19 e C246/19

État du Grandduché de Luxembourg

contra

B (C245/19),

B,

C,

D,

F. C. (C246/19),

Intervenientes:

A

(Direito de recurso de pedidos de informações em matéria fiscal)

[pedido de decisão prejudicial apresentado pela Cour administrative (Supremo Tribunal Administrativo, Luxemburgo)]

«Reenvio prejudicial — Legislação fiscal — Diretiva 2011/16/UE — Cooperação administrativa no domínio da fiscalidade — Artigo 1.o, n.o 1 — Artigo 5.o — Pedido de informações das autoridades fiscais de outro Estado‑Membro — Injunção da autoridade fiscal requerida de prestação das informações — Relevância previsível das informações solicitadas — Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Artigos 7.o e 8.o — Artigo 47.o — Direito a ação perante um tribunal — Exclusão dos recursos da entidade responsável pela prestação das informações, do contribuinte afetado pelas informações e de outros terceiros afetados pelas mesmas»






I.      Introdução

1.        O combate efetivo à evasão ou até à fraude fiscais está hoje em dia no centro do debate público, das reformas legislativas (2) e da jurisprudência do Tribunal de Justiça (3). O combate internacional à erosão da base tributária e à transferência de lucros pelos sujeitos passivos (o denominado projeto BEPS da OCDE (4)) exige, sem dúvida, uma melhor cooperação entre as Administrações Fiscais dos Estados e, em particular, uma troca efetiva de dados.

2.        O presente pedido de decisão prejudicial tem por objeto o outro lado de um sistema de troca de informações eficiente: os bens jurídicos (por exemplo, o direito fundamental à proteção de dados) das pessoas responsáveis pela prestação de informações, dos sujeitos passivos e de outros terceiros que podem não ter conhecimento da transmissão dos seus dados. No presente caso, o Grão‑Ducado do Luxemburgo excluiu expressamente, por lei, o recurso de decisões de injunção para prestação de informações.

3.        No processo Berlioz (5), o Tribunal de Justiça já declarou, a este respeito, que o responsável pela prestação de informações no âmbito de uma troca de informações entre autoridades fiscais nacionais ao abrigo da Diretiva 2011/16 (6) pode impugnar indiretamente, no Estado‑Membro requerido, a legalidade da decisão de injunção para prestação de informações, no quadro da impugnação da decisão mediante a qual a autoridade requerida aplicou uma coima por recusa de prestação de informações (7).

4.        Ora, no presente pedido de decisão prejudicial, está em causa o recurso direto da decisão de injunção para prestação de informações da autoridade fiscal nacional que pretende, ou deve, disponibilizar informações à autoridade fiscal requerente de outro Estado‑Membro, ao que se opõem, neste caso, não só o responsável pela prestação da informação, mas também o contribuinte e outros terceiros interessados.

5.        O Tribunal de Justiça deve agora esclarecer se a decisão de injunção para prestação de informações nos termos da Diretiva 2011/16 consubstancia desde logo uma violação dos direitos fundamentais do responsável pela informação, do contribuinte e dos outros terceiros interessados, da qual deve ser admissível interpor recurso efetivo por força do artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»). Além disso, está em causa a questão de saber qual o grau de concretização e de precisão que deve ter o pedido, tendo em conta as pessoas afetadas, para que a autoridade fiscal requerida possa apreciar a «relevância previsível» das informações solicitadas para efeitos de procedimento fiscal noutro Estado‑Membro. Com efeito, só as informações «previsivelmente relevantes» são objeto da cooperação administrativa na aceção da Diretiva 2011/16.

II.    Quadro jurídico

A.      Direito da União

1.      Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia

6.        O artigo 7.o da Carta, intitulado «Respeito pela vida privada e familiar», tem a seguinte redação:

«Todas as pessoas têm direito ao respeito pela sua vida privada e familiar, pelo seu domicílio e pelas suas comunicações.»

7.        O artigo 8.o da Carta, intitulado «Proteção de dados pessoais», prevê:

«1.      Todas as pessoas têm direito à proteção dos dados de caráter pessoal que lhes digam respeito.

2.      Esses dados devem ser objeto de um tratamento leal, para fins específicos e com o consentimento da pessoa interessada ou com outro fundamento legítimo previsto por lei. Todas as pessoas têm o direito de aceder aos dados coligidos que lhes digam respeito e de obter a respetiva retificação.

3.      […]»

8.        O artigo 47.o, n.o 1, da Carta regula o direito à ação efetiva:

«Toda a pessoa cujos direitos e liberdades garantidos pelo direito da União tenham sido violados tem direito a uma ação perante um tribunal nos termos previstos no presente artigo.»

2.      Diretiva 2011/16

9.        O considerando 9 da Diretiva 2011/16 dispõe o seguinte:

«[…] A norma da “relevância previsível” destina‑se a permitir a troca de informações em matéria fiscal em toda a medida do possível e, simultaneamente, a clarificar que os Estados‑Membros não podem efetuar investigações aleatórias nem pedir informações de utilidade duvidosa relativamente à situação tributária de determinado contribuinte. […]»

10.      O artigo 1.o define o objeto da Diretiva 2011/16:

«1.      A presente diretiva estabelece as regras e os procedimentos ao abrigo dos quais os Estados‑Membros devem cooperar entre si tendo em vista a troca de informações previsivelmente relevantes para a administração e a execução da legislação interna dos Estados‑Membros respeitante aos impostos a que se refere o artigo 2.o

2.      […]

3.      A presente diretiva não afeta a aplicação nos Estados‑Membros das regras relativas ao auxílio judiciário mútuo em matéria penal. Também não prejudica a execução de quaisquer obrigações que incumbam aos Estados‑Membros quanto a uma cooperação administrativa mais ampla resultante de outros instrumentos jurídicos, incluindo eventuais acordos bilaterais ou multilaterais.»

11.      O artigo 5.o da Diretiva 2011/16 estabelece o procedimento de troca de informações a pedido:

«A pedido da autoridade requerente, a autoridade requerida comunica à autoridade requerente todas as informações a que se refere o n.o 1 do artigo 1.o de que disponha ou que obtenha na sequência de inquéritos administrativos.»

12.      O artigo 6.o da Diretiva 2011/16 regula a realização de inquéritos administrativos:

«1.      A autoridade requerida manda efetuar os inquéritos administrativos necessários para obter as informações a que se refere o artigo 5.o

2.      […]

3.      Para obter as informações solicitadas ou para conduzir o inquérito administrativo requerido, a autoridade requerida procede como se agisse por iniciativa própria ou a pedido de outra autoridade do seu próprio Estado‑Membro.

4.      […]»

13.      Por último, o artigo 25.o da Diretiva 2011/16 esclarece que a proteção de dados também se aplica à cooperação administrativa no domínio da fiscalidade.

B.      Direito internacional

1.      Convenção Relativa à Assistência Mútua Administrativa em Matéria Fiscal

14.      Em 25 de janeiro de 1988, os Estados‑Membros do Conselho da Europa e os países membros da OCDE celebraram a Convenção Relativa à Assistência Mútua Administrativa em Matéria Fiscal (8). Todos os Estados‑Membros da União Europeia ratificaram a Convenção Relativa à Assistência Mútua Administrativa em Matéria Fiscal.

15.      O artigo 23.o da convenção, relativo aos processos, é aplicável a todos os tipos de assistência administrativa:

«1.      Os processos referentes às medidas adotadas pelo Estado requerido ao abrigo da presente Convenção são instaurados apenas perante o órgão competente desse Estado.

2.      […]

3.      Logo que haja uma decisão final sobre o processo instaurado, o Estado requerido ou o Estado requerente, consoante o caso, notifica o outro Estado da decisão e das suas implicações para o pedido de assistência.»

2.      Modelo de Convenção da OCDE para Evitar a Dupla Tributação

16.      O Conselho da OCDE adotou, em 30 de julho de 1963, uma recomendação sobre a eliminação da dupla tributação (a seguir «Modelo de Convenção da OCDE») (9).

17.      O artigo 26.o, n.o 1, do Modelo de Convenção da OCDE regula a troca de informações e prevê o seguinte:

«1.      As autoridades competentes dos Estados contratantes trocarão entre si a informação previsivelmente relevante para aplicar as disposições da Convenção ou para administrar ou pôr em vigor as leis internas dos Estados contratantes, das suas subdivisões políticas ou autarquias locais, na medida em que a tributação nelas prevista não seja contrária à Convenção. […]»

3.      Convenção fiscal entre o Luxemburgo e a Espanha

18.      Desde 1988, vigora a convenção fiscal celebrada entre o Luxemburgo e o Reino de Espanha em Madrid, em 3 de junho de 1986 (10). O artigo 27.o, n.o 1, da convenção fiscal regula a troca de informações e corresponde ao artigo 26.o, n.o 1, do Modelo de Convenção da OCDE.

C.      Direito Luxemburguês

1.      Lei de 29 de março de 2013

19.      O Luxemburgo transpôs a Diretiva 2011/16 através da Lei de 29 de março de 2013 (11).

20.      O artigo 6.o da Lei de 29 de março de 2013 determina o seguinte:

«A pedido da autoridade requerente, a autoridade requerida luxemburguesa comunica‑lhe as informações previsivelmente relevantes para a administração e a execução da legislação interna do Estado‑Membro requerente relativa aos impostos referidos no artigo 1.o, de que disponha ou que obtenha na sequência de inquéritos administrativos.»

2.      Lei de 25 de novembro de 2014

21.      Seguiu‑se‑lhe a Lei de 25 de novembro de 2014, que prevê o procedimento aplicável à troca de informações a pedido em matéria fiscal (12), cujo artigo 1.o prevê o seguinte:

«1.      A presente lei é aplicável a contar da sua entrada em vigor aos pedidos de troca de informações formulados em matéria fiscal que emanem da autoridade competente de um Estado requerente ao abrigo:

[…]

4.      Da Lei de 29 de março de 2013, Relativa à Cooperação Administrativa no Domínio da Fiscalidade […]»

22.      O artigo 2.o da Lei de 25 de novembro de 2014 determina o seguinte:

«1.      As Administrações Fiscais podem requerer ao respetivo detentor todo o tipo de informações solicitadas para efeitos da aplicação da troca de informações, conforme prevista nas convenções e nas leis.

2.      O detentor das informações tem a obrigação de prestar as informações solicitadas, na sua totalidade, de forma precisa e sem alteração, no prazo de um mês a contar da notificação da decisão de injunção para prestação das informações solicitadas. Esta obrigação compreende a transmissão, sem alteração, dos documentos sobre os quais as informações se baseiam.

[…]»

23.      O artigo 3.o da Lei de 25 de novembro de 2014 estabelecia o seguinte:

«1.      A Administração Fiscal competente deve verificar a regularidade formal do pedido de troca de informações. Considera‑se formalmente regular o pedido de troca de informações que contenha a indicação do fundamento jurídico e da autoridade requerente competente, bem como as restantes indicações previstas nas convenções e nas leis.

[…]

3.      Se a Administração Fiscal competente não dispuser das informações solicitadas, o diretor da Administração Fiscal competente ou o seu representante deve notificar, por carta registada dirigida ao detentor das informações, a sua decisão de injunção com vista ao fornecimento das informações solicitadas. A notificação da decisão ao detentor das informações solicitadas vale como notificação a toda a pessoa nela designada.

[…]»

24.      Nos termos do artigo 5.o, n.o 1, da Lei de 25 de novembro de 2014:

«Se as informações solicitadas não forem transmitidas no prazo de um mês a contar da notificação da decisão de injunção com vista ao fornecimento das informações solicitadas, é aplicável ao detentor das informações uma coima fiscal até 250 000 euros. O montante da coima é fixado pelo diretor da Administração Fiscal competente ou pelo seu representante.»

25.      O artigo 6.o da Lei de 25 de novembro de 2014 estabelecia o seguinte:

«1.      Não é admissível recurso do pedido de troca de informações nem da decisão de injunção mencionados no artigo 3.o, n.os 1 e 3.

2.      O detentor das informações pode interpor recurso das decisões mencionadas no artigo 5.o para o Tribunal Administrativo. O recurso deve ser interposto no prazo de um mês a contar da notificação da decisão ao detentor das informações solicitadas. O recurso tem efeito suspensivo. Em derrogação da lei relativa ao processo nos tribunais administrativos, não pode haver mais que um articulado por cada parte processual, incluindo a petição inicial. A resposta deve ser apresentada no prazo de um mês após a entrada da petição inicial na secretaria do tribunal. Contudo, no interesse da instrução do processo, o presidente da secção à qual foi distribuído o processo pode ordenar oficiosamente a produção de articulados adicionais no prazo por ele fixado. O tribunal administrativo decide no prazo de um mês após a entrega da resposta ou do termo do prazo para entrega de articulados adicionais.»

3.      Lei de 1 de março de 2019

26.      A Lei de 1 de março de 2019, que altera a Lei de 25 de novembro (13), entrou em vigor em 9 de março de 2019. A Lei de 1 de março de 2019 alterou, em especial, os artigos 3.o, n.o 1 e 6.o, n.o 1, da Lei de 25 de novembro de 2014.

27.      O artigo 3.o, n.o 1, da Lei de 25 de novembro de 2014 prevê, agora, que a Administração Fiscal competente se deve certificar de que as informações solicitadas satisfazem plenamente o critério da relevância previsível no que diz respeito à identidade do contribuinte em causa e do detentor das informações, bem como às exigências do procedimento tributário em questão.

28.      Nos termos do artigo 6.o, n.o 1, da Lei de 25 de novembro de 2014, o detentor das informações pode agora interpor recurso de anulação da decisão de injunção prevista no artigo 3.o, n.o 3, para o tribunal administrativo.

III. Processos principais e pedidos de decisão prejudicial

29.      Os processos principais têm origem em dois pedidos de informação da Administração Fiscal espanhola dirigidos à Administração Fiscal luxemburguesa. A Administração Fiscal espanhola baseia estes pedidos na Convenção Fiscal entre o Luxemburgo e a Espanha de 3 de junho de 1986 e na Diretiva 2011/16. Ambos os pedidos de informações visam a artista F. C., residente em Espanha.

A.      Factos na origem do processo C245/19

30.      Na sequência do primeiro pedido de informações de 18 de outubro de 2016, o Directeur de l’administration des contributions directes de Luxembourg (Diretor da Administração das Contribuições Diretas, Luxemburgo), em 16 de junho de 2017, proferiu uma ordem contra a sociedade de direito luxemburguês B, mediante a qual ordenou, em primeiro lugar, que a sociedade B lhe fornecesse, em relação ao período de 2011 a 2014, cópias dos contratos celebrados pela sociedade B com as sociedades E e F a respeito dos direitos da artista F. C.

31.      O Directeur de l’administration des contributions directes de Luxembourg solicitou ainda à sociedade B que fornecesse as seguintes informações e os seguintes documentos:

«Queiram fornecer cópias de qualquer outro contrato celebrado ao longo dos exercícios de 2011 a 2014 e celebrado previamente ou posteriormente que tenham produzido efeitos durante os exercícios mencionados, relacionado com a artista F. C.»

32.      Por último, ordenou que a sociedade B lhe fornecesse cópias de todas as faturas emitidas ou recebidas em relação a esses contratos, bem como o seu modo de cobrança e o seu pagamento, e ainda os detalhes das contas bancárias e das instituições financeiras em que estão depositados os fundos de tesouraria contabilizados no balanço.

33.      A carta continha a referência de que, em conformidade com o artigo 6.o da Lei de 25 de novembro de 2014, não era admissível recurso daquela decisão.

B.      Factos na origem do processo C246/19

34.      Na sequência do segundo pedido de informações de 16 de março de 2017, a Administração Fiscal luxemburguesa, em 29 de maio de 2017, proferiu uma decisão de injunção contra o banco A, com sede no Luxemburgo, mediante a qual ordenou que o banco A lhe indicasse, em relação ao período compreendido entre 2011 e 2014, os titulares efetivos de uma determinada conta bancária, os nomes da(s) pessoa(s) autorizadas para a conta bancária e os nomes da(s) pessoa(s) que abriu(abriram) a conta, mesmo que a data de abertura não se situe no período abrangido por esta ordem, e ainda que fornecesse os extratos de conta relativos ao referido período e identificasse os beneficiários efetivos da conta.

35.      Além disso, foi ordenado que o banco A fornecesse as seguintes informações e documentos, referentes ao período compreendido entre 2011 e 2014:

–        «Queiram fornecer informação sobre se a conta […] foi aberta após 31 de dezembro de 2014. Se assim for, queiram indicar se os valores eram provenientes de outra conta aberta junto da vossa instituição e, em caso afirmativo, queiram fornecer cópias dessa outra conta relativas ao período referido.

–        Queiram indicar o total de ativos detidos por F. C. na sociedade D, na sociedade B ou noutra sociedade controlada por F. C. no referido período e queiram apresentar os respetivos comprovativos.

–        Queiram indicar todos os ativos de que F. C. era beneficiária efetiva no referido período e os respetivos comprovativos».

36.      Por último, a Administração Fiscal luxemburguesa ordenou ao banco A que fornecesse cópias de todos os documentos pertinentes para esta decisão de injunção. A carta também continha a referência de que, em conformidade com o artigo 6.o da Lei de 25 de novembro de 2014, não era admissível recurso da decisão.

C.      Os processos judiciais principais

37.      Em 17 de julho de 2017, a sociedade B (processo C‑245/19) e F. C., bem como as sociedades B, C e D (processo C‑246/19), interpuseram junto do Tribunal administratif (Tribunal Administrativo, Luxemburgo) recurso das decisões da Administração Fiscal luxemburguesa de 29 de maio e 16 de junho de 2017 e requereram, respetivamente, a alteração e, a título subsidiário, a anulação das decisões. O banco A interveio no último processo.

38.      Por sentenças de 26 de junho de 2018, o Tribunal administratif (Tribunal Administrativo) declarou os recursos parcialmente procedentes. Por um lado, anulou a decisão de 29 de maio de 2017 (processo C‑245/19) na parte em que ordenava à sociedade B que fornecesse cópias de todos os contratos celebrados com as sociedades E e F a respeito dos direitos de F. C. e celebrados previamente ou posteriormente que tivessem produzido efeitos durante os exercícios mencionados, relacionados com F. C.

39.      Por outro lado, anulou a decisão de 16 de junho de 2017 (processo 246/19), na parte em que incumbia o banco de

–        se a conta bancária controvertida tivesse sido aberta após 31 de dezembro de 2014, esclarecer se os valores eram provenientes de outra conta aberta junto da instituição bancária e, em caso afirmativo, fornecer cópias desta outra conta relativas ao referido período,

–        indicar todos os ativos que a contribuinte detinha em nome de outras sociedades por ela controladas, além das sociedades B e D, no referido período e fornecer os respetivos comprovativos, e

–        indicar todos os ativos de que a contribuinte tivesse sido beneficiária efetiva no referido período e fornecer os respetivos comprovativos.

40.      O Tribunal administratif (Tribunal Administrativo) baseou a admissibilidade dos recursos no entendimento de que o artigo 6.o da Lei de 25 de novembro de 2014 violava o artigo 47.o da Carta e, por conseguinte, não devia ser aplicado. Quanto ao mérito, o Tribunal considerou que as referidas informações exigidas pela Administração Fiscal luxemburguesa não eram «previsivelmente relevantes» na aceção da Diretiva 2011/16.

41.      O Estado luxemburguês interpôs recurso destas sentenças, em 24 de julho de 2018, para a Cour administrative (Supremo Tribunal Administrativo). O Estado luxemburguês sustenta, em especial, por um lado, que nos termos do direito luxemburguês só é admissível recurso para os tribunais administrativos de uma decisão que fixe uma sanção pecuniária, o que satisfaz as exigências do artigo 47.o da Carta. Por outro lado, que as informações exigidas pelas autoridades espanholas são «previsivelmente relevantes».

D.      Decisões de reenvio e questões prejudiciais

42.      Perante este contexto, a Cour administrative (Supremo Tribunal Administrativo), pelas Decisões de 14 de março de 2019, suspendeu as instâncias e submeteu ao Tribunal de Justiça, no âmbito do processo C‑245/19, as seguintes questões para decisão prejudicial ao abrigo do artigo 267.o TFUE:

«1)      Devem os artigos 7.o e 8.o, e 52.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, eventualmente lidos em conjugação com o artigo 47.o da referida Carta, ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional de um Estado‑Membro que, no âmbito do regime processual em matéria de troca de informações a pedido, instituído, nomeadamente, a fim de dar execução à Diretiva 2011/16/UE do Conselho, de 15 de fevereiro de 2011, relativa à cooperação administrativa no domínio da fiscalidade e que revoga a Diretiva 77/799/CEE, exclui qualquer ação, nomeadamente de natureza jurisdicional, por parte do terceiro detentor das informações, contra uma decisão através da qual a autoridade competente desse Estado‑Membro o obrigue a fornecer‑lhe informações destinadas a dar seguimento a um pedido de troca de informações emanado de outro Estado‑Membro?

2)      Em caso de resposta afirmativa à primeira questão, devem os artigos 1.o, n.o 1, e 5.o da Diretiva 2011/16 ser interpretados, eventualmente tendo em conta o caráter evolutivo da interpretação do artigo 26.o do Modelo de Convenção Fiscal da OCDE, no sentido de que um pedido de troca de informações, juntamente com uma decisão de injunção da autoridade competente do Estado‑Membro requerido que lhe dá seguimento, satisfazem o critério de inexistência de falta manifesta de relevância previsível quando o Estado‑Membro requerente indica a identidade do contribuinte em causa, o período a que se refere o inquérito no Estado‑Membro requerente e a identidade do detentor das informações visadas, embora solicite informações relativas a contratos, bem como às faturações e aos pagamentos correspondentes, não especificados mas definidos por critérios relativos, primeiro, ao facto de terem sido celebrados pelo detentor das informações identificado, segundo, à sua aplicabilidade durante os anos fiscais em causa no inquérito das autoridades do Estado requerente, e, terceiro, à sua relação com o contribuinte em causa identificado?»

43.      No processo C‑246/19, a Cour administrative (Supremo Tribunal Administrativo) submeteu ao Tribunal de Justiça as seguintes questões:

«1)      Devem os artigos 7.o e 8.o, e 52.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, eventualmente lidos em conjugação com o artigo 47.o da referida Carta, ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional de um Estado‑Membro que, no âmbito do regime processual em matéria de troca de informações a pedido, instituído, nomeadamente, a fim de dar execução à Diretiva 2011/16/UE do Conselho, de 15 de fevereiro de 2011, relativa à cooperação administrativa no domínio da fiscalidade e que revoga a Diretiva 77/799/CEE, exclui qualquer ação, nomeadamente de natureza jurisdicional, por parte [do contribuinte visado por um inquérito noutro Estado Membro] e por parte do terceiro detentor das informações, contra uma decisão através da qual a autoridade competente desse Estado‑Membro o obrigue a fornecer‑lhe informações destinadas a dar seguimento a um pedido de troca de informações emanado de outro Estado‑Membro?

2)      Em caso de resposta afirmativa à primeira questão, devem os artigos 1.o, n.o 1, e 5.o da Diretiva 2011/16 ser interpretados, eventualmente tendo em conta o caráter evolutivo da interpretação do artigo 26.o do Modelo de Convenção Fiscal da OCDE, no sentido de que um pedido de troca de informações, juntamente com uma decisão de injunção da autoridade competente do Estado‑Membro requerido que lhe dá seguimento, satisfazem o critério de inexistência de falta manifesta de relevância previsível quando o Estado‑Membro requerente indica a identidade do contribuinte em causa, o período a que se refere o inquérito no Estado‑Membro requerente e a identidade do detentor das informações visadas, embora solicite informações relativas a contratos, bem como às faturações e aos pagamentos correspondentes, não especificados mas definidos por critérios relativos, primeiro, ao facto de terem sido celebrados pelo detentor das informações identificado, segundo, à sua aplicabilidade durante os anos fiscais em causa no inquérito das autoridades do Estado requerente, e, terceiro, à sua relação com o contribuinte em causa identificado?»

IV.    Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

44.      Por Despacho de 26 de abril de 2019, o presidente do Tribunal de Justiça apensou os processos C‑245/19 e C‑246/19 para efeitos das fases escrita e oral e do acórdão a proferir.

45.      No processo prejudicial perante o Tribunal de Justiça, apresentaram observações escritas o Grão‑Ducado do Luxemburgo, o Reino da Bélgica, o Reino de Espanha, a República Francesa, a República Helénica, a República da Polónia e a Comissão Europeia. O Grão‑Ducado do Luxemburgo, o Reino de Espanha, a República Francesa e a Comissão participaram na audiência de 26 de maio de 2020.

V.      Apreciação jurídica

A.      Quanto às primeiras questões prejudiciais

46.      Com as suas primeiras questões prejudiciais, o órgão jurisdicional de reenvio pretende, em última análise, saber se o artigo 47.o da Carta deve ser interpretado no sentido de que o destinatário de uma decisão de injunção para prestação de informações, o contribuinte em causa e o terceiro interessado devem poder interpor recurso efetivo de tal decisão da autoridade requerida. Para este efeito, importa saber se os direitos dos grupos de pessoas referidos, decorrentes dos artigos 7.o e 8.o, da Carta (respeito pela vida privada e familiar, proteção de dados pessoais), terão eventualmente sido violados.

1.      Violação do artigo 47.o da Carta em relação aos destinatários da decisão de injunção para prestação de informações (C245/19)

47.      Em relação aos destinatários, o Luxemburgo, pela Lei de 1 de março de 2019, introduziu uma possibilidade de recurso direto da decisão de injunção para prestação de informações. Contudo, tal em nada altera a admissibilidade da primeira questão prejudicial no processo C‑245/19. Com efeito, no presente caso, o destinatário interpôs recurso antes da entrada em vigor da Lei de 1 de março de 2019.

48.      A questão de saber se a exclusão do recurso de uma decisão de injunção para prestação de informações em matéria de troca de informações transfronteiriça viola os direitos do destinatário na aceção do artigo 47.o da Carta depende de saber se tal decisão está abrangida pelo âmbito de aplicação da Carta e diz respeito aos «direitos e liberdades garantidos pelo direito da União».

a)      Decisão de injunção para prestação de informações como aplicação do direito da União

49.      Nos termos do seu artigo 51.o, n.o 1, a Carta tem por destinatários os Estados‑Membros apenas quando apliquem o direito da União.

50.      O Tribunal de Justiça já declarou, no processo Berlioz, que um Estado‑Membro aplica o direito da União quando prevê a aplicação de uma sanção pecuniária a um administrado que recusa prestar informações no âmbito de uma troca de informações entre autoridades fiscais, fundada, nomeadamente, nas disposições da Diretiva 2011/16 (14).

51.      Se a aplicação de uma sanção pecuniária não regulada pela Diretiva 2011/16 já constitui aplicação do direito da União, o mesmo é tanto mais verdadeiro para a condução de um inquérito pela autoridade fiscal do Estado‑Membro requerido, regulada no artigo 6.o, n.o 3, da Diretiva 2011/16. Por conseguinte, a Carta é aplicável.

b)      Violação do artigo 47.o da Carta

52.      A exclusão do recurso da decisão de injunção para prestação de informações consubstancia uma violação do artigo 47.o da Carta para o destinatário de tal decisão, se esta for suscetível de violar os seus direitos ou liberdades garantidos pelo direito da União.

53.      A Diretiva 2011/16 apenas estabelece normas para a cooperação administrativa entre os Estados‑Membros. Por conseguinte, não confere nenhum direito aos particulares. No entanto, um administrado pode invocar o artigo 47.o da Carta e defender a sua causa em tribunal no âmbito da aplicação da Diretiva 2011/16 (15).

54.      Em relação ao destinatário da decisão de injunção para prestação de informações pode ficar em aberto a questão de saber se foram eventualmente violados direitos fundamentais da Carta e quais, em concreto. Com efeito, conforme o Tribunal de Justiça já declarou no processo Berlioz, esta possibilidade existe sempre no caso do destinatário de uma medida lesiva tomada por uma autoridade pública (16).

55.      Tal aplica‑se na mesma medida ao destinatário de uma decisão de injunção para prestação de informações e ao destinatário de uma decisão que aplicou uma sanção pecuniária. Com efeito, contrariamente do que alguns Estados‑Membros alegam, a decisão de injunção para prestação de informações já constitui um ato jurídico lesivo em relação ao destinatário. A imposição de uma tal decisão de injunção para prestação de informações, para mais sob pena de sanção pecuniária, não constitui uma mera medida preparatória. Por um lado, o destinatário fica diretamente obrigado a um determinado ato, neste caso, a prestação de informações. Por outro lado, não se trata apenas da preparação de uma medida lesiva para o responsável pela prestação da informação. Em todo o caso, este ato prepara a notificação de liquidação do imposto em relação ao contribuinte. A decisão de injunção para prestação de informações também não é uma medida preparatória de uma decisão de aplicação de uma sanção pecuniária. Com efeito, a decisão de aplicação de uma sanção pecuniária pune a inobservância da decisão de injunção para prestação de informações e não é o objetivo da mesma.

56.      A possibilidade de um recurso incidental, como o Tribunal de Justiça estabeleceu no processo Berlioz através da possibilidade de interposição de recurso de uma eventual ordem de aplicação de uma sanção pecuniária (17), em nada altera esta conclusão, contrariamente ao que afirma o Luxemburgo.

57.      Tanto num Estado de Direito como também numa União de Direito é inaceitável exigir que um interessado viole uma ordem administrativa para poder fiscalizar a legalidade da ordem a título incidental (18), tanto mais quando, tal como sucede no presente caso, o que a Comissão salienta, corretamente, a autoridade fiscal tem margem de apreciação para instaurar um processo de contraordenação. Assim, nesse caso, a autoridade fiscal disporia de recursos para impedir a fiscalização da legalidade do pedido de informações, abstendo‑se de instaurar o processo de contraordenação.

c)      Conclusão

58.      O destinatário de uma decisão de injunção para prestação de informações emitida no âmbito da troca de informações entre autoridades fiscais dos Estados‑Membros em conformidade com a Diretiva 2011/16 tem o direito, nos termos do artigo 47.o da Carta, de pedir a fiscalização jurisdicional da legalidade desta decisão. Por conseguinte, a exclusão da proteção jurisdicional em relação ao destinatário de uma decisão de injunção para prestação de informações viola o artigo 47.o da Carta.

2.      Violação do artigo 47.o da Carta em relação aos contribuintes afetados pela decisão de injunção para prestação de informações (C246/19)

59.      Além disso, importa esclarecer se a exclusão de proteção jurisdicional para a contribuinte que é indiretamente afetada por uma decisão de injunção para prestação de informações dirigida a um terceiro viola o artigo 47.o da Carta.

60.      A emissão pelas autoridades fiscais de uma decisão de injunção para prestação de informações no âmbito da troca de informações transfronteiriça constitui aplicação do direito da União (v. n.os 49 e segs., supra). Por conseguinte, a Carta é aplicável.

a)      Eventual violação de direitos fundamentais de contribuintes indiretamente afetados

61.      Para que o artigo 47.o da Carta seja aplicável, devem estar em causa direitos próprios ou liberdades dos contribuintes. Está‑se perante a ingerência no direito fundamental do sujeito passivo à proteção dos dados pessoais quando uma autoridade fiscal obriga um terceiro (no caso do processo C‑246/19, um banco) a comunicar informações sobre contas bancárias, participações sociais e ativos financeiros daquele contribuinte.

62.      Nos termos do artigo 8.o, n.o 1, da Carta, todas as pessoas têm direito à proteção dos dados de caráter pessoal que lhes digam respeito.

63.      Dados pessoais são todas as informações relativas a qualquer pessoa identificada ou identificável (19). As informações sobre o montante dos rendimentos são dados pessoais (20). O mesmo se aplica a informações sobre dados bancários. A este respeito, também se pode recorrer à vasta jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem relativa ao artigo 8.o da Convenção para a Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950 (a seguir «CEDH») (21).

64.      No presente caso, estão em causa informações sobre contas, saldos de contas, outros ativos financeiros e participações sociais de uma pessoa singular, ou seja, dados pessoais. Por conseguinte, a proteção dada pelo artigo 8.o da Carta é aplicável.

65.      A obrigação de transmissão destes dados à administração fiscal por parte do destinatário da decisão de injunção para prestação de informações constitui, desde logo, uma ingerência no direito fundamental do contribuinte. Contrariamente ao entendimento de certos Estados‑Membros, a ingerência não pode ser negada com o argumento de que não é a decisão de injunção que constitui um ato jurídico lesivo, mas apenas a sua aplicação. Pelo contrário, a decisão de injunção constitui desde logo um ato jurídico diretamente lesivo em relação ao destinatário (v., a este respeito, n.o 61, supra) e um ato jurídico indiretamente lesivo em relação ao contribuinte. A obrigação de atuação do destinatário também põe, desde logo, em risco os direitos fundamentais do contribuinte. Com efeito, com o cumprimento solicitado da obrigação, a autoridade pública tem acesso aos dados pessoais sem o acordo do seu titular (22).

66.      A jurisprudência do TEDH não se opõe a este entendimento. Segundo a mesma, a transmissão de dados bancários do contribuinte às autoridades fiscais do Estado requerente é necessariamente uma ingerência no direito ao respeito pela sua vida privada decorrente do artigo 8.o CEDH (23). Contudo, tal não exclui que também já exista uma ingerência num momento anterior.

67.      Em conclusão, a obrigação de um terceiro de transmitir dados pessoais de um contribuinte afeta, em todo o caso, o direito fundamental do mesmo decorrente do artigo 8.o da Carta. A este respeito, a questão de saber se, além disso, também existe uma ingerência no artigo 7.o da Carta (Respeito pela vida privada e familiar) pode ser deixada em aberto.

b)      Violação do artigo 47.o da Carta pela exclusão do recurso, não obstante a possibilidade de impugnação da liquidação do imposto

68.      A proteção jurisdicional perante os tribunais do Estado requerido, no presente caso, o Luxemburgo, não seria necessária se fosse suficiente que a contribuinte pudesse mais tarde impugnar a liquidação do imposto eventualmente emitida em seu detrimento, neste caso, pelas autoridades fiscais espanholas requerentes. Enquanto a contribuinte também puder invocar deficiências na obtenção de provas no âmbito do presente litígio, poderia defender‑se que o recurso que lhe é permitido em Espanha seria suficientemente eficaz para excluir a violação do artigo 47.o da Carta.

69.      Tal é sugerido pelo facto de o artigo 47.o da Carta não conter nenhuma indicação concreta sobre a configuração do recurso efetivo, mas apenas exigir que todas as pessoas tenham direito à ação perante um tribunal, não exigindo que esta ação tenha de ser diretamente dirigida contra o ato da autoridade pública. Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, um recurso meramente incidental também pode ser efetivo, em determinadas circunstâncias (24). Em especial, o Luxemburgo, a França e a Espanha concluem deste facto que é suficiente o recurso da liquidação do imposto.

70.      Com efeito, o objetivo da Diretiva 2011/16, ou seja, o combate efetivo à fraude e à evasão fiscais, poderia sustentar este entendimento (25). A tutela jurisdicional contra a prestação de informações, inclusive em momento prévio à mesma, conduz, pelo menos, a atrasos.

71.      No entanto, estão em causa duas ingerências na esfera de um titular de direitos fundamentais distintas, que são autónomas entre si, que importa separar juridicamente. Por um lado, são solicitados dados pessoais a um terceiro. Deste modo, há uma intervenção na esfera privada do contribuinte que é protegida no plano do direito da União pelos artigos 7.o e 8.o da Carta. Por outro lado, é imposta uma obrigação pecuniária ao contribuinte. Normalmente, esta última não afeta o direito fundamental à proteção da esfera privada, mas eventualmente os direitos fundamentais consagrados nos artigos 20.o (igualdade perante a lei) e 16.o e 17.o da Carta (liberdade de empresa e direito de propriedade).

72.      A autonomia das ingerências também é evidenciada pelo facto de a recolha de dados não se tornar ilegal pelo simples facto de a liquidação do imposto estar errada. A liquidação do imposto também não se torna necessariamente errada só porque a recolha de dados é ilegal. Do facto de a recolha de dados ilegal ter sido incorporada na liquidação do imposto não resulta uma proibição absoluta de utilização de elementos de prova, pelo menos, não à luz do direito da União (26).

73.      Além disso, não é claro se e quando se procede à liquidação do imposto. Por exemplo, se os dados recolhidos levarem a que o imposto não seja exigível pelo Estado requerente, acabará por nunca existir uma liquidação de imposto que o contribuinte possa impugnar. O mesmo se dirá se os dados recolhidos não forem fiscalmente relevantes, mas o imposto tiver sido liquidado por outros motivos. O contribuinte dificilmente poderia invocar no recurso desta liquidação do imposto a ilegalidade da recolha de dados «infrutífera».

74.      Face ao exposto, um recurso a título incidental da recolha de dados, por meio de um recurso da liquidação do imposto, não constitui um recurso efetivo na aceção do artigo 47.o da Carta. Este recurso já não pode impedir eficazmente a ingerência na proteção dos dados pessoais, que já ocorreu com a recolha de dados. A utilização eventualmente subsequente dos dados apenas perpetua esta ingerência, pelo que um recurso da utilização no âmbito de um processo fiscal, mesmo que existisse a respetiva proibição de utilização, também só evita que a ingerência se perpetue, mas não evita a ingerência propriamente dita.

75.      A possibilidade de interpor recurso também não permite que a assistência administrativa transfronteiriça fique esvaziada de sentido, conforme o demonstram outros Estados‑Membros que preveem a possibilidade de interposição de recurso (27). Tal dependerá antes de mais da configuração do recurso que pode muito bem ter em conta o interesse na assistência administrativa eficaz e tempestiva referida nos considerandos 6, 27 e 29 da Diretiva 2011/16. Porém, a exclusão de todo o recurso viola a garantia consagrada no artigo 47.o da Carta.

76.      Aliás, a própria Diretiva 2011/16 parte do princípio de que a obrigação de assistência administrativa respeita os limites da lei. Com efeito, o Estado requerente só pode pedir informações previsivelmente relevantes (v. artigos 1.o, n.o 1, e 5.o, bem como considerando 9 da Diretiva 2011/16). O destinatário pode sujeitar este requisito a fiscalização jurisdicional, quer seja no quadro da impugnação de uma decisão que aplica uma sanção pecuniária (28) quer seja no quadro da impugnação da própria decisão de injunção (v., a este respeito, n.os 52 e segs., supra).

77.      Por último, mas não menos importante, nos termos do artigo 23.o, n.o 1, da Convenção Relativa à Assistência Mútua Administrativa em Matéria Fiscal, pode ser interposto recurso de medidas adotadas pelo Estado requerente (v. artigo 1.o, n.o 3, da Diretiva 2011/16).

78.      Contrariamente ao que alegam quase todos os intervenientes, esta conclusão também não contraria o Acórdão Sabou (29). Este não diz respeito à situação do processo Berlioz nem à do presente processo (30).

79.      Pelo contrário, no processo Sabou estava em causa a questão de saber se é necessária uma (nova) inquirição no âmbito de um procedimento administrativo em curso para um pedido de informações entre duas autoridades tributárias. Em concreto, estava em causa a questão de saber se a autoridade requerente deve inquirir e fazer participar o contribuinte antes de fiscalizar as suas informações através de um pedido de informações dirigido às autoridades tributárias de outro Estado‑Membro.

80.      Enquanto no processo Sabou estava em causa um pedido de informações junto de outra autoridade pública, no presente caso trata‑se de uma decisão de uma injunção sob pena de sanção aplicada a um particular. Enquanto a autoridade tributária se limitar, tal como sucede no processo Sabou, a pedir informações junto de uma autoridade tributária de outro Estado‑Membro, não é obrigada, à luz do direito da União, a comunicar as mesmas ao contribuinte e a solicitar o seu ponto de vista (31). A Carta não exige um recurso a cada fase de um procedimento administrativo (32). Pelo contrário, as decisões de injunção para prestação de informações dirigidas a terceiros vão além desse ato preparatório de investigação das autoridades tributárias.

81.      Acresce que, no processo Sabou, o contribuinte já tinha sido inquirido, uma vez que tinha fornecido as informações sujeitas a fiscalização. Neste contexto, o Tribunal de Justiça negou o direito a ser ouvido em relação a uma fase no âmbito de um procedimento administrativo (33). Porém, no presente caso, não está em causa a audição no âmbito de um procedimento administrativo, mas antes o direito a um recurso efetivo perante um tribunal para fiscalizar uma decisão administrativa dirigida a outro particular, que diz respeito à própria pessoa. Por conseguinte, o Acórdão Sabou é omisso quanto à situação aqui em causa.

c)      Conclusão

82.      Nos termos do artigo 47.o da Carta, o contribuinte visado na troca de informações entre as autoridades fiscais dos Estados‑Membros ao abrigo da Diretiva 2011/16 pode, pois, sujeitar a legalidade de uma decisão de injunção para prestação de informações dirigida a um terceiro que diga respeito aos seus dados pessoais a fiscalização jurisdicional. A exclusão desta possibilidade de tutela jurisdicional viola o artigo 47.o da Carta.

3.      Violação do artigo 47.o da Carta em relação aos terceiros afetados pela decisão de injunção para prestação de informações (C246/19)

83.      Assim, cabe ainda esclarecer, no âmbito das primeiras questões prejudiciais, se o artigo 47.o da Carta deve ser interpretado no sentido de que também deve ser admissível recurso das injunções da autoridade fiscal requerida pelos terceiros interessados.

84.      Para este efeito, os próprios terceiros interessados referidos não são destinatários das injunções da autoridade fiscal requerida (v., a este respeito, n.os 47 e segs., supra) nem intervenientes no procedimento tributário da autoridade fiscal requerente (v., a este respeito, n.os 59 e segs., supra).

85.      No procedimento que esteve na origem do processo C‑246/19, a Administração Fiscal do Luxemburgo ordenou ao banco A, em especial, que apresentasse informações relativas a contas bancárias e ativos financeiros que também dizem respeito a terceiros (às sociedades B, C e D). Tal como sucede em relação ao contribuinte (v., a este respeito, n.os 62 e segs., supra), a decisão de injunção para prestação de informações também deve ser suscetível de violar «direitos e liberdades» do terceiro interessado «garantidos pelo direito da União» (artigo 47.o da Carta).

86.      Também neste ponto, os intervenientes defenderam posições diametralmente opostas. Enquanto a França e o Luxemburgo não consideram necessário garantir tutela jurisdicional aos terceiros afetados, a Comissão defende que esse direito resulta do artigo 47.o da Carta.

a)      Eventual violação de direitos fundamentais de terceiros indiretamente afetados

87.      Desta forma, importa clarificar se os direitos ou a liberdades dos terceiros, que, neste caso, são várias sociedades, são afetados na aceção do artigo 47.o da Carta, no caso em que a autoridade fiscal obriga terceiros a transmitir informações sobre contas bancárias e ativos financeiros das sociedades. Neste caso, também devem ser tidos em consideração os direitos fundamentais consagrados nos artigos 7.o e 8.o da Carta.

88.      Com efeito, pela sua redação, o artigo 8.o da Carta («pessoa», «dados pessoais») poderia ser aplicável. No entanto, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, retomando os termos do direito secundário de proteção de dados (34), em princípio, só as pessoas singulares estão abrangidas pelo âmbito de aplicação do direito fundamental de proteção de dados consagrado no artigo 8.o da Carta. Em contrapartida, as pessoas coletivas só devem poder beneficiar da proteção dos «dados de caráter pessoal», nos termos do artigo 8.o da Carta, se a sua denominação social identificar uma pessoa singular (35). Pode ficar por esclarecer se é o que sucede no presente caso, uma vez que as sociedades podem, aqui, eventualmente, basear‑se no direito consagrado no artigo 7.o da Carta.

89.      O artigo 7.o da Carta consagra o direito fundamental de todas as pessoas ao respeito pela sua vida privada e familiar, que, relativamente ao tratamento de dados pessoais, abrange todas as informações relativas a qualquer pessoa singular identificada ou identificável (36). A proteção da vida privada também abrange atividades profissionais ou comerciais, incluindo as transações que lhes digam respeito (37), onde também se incluem as informações sobre dados bancários (38).

90.      Neste contexto, as pessoas coletivas também podem beneficiar do artigo 7.o da Carta (39). No entanto, no âmbito da justificação de uma ingerência no artigo 7.o da Carta, podem ser aplicados critérios em relação às pessoas coletivas diferentes dos que são aplicados em relação às pessoas singulares (40). Porém, tal é irrelevante para a existência do direito ao recurso efetivo nos termos do artigo 47.o da Carta.

91.      No presente caso, foram exigidas informações relativas a contas bancárias e a ativos financeiros que também dizem respeito às sociedades B, C e D. Por conseguinte, estas pessoas coletivas podem invocar o artigo 7.o da Carta.

92.      Contrariamente ao que afirmaram alguns Estados‑Membros, a ingerência no artigo 7.o da Carta pode ser tão significativa para os terceiros interessados como para os destinatários da decisão de injunção da autoridade requerida e para a contribuinte. Assim, a Comissão salienta, com razão, que o pedido de informações e a decisão de injunção relativa ao mesmo pedido, proferida pela autoridade requerida, se podem basear em factos errados que dizem respeito a terceiros. Com a transmissão dos dados a uma autoridade pública, há um desconhecido que fica na possa dos mesmos, independentemente do acordo do titular dos dados. No entanto, é precisamente esta situação que o artigo 7.o da Carta pretende evitar. Este exemplo ilustra bem a necessidade prática do terceiro interessado do benefício de um recurso efetivo dessas decisões de injunção.

93.      Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, para a existência de uma ingerência no direito fundamental ao respeito pela vida privada, pouco importa que as informações relativas à vida privada em questão tenham ou não caráter sensível, ou que os interessados tenham ou não sofrido eventuais inconvenientes em razão dessa ingerência (41).

94.      A obrigação de transmissão destes dados à administração fiscal por um terceiro também constitui desde logo uma ingerência no direito fundamental das sociedades terceiras afetadas (42).

95.      Contrariamente ao entendimento de França, as decisões de injunção da autoridade requerida não podem ser consideradas atos preparatórios da recolha de informações que ainda não produzem efeitos prejudiciais, pelo que ainda não representam uma ingerência no artigo 7.o da Carta. Com efeito, em relação aos terceiros interessados, não será adotado nenhum ato jurídico subsequente que estivesse a ser preparado por esta decisão de injunção. Tal como acima referido (v. n.os 68 e segs., supra), a decisão de injunção prepara, em todo o caso, a liquidação do imposto em relação ao contribuinte, mas não prepara nenhum ato jurídico em relação a terceiros interessados.

96.      Pelo contrário, a ingerência já cessou com a ordenada transmissão dos dados por outro particular à autoridade tributária. O artigo 7.o da Carta não exige que ainda ocorra outro dano financeiro ou moral que pudesse então ser liquidado posteriormente de outra forma.

97.      Contrariamente ao entendimento do Luxemburgo, a admissão da ingerência nos direitos fundamentais dos terceiros interessados também não contraria a decisão Othymia Investments/Países Baixos do TEDH. Esta dizia apenas respeito à impugnação do pedido de informações entre duas autoridades fiscais. O TEDH declarou apenas que o artigo 8.o da CEDH não obriga à notificação prévia de todos os possíveis interessados sobre uma troca de informações em matéria fiscal (43). Por conseguinte, o objeto desta decisão era apenas a obrigação de comunicação e não a tutela jurisdicional contra uma decisão de injunção para prestação de informações.

98.      Quando uma autoridade fiscal obriga outrem a transmitir‑lhe informações sobre contas bancárias e ativos financeiros de terceiros, está possivelmente a violar os direitos destes terceiros decorrentes do artigo 7.o da Carta.

b)      Violação do artigo 47.o da Carta pela exclusão dos recursos

99.      Em face do exposto, importa analisar se o direito dos terceiros interessados decorrente do artigo 47.o da Carta é infringido pela exclusão de um recurso da decisão de injunção para prestação de informações. É o que sucede quando o recurso efetivo dos terceiros interessados não é garantido.

100. A especificidade em relação aos terceiros interessados consiste no facto de os mesmos não participarem diretamente em nenhum procedimento administrativo. Não estão diretamente envolvidos no procedimento administrativo fiscal, como é o caso do contribuinte, nem no procedimento de prestação de informações, como é o caso do responsável pelas informações. Assim, não assiste aos terceiros qualquer direito dos intervenientes como, por exemplo, o direito de serem ouvidos.

101. No entanto, as decisões de injunção da autoridade requerida afetam os terceiros se a autoridade requerida exigir dados pessoais dos terceiros interessados a outro particular. Contrariamente aos destinatários e ao contribuinte, os terceiros interessados não podem, neste caso, nem recorrer de uma eventual sanção por violação da decisão de injunção nem da liquidação do imposto subsequente. Deste modo, os terceiros interessados, perante uma legislação como a que está aqui em causa, não podem interpor qualquer recurso e, por conseguinte, também não podem interpor qualquer recurso efetivo das decisões de injunção para prestação de informações da autoridade requerida que lhes digam respeito.

102. O recurso a título incidental no âmbito de um processo subsequente de responsabilidade do Estado, contrariamente ao que afirma a França, não consubstancia um recurso efetivo na aceção do artigo 47.o da Carta. Desde logo, este recurso que, além do mais, está associado a outros requisitos, não é suscetível de impedir a violação dos direitos fundamentais, e, quando muito, compensa um prejuízo sofrido. No entanto, a mera possibilidade secundária de indemnização não constitui um recurso efetivo (44).

103. Além disso, a referência da França a um recurso num procedimento tributário subsequentemente instaurado, entre outros, também contra os terceiros interessados, é improcedente. Conforme acima referido, este argumento não é defensável, desde logo, em relação ao contribuinte, porque no momento da ingerência no direito fundamental nem sequer é certo que venha a existir uma liquidação do imposto (v., a este respeito, n.os 68 e segs., supra). O mesmo vale, a fortiori, no que diz respeito a um terceiro interessado.

104. É certo que a França apresenta a «hipótese» em que os terceiros interessados, no presente caso, são sociedades «puramente artificiais» detidas pela contribuinte, cujos interesses se confundem com os da contribuinte. Por conseguinte, entende que o recurso da contribuinte é bastante. Contudo, estas sociedades também têm personalidade jurídica própria e podem ser titulares de direitos fundamentais próprios, mesmo no caso em que são controladas por outras. Mesmo que houvesse a suspeita de existência de constituição abusiva, tal em nada alteraria a sua existência e, deste modo, o direito a um recurso efetivo, desde logo para que possam afastar esta suspeita perante o tribunal.

105. Além disso, nem todos os terceiros afetados pelas decisões de injunção das autoridades requeridas estão ligados ao contribuinte. Por esse motivo, este argumento da França em nada altera o direito dos terceiros interessados a um recurso efetivo.

106. Por último, as observações relativas ao artigo 23.o da Convenção Relativa à Assistência Mútua Administrativa em Matéria Fiscal no que diz respeito aos contribuintes (v., a este respeito, n.o 77, supra) aplicam‑se na mesma medida aos terceiros interessados.

107. Em face do exposto, a conclusão de que a exclusão de recursos de decisões de injunção para prestação de informações da autoridade requerida viola o direito dos terceiros afetados pelas mesmas a um recurso efetivo nos termos do artigo 47.o da Carta mantém‑se inalterada.

c)      Conclusão

108. Os terceiros afetados por uma decisão de injunção para prestação de informações no âmbito da troca de informações entre autoridades fiscais dos Estados‑Membros ao abrigo da Diretiva 2011/16 podem sujeitar esta injunção a fiscalização jurisdicional nos termos do artigo 47.o da Carta. A exclusão da possibilidade de recurso viola o artigo 47.o da Carta.

B.      Quanto às segundas questões prejudiciais: relevância previsível na aceção do artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2011/16

109. As segundas questões prejudiciais nos processos C‑245/19 e C‑246/19 são muito idênticas, distinguindo‑se apenas no que diz respeito às informações que foram pedidas pelo Estado‑Membro requerente, a Espanha, ao Estado‑Membro requerido, o Luxemburgo.

110. No essencial, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber como deve ser interpretado o requisito das informações «previsivelmente relevantes», previsto no artigo 5.o, em conjugação com o artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2011/16. Saber se o mesmo está preenchido em cada caso concreto não é uma questão de interpretação, mas sim de aplicação do direito da União que compete, por conseguinte, ao órgão jurisdicional nacional.

111. A este respeito, o Tribunal de Justiça já declarou, no processo Berlioz, que resulta da letra dos artigos 1.o, n.o 1, e 5.o da Diretiva 2011/16 que a expressão «previsivelmente relevantes» designa a qualidade que devem revestir as informações solicitadas. A obrigação que incumbe à autoridade requerida nos termos do artigo 5.o da Diretiva 2011/16, de cooperação com a autoridade requerente, não se estende à comunicação de informações desprovidas dessa qualidade (45).

112. Assim, a «relevância previsível» das informações solicitadas constitui uma condição do pedido (46). O presente processo constitui uma oportunidade de esclarecer os critérios à luz dos quais este requisito deve ser apreciado.

113. A este respeito, o conceito de relevância previsível reflete o conceito utilizado no artigo 26.o do Modelo de Convenção da OCDE. O Tribunal de Justiça justificou esta conclusão, corretamente, apoiando‑se na semelhança dos conceitos utilizados na Diretiva 2011/16 e no artigo 26.o do Modelo de Convenção da OCDE. Neste sentido, a exposição de motivos da proposta que deu origem à Diretiva 2011/16 (47) faz referência ao Modelo de Convenção da OCDE (48).

114. De acordo com os comentários ao artigo 26.o do Modelo de Convenção      da OCDE (49), os Estados contratantes não podem realizar investigações aleatórias «fishing expeditions». Não podem solicitar informações cuja relevância seja improvável para o esclarecimento dos assuntos fiscais de uma pessoa. Pelo contrário, deve haver a possibilidade razoável de as informações solicitadas serem relevantes (50). Os comentários ao artigo 26.o do Modelo de Convenção da OCDE descrevem, na secção 8, situações típicas (51) em que a relevância previsível pode ser presumida. A estas foi posteriormente acrescentado o grupo dos pedidos de informações sobre contas (52). Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber a relevância destas alterações para a interpretação da Diretiva 2011/16.

115. Começarei por me debruçar sobre a questão de saber se as alterações posteriores ao Comentário ao Modelo de Convenção da OCDE são relevantes para a interpretação da Diretiva 2011/16 (v., a este respeito, n.o 1). Subsequentemente, irei debruçar‑me sobre a interpretação do requisito da relevância previsível (v., a este respeito, n.o 2).

1.      Relevância das alterações ao Comentário ao Modelo de Convenção da OCDE?

116. O órgão jurisdicional de reenvio pretende, em particular, saber se o caráter evolutivo da interpretação do artigo 26.o do Modelo de Convenção da OCDE deve eventualmente ser tido em conta para a interpretação dos artigos 1.o, n.o 1, e 5.o da Diretiva 2011/16.

117. O Comentário ao Modelo de Convenção da OCDE reproduz o entendimento em relação à compreensão ou à interpretação do Modelo de Convenção por parte dos Estados contratantes (53) e está permanentemente a ser trabalhado e alterado.

118. Conforme já afirmei noutro local (54), o Modelo de Convenção da OCDE não é um tratado de direito internacional público multilateral, juridicamente vinculativo, mas um ato unilateral de um organismo internacional, sob a forma de recomendações aos seus Estados‑Membros. No próprio entender da OCDE, estas recomendações não são vinculativas. Pelo contrário, nos termos do Regulamento de Processo da OCDE, os Estados‑Membros devem analisar se consideram a sua implementação oportuna (55). Esta constatação vale, a fortiori, para os comentários publicados a este respeito pela OCDE.

119. Estas perspetivas jurídicas relativas ao Modelo de Convenção da OCDE não podem influenciar diretamente a interpretação de uma diretiva, mesmo nos casos em que os conceitos utilizados pelo Modelo de Convenção e pela diretiva sejam idênticos. Neste sentido, estes comentários só reproduzem o entendimento dos peritos enviados pelos Governos dos Estados da OCDE (56), mas não o entendimento do legislador parlamentar a nível da União ou dos seus Estados‑Membros (57).

120. O Tribunal de Justiça já declarou, com razão, que as disposições de uma convenção para evitar a dupla tributação, interpretadas à luz dos comentários ao Modelo de Convenção da OCDE, não podem restringir o direito da União (58). Esta constatação aplica‑se, a fortiori, às alterações ao Modelo de Convenção da OCDE e aos comentários que tenham sido efetuados após a publicação da diretiva. Caso contrário, os Estados contratantes, que não são necessariamente Estados‑Membros da União Europeia, teriam o poder de decidir sobre a interpretação de uma diretiva da União Europeia.

121. Em consequência, a alteração da interpretação do artigo 26.o do Modelo de Convenção da OCDE no comentário ao mesmo não tem automaticamente como consequência a alteração da interpretação do artigo 5.o, em conjugação com o artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2011/16. Ainda que os peritos dos Estados‑Membros da OCDE concordem, entretanto, que um pedido de informações relativo a todas as contas do contribuinte e a todas as contas de outras pessoas não especificadas que estejam relacionadas com o contribuinte em causa, junto de um determinado banco, constitui um exemplo de relevância previsível na aceção do artigo 26.o do Modelo de Convenção da OCDE, deste facto não resulta automaticamente que o mesmo também se aplica aos artigos 1.o, n.o 1, e 5.o da Diretiva 2011/16.

122. O Tribunal de Justiça pode, se a interpretação do artigo 26.o do Modelo de Convenção da OCDE o convencer, adotar o princípio da OCDE e interpretar a diretiva em sentido semelhante. No entanto, não existe nenhum automatismo jurídico a este respeito.

123. Em face do exposto, deve ser analisado se os comentários ao artigo 26.o do Modelo de Convenção da OCDE são convincentes e podem ser transpostos. As alterações ao comentário ao Modelo de Convenção da OCDE que tenham sido realizadas após a publicação de um ato jurídico da União necessitam de uma verificação mais intensiva do que os comentários na data da publicação do ato jurídico. Com efeito, as alterações subsequentes não conseguem reproduzir a vontade do legislador da União.

124. O órgão jurisdicional de reenvio salienta que os pedidos de informações nos termos da Diretiva 2011/16 estão relacionados com a ingerência nos direitos fundamentais dos cidadãos da União. Nos termos do artigo 52.o, n.o 1, da Carta, tais restrições devem ser previstas por lei e devem basear‑se em decisões do legislador nacional ou da União. Nem o Modelo de Convenção da OCDE nem os comentários ao mesmo respondem a esta exigência. No Acórdão N Luxembourg 1 e o. (59), referido pelo órgão jurisdicional de reenvio, o Tribunal de Justiça também não declarou que as alterações ao Modelo de Convenção ou aos comentários efetuados após a publicação da diretiva também alteram automaticamente a interpretação da mesma.

125. Assim, mantém‑se uma interpretação autónoma de direito da União do conceito de «relevância previsível» nos termos do artigo 5.o, em conjugação com o artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2011/16. Em consequência, é a sua redação e a sua finalidade que são principalmente determinantes.

2.      Os dois objetivos do requisito da «relevância previsível»

126. De acordo com o considerando 9 da Diretiva 2011/16, a norma da «relevância previsível» destina‑se a permitir a troca de informações em matéria fiscal em toda a medida do possível. Ao mesmo tempo, também se destina a clarificar que os Estados‑Membros não podem efetuar investigações aleatórias nem pedir informações de utilidade duvidosa relativamente à situação tributária de determinado contribuinte (60).

127. Em meu entender, daqui resulta que, por um lado, as informações solicitadas devem ter uma determinada relevância material para a determinação do imposto no Estado‑Membro requerente [aspeto material, v., a este respeito, ponto a)]. Por outro lado, não deve ser permitido que os Estados‑Membros efetuem investigações aleatórias (ou seja, um pedido de informações sem objetivos concretos ou «fishing expeditions») [aspeto formal, v., a este respeito, ponto b)].

a)      Análise limitada da relevância previsível no EstadoMembro requerido para facilitar a troca de informações

128. O Tribunal de Justiça já analisou o aspeto material de forma muito aprofundada no processo Berlioz. Segundo o mesmo, é à autoridade requerente que cabe apreciar, segundo as circunstâncias do processo, a relevância previsível das informações solicitadas para essa investigação, em função da evolução do procedimento e da exploração das fontes habituais de informações a que pôde recorrer. A autoridade requerente detém a este respeito uma certa margem de apreciação (61). O alcance do controlo da autoridade requerida é limitado (62).

129. Assim, a autoridade requerida deve, em princípio, confiar na autoridade requerente e presumir que o pedido de informações que lhe é submetido é simultaneamente conforme com o direito nacional da autoridade requerente e necessário à investigação. Além disso, a autoridade requerida não possui, regra geral, um conhecimento aprofundado do quadro factual e jurídico existente no Estado requerente. Em consequência, a autoridade requerida não pode substituir a apreciação da autoridade requerente da utilidade eventual das informações solicitadas pela sua própria apreciação (63).

130. O controlo exercido pela autoridade requerida limita‑se a permitir que essa autoridade se certifique de que as informações requeridas não são desprovidas de relevância previsível tendo em conta a identidade do contribuinte visado e a do terceiro eventualmente requerido, e as necessidades da investigação fiscal em causa (64). Este critério de controlo também se aplica aos órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro requerido (65). Por conseguinte, as informações solicitadas não podem ser manifestamente irrelevantes para efeitos da investigação fiscal realizada pela autoridade requerente.

131. Para permitir à autoridade requerida proceder à verificação — ainda que limitada —, a autoridade requerente deve fundamentar de forma adequada o seu pedido de informações, devendo esclarecer a finalidade das informações solicitadas no âmbito do procedimento fiscal conduzido contra o contribuinte identificado no pedido de informações (66). Esta fundamentação deve permitir que o juiz nacional exerça a fiscalização da legalidade do pedido de informações (67). Uma fundamentação puramente formal, da qual não resulta a razão pela qual as informações solicitadas são relevantes, nos termos do direito nacional, para o procedimento fiscal no Estado‑Membro requerente, não satisfaz estas exigências. Porém, é ao órgão jurisdicional de reenvio que compete apreciar a fundamentação do pedido de informações.

b)      Proibição de realização de investigações aleatórias

132. De acordo com o considerando 9 da Diretiva 2011/16, com o requisito da «relevância previsível» pretende‑se simultaneamente clarificar que os Estados‑Membros não podem efetuar investigações aleatórias («fishing expeditions») (n.os 126 e 127 das presentes Conclusões), o que também visa, designadamente, garantir a capacidade de funcionamento do sistema de troca de informações, para que o mesmo não seja sobrecarregado por pedidos sem objetivo concreto.

133. Assim, a questão decisiva é a de saber quando, no âmbito da diretiva 2011/16, existe uma investigação ilícita, ou quando existe assistência lícita ao apuramento dos factos. O Tribunal de Justiça ainda não esclareceu esta questão no âmbito da assistência administrativa transfronteiriça.

134. No entanto, o Tribunal de Justiça já se debruçou sobre uma problemática semelhante em matéria de direito da concorrência, concluindo que de facto, para detetar e sancionar comportamentos anticoncorrenciais das empresas, a Comissão pode ordenar uma inspeção às empresas em causa (68). O artigo 20.o, n.o 4, segundo período, do Regulamento 1/2003 especifica, a este respeito, que a Comissão, nessas decisões, deve indicar o objeto e a finalidade da inspeção (69). Deste modo, pretende‑se evitar que a Comissão possa proceder indiscriminadamente a diligências de instrução na falta de suspeitas concretas (70) — uma prática para a qual é utilizada frequentemente a expressão inglesa «fishing expeditions» («andar à pesca» de informações).

135. Conforme já afirmei neste contexto (71), a Comissão deve indicar com a maior precisão possível o que é que procura e os elementos sobre os quais deve incidir a inspeção (72). Por outras palavras, as presunções que são objeto da instrução devem resultar claramente da fundamentação da decisão de realização de diligências de instrução (73). Trata‑se da descrição das infrações às regras de concorrência que a Comissão entende terem sido cometidas, de uma forma que seja compreensível para as empresas em causa.

136. Este raciocínio pode, em princípio, ser transposto para a presente situação de assistência administrativa transfronteiriça. Neste caso, é também necessário que a autoridade requerida possa compreender o que a autoridade requerente pretende investigar, devendo, conforme acima referido, analisar, pelo menos, se as informações não são, em qualquer caso, manifestamente irrelevantes. Além disso, essa fundamentação é relevante para o recurso, imposto pelos direitos fundamentais, do destinatário (v., a este respeito, n.os 47 e segs., supra), do contribuinte afetado (v., a este respeito, n.os 59 e segs.) e, eventualmente, do terceiro interessado (v., a este respeito, n.os 83 e segs.), para que estes se possam defender efetivamente contra uma decisão ilícita de injunção para prestação de informações formulada pela autoridade requerida.

137. No entanto, se a autoridade requerente tiver de indicar as suspeitas que pretende investigar com o pedido de informações, a consulta a todas as «contas não especificadas de outras pessoas relacionadas com o contribuinte em causa», por exemplo, não satisfaz automaticamente estes requisitos.

138. Normalmente, a autoridade requerente deve, antes de mais, incorporar no pedido de informações os factos que pretende investigar ou, pelo menos, as suspeitas concretas relativas a estes factos e a sua relevância em matéria fiscal. Esta fundamentação deve permitir ao Estado requerido justificar perante os seus tribunais a assistência com as respetivas ingerências nos direitos fundamentais (do destinatário, do contribuinte ou do terceiro interessado). As exigências de fundamentação crescem em função do alcance e da sensibilidade das informações solicitadas (74).

139. Por conseguinte, o pedido de assistência administrativa é desprovido de relevância previsível se for formulado para obter meios de prova aleatórios e sem relação concreta com o procedimento fiscal em curso (75).

140. Deste modo, para distinguir entre as informações previsivelmente relevantes e as investigações aleatórias ilícitas, devem ser tidos em consideração diversos fatores. Em primeiro lugar, importa o objeto da investigação da autoridade requerente e a sua acusação em termos fiscais. Em seguida, o comportamento anterior (76) do contribuinte também é relevante. Para esse efeito, o Schweizerische Bundesgericht (Tribunal Federal suíço) exige, corretamente, a existência de indícios concretos do não cumprimento de obrigações fiscais (77).

141. Este seria eventualmente o caso no presente processo, se a contribuinte tivesse anteriormente retido informações sobre contas ou relações com terceiros com ela relacionados ou se tivesse prestado informações contraditórias no procedimento fiscal. Por último, também importa conhecer as circunstâncias que a administração fiscal requerente apurou até à data. Por exemplo, no caso de redes complexas de empresas com transações financeiras pouco claras entre si, pode haver uma necessidade especial de formular um pedido de informações. O mesmo se dirá nos casos em que dos inquéritos realizados até à data resultem informações contraditórias que devam então ser esclarecidas com a ajuda do banco A.

142. Em face do exposto, no presente caso, a Administração Fiscal espanhola deve referir, por exemplo, elementos que justifiquem a sua presunção de que a contribuinte tem outras contas junto do banco A, a sua presunção da existência de outros rendimentos não declarados e a razão pela qual suspeita da existência de transferências de valores entre a contribuinte e as sociedades B, C e D.

143. Sem estes elementos concretos, o pedido de informações relativo à identificação de todas as contas detidas por um contribuinte e de todas as contas não especificadas detidas por terceiros que tenham alguma ligação ao contribuinte, num determinado banco, não é admissível nos termos da Diretiva 2011/16 e consubstancia uma investigação aleatória não permitida («fishing expedition»).

144. Contudo, a necessária delimitação deve ocorrer mediante uma análise global de todas as circunstâncias do caso concreto, o que compete ao órgão jurisdicional de reenvio.

145. Se o órgão jurisdicional de reenvio concluir que o pedido de informações consubstancia uma investigação aleatória inadmissível, a administração fiscal requerida poderá não dar seguimento ao pedido de informações. Com efeito, nos termos dos artigos 1.o, n.o 1, e 5.o, tendo em conta o considerando 9 da Diretiva 2011/16, os Estados‑Membros não podem efetuar investigações aleatórias («fishing expeditions»).

3.      Conclusão relativa às segundas questões prejudiciais

146. Os artigos 1.o, n.o 1, e 5.o da Diretiva 2011/16 devem ser interpretados no sentido de que a autoridade requerente deve fundamentar o pedido de informações para que a autoridade requerida possa avaliar se não falta manifestamente a relevância previsível para a liquidação do imposto pela autoridade requerente. O pedido deve conter elementos concretos relativos aos factos ou aos procedimentos relevantes para efeitos fiscais, de modo que exclua uma investigação aleatória inadmissível («fishing expedition»).

VI.    Conclusão

147. Pelo exposto, proponho que se responda o seguinte às questões prejudiciais da Cour administrative (Supremo Tribunal Administrativo, Luxemburgo):

1.      O artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia deve ser interpretado no sentido de que a decisão mediante a qual uma autoridade requerida ao abrigo da Diretiva 2011/16, relativa à cooperação administrativa no domínio da fiscalidade, obriga uma pessoa a prestar informações sobre um contribuinte ou sobre terceiros deve poder ser impugnada por essa pessoa, pelo contribuinte ou pelos terceiros interessados, perante os tribunais do Estado‑Membro requerido.

2.      Os artigos 1.o, n.o 1, e 5.o da Diretiva 2011/16 devem ser interpretados no sentido de que a autoridade requerente deve fundamentar o pedido de informações para que a autoridade requerida possa avaliar se a relevância previsível das informações solicitadas para a liquidação do imposto pela autoridade requerente não é manifestamente inexistente. O pedido deve conter elementos concretos relativos aos factos ou aos procedimentos relevantes para efeitos fiscais, de modo que exclua uma investigação aleatória inadmissível («fishing expedition»).


1      Língua original: alemão.


2      A Diretiva 2011/16/UE do Conselho, de 15 de fevereiro de 2011, relativa à cooperação administrativa no domínio da fiscalidade e que revoga a Diretiva 77/799/CEE (JO 2011, L 64, p. 1), está, entretanto, em vigor na versão alterada pela Diretiva (UE) 2018/822 do Conselho, de 25 de maio de 2018 (JO 2018, L 139, p. 1). Os Estados‑Membros devem aplicar as disposições que implementam estas alterações a partir de 1 de julho de 2020.


3      Acórdãos de 26 de fevereiro de 2019, N Luxembourg 1 e o. (C‑115/16, C‑118/16, C‑119/16 e C‑299/16, EU:C:2019:134), e T Danmark e Y Denmark (C‑116/16 e C‑117/16, EU:C:2019:135); minhas Conclusões nestes processos (C‑115/16, EU:C:2018:143, C‑116/16, EU:C:2018:144, C‑117/16, EU:C:2018:145, C‑118/16, EU:C:2018:146, C‑119/16, EU:C:2018:147, e C‑299/16, EU:C:2018:148).


4      Organização para o Desenvolvimento e Cooperação Económica, Base Erosion and Profit Shifting.


5      Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373).


6      A Diretiva 2011/16 é aplicável ao presente caso, na versão alterada pela Diretiva (UE) 2016/2258 do Conselho, de 6 de dezembro de 2016 (JO 2016, L 342, p. 1).


7      Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.o 59 e n.o 2 da parte decisória).


8      Conselho da Europa, Série de Tratados Europeus, n.o 127, na redação alterada pelo Protocolo de 2010, Série de Tratados Europeus, n.o 208. Só as versões inglesa e francesa da convenção são oficiais.


9      Recommendation concerning the Avoidance of Double Taxation/Recommandation concernant la suppression des doubles impositions (Recomendação para evitar a dupla tributação). A versão atual do Modelo de Convenção da OCDE é datada de 21 de novembro de 2017.


10      Convention entre le Grand‑Duché de Luxembourg et le Royaume d’Espagne tendant à éviter les doubles impositions en matière d’impôts sur le revenu et sur la fortune et à prévenir la fraude et l’évasion fiscales/Convenio entre el Reino de España y el Gran Ducado de Luxemburgo para evitar la doble imposición en materia de impuestos sobre la Renta y el Patrimonio y para prevenir el fraude y la evasión fiscal (Convenção entre o Grão‑Ducado do Luxemburgo e o Reino de Espanha para Evitar a Dupla Tributação em Matéria de Impostos sobre o Rendimento e sobre a Riqueza e para Prevenir a Fraude e a Evasão Fiscais), na versão alterada pelo Protocolo de 10 de novembro de 2009.


11      Lei que transpõe a Diretiva 2011/16, Mémorial A 2013, p. 756.


12      Mémorial A 2014, p. 4170.


13      Mémorial A 2019, p. 112.


14      Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.o 42 e n.o 1 da parte dispositiva).


15      Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.os 45 e segs.).


16      Jurisprudência constante, Acórdãos de 13 de setembro de 2018, UBS Europe e o. (C‑358/16, EU:C:2018:715, n.o 56), e de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.o 51); Despacho de 17 de novembro de 2005, Minoan Lines/Comissão (C‑121/04 P, não publicado, EU:C:2005:695, n.o 30); e Acórdãos de 22 de outubro de 2002, Roquette Frères (C‑94/00, EU:C:2002:603, n.o 27), e de 21 de setembro de 1989, Hoechst/Comissão (46/87 e 227/88, EU:C:1989:337, n.o 19).


17      Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.o 59 e n.o 2 da parte dispositiva).


18      V. Acórdãos de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho (C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.o 104), e de 13 de março de 2007, Unibet (C‑432/05, EU:C:2007:163, n.o 64).


19      Acórdãos de 3 de outubro de 2019, A e o. (C‑70/18, EU:C:2019:823, n.o 54); de 16 de janeiro de 2019, Deutsche Post (C‑496/17, EU:C:2019:26, n.o 54); de 17 de outubro de 2013, Schwarz (C‑291/12, EU:C:2013:670, n.o 26); de 24 de novembro de 2011, Asociación Nacional de Establecimientos Financieros de Crédito (C‑468/10 e C‑469/10, EU:C:2011:777, n.o 42); e de 9 de novembro de 2010, Volker und Markus Schecke e Eifert (C‑92/09 e C‑93/09, EU:C:2010:662, n.o 52).


20      V. Acórdãos de 1 de outubro de 2015, Bara e o. (C‑201/14, EU:C:2015:638, n.os 14 e 29); de 16 de dezembro de 2008, Satakunnan Markkinapörssi e Satamedia (C‑73/07, EU:C:2008:727, n.o 35); e de 20 de maio de 2003, Österreichischer Rundfunk e o. (C‑465/00, C‑138/01 e C‑139/01, EU:C:2003:294, n.o 73).


21      TEDH, 22 de dezembro de 2015, G.S.B./Suíça, CE:ECHR:2015:1222JUD002860111, § 51, e 7 de julho de 2015, M.N. e o./San Marino, CE:ECHR:2015:0707JUD002800512, § 51.


22      V., neste sentido, Parecer 1/15 de 26 de julho de 2017 (EU:C:2017:592, n.os 125 e 126), e Acórdãos de 21 de dezembro de 2016, Tele2 Sverige e Watson e o. (C‑203/15 e C‑698/15, EU:C:2016:970, n.o 100), de 1 de outubro de 2015, Bara e o. (C‑201/14, EU:C:2015:638, n.o 29), e de 20 de maio de 2003, Österreichischer Rundfunk e o. (C‑465/00, C‑138/01 e C‑139/01, EU:C:2003:294, n.o 74).


23      TEDH, 22 de dezembro de 2015, G.S.B./Suíça, CE:ECHR:2015:1222JUD002860111, § 50.


24      Acórdãos de 21 de novembro de 2019, Deutsche Lufthansa (C‑379/18, EU:C:2019:1000, n.o 61), e de 13 de março de 2007, Unibet (C‑432/05, EU:C:2007:163, n.os 47, 50 e 53).


25      V. Acórdãos de 22 de outubro de 2013, Sabou (C‑276/12, EU:C:2013:678, n.o 32), e de 27 de setembro de 2007, Twoh International (C‑184/05, EU:C:2007:550, n.os 30 e 31). Quanto às causas justificativas no âmbito das liberdades fundamentais, v. Acórdãos de 3 de março de 2020, Google Ireland (C‑482/18, EU:C:2020:141, n.o 47); de 25 de julho de 2018, TTL (C‑553/16, EU:C:2018:604, n.o 57); e de 26 de maio de 2016, NN (L) International (C‑48/15, EU:C:2016:356, n.o 59).


26      Acórdão de 10 de abril de 2003, Steffensen (C‑276/01, EU:C:2003:228, n.o 75), e minhas Conclusões nos processos apensos IN e JM (C‑469/18 e C‑470/18, EU:C:2019:597, n.os 70 e segs.); do Acórdão de 17 de dezembro de 2015, WebMindLicenses (C‑419/14, EU:C:2015:832), também não se retira nenhuma proibição absoluta de utilização de elementos de prova.


27      V., a título de exemplo para a República Federal da Alemanha, os Acórdãos do Finanzgericht Köln (Tribunal Tributário de Colónia), de 12 de setembro de 2018, 2 K 814/18; de 13 de abril de 2018, 2 V 174/18; de 23 de fevereiro de 2018, 2 V 814/17; e de 20 de outubro de 2017, 2 V 1055/17.


28      Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.o 59 e n.o 2 da parte dispositiva).


29      Acórdão de 22 de outubro de 2013 (C‑276/12, EU:C:2013:678).


30      Neste sentido, expressamente, Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.o 58).


31      Acórdão de 22 de outubro de 2013, Sabou (C‑276/12, EU:C:2013:678, n.o 41).


32      V. Acórdão de 22 de outubro de 2013, Sabou (C‑276/12, EU:C:2013:678, n.o 44).


33      Acórdão de 22 de outubro de 2013, Sabou (C‑276/12, EU:C:2013:678, n.o 46 e n.o 1 da parte dispositiva), e minhas Conclusões neste processo (EU:C:2013:370, n.o 62).


34      Em concreto, trata‑se do artigo 2.o, alínea a), da Diretiva 95/46/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de outubro de 1995, relativa à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados, e do artigo 2.o, alínea a), do Regulamento (CE) n.o 45/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro de 2000, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais pelas instituições e pelos órgãos comunitários e à livre circulação desses dados.


35      Acórdãos de 17 de dezembro de 2015, WebMindLicenses (C‑419/14, EU:C:2015:832, n.o 79), e de 9 de novembro de 2010, Volker und Markus Schecke e Eifert (C‑92/09 e C‑93/09, EU:C:2010:662, n.os 52 e 53).


36      Acórdãos 3 de outubro de 2019, A e o. (C‑70/18, EU:C:2019:823, n.o 54); de 16 de janeiro de 2019, Deutsche Post (C‑496/17, EU:C:2019:26, n.o 54); de 17 de outubro de 2013, Schwarz (C‑291/12, EU:C:2013:670, n.o 26); de 24 de novembro de 2011, Asociación Nacional de Establecimientos Financieros de Crédito (C‑468/10 e C‑469/10, EU:C:2011:777, n.o 42); e de 9 de novembro de 2010, Volker und Markus Schecke e Eifert (C‑92/09 e C‑93/09, EU:C:2010:662, n.o 52).


37      TEDH, 7 de julho de 2015, M.N. e o./San Marino, CE:ECHR:2015:0707JUD002800512, § 51; o artigo 7.o da Carta corresponde ao artigo 8.o, n.o 1, da CEDH, Acórdão de 14 de fevereiro de 2019, Buivids (C 345/17, EU:C:2019:122, n.o 65).


38      TEDH, 22 de dezembro de 2015, G.S.B./Suíça, CE:ECHR:2015:1222JUD002860111, § 51, e 7 de julho de 2015, M.N. e o./San Marino, CE:ECHR:2015:0707JUD002800512, § 51.


39      Acórdãos de 17 de dezembro de 2015, WebMindLicenses (C‑419/14, EU:C:2015:832, n.o 80), e de 14 de fevereiro de 2008, Varec (C‑450/06, EU:C:2008:91, n.o 48). Neste sentido, igualmente, Acórdão de 9 de novembro de 2010, Volker und Markus Schecke e Eifert (C‑92/09 e C‑93/09, EU:C:2010:662, n.o 87, no qual o Tribunal de Justiça apreciou a proporcionalidade face ao artigo 7.o da Carta). V., igualmente, TEDH, 16 de junho de 2015 (decisão), Othymia Investments/Países Baixos, CE:ECHR:2015:0616DEC007529210, § 37; 14 de março de 2013, Bernh Larsen Holding e o./Noruega, ECLI:CE:ECHR:2013:0314JUD002411708, § 104; e 16 de abril de 2002, Stes Colas e o./França, ECLI:CE:ECHR:2002:0416JUD003797197, § 41.


40      Neste sentido, segundo a jurisprudência do TEDH, as informações puramente financeiras merecem menor proteção do que os dados íntimos, v. TEDH, 22 de dezembro de 2015, G.S.B./Suíça, CE:ECHR:2015:1222JUD002860111, § 93.


41      Acórdãos de 6 de outubro de 2015, Schrems (C‑362/14, EU:C:2015:650, n.o 87); de 8 de abril de 2014, Digital Rights Ireland e o. (C‑293/12 e C‑594/12, EU:C:2014:238, n.o 33); e de 20 de maio de 2003, Österreichischer Rundfunk e o. (C‑465/00, C‑138/01 e C‑139/01, EU:C:2003:294, n.o 75).


42      V. TEDH, 7 de julho de 2015, M.N. e o./San Marino, CE:ECHR:2015:0707JUD002800512, § 54.


43      TEDH, 16 de junho de 2015 (decisão), Othymia Investments/Países Baixos, CE:ECHR:2015:0616DEC007529210, § 44.


44      TEDH, 7 de julho de 2015, M.N. e o./San Marino, CE:ECHR:2015:0707JUD002800512, § 81.


45      Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.o 63).


46      Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.o 64).


47      Proposta de diretiva do Conselho relativa à cooperação administrativa no domínio da fiscalidade, COM(2009) 29 final, de 2 de fevereiro de 2009.


48      Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.o 67).


49      Conselho da OCDE, Comentário ao Modelo de Convenção da OCDE, comentários ao artigo 26.o, à data de 21 de novembro de 2017.


50      Secção 5 dos comentários ao artigo 26.o do Modelo de Convenção da OCDE.


51      Nos termos da secção 4.4 dos comentários ao artigo 26.o do Modelo de Convenção da OCDE, a enumeração dos casos na secção 8 é meramente exemplificativa.


52      Secção 8, alínea e), dos comentários ao artigo 26.o do Modelo de Convenção da OCDE.


53      Secção 3 da introdução ao comentário ao artigo 26.o do Modelo de Convenção da OCDE.


54      Minhas Conclusões nos processos N Luxembourg 1 (C‑115/16, EU:C:2018:143, n.os 50 e segs.); T Danmark (C‑116/16, EU:C:2018:144, n.os 81 e segs.); Y Denmark (C‑117/16, EU:C:2018:145, n.os 81 e segs.); X Denmark (C‑118/16, EU:C:2018:146, n.os 50 e segs.); C Danmark (C‑119/16, EU:C:2018:147, n.os 50 e segs.); e Z Denmark (C‑299/16, EU:C:2018:148, n.os 50 e segs.).


55      O artigo 18.o, alínea b), do Regulamento de Processo da OCDE dispõe: «Recommendations of the Organisation, made by the Council in accordance with Articles 5, 6 and 7 of the Convention, shall be submitted to the Members for consideration in order that they may, if they consider it opportune, provide for their implementation» (As recomendações da Organização, feitas pelo Conselho ao abrigo do disposto nos artigos 5.o, 6.o e 7.o da Convenção, devem ser submetidas à consideração dos Membros para sua implementação, se a considerarem oportuna). Pode ser consultado em https://www.oecd.org/legal/rules%20of%20Procedure%20OECD%20Oct%202013.pdf.


56      Secção 29 da introdução ao comentário ao Modelo de Convenção Fiscal da OCDE.


57      As minhas Conclusões nos processos N Luxembourg 1 (C‑115/16, EU:C:2018:143, n.o 52); T Danmark (C‑116/16, EU:C:2018:144, n.o 83); Y Denmark (C‑117/16, EU:C:2018:145, n.o 83); X Denmark (C‑118/16, EU:C:2018:146, n.o 52); C Danmark (C‑119/16, EU:C:2018:147, n.o 52); e Z Denmark (C‑299/16, EU:C:2018:148, n.os 50 e segs.).


58      Acórdão de 19 de janeiro de 2006, Bouanich (C‑265/04, EU:C:2006:51, n.os 50 e 56).


59      Acórdão de 26 de fevereiro de 2019, N Luxembourg 1 e o. (C‑115/16, C‑118/16, C‑119/16 e C‑299/16, EU:C:2019:134, n.os 90 a 93).


60      Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.o 66).


61      Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.os 70 e 71).


62      Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.o 76).


63      Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.o 77).


64      Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.o 82).


65      Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.o 85).


66      Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.o 80).


67      Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373, n.o 84).


68      V. Acórdãos de 25 de junho de 2014, Nexans e Nexans France/Comissão (C‑37/13 P, EU:C:2014:2030, n.o 33); de 22 de outubro de 2002, Roquette Frères (C‑94/00, EU:C:2002:603, n.o 42); e de 21 de setembro de 1989, Hoechst/Comissão (46/87 e 227/88, EU:C:1989:337, n.o 25).


69      V. Acórdãos de 30 de janeiro de 2020, České dráhy/Comissão (C‑538/18 P e C‑539/18 P, EU:C:2020:53, n.o 40); de 25 de junho de 2014, Nexans e Nexans France/Comissão (C‑37/13 P, EU:C:2014:2030, n.o 34); de 22 de outubro de 2002, Roquette Frères (C‑94/00, EU:C:2002:603, n.o 47); e de 21 de setembro de 1989, Hoechst/Comissão (46/87 e 227/88, EU:C:1989:337, n.o 29).


70      V., a este respeito, minhas Conclusões nos processos Nexans France e Nexans/Comissão (C‑606/18 P, EU:C:2020:207, n.o 55); Nexans e Nexans France/Comissão (C‑37/13 P, EU:C:2014:223, n.os 43 e 52); e Solvay/Comissão (C‑109/10 P, EU:C:2011:256, n.o 138).


71      Minhas Conclusões nos processos Nexans France e Nexans/Comissão (C‑606/18 P, EU:C:2020:207, n.os 55 e 56), e Nexans e Nexans France/Comissão (C‑37/13 P, EU:C:2014:223, n.o 52).


72      Acórdão de 22 de outubro de 2002, Roquette Frères (C‑94/00, EU:C:2002:603, n.o 83).


73      Acórdãos de 25 de junho de 2014, Nexans e Nexans France/Comissão (C‑37/13 P, EU:C:2014:2030, n.o 35); de 17 de outubro de 1989, Dow Chemical Ibérica e o./Comissão (97/87 a 99/87, EU:C:1989:380, n.o 45), e Dow Benelux/Comissão (85/87, EU:C:1989:379, n.o 9); e de 21 de setembro de 1989, Hoechst/Comissão (46/87 e 227/88, EU:C:1989:337, n.o 41). V., igualmente, minhas Conclusões no processo Solvay/Comissão (C‑109/10 P, EU:C:2011:256, n.o 138).


74      Em sentido semelhante, Schweizerische Bundesgericht (Tribunal Federal suíço), Acórdão de 12 de setembro de 2016 — 2C_276/2016 —, n.o 6.3, quanto ao nível de pormenor da matéria de facto apresentada.


75      Neste sentido, também, Schweizerische Bundesgericht (Tribunal Federal suíço), Acórdão de 26 de julho de 2019 — 2C_653/2018 —, n.os 6.1.2 e segs., e de 12 de setembro de 2016 — 2C_276/2016 —, n.os 6.1.2 e segs.


76      Neste sentido, explicitamente, também, Schweizerische Bundesgericht (Tribunal Federal suíço), Acórdão de 12 de setembro de 2016 — 2C_276/2016 —, n.o 6.4.3. O comportamento do cliente do banco, do qual resulta a suspeita de que a pessoa em causa não teria efetivamente declarado corretamente o património ou os rendimentos, é determinante.


77      Schweizerische Bundesgericht (Tribunal Federal suíço), Acórdão de 26 de julho de 2019 — 2C_653/2018 —, n.o 6.2.2.