Language of document : ECLI:EU:T:2023:734

Processo T304/20

Laura Molina Fernández

contra

Conselho Único de Resolução

 Acórdão do Tribunal Geral (Terceira Secção alargada) de 22 de novembro de 2023

«União Económica e Monetária — União Bancária — Mecanismo Único de Resolução das instituições de crédito e de certas empresas de investimento (MUR) — Resolução do Banco Popular Español — Decisão do CUR que recusa uma indemnização aos acionistas e aos credores afetados pelas medidas de resolução — Avaliação da diferença de tratamento — Independência do avaliador»

1.      Política económica e monetária — Política económica — Mecanismo Único de Resolução das instituições de crédito e de certas empresas de investimento — Adoção de um programa de resolução — Poder de apreciação do Conselho Único de Resolução (CUR) — Alcance — Pedido de indemnização dos acionistas e credores — Apreciação dos elementos factuais de ordem científica e técnica altamente complexos — Apreciações económicas complexas — Amplo poder de apreciação — Fiscalização jurisdicional — Limites — Erro manifesto de apreciação — Ónus da prova

[Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, artigo 41.°, n.° 2, alínea a)]

(cf. n.os 32‑38)

2.      Política económica e monetária — Política económica — Mecanismo Único de Resolução das instituições de crédito e de certas empresas de investimento — Adoção de um programa de resolução — Pedido de indemnização dos acionistas e credores — Determinação do tratamento dos acionistas e dos credores no âmbito de um processo normal de insolvência — Processo normal de insolvência — Conceito — Liquidação da entidade — Inclusão — Concordata com os credores — Exclusão — Cenário de continuidade da exploração — Exclusão

(Regulamento n.° 806/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, artigo 20.°, n.os 16 e 18)

(cf. n.os 48, 50, 56, 58)

Resumo

Nos processos apensos T‑302/20, T‑303/20 e T‑307/20 e no processo T‑304/20, os recorrentes são pessoas singulares e coletivas que eram acionistas do Banco Popular Español, SA (a seguir «Banco Popular») antes da adoção de um programa de resolução desse banco. Em contrapartida, no processo T‑330/20, trata‑se de fundos de investimento que, antes da adoção desse mesmo programa, detinham instrumentos de capital, com exceção de um deles, que sucedeu nos direitos de uma entidade detentora de obrigações do Banco Popular.

Em 7 de junho de 2017, a sessão executiva do Conselho Único de Resolução (CUR) adotou, com base no Regulamento n.° 806/2014 (1), um programa de resolução para o Banco Popular (2), aprovado no mesmo dia pela Comissão Europeia (3).

Antes da adoção desse programa, o CUR tinha contratado o gabinete Deloitte Revisores de Empresas, na qualidade de avaliador (a seguir «gabinete avaliador»), para realizar uma avaliação do Banco Popular antes de uma eventual resolução, bem como a avaliação da diferença de tratamento, posteriormente a uma resolução potencial. Em 6 de junho de 2017, o gabinete avaliador entregou ao CUR uma avaliação (a seguir «avaliação 2»), que tinha por objetivo estimar o valor do ativo e do passivo do Banco Popular, fornecer uma estimativa sobre o tratamento de que os acionistas e credores teriam beneficiado se o Banco Popular tivesse sido objeto de um processo normal de insolvência e fornecer os elementos que permitissem tomar a decisão relativa às ações e aos instrumentos de propriedade a transferir e que permitissem ao CUR determinar condições comerciais para efeitos do instrumento de alienação da atividade. No programa de resolução, considerando que estavam preenchidas as condições exigidas (4), o CUR decidiu submeter o Banco Popular a um processo de resolução. Na sequência de um processo de venda transparente e aberto realizado pela autoridade de resolução espanhola, o Fondo de Reestructuración Ordenada Bancaria (FROB, Fundo de Reestruturação Ordenada das Instituições Bancárias, Espanha), as «novas ações II» foram transferidas para o Banco Santander, S. A.

Na sequência da adoção do programa de resolução, o gabinete avaliador transmitiu ao CUR a avaliação da diferença de tratamento (5) (a seguir «avaliação 3») destinada a determinar se os acionistas e credores afetados teriam beneficiado de um melhor tratamento se o Banco Popular tivesse sido objeto de um processo normal de insolvência do que aquele de que foram objeto devido à resolução. Essa avaliação foi realizada no âmbito de um cenário de liquidação, em aplicação da legislação espanhola, no momento em que o programa de resolução foi adotado. O gabinete avaliador considerou que a abertura de um processo normal de insolvência do Banco Popular em 7 de junho de 2017 teria levado a uma liquidação não planificada. Concluiu que, em cada uma dessas hipóteses, para os acionistas afetados e para os credores subordinados, não existia qualquer diferença de tratamento face à resultante da medida de resolução.

Em seguida, para poder tomar uma decisão final sobre a necessidade ou não de lhes conceder uma indemnização recorrendo ao Fundo Único de Resolução (6), o CUR convidou os acionistas e credores afetados a comunicarem‑lhe o seu interesse em exercerem o seu direito de audiência, tendo em conta a sua decisão preliminar a esse respeito (7), na qual concluía, à luz da avaliação 3, que não era obrigado a pagar‑lhes uma indemnização. O procedimento relativo ao direito de audiência decorreu em duas fases sucessivas, a saber, a fase de inscrição, em que os acionistas e credores afetados eram convidados a comunicar o seu interesse em exercerem o seu direito de audiência, e depois a fase de consulta, durante a qual as pessoas em causa podiam apresentar os seus comentários sobre a decisão preliminar à qual estava anexa a versão não confidencial da avaliação 3.

No termo dessa fase de consulta, o CUR examinou os comentários relevantes e recebeu do gabinete avaliador um documento de clarificação em que este confirmava que a estratégia e os diferentes cenários de liquidação hipotéticos pormenorizados na avaliação 3, bem como as metodologias seguidas e as análises efetuadas, permaneciam válidas.

Em 17 de março de 2020, o CUR adotou a Decisão SRB/EES/2020/52, destinada a determinar se devia ser concedida uma indemnização aos acionistas e aos credores afetados pelas medidas de resolução efetuadas em relação ao Banco Popular (a seguir «decisão recorrida»), na qual considerou que o gabinete avaliador era independente e que a avaliação 3 respeitava o quadro legal aplicável e estava suficientemente fundamentada e completa. Apresentou também os comentários feitos pelos acionistas e credores afetados bem como a sua avaliação e concluiu que não havia qualquer diferença entre o tratamento de que os acionistas e credores afetados tinham realmente sido objeto e aquele de que teriam beneficiado se o Banco Popular tivesse sido sujeito a um processo normal de insolvência à data da resolução.

Com os seus acórdãos, nos quais conclui pela negação de provimento aos três recursos, baseados no artigo 263.° TFUE, o Tribunal Geral pronuncia‑se, pela primeira vez, sobre um pedido de anulação de uma decisão do CUR relativa à eventual indemnização dos acionistas e dos credores afetados na sequência de uma resolução bancária. A este título, o Tribunal Geral examina várias questões inéditas suscitadas nos três recursos, em especial no que respeita à apreciação da situação dos acionistas e credores afetados caso o Banco Popular tivesse sido sujeito a um processo normal de insolvência, à independência do gabinete avaliador, ao direito de audiência durante o processo, ao direito a um recurso efetivo e ao direito de propriedade.

Apreciação do Tribunal Geral

Em primeiro lugar, o Tribunal Geral rejeita as alegações de que a decisão recorrida está ferida de ilegalidade quanto ao exame da questão de saber se os antigos acionistas do Banco Popular teriam beneficiado de um melhor tratamento num processo normal de insolvência.

Primeiro, o Tribunal Geral refere, por um lado, que resulta claramente das disposições do Regulamento n.° 806/2014 que a referência (8) ao tratamento de que os acionistas e credores da entidade teriam beneficiado se esta tivesse sido sujeita a um processo normal de insolvência remete para o seu tratamento hipotético em caso de liquidação da entidade. Por outro lado, o método de avaliação desse tratamento definido no Regulamento Delegado 2018/344 (9) corresponde à realização dos ativos da instituição e, portanto, a uma liquidação conforme definida no artigo 3.°, n.° 1, ponto 42, do Regulamento n.° 806/2014.

Segundo, para determinar a diferença de tratamento, a comparação tem por objeto o tratamento real dado aos acionistas e credores afetados devido à resolução e a avaliação da sua situação caso a medida de resolução não tivesse sido adotada, a saber, a hipótese de a entidade ter sido liquidada.

Terceiro, o Tribunal Geral observa que, na apreciação da diferença de tratamento na sequência de uma resolução decidida pelo FROB, o direito espanhol prevê que o cenário contrafactual seja um cenário de liquidação da entidade que tem em conta as disposições da lei espanhola relativas à liquidação. Daí conclui que a determinação da diferença de tratamento se deve basear num cenário de liquidação, o que exclui a possibilidade de um cenário assente numa continuidade de exploração da entidade ou numa concordata com os credores.

Quarto, o Tribunal Geral precisa que o cenário contrafactual de liquidação previsto na avaliação 3 devia ser definido à luz da situação do Banco Popular à data da resolução. Nessa data, o Banco Popular não estava em condições de prosseguir as suas atividades, dada a sua situação de liquidez, a sua situação ou risco de insolvência e a possível revogação da sua autorização bancária, e que, por esse motivo, nem uma concordata nem um cenário de insolvência que assumisse a hipótese de uma empresa em continuidade de exploração eram possíveis.

Do mesmo modo, o Tribunal rejeita o argumento de que o gabinete avaliador deveria ter efetuado uma avaliação do Banco Popular que previsse a venda do estabelecimento na sua totalidade ou por unidade de produção, a qual implicava uma prossecução das atividades da empresa. O gabinete avaliador não cometeu, pois, qualquer erro ao utilizar uma metodologia baseada num cenário de liquidação e na venda dos ativos individualmente ou por carteiras.

Quinto, a decisão recorrida não está ferida de qualquer erro manifesto de apreciação tanto no que respeita à consideração de uma duração máxima do processo de liquidação de sete anos, tendo em conta, nomeadamente, o objetivo de realizar uma liquidação num prazo razoável e às incertezas induzidas por uma duração de liquidação prolongada, como quanto à avaliação das carteiras de créditos produtivos e não produtivos, das filiais imobiliárias do Banco Popular e dos riscos jurídicos.

Em segundo lugar, o Tribunal Geral julga improcedente o fundamento relativo à falta de independência do gabinete avaliador.

Primeiro, refere que as circunstâncias do caso, por um lado, não demonstram que o gabinete avaliador, ao realizar a avaliação 3, tenha sido influenciado pelo facto de ter realizado a avaliação 2 e, por outro, contradizem o argumento da recorrente de que podia razoavelmente parecer ter falta de objetividade ou de imparcialidade.

Com efeito, na avaliação 3, a análise da diferença de tratamento baseia‑se no tratamento efetivo dos acionistas e credores afetados na sequência da resolução. A avaliação do ativo e do passivo do Banco Popular para efeitos da resolução que figura na primeira parte da avaliação 2 não foi tida em conta na avaliação 3 e não podia, portanto, influenciar o gabinete avaliador quando a realizou.

Acresce que a avaliação 2 continha muitas reservas quanto à fiabilidade da simulação do cenário de liquidação. O Tribunal Geral rejeita, portanto, a alegação de que o gabinete avaliador, com o objetivo de proteger a sua reputação profissional, se considerou vinculado pelas conclusões que figuravam na avaliação 2 quando realizou a avaliação 3.

Além disso, o Tribunal Geral rejeita o argumento da recorrente de que o gabinete avaliador foi incentivado a evitar qualquer retificação ou alteração das conclusões contidas na avaliação 2, que é desmentido pelas circunstâncias em que foram efetuadas as avaliações 2 e 3. Com efeito, a avaliação 3 baseava‑se em informações mais precisas do que aquelas de que dispunha o gabinete avaliador na fase da avaliação 2. Por outo lado, o CUR, logo com a receção da avaliação 2, ficou informado de que o gabinete avaliador se devia basear em novos dados na avaliação 3 e, portanto, alterar a avaliação efetuada na simulação do cenário de liquidação. Na avaliação 3, o gabinete avaliador não se limitou a confirmar o resultado da simulação que figurava na avaliação 2. De resto, o simples facto de o gabinete avaliador ter chegado à mesma conclusão não basta para demonstrar que se considerou vinculado pela sua avaliação realizada na avaliação 2 quando efetuou a avaliação 3.

Por último, o Tribunal Geral rejeita a alegação de que o CUR deveria ter recorrido a um avaliador diferente para proceder a uma avaliação segundo um método diferente, uma vez que a avaliação do tratamento dos acionistas e credores afetados devia ser efetuada segundo um cenário de liquidação. Do mesmo modo, nenhuma disposição do Regulamento n.° 806/2014 nem do Regulamento Delegado 2016/1075 se opõe expressamente a que as avaliações 2 e 3 sejam feitas pelo mesmo avaliador.

Segundo, o Tribunal Geral rejeita as alegações de falta de independência do gabinete avaliador devido às suas alegadas ligações com o Banco Popular e o Banco Santander.

A este título, observa que, à data da designação do gabinete avaliador como avaliador independente, por um lado, a identidade do adquirente não era conhecida, pelo que não era possível ter em conta as ligações entre o gabinete avaliador e o Banco Santander e, por outro, o gabinete avaliador já não prestava serviços de auditoria ao Banco Santander.

Refira‑se que, ao longo de todo o procedimento relativo à resolução do Banco Popular, o CUR assegurou, como era obrigado a fazer, que o gabinete avaliador respeitasse as exigências de independência e, em particular, as relativas à inexistência de conflito de interesses previstas no artigo 41.° do Regulamento Delegado 2016/1075 (10).

Assim, não cometeu qualquer erro o CUR ao considerar que os serviços prestados pelo gabinete avaliador tanto ao Banco Popular como ao Banco Santander não eram suscetíveis de influenciar a sua apreciação na realização da avaliação 3 e não eram, portanto, suscetíveis de demonstrar a existência de interesses significativos, reais ou potenciais em comum ou em conflito com eles.

Do mesmo modo, nenhum argumento põe em causa as apreciações do CUR relativas à inexistência de ligação entre, por um lado, os serviços de auditoria e os serviços relativos à integração do Banco Popular prestados ao Banco Santander pelo gabinete avaliador e, por outro, os elementos relevantes para a avaliação 3, que apenas dizia respeito à avaliação do Banco Popular e não do Banco Santander.

Além disso, os recorrentes não explicam de que forma esses serviços prestados pelo gabinete avaliador eram suscetíveis de influenciar ou se podia razoavelmente considerar que influenciavam a sua apreciação na realização da avaliação 3.

Por outro lado, o Tribunal entende que considerar que o CUR devia ter tido em conta uma aparência de falta de objetividade ou de imparcialidade do gabinete avaliador devido às suas ligações com o Banco Santander pressupõe demonstrar que, quando o primeiro considerou, na avaliação 3, que os acionistas e credores afetados não teriam beneficiado de um tratamento mais favorável no âmbito de um processo normal de insolvência pretendia favorecer a resolução. Além disso, mesmo admitindo que o gabinete avaliador tivesse concluído, na avaliação 3, que os acionistas e credores afetados teriam beneficiado de melhor tratamento em caso de liquidação do Banco Popular, a indemnização que daí pudesse resultar seria paga pelo FUR e não pelo Banco Santander.

Além disso, o Tribunal Geral considera que o resultado da avaliação 3 não tem influência na legalidade e na legitimidade da decisão de submeter o Banco Popular a um processo de resolução e no resultado dessa resolução, a saber, a sua venda ao Banco Santander, e que não pode ter como consequência gerar um direito de indemnização dos acionistas e credores afetados por parte do Banco Santander.

O Tribunal Geral conclui que, na medida em que a avaliação 3, fosse qual fosse o seu resultado, não podia afetar a situação do Banco Santander, o gabinete avaliador não podia favorecê‑la. As suas ligações não podem, portanto, suscitar dúvidas legítimas quanto à existência de um eventual juízo antecipado nem levar a uma falta de objetividade ou de imparcialidade do gabinete avaliador. Essas ligações não constituíam uma circunstância suscetível de pôr em causa a sua independência para realizar a avaliação 3 e a sua designação pelo CUR como avaliador independente.

Em terceiro lugar, o Tribunal Geral julga improcedente o fundamento relativo a uma alegada violação do direito de audiência dos acionistas e credores, em particular, na medida em que o CUR lhes impôs que apresentassem os seus comentários num formulário.

A este respeito, em primeiro lugar, recorda que o respeito do direito de audiência deve ser assegurado mesmo na falta de uma regulamentação que preveja expressamente o exercício desse direito e que nem o Regulamento n.° 806/2014 nem a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») preveem um procedimento específico para aplicar o direito de audiência. Assim, a opção do CUR de utilizar um formulário para recolher os comentários dos acionistas e dos credores afetados fazia parte da sua margem de apreciação na organização desse processo, para permitir que os acionistas e credores afetados exercessem o seu direito de audiência, desde que pudessem exercê‑lo de forma efetiva e útil.

Segundo, no caso, o Tribunal Geral observa que o CUR analisou todos os comentários recebidos e explicou, na decisão recorrida, por que motivo alguns desses comentários eram irrelevantes para efeitos da adoção da decisão recorrida e rejeita o argumento relativo à violação do direito de audiência pelo facto de o CUR ter rejeitado comentários irrelevantes.

Terceiro, observa que, no formulário, as questões estavam redigidas de forma neutra sob a forma de apresentação sucinta do tema em causa e de remissão para as partes da decisão preliminar ou da avaliação 3 visadas, seguida de um convite aos acionistas e aos credores afetados para apresentarem os seus comentários ou os seus pareceres sobre esse tema.

Quarto, o Tribunal rejeita o argumento relativo à limitação da extensão das respostas ao formulário, por ser puramente teórico e não ser suscetível de demonstrar que, sem esse limite, o procedimento poderia ter conduzido a um resultado diferente.

Com efeito, por um lado, os comentários apresentados pelos acionistas e credores afetados no procedimento relativo ao direito de audiência em resposta ao formulário foram objeto de análise detalhada na decisão recorrida e levaram o gabinete avaliador a adotar o documento de clarificação. Assim, embora a extensão dos comentários fosse limitada, o CUR e o gabinete avaliador responderam de forma circunstanciada.

Por outro lado, os recorrentes não indicam que comentários, para além dos que tinham sido formulados e aos quais o CUR e o gabinete avaliador tinham respondido, foram impedidos de apresentar devido à dimensão do formulário. Também não precisam quais seriam os documentos que pretendiam juntar ao formulário.

Em quarto lugar, o Tribunal rejeita como inoperante o fundamento relativo ao facto de a avaliação 3 ter uma base errada no que respeita à situação financeira do Banco Popular no momento da sua resolução.

Com efeito, recorda que a apreciação da diferença de tratamento devia ser efetuada no momento em que o programa de resolução foi adotado. Ora, o relatório pericial do Banco de Espanha de 8 de abril de 2019, em que se baseiam os recorrentes e cuja apresentação se requeria através de uma diligência de instrução, diz respeito a acontecimentos anteriores à resolução do Banco Popular, que eram irrelevantes para a realização da avaliação 3.

Em quinto lugar, o Tribunal Geral julga improcedente o fundamento relativo ao facto de o CUR ter indevidamente delegado no gabinete avaliador os poderes de decisão que lhe são conferidos pelo Regulamento n.° 806/2014.

Primeiro, depois de ter declarado que os recorrentes não deduzem uma exceção de ilegalidade do Regulamento n.° 806/2014 nem alegações relativas ao exercício de um poder discricionário pelo CUR ou à falta de clareza quanto à delimitação das competências deste último nesse regulamento, nem alegações relativas à violação do referido regulamento pelo CUR, na medida em que ele teria agido fora dos poderes que este lhe confere, o Tribunal Geral considera que os argumentos destinados a acusar o CUR de ter conferido um poder decisório ao gabinete avaliador não podem demonstrar uma violação dos princípios relativos à delegação de poderes.

Segundo, o Tribunal Geral lembra que a decisão de não conceder uma indemnização aos acionistas e aos credores afetados foi efetivamente adotada pelo CUR e não pelo gabinete avaliador.

Além disso, de acordo com o Regulamento n.° 806/2014, os aspetos económicos e técnicos da avaliação do tratamento de que os acionistas e credores afetados teriam beneficiado se o Banco Popular tivesse sido objeto de um processo normal de insolvência tinham que ser apreciados por um avaliador independente e não pelo próprio CUR. Assim, o facto de o CUR ter confiado ao gabinete avaliador a realização da avaliação 3 não pode ser interpretado como uma delegação do seu poder de adotar a decisão.

Terceiro, por um lado, à luz do disposto no Regulamento n.° 806/2014, o facto de o CUR ter aprovado as conclusões da avaliação 3 não pode ser interpretado como uma falta de controlo por parte deste do cumprimento das exigências que o avaliador independente tem que cumprir quando realiza a sua avaliação. Por outro lado, resulta do próprio conteúdo da decisão recorrida que o CUR não se limitou a resumir a avaliação 3 e o documento de clarificação, antes tendo analisado a sua validade à luz dos comentários dos acionistas e dos credores afetados.

Em sexto lugar, o Tribunal Geral julga improcedente o fundamento relativo à violação do direito a um recurso efetivo.

Quanto à não‑divulgação de certas informações na versão não confidencial da avaliação 3, anexa à decisão preliminar, o Tribunal refere que o entendimento do CUR de que os dados expurgados relativos às provisões para riscos jurídicos que constam da avaliação 3 estavam abrangidos pelo sigilo profissional e eram confidenciais não é impugnado, tal como não é impugnado o facto de o CUR ter a obrigação de proteger os dados confidenciais (11). Por outro lado, os recorrentes não indicam que esses dados expurgados seriam necessários para a compreensão da decisão recorrida ou para o exercício do seu direito a um recurso jurisdicional efetivo.

Em sétimo lugar, o Tribunal Geral julga improcedente o fundamento relativo à violação do direito de propriedade.

O Tribunal lembra que o Regulamento n.° 806/2014 institui um mecanismo que garante aos acionistas ou aos credores da entidade objeto de uma resolução uma justa indemnização em conformidade com as exigências do artigo 17.°, n.° 1, da Carta.

No caso, não tendo demonstrado que o CUR cometeu um erro manifesto de apreciação ao concluir, com base na avaliação 3, que os acionistas e credores afetados do Banco Popular não teriam tido melhor tratamento no âmbito de um processo normal de insolvência do que no âmbito da resolução, os recorrentes não demonstraram uma violação do seu direito de propriedade resultante da decisão recorrida.

Por outro lado, não se pode validamente alegar que o CUR violou o artigo 17.° da Carta pelo facto de o valor da indemnização a título do princípio de que nenhum credor pode ter pior tratamento foi calculado com base no pior cenário possível para os acionistas, a saber, um processo de liquidação do Banco Popular. Com efeito, a aplicação de um cenário contrafactual de liquidação está em conformidade com as disposições aplicáveis.



1      Regulamento (UE) n.° 806/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de julho de 2014, que estabelece regras e um procedimento uniformes para a resolução de instituições de crédito e de certas empresas de investimento no quadro de um Mecanismo Único de Resolução e de um Fundo Único de Resolução bancária e que altera o Regulamento (UE) n.° 1093/2010 (JO 2014, L 225, p. 1).


2      Em 7 de junho de 2017, o CUR adotou a Decisão SRB/EES/2017/08, relativa a um programa de resolução para o Banco Popular (a seguir «decisão de resolução»).


3      Decisão (UE) 2017/1246 da Comissão, de 7 de junho de 2017, que aprova o programa de resolução para o Banco Popular Español S.A. (JO 2017, L 178, p. 15).


4      Nos termos do artigo 18.°, n.° 1, do Regulamento n.° 806/2014.


5      Nos termos do artigo 20.°, n.os 16 a 18, do Regulamento n.° 806/2014.


6      Nos termos do artigo 76.°, n.° 1, alínea e), do Regulamento n.° 806/2014.


7      Decisão preliminar relativa à eventual necessidade de compensar os acionistas e credores em relação aos quais as medidas de resolução do Banco Popular Español S.A. produziram efeitos e o lançamento do processo de registo para o direito a ser ouvido (SRB/EES/2018/132) (a seguir «decisão preliminar»).


8      Nos termos do artigo 20.°, n.os 16 a 18, do Regulamento n.° 806/20104.


9      Regulamento Delegado (UE) 2018/344 da Comissão, de 14 de novembro de 2017, que complementa a Diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho no que diz respeito às normas técnicas de regulamentação que especificam os critérios relativos às metodologias de avaliação da diferença de tratamento no âmbito da resolução (JO 2018, L 67, p. 3).


10      Nos termos do artigo 41.° do Regulamento Delegado (UE) 2016/1075 da Comissão, de 23 de março de 2016, que complementa a Diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho no que respeita às normas técnicas de regulamentação que especificam o conteúdo dos planos de recuperação, dos planos de resolução e dos planos de resolução de grupos, os critérios mínimos que as autoridades competentes devem avaliar no que respeita aos planos de recuperação e aos planos de recuperação de grupos, as condições para a prestação de apoio financeiro intragrupo, os requisitos para os avaliadores independentes, o reconhecimento contratual dos poderes de redução e de conversão, os procedimentos e teor dos requisitos de notificação e de aviso de suspensão e o funcionamento operacional dos colégios de resolução (JO 2016, L 184, p. 1).


11 Nos termos do artigo 88.°, n.° 5, do Regulamento n.° 806/2014.