DESPACHO DO TRIBUNAL DA FUNÇÃO PÚBLICA DA UNIÃO EUROPEIA

(Terceira Secção)

25 de fevereiro de 2014

Processo F‑118/11

Luigi Marcuccio

contra

Comissão Europeia

«Função pública ― Funcionários ― Decisão da AIPN relativa à aposentação de um funcionário e atribuição de uma pensão de invalidez ― Decisão que não se pronuncia sobre a origem profissional da doença que justificou a aposentação ― Dever de a AIPN reconhecer a origem profissional da doença ― Artigo 78.°, quinto parágrafo, do Estatuto ― Necessidade de convocar uma nova comissão de invalidez ― Pertinência de uma decisão anterior adotada nos termos do artigo 73.° do Estatuto ― Artigo 76.° do Regulamento de Processo ― Recurso em parte manifestamente inadmissível e em parte manifestamente improcedente»

Objeto:      Recurso interposto nos termos do artigo 270.° TFUE, aplicável ao Tratado CEEA por força do seu artigo 106.°‑A, no qual L. Marcuccio pede, designadamente, a anulação da decisão tácita em que a Comissão Europeia indeferiu o seu pedido de adoção de uma decisão de ou relativa ao reconhecimento da origem profissional da doença que levou aquela instituição a aposentar o recorrente por invalidez, e o pagamento de várias indemnizações relativas a prejuízos sofridos e que continuará a sofrer devido à omissão ilegal da Comissão, desde 30 de maio de 2005, de adotar uma decisão de reconhecimento da origem profissional dessa doença.

Decisão:      O recurso é julgado em parte manifestamente inadmissível e em parte manifestamente improcedente. Cada parte suporta as suas próprias despesas.

Sumário

1.      Processo judicial ― Apresentação da contestação ― Prazo ― Reinício de um processo suspenso ― Início da contagem

(Regulamento de Processo do Tribunal da Função Pública, artigos 39.°, n. os 1e 3, 100.°, n.° 3, e 116.°; Estatuto dos Funcionários, artigos 91.°, n.° 4, e 90.°, n.° 2)

2.      Recursos de funcionários ― Recurso relativo à falta de adoção de uma decisão por parte da Administração ― Fundamentos relativos à anulação do indeferimento e à declaração de uma omissão ― Única e mesma via de recurso

(Artigos 263.°, quarto parágrafo, e 265.°, terceiro parágrafo, TFUE; Estatuto dos Funcionários, artigo 90.°, n.os 1 e 2)

3.      Funcionários ― Pensões ― Pensão de invalidez ― Determinação da origem profissional da doença ― Competência da comissão de invalidez

(Estatuto dos Funcionários, artigos 11.°, 73.° e 78.°; anexo VIII, artigo 13.°)

4.      Funcionários ― Decisão lesiva ― Dever de fundamentação ― Alcance ― Fundamentação insuficiente ― Regularização no decurso do processo contencioso ― Requisitos

(Artigo 296.°, segundo parágrafo, TFUE; Estatuto dos Funcionários, artigo 25.°)

5.      Funcionários ― Pensões ― Pensão de invalidez ― Determinação da origem profissional da doença ― Início do processo após a interposição do recurso ― Consequências

(Estatuto dos Funcionários, artigos 73.° e 78.°)

1.      Num processo suspenso nos termos do artigo 91.°, n.° 4, do Estatuto, uma decisão tácita de indeferimento implica o fim da suspensão do processo e a parte recorrida dispõe, nos termos do artigo 39.°, n.° 1, e do artigo 100.°, n.° 3, do Regulamento de Processo do Tribunal da Função Pública, de um prazo de dois meses a partir do fim da suspensão, ao qual acresce um prazo de dilação fixo de dez dias, para apresentar contestação. Sendo esses prazos de ordem pública e, como tal, não estando na disposição das partes nem do Tribunal da Função Pública, o reinício do processo nessas circunstâncias, bem como a contagem do prazo, não dependem de uma informação que deva ser formalmente prestada pelo Tribunal.

Assim, uma carta da parte recorrida, que deve ser considerada uma contestação, apresentada dentro do prazo, e em que se pede que o Tribunal da Função Pública declare que não há que conhecer do mérito, implica a improcedência do pedido do recorrente de que fosse dado provimento ao seu recurso à revelia, nos termos do artigo 116.° do Regulamento de Processo.

(cf. n.os 35 a 38)

Ver:

Tribunal da Função Pública: 14 de novembro de 2006, Villa e o./Parlamento, F‑4/06, n.os 24 e 26, e jurisprudência referida; 23 de abril de 2008, Pickering/Comissão, F‑103/05, n.os 49 e 51; 7 de julho de 2011, Pirri/Comissão, F‑21/11, n.° 14

2.      Os pedidos de anulação relativos, respetivamente, ao artigo 90.°, n.° 1, do Estatuto e ao artigo 90.°, n.° 2, do Estatuto, podem em grande medida ser confundidos, à semelhança do que acontece, no contencioso da legalidade dos atos da União Europeia, com um recurso de anulação de um ato de recusa de adoção de uma decisão nos termos do artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE e um recurso de declaração de abstenção ilegal de uma instituição de adotar tal decisão nos termos do artigo 265.°, terceiro parágrafo, TFUE, constituindo estas duas disposições apenas a expressão de uma única e mesma via de direito.

(cf. n.° 52)

Ver:

Tribunal de Justiça: 18 de novembro de 1970, Chevalley/Comissão, 15/70, n.° 6

3.      No processo de aposentação por invalidez de um funcionário, a autoridade investida do poder de nomeação não pode adotar uma decisão de reconhecimento da origem profissional de uma doença que justificou a aposentação por invalidez sem dispor para tal do parecer da comissão de invalidez constituída para esse efeito e em cuja constituição o funcionário deve colaborar no que respeita quer à designação de um dos médicos que compõem essa comissão quer à apresentação de todos os elementos suscetíveis de serem úteis à comissão para a adoção das apreciações médicas inerentes aos seus trabalhos.

Incumbe também ao funcionário requerer o benefício do artigo 78.°, quinto parágrafo, do Estatuto, e nos casos em que é apresentado um pedido referente à origem profissional da invalidez, cabe, em princípio, à instituição em causa iniciar o processo de reconhecimento da origem profissional. Contudo, a instituição não se pode eximir de uma nova consulta da comissão de invalidez e reconhecer imediatamente, sem nenhuma formalidade, a origem profissional da doença invocada.

Além disso, tendo em conta o facto de os processos nos termos dos artigos 73.° e 78.° poderem legitimamente conduzir a resultados médicos divergentes em relação à mesma situação de facto, designadamente no que respeita à questão da origem profissional da doença que afeta o mesmo funcionário, a autoridade investida do poder de nomeação também não se pode basear nas conclusões de reconhecimento de uma doença profissional nos termos do artigo 73.° do Estatuto, para deferir imediatamente um pedido de reconhecimento, nos termos do artigo 78.°, quinto parágrafo, do Estatuto, de que a doença que justificou a aposentação do interessado por invalidez tem também origem profissional.

Por último, não cabe ao juiz da União substituir‑se à instituição em causa ou à comissão de invalidez para determinar ele próprio, sem que tenha sido iniciado um processo de reconhecimento da origem profissional, se a doença que justificou a decisão de aposentação tem origem profissional.

(cf. n.os 58 a 63, 66 e 68)

Ver:

Tribunal de Justiça: 12 de janeiro de 1983, K/Conselho, 257/81, n.os 11, 12, 14, 15 e 20

Tribunal de Primeira Instância: 27 de fevereiro de 1992, Plug/Comissão, T‑165/89, n.° 67; 14 de maio de 1998, Lucaccioni/Comissão, T‑165/95, n.° 149; 1 de julho de 2008, Comissão/D., T‑262/06 P, n.° 70

Tribunal da Função Pública: 22 de maio de 2007, López Teruel/IHMI, F‑97/06, n.os 48 e 68; 1 de fevereiro de 2008, Labate/Comissão, F‑77/07, n.° 12; 30 de junho de 2011, Marcuccio/Comissão, F‑14/10, n.° 60; 6 de novembro de 2012, Marcuccio/Comissão, F‑41/06 RENV, n.os 98 e 99

4.      A extensão do dever de fundamentação deve, em cada caso, ser apreciada em função das circunstâncias concretas. Uma decisão está suficientemente fundamentada sempre que intervenha num contexto conhecido do funcionário em causa, que lhe permita compreender o alcance da medida tomada a seu respeito.

Em caso de fundamentação insuficiente, os fundamentos apresentados no decurso do processo podem, excecionalmente, privar de objeto um fundamento relativo à violação do dever de fundamentação.

Nessa situação, a Administração pode, no decurso da instância, apresentar fundamentação suplementar suficiente para a sua decisão tácita de indeferimento, em particular quando esta última decisão deve ser apreciada como uma decisão de indeferimento «nesse estado», ou seja, no estado do processo de reconhecimento da origem profissional da doença do recorrente nos termos do artigo 78.° do Estatuto e, enquanto tal, em nada prejudica a decisão a adotar no termo do processo.

(cf. n.os 71 a 73 e 78)

Ver:

Tribunal de Justiça: 26 de novembro de 1981, Michel/Parlamento, 195/80, n.° 22; 27 de março de 1985, Kypreos/Conselho, 12/84, n.° 8; 8 de março de 1988, Sergio e o./Comissão, 64/86, 71/86 a 73/86 e 78/86, n.° 52; 28 de fevereiro de 2008, Neirinck/Comissão, C‑17/07 P, n.os 50 e 51

Tribunal de Primeira Instância: 20 de março de 1991, Pérez‑Mínguez Casariego/Comissão, T‑1/90, n.° 73; 6 de julho de 1995, Ojha/Comissão, T‑36/93, n.° 60; 12 de dezembro de 2002, Morello/Comissão, T‑135/00, n.° 28; 1 de abril de 2004, N/Comissão, T‑198/02, n.° 70; 6 de julho de 2004, Huygens/Comissão, T‑281/01, n.° 105; 15 de setembro de 2005, Casini/Comissão, T‑132/03, n.° 36

Tribunal da Função Pública: 31 de março de 2011, Hecq/Comissão, F‑10/10, n.° 68

5.      Uma acusação relativa ao facto de não ter sido iniciado o processo para reconhecimento da origem profissional da doença do recorrente carece de base factual quando, após a interposição do recurso pelo funcionário em causa, a autoridade investida do poder de nomeação deferiu o seu pedido.

Nessas condições, caberá, por um lado, à autoridade investida do poder de nomeação, antes de se pronunciar, consultar novamente a comissão de invalidez, que terá de verificar se o estado patológico do recorrente apresenta um nexo suficientemente direto com um risco específico e típico, inerente às funções que o recorrente exerceu e, por outro, ao recorrente, no seu interesse de ver a sua situação administrativa esclarecida, colaborar plenamente na convocação de uma comissão de invalidez e no bom funcionamento dos seus trabalhos.

(cf. n.os 81 e 82)

Ver:

Tribunal de Justiça: 12 de julho de 1988, Parlamento/Conselho, 377/87, n.° 10