ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

6 de junho de 2013 (*)

«Agricultura ― Medidas excecionais relativas à introdução de açúcar extraquota no mercado da União e relativas à abertura de um contingente pautal ― Recurso de anulação ― Ato regulamentar de medidas de execução ― Falta de afetação individual ― Inadmissibilidade ― Ação de indemnização»

No processo T‑279/11,

T&L Sugars Ltd, com sede em Londres (Reino Unido),

Sidul Açúcares Unipessoal Lda, com sede em Santa Iria de Azóia (Portugal),

representadas por D. Waelbroeck, advogado, e D. Slater, solicitor,

recorrentes,

contra

Comissão Europeia, representada inicialmente por P. Rossi e A. Demeneix, e em seguida por M. Rossi, Demeneix e N. Donnelly, e por último por P. Rossi e P. Ondrůšek, na qualidade de agentes,

recorrida,

apoiada por:

Conselho da União Europeia, representado por E. Sitbon e A. Westerhof Löfflerová, na qualidade de agentes,

e

República Francesa, representada por G. de Bergues e C. Candat, na qualidade de agentes,

intervenientes,

que tem por objeto, por um lado, um pedido de anulação do Regulamento (UE) n.° 222/2011 da Comissão, de 3 de março de 2011, que estabelece medidas excecionais de introdução no mercado da União de açúcar e de isoglicose extraquota com uma imposição reduzida sobre os excedentes durante a campanha de comercialização de 2010/2011 (JO L 60, p. 6), do Regulamento de Execução (UE) n.° 293/2011 da Comissão, de 23 de março de 2011, que fixa o coeficiente de atribuição, rejeita novos pedidos e encerra o prazo de apresentação de pedidos de quantidades disponíveis de açúcar extraquota para venda no mercado da União com imposição reduzida sobre os excedentes (JO L 79, p. 8), do Regulamento de Execução (UE) n.° 302/2011 da Comissão, de 28 de março de 2011, que abre um contingente pautal para a importação a título excecional de certas quantidades de açúcar na campanha de comercialização de 2010/2011 (JO L 81, p. 8), e do Regulamento de Execução (UE) n.° 393/2011 da Comissão, de 19 de abril de 2011, que fixa os coeficientes de atribuição para a emissão de certificados de importação de produtos do setor do açúcar ao abrigo de determinados contingentes pautais, solicitados entre 1 e 7 de abril de 2011, e suspende a apresentação desses pedidos de certificados (JO L 104, p. 39), e, por outro, um pedido de reparação dos danos sofridos,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção),

composto por: S. Papasavvas, presidente, V. Vadapalas (relator) e K. O’Higgins, juízes,

secretário: S. Spyropoulos, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 17 de janeiro de 2013,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        As recorrentes, T&L Sugars Ltd e Sidul Açúcares, Unipessoal Lda, são empresas de refinação de açúcar de cana estabelecidas na União Europeia. A sua capacidade de produção acumulada representa cerca de metade das necessidades tradicionais de aprovisionamento da indústria da refinação de açúcar de cana da União.

2        A oferta de açúcar no mercado da União inclui o açúcar produzido, por um lado, na transformação de beterraba sacarina produzida na União e, por outro, na refinação de açúcar de cana bruto importado de países terceiros, sendo o produto final quimicamente idêntico nos dois casos. O açúcar de cana bruto proveniente da União, a saber, dos departamentos franceses do Ultramar e dos Açores, representa menos de 2% da produção de açúcar da União.

3        Entre 3 de março e 19 de abril de 2011, a Comissão Europeia adotou certas medidas destinadas a aumentar a oferta de açúcar no mercado da União, no qual se verificava escassez.

4        Estas medidas tinham por objeto, por um lado, permitir que os produtores da União comercializassem uma quantidade limitada de açúcar e de isoglicose, além da quota de produção interna, e, por outro, instituir um contingente pautal que permitisse a qualquer operador económico interessado importar uma quantidade limitada de açúcar beneficiando de uma suspensão de direitos de importação.

5        Essas medidas foram adotadas no âmbito dos seguintes atos (a seguir «regulamentos impugnados»):

─        Regulamento (UE) n.° 222/2011 da Comissão, de 3 de março de 2011, que estabelece medidas excecionais de introdução no mercado da União de açúcar e de isoglicose extraquota com uma imposição reduzida sobre os excedentes durante a campanha de comercialização de 2010/2011 (JO L 60, p. 6);

─        Regulamento de Execução (UE) n.° 293/2011 da Comissão, de 23 de março de 2011, que fixa o coeficiente de atribuição, rejeita novos pedidos e encerra o prazo de apresentação de pedidos de quantidades disponíveis de açúcar extraquota para venda no mercado da União com imposição reduzida sobre os excedentes (JO L 79, p. 8);

─        Regulamento de Execução (UE) n.° 302/2011 da Comissão, de 28 de março de 2011, que abre um contingente pautal para a importação a título excecional de certas quantidades de açúcar na campanha de comercialização de 2010/2011 (JO L 81, p. 8);

─        Regulamento de Execução (UE) n.° 393/2011 da Comissão, de 19 de abril de 2011, que fixa os coeficientes de atribuição para a emissão de certificados de importação de produtos do setor do açúcar ao abrigo de determinados contingentes pautais, solicitados entre 1 e 7 de abril de 2011, e suspende a apresentação desses pedidos de certificados (JO L 104, p. 39).

 Tramitação do processo e pedidos das partes

6        Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 30 de maio de 2011, as recorrentes interpuseram o presente recurso.

7        Por despacho do presidente da Quinta Secção do Tribunal Geral de 20 de outubro de 2011, foram admitidas as intervenções do Conselho da União Europeia e da República Francesa em apoio dos pedidos da Comissão. Tendo as recorrentes pedido o tratamento confidencial relativamente aos intervenientes, a comunicação das peças processuais aos intervenientes foi limitada às versões não confidenciais.

8        Em 26 de outubro de 2011, a Comissão, por requerimento separado, apresentou uma exceção de inadmissibilidade.

9        As sociedades RAR ― Refinarias de Açúcar Reunidas, SA, DAI ― Sociedade de desenvolvimento agroindustrial, SA, Gruppo SFIR SpA e SFIR Raffineria di Brindisi SpA, por um lado, bem como o Comité européen des fabricants de sucre, por outro, pediram para intervir em apoio dos pedidos, respetivamente, das recorrentes e da Comissão. A decisão sobre esses pedidos foi deixada para o momento em que o Tribunal Geral conhecesse da exceção de inadmissibilidade.

10      As recorrentes apresentaram as suas observações sobre a exceção de inadmissibilidade em 13 de janeiro de 2012. O Conselho e a República Francesa apresentaram as suas alegações de intervenção limitadas à questão da admissibilidade do recurso, respetivamente, em 10 e 16 de abril de 2012. A Comissão e as recorrentes apresentaram as suas observações sobre as alegações de intervenção, respetivamente, em 22 de maio e 18 de junho de 2012.

11      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral decidiu dar início à fase oral e, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, colocou questões escritas às partes. Estas responderam às questões nos prazos fixados.

12      Na audiência de 17 de janeiro de 2013, foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal Geral.

13      Na sua petição, as recorrentes concluem pedindo que o Tribunal se digne:

─        anular os regulamentos impugnados;

─        a título subsidiário, declarar ilegais as disposições do artigo 186.°, alínea a), e do artigo 187.° do Regulamento (CE) n.° 1234/2007 do Conselho, de 22 de outubro de 2007, que estabelece uma organização comum dos mercados agrícolas e disposições específicas para certos produtos agrícolas (Regulamento OCM única) (JO L 299, p. 1), e anular os regulamentos impugnados na medida em que têm direta ou indiretamente essas disposições como base jurídica;

─        condenar a União, representada pela Comissão, a reparar os danos sofridos pelas recorrentes pela violação das suas obrigações pela Comissão e fixar o montante da indemnização relativa ao período de 1 de outubro de 2009 a 31 de março de 2011 na quantia de 35 485 746 euros, acrescido dos danos em curso sofridos pelas recorrentes desde essa data, ou fixar outro montante do dano em função da sua evolução ao longo do processo, como vier a ser demonstrado pelas recorrentes;

─        condenar no pagamento de juros sobre o montante exigível, contados da data da prolação do acórdão até pagamento efetivo do montante principal devido, à taxa então fixada pelo Banco Central Europeu para as operações principais de refinanciamento, agravada em dois pontos percentuais, ou a qualquer outra taxa apropriada;

─        condenar a Comissão nas despesas.

14      Por outro lado, resulta dos pontos 174 a 180 da petição que as recorrentes suscitam também, mas «unicamente por precaução» para o caso de o recurso interposto do Regulamento n.° 222/2011 e do Regulamento de execução n.° 302/2011 não ser admitido, uma exceção de ilegalidade desses regulamentos.

15      Nas suas observações quanto à exceção de inadmissibilidade, as recorrentes concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne,

─        quanto ao recurso de anulação:

─        tratar a peça processual apresentada pela Comissão, intitulada «Exceção de inadmissibilidade», como uma contestação e retirar as consequências processuais dessa requalificação;

─        a título subsidiário, julgar inadmissível essa peça processual, por violação do artigo 114.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral;

─        de qualquer forma, julgar improcedente a exceção de inadmissibilidade;

─        julgar admissível e procedente o recurso;

─        a título subsidiário, julgar procedente a exceção de ilegalidade do artigo 186.°, alínea a), e do artigo 187.° do Regulamento n.° 1234/2007 e anular os regulamentos impugnados na medida em que têm direta ou indiretamente essas disposições por base jurídica;

─        condenar a Comissão nas despesas;

─        quanto à ação de indemnização:

─        proferir acórdão à revelia;

─        a título subsidiário, julgar improcedente a exceção de inadmissibilidade;

─        julgar procedente a ação de indemnização, incluindo o pedido de juros sobre a quantia reclamada;

─        condenar a Comissão nas despesas.

16      A Comissão, apoiada pelo Conselho e pela República Francesa, conclui, na exceção de inadmissibilidade, que o Tribunal se digne:

─        julgar o recurso inadmissível;

─        condenar as recorrentes nas despesas.

 Questão de direito

17      Nos termos do artigo 114.°, n.os 1 e 4, do Regulamento de Processo, se uma parte apresentar por requerimento separado um pedido no sentido de o Tribunal decidir da inadmissibilidade, este decide do pedido ou reserva a decisão para final.

18      No caso, o Tribunal decide conhecer da exceção de inadmissibilidade apresentada pela Comissão sem passar ao conhecimento de mérito.

19      Preliminarmente, há que decidir do pedido das recorrentes de que o Tribunal julgue inadmissível a exceção de inadmissibilidade apresentada pela Comissão e julgue a causa à revelia.

 Quanto à admissibilidade da exceção de inadmissibilidade

20      As recorrentes contestam a admissibilidade do pedido apresentado pela Comissão ao abrigo do artigo 114.° do Regulamento de Processo, alegando, por um lado, que esse pedido constitui, na realidade, uma contestação e, por outro, que é inadmissível na medida em que viola o artigo 114.°, n.° 1, do Regulamento de Processo.

21      Nos termos do artigo 114.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, se uma das partes pedir ao Tribunal Geral que se pronuncie sobre a inadmissibilidade antes de conhecer do mérito da causa, deve apresentar o seu pedido em requerimento separado. O requerimento deve conter a exposição dos fundamentos de facto e de direito em que se apoia o pedido e, em anexo, os documentos em apoio.

22      Há que observar que o pedido apresentado no presente caso pela Comissão está inserido numa peça distinta que contém os pedidos da recorrida e a exposição dos seus fundamentos. De resto, esse pedido é intitulado «Exceção de inadmissibilidade» e invoca claramente o artigo 114.° do Regulamento de Processo.

23      Ainda que alguns dos argumentos da Comissão possam respeitar ao mérito da causa, como alegam as recorrentes, isso não é suscetível de afetar o caráter suficiente da exposição dos fundamentos invocados em apoio da inadmissibilidade do recurso.

24      Assim, há que considerar que a exceção de inadmissibilidade preenche os requisitos previstos no artigo 114.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, sendo, portanto, admissível.

 Quanto ao pedido de decisão à revelia

25      As recorrentes alegam que a exceção de inadmissibilidade apresentada pela Comissão respeita unicamente ao recurso de anulação e não à ação de indemnização. Alegam que a Comissão não respondeu à petição no que respeita ao seu pedido de indemnização e convidam o Tribunal a conhecer desse pedido à revelia.

26      A este respeito, há que recordar que o artigo 122.°, n.° 1, do Regulamento de Processo dispõe que, se o demandado não responder à petição na forma e no prazo previstos, o demandante pode pedir ao Tribunal que dê provimento aos seus pedidos.

27      No caso, há que observar que as recorrentes apresentaram uma única petição com um pedido de anulação e um pedido de indemnização.

28      No seu pedido nos termos do artigo 114.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, que foi apresentado na forma e no prazo previstos, a Comissão conclui pela inadmissibilidade do recurso em conjunto.

29      Nestas condições, a instância só pode prosseguir nos termos do artigo 114.°, n.° 4, do Regulamento de Processo se o Tribunal julgar improcedente o pedido da Comissão ou o reservar para a decisão final de mérito.

30      Mesmo admitindo, como alegam as recorrentes, que a Comissão não suscita nenhum argumento relevante no que respeita à inadmissibilidade do pedido de indemnização, essa consideração faz parte da apreciação do mérito do pedido e não pode significar uma falta de resposta à petição na forma prevista.

31      Assim, visto não estarem reunidos os pressupostos previstos no artigo 122.°, n.° 1, do Regulamento de Processo no presente caso, não há que julgar à revelia no pedido de indemnização.

 Quanto à admissibilidade do recurso de anulação

32      Nos termos do artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE, «[q]ualquer pessoa singular ou coletiva pode interpor, nas condições previstas nos primeiro e segundo parágrafos, recursos contra os atos de que seja destinatária ou que lhe digam direta e individualmente respeito, bem como contra os atos regulamentares que lhe digam diretamente respeito e não necessitem de medidas de execução».

33      No caso, as recorrentes baseiam a sua legitimidade para recorrerem dos regulamentos impugnados no facto de estes serem atos regulamentares que lhes dizem diretamente respeito e não necessitarem de medidas de execução ou, a título subsidiário, que lhes dizem direta e individualmente respeito.

34      A Comissão, apoiada pelo Conselho e pela República Francesa, alega que os regulamentos impugnados, não deixando de ser atos regulamentares, não dizem individualmente nem diretamente respeito às recorrentes, além de necessitarem de medidas de execução.

35      O Tribunal entende que se deve analisar primeiro a exceção de os regulamentos impugnados necessitarem de medidas de execução e, em segundo lugar, a da falta de afetação individual.

 Quanto à exceção de os regulamentos impugnados necessitarem de medidas de execução

36      Há que observar que os regulamentos impugnados constituem atos regulamentares na aceção do artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE, visto serem atos de alcance geral não adotados de acordo com o processo legislativo comum ou segundo um processo legislativo especial na aceção do artigo 289.°, n.os 1 a 3, TFUE [v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 25 de outubro de 2011, Microban International e Microban (Europe)/Comissão, T‑262/10, Colet., p. II‑7697, n.° 21]. Este ponto não é, aliás, discutido entre as partes.

37      Quanto à questão de saber se os regulamentos impugnados necessitam de medidas de execução, na aceção do artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE, há que recordar que os atos em causa têm por objetivo, por um lado, permitir que os produtores da União comercializem uma quantidade limitada de açúcar e de isoglicose extraquota e, por outro lado, instituir um contingente pautal que permita a qualquer operador económico interessado importar uma quantidade limitada de açúcar beneficiando da suspensão dos direitos de importação.

38      Por um lado, quanto à introdução no mercado de açúcar extraquota, o Regulamento n.° 222/2011 permite a comercialização de 500 000 toneladas de açúcar, expressas em equivalente de açúcar branco, e de 26 000 toneladas de isoglicose extraquota e com imposição nula, em vez da imposição de 500 euros/tonelada normalmente aplicável ao açúcar excedentário.

39      O artigo 2.°, n.° 4, do Regulamento n.° 222/2011 dispõe que, para beneficiarem dessa quantidade excecional, os produtores devem pedir certificados às autoridades nacionais competentes do Estado‑Membro em que foram aprovados. Nos termos do artigo 4.° deste regulamento, essas autoridades pronunciam‑se sobre a admissibilidade dos pedidos à luz dos critérios previstos no mesmo regulamento e seguidamente notificam a Comissão dos pedidos admissíveis.

40      Resulta dos artigos 5.° e 6.° do Regulamento n.° 222/2011 que, uma vez superada a quantidade prevista para o açúcar extraquota, a Comissão fixa um coeficiente de atribuição, que os Estados‑Membros aplicam às quantidades abrangidas por cada pedido de certificado que tenha sido comunicado, rejeita os pedidos que ainda não tenham sido comunicados e encerra o prazo de apresentação de pedidos. Semanalmente, as autoridades nacionais emitem certificados que conferem o direito a uma redução da imposição, nos pedidos notificados à Comissão na semana anterior, segundo o modelo do certificado anexo ao regulamento.

41      Nos termos do artigo 1.° do Regulamento de execução n.° 293/2011, a Comissão fixou em 67,106224% o coeficiente de atribuição a aplicar pelas autoridades nacionais aos pedidos apresentados entre 14 e 18 de março de 2011 e notificados à Comissão. Além disso, indeferiu os pedidos posteriores e encerrou o prazo de apresentação de pedidos.

42      Por outro lado, quanto ao contingente pautal de importação excecional, o Regulamento de execução n.° 302/2011 dispõe que os direitos de importação são suspensos entre 1 de abril de 2011 e 30 de setembro de 2011, relativamente a uma quantidade de 300 000 toneladas de açúcar.

43      Quanto à gestão desse contingente, o Regulamento de execução n.° 302/2011 remete para o Regulamento (CE) n.° 891/2009 da Comissão, de 25 de setembro de 2009, relativo à abertura e modo de gestão de determinados contingentes pautais comunitários no setor do açúcar (JO L 254, p. 82), que, por sua vez, faz referência ao Regulamento (CE) n.° 1301/2006 da Comissão, de 31 de agosto de 2006, que estabelece normas comuns aplicáveis à administração de contingentes pautais de importação de produtos agrícolas, regidos por regimes de certificados de importação (JO L 238, p. 13), e ao Regulamento (CE) n.° 376/2008 da Comissão, de 23 de abril de 2008, que estabelece normas comuns de execução do regime de certificados de importação, de exportação e de prefixação para os produtos agrícolas (Versão codificada) (JO L 114, p. 3).

44      Nos termos dos artigos 5.° e 6.° do Regulamento n.° 1301/2006 e do artigo 12.° do Regulamento n.° 376/2008, no âmbito da gestão dos contingentes, as autoridades nacionais recebem os pedidos de certificado de importação e verificam o respeito das condições de admissibilidade. Seguidamente, nos termos dos artigos 7.° e 11.° do Regulamento n.° 1301/2006 e dos artigos 8.° e 9.° do Regulamento n.° 891/2009, notificam a Comissão dos pedidos recebidos, passam os certificados de importação aos operadores e informam a Comissão das quantidades atribuídas.

45      O Regulamento de execução n.° 393/2011 define o coeficiente de atribuição, que é de 1,8053%, para os pedidos de certificado de importação apresentados entre 1 e 7 de abril de 2011, relativamente aos quais tenha sido superada a quantidade disponível, e suspende a apresentação de novos pedidos até ao final da campanha de comercialização de 2010/2011.

46      À luz destas observações, há que observar que, para lhes ser concedido o direito de comercializar ou importar açúcar beneficiando dos regimes excecionais previstos nos regulamentos impugnados, os operadores económicos interessados devem previamente apresentar um pedido às autoridades nacionais.

47      Além disso, os certificados que dão direito à redução da imposição e os certificados de importação são passados pelas autoridades nacionais, que aplicam, a esse respeito, os coeficientes de atribuição determinados pelos Regulamentos de execução n.os 293/2011 e 393/2011.

48      Daí resulta que os regulamentos impugnados, tanto os relativos
à comercialização do açúcar extraquota como os relativos ao contingente pautal, não podem produzir os seus efeitos jurídicos relativamente aos operadores em causa sem a intermediação de medidas prévias tomadas pelas autoridades nacionais.

49      Resulta ainda dos regulamentos impugnados que as medidas tomadas a nível nacional são de natureza decisória, uma vez que as autoridades nacionais, nos termos do artigo 2.°, n.° 4, do Regulamento n.° 222/2011, podem impor certas condições formais aos requerentes, nos termos do artigo 4.°, n.° 1, do Regulamento n.° 222/2011 e do artigo 6.° do Regulamento n.° 1301/2006, podem pronunciar‑se sobre a admissibilidade dos pedidos e, nos termos do artigo 6.° do Regulamento n.° 222/2011 e do artigo 7.° do Regulamento n.° 1301/2006, passar os certificados que dão direito à redução da imposição e os certificados de importação.

50      Os regulamentos impugnados assentam, assim, em decisões individuais tomadas a nível nacional, sem as quais não podem afetar a posição jurídica das pessoas singulares e coletivas em causa.

51      Assim, esses regulamentos não podem ser qualificados de atos que não necessitam de medidas de execução na aceção do artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE.

52      Isso não é posto em causa pelo argumento das recorrentes que invocam o objetivo prosseguido pelo artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE e salientam o facto de as autoridades nacionais não disporem de nenhuma margem de apreciação na execução dos regulamentos impugnados, sendo o seu papel «puramente mecânico», isto é, o de uma simples «caixa postal».

53      Resulta da jurisprudência do Tribunal Geral que a questão de saber se o ato regulamentar impugnado deixa ou não um poder de apreciação às autoridades nacionais encarregadas das medidas de execução não é relevante para determinar se necessita de medidas de execução na aceção do artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE (despachos do Tribunal Geral de 4 de junho de 2012, Hüttenwerke Krupp Mannesmann e o./Comissão, T‑379/11, não publicado na Coletânea, n.° 51, e Eurofer/Comissão, T‑381/11, n.° 59).

54      Embora, invocando o acórdão Microban International e Microban (Europe)/Comissão, já referido, as recorrentes aleguem que as medidas de execução em causa não são «verdadeiras», mas unicamente «acessórias», refira‑se que as circunstâncias do acórdão invocado são diferentes das do presente caso.

55      Com efeito, no acórdão Microban International e Microban (Europe)/Comissão, já referido (n.° 29), o Tribunal referiu que a proibição de comercialização da substância química em causa tinha caráter automático e obrigatório a partir de uma data precisa, mesmo embora os Estados‑Membros dispusessem da faculdade de adotar medidas de execução durante um período transitório. Assim, uma vez que o período transitório previsto no ato impugnado era acessório relativamente à proibição cuja legalidade era o objeto do litígio, as medidas de execução ao longo desse período não eram tidas em conta na análise da legitimidade para agir contra a proibição.

56      Pelo contrário, no presente caso, os regulamentos impugnados, na medida em que preveem o direito de comercializar ou importar açúcar em condições particularmente favoráveis, não têm caráter automático, antes exigem a adoção de medidas nacionais que permitam a produção de efeitos jurídicos para os particulares.

57      Assim, a solução a que se refere o acórdão Microban International e Microban (Europe)/Comissão, já referido (n.° 29), não é transponível para as condições do presente caso.

58      Em seguida, quanto ao objetivo prosseguido pelo artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE, há que recordar que é nomeadamente o de permitir a uma pessoa singular ou coletiva recorrer dos atos regulamentares que lhe digam diretamente respeito e não necessitem de medidas de execução, assim evitando os casos em que essa pessoa tenha de violar a lei para ter acesso aos tribunais (v., neste sentido, despacho Eurofer, já referido, n.° 60).

59      Esta disposição põe assim em prática o direito a uma proteção jurisdicional efetiva garantido pelo artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (JO 2010, C 83, p. 389).

60      No caso, as recorrentes não alegam ter de violar a lei para terem acesso aos tribunais. Indicam, porém, que a possibilidade de recorrerem das medidas nacionais tomadas no âmbito da execução dos regulamentos impugnados continua, quanto a elas, pelo menos incerta.

61      Alegam que, no direito português, os «simples atos de execução», como as decisões da autoridade nacional de emissão de certificados, não estão sujeitos a impugnação, a menos que estejam feridos de uma ilegalidade diferente da relativa ao ato de base. Segundo as recorrentes, o direito português não permite, portanto, invocar a ilegalidade do ato da União através da impugnação do certificado passado pelas autoridades nacionais.

62      Além disso, as recorrentes alegam que não podem impugnar a nível nacional as medidas tomadas em execução dos Regulamentos n.os 222/2011 e 293/2011, que se dirigem unicamente aos produtores de açúcar da União. Trata‑se de certificados passados a terceiros, não publicados e com dados confidenciais, não estando as recorrentes em condições de saberem da sua existência nem de tomarem conhecimento do seu conteúdo e, assim, de os impugnarem.

63      A Comissão, interrogada sobre essa questão pelo Tribunal, indicando embora não lhe poder dar uma resposta definitiva, entende que as recorrentes provavelmente não teriam legitimidade para impugnarem as medidas de execução adotadas pelos Estados‑Membros para transporem os Regulamentos n.os 222/2011 e 293/2011, uma vez que as medidas em causa não lhes dizem respeito nem lhes são dirigidas, e, portanto, provavelmente não poderiam demonstrar suficiente interesse em agir. Acrescenta, porém, que a questão de saber se os tribunais de um Estado‑Membro reconhecem ou não a legitimidade a uma pessoa pelo facto de esta não poder demonstrar suficiente interesse não é relevante para apreciar a admissibilidade de um recurso à luz dos pressupostos do artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE.

64      A República Francesa alega, a esse respeito, que, para os tribunais administrativos franceses, as medidas adotadas pelas autoridades nacionais em aplicação dos regulamentos impugnados têm caráter decisório e constituem, assim, atos recorríveis. Observa, aliás, quanto ao interesse em agir das pessoas não destinatárias de uma decisão, que o interesse em agir dos eventuais recorrentes é amplamente admitido pelos tribunais administrativos franceses, por exemplo, quando um operador económico impugna uma decisão que beneficia um concorrente.

65      A respeito dessa discussão, refira‑se que, no presente caso, não se pode determinar com segurança que as recorrentes dispõem de um meio processual que lhes permita impugnar as medidas tomadas pelas autoridades nacionais no âmbito da execução dos regulamentos impugnados.

66      Por um lado, ao contrário de certos outros domínios, como no da regulamentação aduaneira (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 9 de julho de 2008, Trubowest Handel e Makarov/Conselho e Comissão, T‑429/04, não publicado na Coletânea, n.° 43), esse meio processual a nível nacional não está expressamente previsto no direito derivado da União.

67      Por outro lado, quanto aos meios processuais previstos no direito nacional, as observações das partes vão no sentido de indicar que os direitos dos Estados‑Membros divergem quanto à possibilidade de interpor um recurso que permita impugnar os regulamentos impugnados.

68      A este respeito, há que recordar que o artigo 19.°, n.° 1, segundo parágrafo, TUE dispõe que os Estados‑Membros estabelecem as vias de recurso necessárias para assegurar uma tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União.

69      Contudo, a aplicação pelo Tribunal Geral do pressuposto relativo à inexistência de medidas de execução, conforme prevista no artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE, não pode estar sujeita à existência de um meio processual efetivo em causa no interior dos sistemas jurídicos dos Estados‑Membros, que permita pôr em causa a validade do ato da União impugnado.

70      Com efeito, esse regime exigiria em cada caso concreto que o juiz da União analisasse e interpretasse o direito processual nacional, o que excederia a sua competência no âmbito da fiscalização da legalidade dos atos da União (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 25 de julho de 2002, Unión de Pequeños Agricultores/Conselho, C‑50/00 P, Colet., p. I‑6677, n.° 43, e de 1 de abril de 2004, Comissão/Jégo‑Quéré, C‑263/02 P, Colet., p. I‑3425, n.° 33).

71      Esta conclusão não é, aliás, posta em causa pela argumentação das recorrentes, que invocam o direito à tutela jurisdicional efetiva e que alegam que manifestamente um meio processual a nível nacional não é efetivo, uma vez que os tribunais dos Estados‑Membros não têm competência para declararem a ilegalidade do ato da União.

72      Com efeito, o juiz da União não pode, sem exceder as suas competências, interpretar as condições em que um particular pode impugnar em juízo um regulamento, de uma forma que leve a afastar‑se das condições em causa expressamente previstas no Tratado, mesmo à luz do princípio da tutela jurisdicional efetiva (v., neste sentido, acórdãos Unión de Pequeños Agricultores/Conselho, já referido, n.° 44, e Comissão/Jégo‑Quéré, já referido, n.° 36).

73      À luz de todas estas considerações, há que julgar procedente a exceção relativa ao facto de os regulamentos impugnados não constituírem atos regulamentares que não necessitam de medidas de execução na aceção do artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE.

 Quanto à exceção de falta de afetação individual

74      A Comissão alega que os regulamentos impugnados são atos de alcance geral que não dizem individualmente respeito às recorrentes.

75      As recorrentes alegam que, «pelo menos», o Regulamento de execução n.° 393/2011 que fixa o coeficiente de atribuição no que respeita ao contingente pautal relativo à importação de açúcar com imposição nula lhes diz individualmente respeito.

76      Segundo jurisprudência assente, para um ato de alcance geral dizer individualmente respeito a uma pessoa singular ou coletiva, deve atingi‑la devido a certas características específicas dessa pessoa ou devido a uma situação de facto que a caracterize relativamente a qualquer outra pessoa e, por isso, a individualize de forma análoga à de um destinatário (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 15 de julho de 1963, Plaumann/Comissão, 25/62, Colet. 1962‑1964, pp. 279, 284, e Unión de Pequeños Agricultores/Conselho, já referido, n.° 36).

77      No caso, há que observar que os regulamentos impugnados produzem efeitos jurídicos sobre categorias de pessoas previstas de forma geral e abstrata, uma vez que se aplicam respetivamente a todos os produtores de açúcar da União e a todos os importadores de açúcar, sem individualizar as recorrentes de qualquer forma.

78      Quanto aos Regulamentos n.os 222/2011, 293/2011 e 302/2011, as recorrentes não apresentam nenhum argumento suscetível de demonstrar que estes as atingem individualmente.

79      Quanto ao Regulamento de execução n.° 393/2011, alegam que este afeta uma categoria fechada de operadores, uma vez que define um coeficiente de atribuição a fim de permitir a distribuição do contingente pautal unicamente entre os importadores que tenham apresentado os seus pedidos entre 1 e 7 de abril de 2011. Entendem que o número de pessoas em causa foi, assim, fixado no momento da sua adoção.

80      Há que observar que o Regulamento de execução n.° 393/2011, adotado em 19 de abril de 2011, fixa o coeficiente de atribuição aplicável unicamente aos pedidos de certificados apresentados entre 1 e 7 de abril de 2011.

81      Esse regulamento diz, assim, respeito a um número de operadores económicos determinado no momento da sua adoção e que não pode ser alargado. De resto, é pacífico que as recorrentes apresentaram os seus pedidos entre essas duas datas e fazem parte do grupo de operadores em causa.

82      A este respeito, há que recordar que, quando um ato recorrido afeta um grupo de pessoas que são identificadas ou identificáveis no momento em que é adotado e em função de critérios específicos dos membros do grupo, esse ato pode dizer individualmente respeito a essas pessoas na medida em que façam parte de um círculo restrito de operadores económicos (acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de junho de 2006, Bélgica e Forum 187/Comissão, C‑182/03 e C‑217/03, Colet., p. I‑5479, n.° 60; v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 26 de junho de 1990, Sofrimport/Comissão, C‑152/88, Colet., p. I‑2477, n.° 11).

83      Não é menos verdade que a simples possibilidade de determinar, no momento da adoção da medida impugnada, com maior ou menor precisão, o número ou mesmo a identidade dos sujeitos de direito a quem se aplica uma medida em nada implica que se deva considerar que essa medida diz individualmente respeito a esses sujeitos, na medida em que esteja assente que essa aplicação se efetua por força de uma situação objetiva de direito ou de facto definida pelo ato em causa (despachos do Tribunal de Justiça de 21 de junho de 1993, Chiquita Banana e o./Conselho, C‑276/93, Colet., p. I‑3345, n.° 8, e de 28 de junho de 2001, Eridania e o./Conselho, C‑352/99 P, Colet., p. I‑5037, n.° 59).

84      Em particular, uma vez que o círculo restrito resulta da própria natureza do regime instituído pela regulamentação impugnada, a pertença a esse círculo não pode individualizar a pessoa em causa (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal Geral de 10 de julho de 1996, Weber/Comissão, T‑482/93, Colet., p. II‑609, n.os 65 e 66, e de 7 de novembro de 1996, Roquette Frères/Conselho, T‑298/94, Colet., p. II‑1531, n.os 41 e 43).

85      No caso, a fixação de um coeficiente de atribuição está prevista no artigo 7.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1301/2006, no caso de as quantidades a que se referem os pedidos de certificados excederem as quantidades disponíveis para o contingente pautal. Resulta do método de cálculo previsto nessa disposição que o coeficiente é resultado da quantidade disponível e da quantidade pedida, sem ter em conta o conteúdo dos pedidos individuais ou a situação específica dos requerentes.

86      Assim, o Regulamento de execução n.° 393/2011 fixa o coeficiente de atribuição único, a fim de distribuir a quantidade limitada prevista no contingente pautal entre todos os operadores que apresentaram um pedido de importação.

87      Por conseguinte, este regulamento afeta a posição jurídica dos requerentes em razão de uma situação de direito e de facto determinada objetivamente.

88      Por outro lado, a adoção de um coeficiente único que permita repartir a quantidade disponível não teria sido possível sem conhecer o número total de pedidos validamente apresentados. Assim, a apresentação dos pedidos tinha necessariamente de ser suspensa antes da adoção do regulamento impugnado, uma vez que a criação do círculo restrito resultava, assim, da própria natureza do regime instituído pelo Regulamento n.° 302/2011.

89      Daqui resulta que cada uma das recorrentes é afetada pelo regulamento impugnado em razão da sua qualidade objetiva, enquanto produtor que apresentou um pedido de certificado, e da mesma forma que todos os outros produtores que o fizeram antes da suspensão. Nestas condições, a pertença a um círculo restrito, que resulta, aliás, da própria natureza da regulamentação em causa, não pode individualizar as recorrentes.

90      Por outro lado, embora as recorrentes aleguem que a sua situação é caracterizada atendendo à obrigação de a Comissão ter em conta a sua situação na adoção do regulamento impugnado, refira‑se que a existência dessa obrigação não está demonstrada.

91      Por um lado, o argumento que as recorrentes baseiam nas disposições do artigo 26.°, n.° 2, do Regulamento (CE) n.° 318/2006 do Conselho, de 20 de fevereiro de 2006, que estabelece a organização comum de mercado no setor do açúcar (JO L 58, p. 1), é irrelevante, uma vez que esse regulamento foi revogado pelo Regulamento n.° 1234/2007 e não estava, portanto, em vigor à época dos factos.

92      Por outro lado, embora as recorrentes se refiram igualmente ao artigo 186.°, alínea a), e ao artigo 187.° do Regulamento n.° 1234/2007, que dispõem, respetivamente e nomeadamente, que «a Comissão pode adotar as medidas necessárias [...] no que se refere aos produtos dos setores do açúcar [...], em caso de subida ou descida sensível dos preços de qualquer desses produtos no mercado comunitário» e que «pode, designadamente, suspender os direitos de importação, no todo ou em parte, para certas quantidades», há que observar que em nada resulta dos termos dessas disposições que a Comissão, na adoção do Regulamento de execução n.° 393/2011, tivesse de tomar em consideração a situação dos refinadores de açúcar de cana nem, a fortiori, das recorrentes.

93      Por último, ao invés do que alegam as recorrentes, o Regulamento n.° 393/2011 também não pode ser considerado um feixe de decisões individuais, uma vez que respeita a um grupo de operadores definido de forma geral, abstraindo do conteúdo dos pedidos individuais e da situação específica de cada um dos requerentes.

94      Assim, há que observar que os regulamentos impugnados e, mais em particular, o Regulamento de execução n.° 393/2011 não dizem individualmente respeito às recorrentes.

95      Em face do exposto, uma vez que os regulamentos impugnados necessitam de medidas de execução e não dizem individualmente respeito às recorrentes, o recurso de anulação desses atos deve ser julgado inadmissível, sem que seja necessário conhecer da exceção de falta de afetação direta.

96      Quanto à exceção de ilegalidade formulada pelas recorrentes, a título subsidiário, contra o artigo 186.°, alínea a), e o artigo 187.° do Regulamento n.° 1234/2007, bem como contra os Regulamentos n.os 222/2011 e 302/2011, há que recordar que a possibilidade de invocar a inaplicabilidade de um ato de alcance geral nos termos do artigo 277.° TFUE não constitui um direito de ação autónomo e não pode ser exercida na falta de um direito de recurso principal (v. despacho do Tribunal Geral de 8 de julho de 1999, Area Cova e o./Conselho, T‑194/95, Colet., p. II‑2271, n.° 78 e jurisprudência aí referida).

97      Assim, uma vez que o recurso de anulação foi julgado inadmissível, a exceção de ilegalidade suscitada em relação com esse recurso deve, consequentemente, ser rejeitada.

 Quanto à admissibilidade da ação de indemnização

98      Resulta da exceção de inadmissibilidade que a Comissão conclui pela inadmissibilidade do recurso na íntegra.

99      Alega, de resto, referindo‑se ao dano alegado pelas recorrentes, que «esses fundamentos não podem ser objeto de recurso ao abrigo do artigo 263.°, quarto parágrafo, […] TFUE, pois o recurso não é admissível».

100    Além disso, na audiência, a Comissão precisou que concluía pela inadmissibilidade do pedido de indemnização, tendo em conta o facto de estar inextricavelmente ligado ao pedido de anulação dos regulamentos impugnados e de, por isso, não ser autónomo.

101    As recorrentes indicam que a ação de indemnização constitui um meio processual autónomo, pelo que a inadmissibilidade do pedido de anulação não pode afetar o seu destino.

102    Há que recordar que a ação de indemnização foi instituída como um meio processual autónomo, com a sua função particular no âmbito do sistema dos meios processuais e sujeita a condições de exercício concebidas com vista ao seu objeto específico (acórdão do Tribunal de Justiça de 2 de dezembro de 1971, Zuckerfabrik Schöppenstedt/Conselho, 5/71, Colet., p. 375, n.° 3), pelo que a declaração de inadmissibilidade do pedido de anulação não leva automaticamente à inadmissibilidade do pedido de indemnização (acórdão do Tribunal de Justiça de 26 de fevereiro de 1986, Krohn Import‑Export/Comissão, 175/84, Colet., p. 753, n.° 32).

103    O limite desse princípio coloca‑se na proibição de desviar o processo. Um demandante não pode, através da ação de indemnização, tentar obter um resultado semelhante ao de uma anulação do ato sendo inadmissível o recurso de anulação desse ato (acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de dezembro de 1966, Schreckenberg/Comissão, 59/65, Recueil, pp. 785, 797, Colet. 1965‑1968, p. 535).

104    Assim, a ação de indemnização pode ser julgada inadmissível quando vise a mesma ilegalidade e pretenda os mesmos fins pecuniários do recurso de anulação cuja interposição em tempo útil o demandante negligenciou (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça, Krohn Import‑Export/Comissão, já referido, n.° 33, e de 14 de setembro de 1999, Comissão/AssiDomän Kraft Products e o., C‑310/97 P, Colet., p. I‑5363, n.° 59).

105    Ora, essa hipótese excecional não se verifica no presente caso, uma vez que as recorrentes não negligenciaram a interposição do recurso de anulação e, de qualquer forma, o seu pedido de indemnização não visa a mesma ilegalidade nem se dirige aos mesmos fins pecuniários do pedido de anulação.

106    Com efeito, por um lado, no âmbito do seu pedido de indemnização, as recorrentes alegam não só a ilegalidade dos regulamentos impugnados mas também a violação dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança legítima, da não discriminação, da proporcionalidade, bem como do dever de diligência e de boa administração a cargo da Comissão.

107    Por outro lado, o seu pedido de indemnização dirige‑se à reparação dos danos constituídos por prejuízos sofridos e por lucros cessantes quer devido à incapacidade de as refinarias satisfazerem as suas necessidades de aprovisionamento quer ao pagamento de direitos de importação. Ora, a reparação desses danos não coincide com os fins pretendidos com o pedido de anulação dos regulamentos impugnados.

108    Nestas condições, a inadmissibilidade do pedido de anulação não pode levar automaticamente à inadmissibilidade do pedido de indemnização.

109    Por outro lado, no que respeita ao pedido de indemnização, a Comissão não suscita nenhuma exceção autónoma.

110    Na medida em que o Conselho alega, nas suas alegações de intervenção, que a inadmissibilidade do pedido de anulação deixa manifestamente sem fundamento o pedido de indemnização, há que referir que a Comissão não concluiu pela improcedência desse pedido. A conclusão autónoma nesse sentido formulada pelo Conselho como interveniente é, portanto, inadmissível.

111    Daqui resulta que a exceção de inadmissibilidade deve ser julgada improcedente na medida em que se refere ao pedido de indemnização.

112    A este respeito, visto serem dois meios processuais autónomos, é possível, ao decidir de uma exceção, declarar a lide parcialmente inadmissível, no que respeita ao pedido de anulação, decidindo embora que subsista no pedido de indemnização (v., neste sentido, despacho do Tribunal de Justiça de 21 de junho de 1993, Van Parijs e o./Conselho e Comissão, C‑257/93, Colet., p. I‑3335, n.os 14 e 15).

113    No caso, há que observar, assim, que a lide subsiste na medida em que se dirige à reparação dos danos sofridos.

 Quanto às despesas

114    Uma vez que a lide subsiste na medida em que se destina à reparação dos danos sofridos, há que reservar para final a decisão quanto às despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

decide:

1)      O recurso é julgado inadmissível na medida em que se dirige à anulação do Regulamento (UE) n.° 222/2011 da Comissão, de 3 de março de 2011, que estabelece medidas excecionais de introdução no mercado da União de açúcar e de isoglicose extraquota com uma imposição reduzida sobre os excedentes durante a campanha de comercialização de 2010/2011, do Regulamento de Execução (UE) n.° 293/2011 da Comissão, de 23 de março de 2011, que fixa o coeficiente de atribuição, rejeita novos pedidos e encerra o prazo de apresentação de pedidos de quantidades disponíveis de açúcar extraquota para venda no mercado da União com imposição reduzida sobre os excedentes, do Regulamento de Execução (UE) n.° 302/2011 da Comissão, de 28 de março de 2011, que abre um contingente pautal para a importação a título excecional de certas quantidades de açúcar na campanha de comercialização de 2010/2011, e do Regulamento de Execução (UE) n.° 393/2011 da Comissão, de 19 de abril de 2011, que fixa os coeficientes de atribuição para a emissão de certificados de importação de produtos do setor do açúcar ao abrigo de determinados contingentes pautais, solicitados entre 1 e 7 de abril de 2011, e suspende a apresentação desses pedidos de certificados.

2)      A exceção de inadmissibilidade é julgada improcedente no que respeita ao pedido de reparação dos danos sofridos.

3)      Reserva‑se para final a decisão quanto às despesas.

Papasavvas

Vadapalas

O’Higgins

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 6 de junho de 2013.

Assinaturas


* Língua do processo: inglês.