DIVISÃO DE IMPRENSA E INFORMAÇÃO

COMUNICADO DE IMPRENSA N.· 57/97 (1)

30 de Setembro de 1997

Conclusões do advogado-geral Giuseppe Tesauronos processos C-157/96 e C-180/96

The National Farmers' Union e o. / The Ministry of Agriculture, Fisheries and Food, the Commissioners for Customs and Excise

Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte / Comissão das Comunidades Europeias

O ADVOGADO GERAL G. TESAURO PRONUNCIA-SE SOBRE A QUESTÃO DAS "VACAS LOUCAS"


Na opinião do advogado-geral, é válida a decisão pela qual a Comissão proibiu o Reino Unido de exportar para os outros Estados-Membros e para países terceiros bovinos vivos, carne de bovino e produtos derivados

Factos na origem do litígio

A EEB (encefalopatia espongiforme bovina), doença chamada das "vacas loucas", é uma doença que se caracteriza por uma degenerescência do cérebro, caracterizada pela alteração do tecido cerebral (que fica com um aspecto esponjoso) e pelo aparecimento de uma proteína anómala, o prião. Afecta muitas espécies animais, mas também os seres humanos. A natureza exacta dos agentes infecciosos é desconhecida; considera-se, no estádio actual, que a causa é a utilização na alimentação animal de farinhas de carne e ossos que contêm o agente infeccioso. O primeiro caso de EEB foi identificado em 1986 no Reino Unido. O Reino Unido tinha então adoptado diversas medidas de prevenção e proibido a utilização das proteínas suspeitas na alimentação dos ruminantes, e ainda Ä a partir de Novembro de 1989 Ä a venda ou utilização na alimentação humana de determinadas miudezas especificadas de carne de bovino e das cabeças de bovinos, com exclusão da língua. A Comissão tinha por seu turno imposto, através de uma decisão de 1994, numerosas proibições de exportação de bovinos vivos e de carnes frescas para os outros Estados-Membros e tinha, por outro lado, previsto um sistema de identificação e certificação dos animais.

Em Março de 1996, um organismo científico autónomo, consultor do Governo do Reino Unido, tendo detectado novos casos da doença de Creutzfeldt-Jacob em pessoas jovens e com indícios clínicos atípicos, insistiu na necessidade de se aplicarem as medidas de protecção e controlo e ainda a proibição de utilização de farinhas de carne e ossos de mamíferos como alimento dos animais.

Quase simultaneamente, alguns Estados-Membros encerraram as fronteiras aos bovinos vivos e à carne de bovino proveniente do Reino Unido e alguns países terceiros encerraram as fronteiras aos mesmos produtos, em geral provenientes da União Europeia.

Através da decisão de 27 de Março de 1996, a Comissão impôs finalmente ao Reino Unido a proibição de exportar para os outros Estados-Membros e para países terceiros bovinos vivos e carne de bovino, e ainda vários produtos derivados.

Os dois processos em análise

Foram apresentados ao Tribunal de Justiça dois processos:

O Reino Unido tinha ao mesmo tempo pedido ao Tribunal de Justiça que a execução da decisão fosse suspensa e que fossem concedidas medidas provisórias, mas o Tribunal de Justiça indeferiu esses pedidos em 12 de Julho de 1996.

A função do advogado-geral

Compete ao advogado-geral assistir o Tribunal de Justiça, apresentando conclusões fundamentadas nos processos em análise e sugerindo ao Tribunal de Justiça como resolver as questões apresentadas. Actua com total imparcialidade e inteira independência; as suas conclusões não são vinculativas para o Tribunal de Justiça.

As conclusões

A competência da Comissão

As directivas 90/425 e 89/662 do Conselho (relativas aos controlos veterinários e ao comércio intracomunitário de animais vivos) dão à Comissão amplos poderes para adoptar as medidas necessárias para impedir riscos graves para os animais e para o homem: a saúde é efectivamente um objectivo prioritário, que justifica eventualmente limitações à livre circulação de mercadorias e que é considerado uma componente importante da política agrícola comum. A gravidade da EEB e o perigo da sua transmissão ao homem é uma hipótese real, que legitima a decisão. A proibição de exportação para países terceiros, não excluída pela directiva, é um instrumento indispensável para garantir o efeito útil da decisão, isto é, para evitar Ä através de um isolamento absoluto da zona Ä que a proibição de exportar para os Estados-Membros seja frustrada por uma "passagem" através de países terceiros. Os rigorosos controlos das importações do Reino Unido revelaram-se, de resto, uma medida insuficiente.

A fundamentação da decisão

A obrigação de fundamentar os actos é consagrada pelo artigo 190.· do Tratado: o objectivo é esclarecer a lógica da adopção de um acto, dar a conhecer aos interessados as razões da adopção da medida e permitir ao Tribunal de Justiça exercer a sua fiscalização. As eventuais censuras de falta de fundamento devem ser feitas de outra forma.

A Comissão (como se descreve no quinto considerando) pretendeu evitar o risco de transmissibilidade da doença e as preocupações a isso atinentes, propagadas entre os consumidores: a fundamentação é portanto suficiente.

O princípio da proporcionalidade

O Reino Unido sustenta que as medidas nacionais e comunitárias já anteriormente adoptadas seriam suficientes para garantir a protecção da saúde.

De um ponto de vista concreto, observa-se que se verificaram novas e graves circunstâncias de facto, que levaram o próprio Reino Unido a adoptar medidas adicionais.

Além disso, não existindo provas científicas irrefutáveis, o Tribunal de Justiça não tem elementos para apreciar a proporcionalidade da medida. Por outro lado, a Comissão, apoiada por organismos científicos, dispõe de uma suficiente margem de discricionaridade. Portanto, só o carácter manifestamente não adequado de uma medida pode torná-la ilegal; mas, tendo em conta as incertezas científicas e a inexistência de controlos nacionais, e ainda a urgência do caso, a decisão da Comissão não pode ser considerada manifestamente desproporcionada. A proibição absoluta de exportação para todos os países terceiros é necessária para garantir o efeito útil de todas as outras medidas. As outras soluções sugeridas pelas partes não são de qualquer modo susceptíveis de evitar o risco de fraudes ou de reimportações. Em especial, a inexistência de sistemas gerais de identificação não permite determinar se cada um dos bovinos pode ter sido contaminado pela alimentação ou pelo contacto com outros animais.

O princípio da não discriminação e os objectivos da política agrícola comum

Este princípio, que deriva do princípio geral da igualdade, impõe que não se trate de modo diferente situações análogas, a menos que a diferença de tratamento se justifique objectivamente. No que diz respeito aos produtores britânicos, o facto de 97,9% dos casos de EEB na Europa se terem verificado no Reino Unido é uma razão objectiva para os sujeitar a um tratamento diferente relativamente aos dos outros Estados-Membros. Em contrapartida, no que diz respeito aos consumidores britânicos, é necessário reconhecer que, de qualquer forma, a base jurídica da decisão não admitia uma proibição de comercialização de carnes nacionais no Reino Unido, o que exigiria, por outro lado, controlos de custo elevadíssimo. Além disso, apesar de entre os objectivos fundamentais da política agrícola comum figurarem o da estabilização dos mercados e o de assegurar preços razoáveis, a protecção da saúde constitui uma exigência primordial e imprescindível em relação a todas as políticas comunitárias.

A proibição de exportação de "produtos derivados"

Trata-se dos produtos que entram na cadeia alimentar e dos produtos utilizados na indústria farmacêutica e cosmética. O Reino Unido sustentou que estes produtos não estão definidos de modo claro, que não existia uma fundamentação adequada quanto a este aspecto e que a Comissão não podia proibir a sua exportação, porque as normas do Tratado não o permitem. Na realidade, os considerandos da decisão explicitam a fundamentação, esclarecendo que todos os produtos derivados, susceptíveis de criar um risco, estão abrangidos pela proibição. Além disso, a decisão é dirigida especificamente ao Reino Unido, que, tendo em conta o seu profundo conhecimento da situação, não podia ignorar quais os produtos abrangidos pela decisão.

Para outras informações queira dirigir-se a Milagros Gallego, tel. (352) 4303.3442; fax (352) 4303.2500

(1) Este comunicado existe em todas as línguas oficiais.