A atividade judiciária

A | O Tribunal de Justiça em 2023
B | O Tribunal Geral em 2023
C | Jurisprudência em 2023

 
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A | O Tribunal de Justiça em 2023

O Tribunal de Justiça pode principalmente ser chamado a conhecer de:

  • Pedidos de decisão prejudicial

Quando um juiz nacional tem dúvidas sobre a interpretação ou a validade de uma norma da União, suspende a instância no tribunal nacional e submete a questão ao Tribunal de Justiça. Depois de esclarecido pela decisão proferida pelo Tribunal de Justiça, o juiz nacional pode resolver o litígio que lhe foi submetido. Nos processos que requerem uma resposta num prazo muito curto (por exemplo, em matéria de asilo, de controlo nas fronteiras, de rapto de crianças, etc.), está prevista uma tramitação prejudicial urgentePPU»);

  • Ações e recursos diretos, que visam:
    • obter a anulação de um ato da União («recurso de anulação») ou
    • obter a declaração do incumprimento do direito da União por um Estado-Membro («ação por incumprimento»). Se o Estado-Membro não der execução ao acórdão que declarou o incumprimento, numa segunda ação, denominada ação por «duplo incumprimento», o Tribunal de Justiça pode aplicar-lhe uma sanção pecuniária;
  • Recursos das decisões proferidas pelo Tribunal Geral, na sequência dos quais o Tribunal de Justiça pode anular a decisão do Tribunal Geral;
  • Pedidos de parecer sobre a compatibilidade com os Tratados de um projeto de acordo que a União pretenda celebrar com um Estado terceiro ou uma organização internacional (apresentados por um Estado-Membro ou por uma instituição europeia).

Atividade e evolução do Tribunal de Justiça

Os últimos meses do ano 2023 ficaram marcados pelas negociações relativas ao pedido legislativo que, em novembro de 2022, o Tribunal de Justiça enviou ao Parlamento Europeu e ao Conselho, para, por um lado, transferir para o Tribunal Geral a competência prejudicial do Tribunal de Justiça em seis matérias específicas (imposto sobre o valor acrescentado, impostos especiais sobre o consumo, Código Aduaneiro, classificação pautal de mercadorias na Nomenclatura Combinada, indemnização e assistência de passageiros, bem como o sistema de troca de quotas de emissão de gases com efeito de estufa) e, por outro, alargar o âmbito de aplicação do mecanismo, que entrou em vigor em maio de 2019, de recebimento prévio dos recursos de decisões do Tribunal Geral interpostos no Tribunal de Justiça. Este pedido legislativo tem por objetivo permitir assegurar, atento o interesse dos sujeitos de direito a uma justiça de qualidade proferida dentro de prazos razoáveis, um melhor equilíbrio do volume de trabalho entre o Tribunal de Justiça e o Tribunal Geral, sendo este último composto, desde julho de 2022, por dois juízes por Estado-Membro (ou seja, um total de 54).

O Tribunal de Justiça poderá assim concentrar-se ainda mais nas suas missões centrais de jurisdição constitucional e suprema da União. À semelhança dos últimos anos, o contencioso entrado no Tribunal de Justiça, através da via prejudicial ou de ações ou recursos diretos (nomeadamente ações por incumprimento), tem com efeito sido marcado por temas sensíveis, que em regra mobilizam a Grande Secção, como sejam a preservação dos valores do Estado de direito no contexto das reformas judiciais nacionais, a política de asilo e de imigração, a proteção dos dados pessoais e a aplicação das regras da concorrência na era do digital, a luta contra as discriminações ou ainda os desafios ambientais, energéticos ou climáticos.

No que se refere à transferência parcial da competência prejudicial para o Tribunal Geral, esta assentará em dois princípios de base, ditados por considerações de segurança jurídica, de celeridade e de transparência: o princípio do «balcão único», segundo o qual qualquer pedido de decisão prejudicial deverá sempre ser dirigido ao Tribunal de Justiça, que determinará se um processo prejudicial diz, ou não, exclusivamente respeito a uma ou a várias das matérias específicas acima referidas, e o princípio de uma transferência integral de todos os processos prejudiciais que digam exclusivamente respeito a uma ou a outra destas matérias específicas. Se, em contrapartida, o processo não disser exclusivamente respeito a esta, se suscitar nomeadamente questões independentes de interpretação do direito primário ou da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, esse processo será tratado pelo Tribunal de Justiça.

A transferência de um processo prejudicial para o Tribunal Geral não afetará contudo a faculdade de este último remeter o processo prejudicial ao Tribunal de Justiça se entender que a resposta impõe que seja proferida uma decisão de princípio, nem a possibilidade de o Tribunal de Justiça proceder, a título excecional, a um reexame da decisão proferida pelo Tribunal Geral no caso de ser seriamente afetada a unidade ou a coerência do Direito da União.

Depois de vários meses de exame e de negociações, foi alcançado um acordo político sobre este pedido legislativo em dezembro de 2023. No âmbito deste acordo, ficou nomeadamente previsto que as alegações ou as observações escritas apresentadas por uma parte que participou no processo prejudicial serão publicadas no sítio Internet do Tribunal de Justiça num prazo razoável após o encerramento do processo, salvo se essa parte se opuser a essa publicação.

No momento em que estas linhas são escritas, o calendário concreto da adoção formal das alterações do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e a data da entrada em vigor destas alterações não são ainda conhecidos de modo definitivo, sendo ainda muitos os trabalhos que têm de ser levados a cabo, no que se refere concretamente à alteração dos Regulamentos de Processo do Tribunal de Justiça e do Tribunal Geral imposta pela aplicação desta reforma. Esta aprovação de princípio abre no entanto a porta a uma redefinição dos contornos do funcionamento das jurisdições da União nos próximos anos.

No plano da sua composição, verificaram-se alterações no Tribunal de Justiça em 2023, na sequência da partida do advogado-geral Giovanni Pitruzzella, no seguimento da sua nomeação como juiz no Tribunal Constitucional italiano.

No que se refere às estatísticas do ano transato, estas traduzem, novamente, o elevado nível das atividades do Tribunal de Justiça dos últimos anos. Assim, em 2023, deram entrada no Tribunal de Justiça 821 processos, ou seja, mais alguns processos do que em 2022, e foram findos 783 processos, ou seja, um número muito semelhante ao dos três últimos anos. A duração média dos processos, independentemente da natureza dos processos, ascendeu a 16,1 meses e o número de processos pendentes em 31 de dezembro 2023 era de 1 149 processos.

Koen Lenaerts

Presidente do Tribunal de Justiça da União Europeia

 
821
processos entrados
518
reenvios prejudiciais dos quais:
2
PPU
Principais Estados‑Membros de origem dos pedidos:
Alemanha
94
Bulgária
51
Polónia
48
Itália
43
Roménia
40
60
ações e recursos diretos dos quais:
49
ações por incumprimento
3
ações por «duplo incumprimento»
231
recursos de decisões do Tribunal Geral
8
pedidos de assistência judiciária
Uma parte no processo que esteja impossibilitada de fazer face aos encargos da instância pode pedir para beneficiar de assistência judiciária.
 
783
processos findos
532
reenvios prejudiciais dos quais
4
PPU
36
ações e recursos diretos dos quais
18
incumprimentos declarados contra
13
Estados‑Membros
3
ações por «duplo incumprimento»
201
recursos de decisões do Tribunal Geral dos quais
37
anulam a decisão do Tribunal Geral
Duração média dos processos:
16,1 meses
Duração média dos processos
prejudiciais urgentes:
4,3 meses
 
1 149
processos pendentes em 31 de dezembro de 2023
Principais matérias tratadas:
Auxílios de Estado e concorrência
143
Espaço de liberdade, segurança e justiça
118
Aproximação das legislações
88
Fiscalidade
83
Proteção dos consumidores
76
Transportes
63
Ambiente
51
Princípios do direito da União
50
Política social
47
Propriedade intelectual
47

Membros do Tribunal de Justiça

O Tribunal de Justiça é composto por 27 juízes e 11 advogados-gerais.

Os juízes e os advogados-gerais são designados de comum acordo pelos Governos dos Estados‑Membros, após consulta de um comité encarregado de dar um parecer sobre a adequação dos candidatos propostos ao exercício das funções em causa. Os seus mandatos são de seis anos, renováveis.

São escolhidos de entre pessoas que ofereçam todas as garantias de independência e possuam a capacidade requerida para o exercício, nos respetivos países, de altas funções jurisdicionais ou que tenham reconhecida competência.

Os juízes exercem as suas funções com toda a imparcialidade e independência.

Os juízes do Tribunal de Justiça elegem, entre si, o presidente e o vice-presidente. Os juízes e os advogados-gerais nomeiam o secretário para um mandato de seis anos.

Compete aos advogados-gerais apresentar, com total imparcialidade e independência, um parecer jurídico denominado «Conclusões» nos processos que lhes sejam submetidos. Este parecer não é vinculativo, mas fornece uma perspetiva complementar sobre o objeto do litígio.

Em 2023, não foi nomeado nenhum novo membro no Tribunal de Justiça.

K. Lenaerts

Presidente

L. Bay Larsen

Vice-Presidente

A. Arabadjiev

Presidente da Primeira Secção

A. Prechal

Presidente da Segunda Secção

K. Jürimäe

Presidente da Terceira Secção

C. Lycourgos

Presidente da Quarta Secção

E. Regan

Presidente da Quinta Secção

M. Szpunar

Primeiro Advogado‑Geral

T. von Danwitz

Presidente da Sexta Secção

F. Biltgen

Presidente da Sétima Secção

N. J. Cardoso da Silva Piçarra

Presidente da Oitava Secção

Z. Csehi

Presidente da Décima Secção

O. Spineanu‑Matei

Presidente da Nona Secção

J. Kokott

Advogada‑Geral

M. Ilešič

Juiz

J.-C. Bonichot

Juiz

M. Safjan

Juiz

S. Rodin

Juiz

M. Campos

Advogado-Geral

P. G. Xuereb

Juiz

L. S. Rossi

Juíza

I. Jarukaitis

Juiz

P. Pikamäe

Advogado-Geral

A. Kumin

Juiz

N. Jääskinen

Juiz

N. Wahl

Juiz

J. Richard de la Tour

Advogado-Geral

A. Rantos

Advogado-Geral

I. Ziemele

Juíza

J. Passer

Juiz

D. Gratsias

Juiz

M. L. Arastey Sahún

Juíza

A. M. Collins

Advogado-Geral

M. Gavalec

Juiz

N. Emiliou

Advogado-Geral

T. Ćapeta

Advogada-Geral

L. Medina

Advogada-Geral

A. Calot Escobar

Secretário

Ordem protocolar a partir de 15/11/2023

B | O Tribunal Geral em 2023

O Tribunal Geral pode, principalmente, ser chamado a conhecer, em primeira instância, das ações e recursos diretos iniciados pelas pessoas singulares ou coletivas (indivíduos, sociedades, associações, etc.), quando lhes digam individual e diretamente respeito, e pelos Estados‑Membros contra os atos das instituições, órgãos ou organismos da União Europeia, bem como das ações e recursos diretos destinados a obter a reparação dos prejuízos causados pelas instituições ou pelos seus agentes.

Grande parte do seu contencioso é de natureza económica: propriedade intelectual (marcas, desenhos e modelos da União Europeia), concorrência, auxílios de Estado e supervisão bancária e financeira.

O Tribunal Geral é igualmente competente para decidir em matéria de função pública sobre os litígios entre a União Europeia e os seus agentes.

As decisões do Tribunal Geral podem ser objeto de recurso para o Tribunal de Justiça, limitado às questões de direito. Nos processos que já beneficiaram de uma dupla apreciação (por uma câmara de recurso independente e, depois, pelo Tribunal Geral), o Tribunal de Justiça só recebe o recurso se este suscitar uma questão importante para a unidade, a coerência ou o desenvolvimento do direito da União.

Atividade e evolução do Tribunal Geral

Marc van der Woude

Presidente do Tribunal Geral

No decurso do ano de 2023, a reforma do Tribunal Geral que prevê a duplicação do número dos seus juízes (Regulamento 2015/2422) produziu plenamente os efeitos pretendidos. As estatísticas judiciárias da jurisdição comprovam isto mesmo. O Tribunal Geral encerrou 904 processos e deram entrada 868 processos (não estando neste número contabilizados 404 processos idênticos que deram entrada no final do ano), tendo-se assim reduzido o número de processos pendentes. Por outro lado, a duração média dos processos manteve-se num nível satisfatório: 18,2 meses em média, o que é um indicador de uma gestão eficaz dos processos.

Em simultâneo, o Tribunal Geral consolidou a sua prática que consiste em remeter mais processos para secções alargadas. Em 2023, 13,6 % dos processos findos foram decididos pelas secções alargadas e não menos de 120 processos foram remetidos a estas secções. O Tribunal Geral já não hesita em remeter alguns processos de importância excecional para a sua Grande Secção, composta de 15 juízes. Em especial, foi nesta formação solene que o Tribunal Geral proferiu o Acórdão no processo Venezuela/Conselho respeitante a medidas restritivas aprovadas pelo Conselho da União Europeia contra empresas e nacionais venezuelanos (T-65/18 RENV; v. capítulo «Retrospetiva sobre os Grandes Acórdãos do Ano»). Também foram remetidos para a Grande Secção quatro processos intentados pelas quatro organizações europeias de juízes relativos ao Plano Nacional de Retoma e de Resiliência polaco (T-530/22 a T-533/22), e dois processos respeitantes às medidas restritivas implementadas pela União Europeia contra a Rússia devido à guerra na Ucrânia (processos T-635/22 e T-644/22).

Estes resultados satisfatórios ficam parcialmente a dever-se à estabilidade da composição da jurisdição. Com efeito, em 2023, só dois juízes deixaram de exercer as suas funções, a saber, os juízes S. Frimodt Nielsen e V. Valančius, que foram respetivamente substituídos pelo juiz S. L. Kalėda e pela juíza L. Spangsberg Grønfeldt. Aproveito esta oportunidade para agradecer aos dois a contribuição que deram para a boa administração da justiça da União. Em 2023, assistimos também à cessação de funções do secretário E. Coulon, depois de 18 anos de bons e leais serviços, bem como à chegada do seu sucessor, V. Di Bucci. Por ocasião da partida de E. Coulon, foi organizado um colóquio dedicado ao direito processual da União, que serviu de palco para homenagens e intervenções de alto nível.

Ao longo de todo o ano de 2023, o Tribunal Geral prosseguiu o seu processo de modernização, nomeadamente para melhorar o tratamento dos processos mais volumosos e complexos. Estes processos, que em regra dizem respeito ao direito económico e financeiro, merecem que lhes seja dedicada uma abordagem proativa e adaptada, tanto ao nível da atribuição de recursos como no âmbito da planificação do trabalho. Esta abordagem, à qual os representantes das partes serão associados, permitirá reduzir a duração da instância e responder de forma mais específica às expectativas das partes.

Além disso, para responder plenamente às expectativas legítimas dos sujeitos de direito na perspetiva de uma transferência parcial da competência prejudicial para certas áreas específicas e da extensão do mecanismo de recebimento prévio dos recursos de decisões do Tribunal Geral, este trabalhou ao longo de 2023 para implementar as evoluções necessárias das suas modalidades de organização e das suas futuras regras processuais.

 
1 271 *
processos entrados
1 148
ações e recursos diretos, dos quais:
Propriedade intelectual e industrial
309
Função pública da UE
75
Auxílios de Estado e concorrência
23
13
recursos iniciados pelos Estados‑Membros
65
pedidos de assistência judiciária
Uma parte no processo que esteja impossibilitada de fazer face aos encargos da instância pode pedir para beneficiar de assistência judiciária.
* No final de 2023, deu entrada no Tribunal Geral um conjunto excecional de 404 processos, em substância idênticos, relativos aos direitos adquiridos ou em curso de aquisição para o regime de pensão complementar dos deputados europeus. Estes processos foram apensados. Se forem contabilizados como apenas um único processo, os números brutos são de 868 processos entrados (745 ações e recursos diretos) e 1 438 processos pendentes.

Inovações jurisprudenciais

Savvas S. Papasavvas

Vice-Presidente do Tribunal Geral

O contencioso do Tribunal Geral está em constante evolução. Sob o impulso das ações intentadas e dos recursos interpostos pelos sujeitos de direito, cada acórdão constitui mais um tijolo para o edifício jurisprudencial. O ano de 2023 não constituiu uma exceção à regra e no decurso do ano o Tribunal Geral abordou questões novas em domínios clássicos, ao mesmo tempo que assentou as bases de contencioso em pleno desenvolvimento. O ano de 2023 constituiu também a ocasião para a Grande Secção se reunir para analisar uma questão singular de Política Externa e de Segurança Comum.

O controlo da aplicação das regras da concorrência faz parte do contencioso atribuído ao Tribunal Geral desde a criação deste último. O Tribunal Geral tem assim uma grande experiência neste domínio. Contudo, por o ambiente jurídico estar em constante evolução, nesta matéria como noutras, são constantemente submetidas questões inéditas ao Tribunal Geral. Foi o que sucedeu nomeadamente com o Acórdão de 24 de maio de 2023, Meta Platforms Ireland/Comissão (T-451/20), no qual o Tribunal Geral examinou, pela primeira vez, a legalidade de um pedido de informações através de termos de pesquisa ao abrigo do Regulamento n.º 1/2003, bem como a legalidade de um procedimento de sala de dados virtual para o tratamento de documentos que contêm dados pessoais sensíveis. Estava em causa o Tribunal Geral certificar-se de que a Comissão tinha limitado o seu pedido apenas às informações necessárias para verificar presunções de infrações que justificavam a condução do seu inquérito (v. artigo «Focus»).

De igual modo, por muito clássico e delimitado que possa ser e estar, o regime da responsabilidade extracontratual da União Europeia deu origem a questões interessantes e inéditas. Com efeito, deu entrada no Tribunal Geral uma ação de indemnização dos danos materiais e morais supostamente sofridos pelo International Management Group depois de uma fuga de informação, através da imprensa, de um relatório de investigação do Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF) sobre o seu estatuto jurídico. O demandante invocou a ilegalidade do comportamento da Comissão, com a qual tinha celebrado vários acordos, bem como o do OLAF. Nesta ocasião, num Acórdão de 28 de junho de 2023, IMG/Comissão (T‑752/20), o Tribunal Geral especificou as condições que têm de estar verificadas para se determinar se existiu uma violação suficientemente caracterizada de uma norma jurídica que tem por objeto conferir direitos aos particulares.

No palmarés do contencioso em pleno desenvolvimento, o contencioso dos processos bancários e financeiros ocupa uma boa posição. Mais especificamente, tem sido submetido ao Tribunal Geral um número crescente de recursos que têm origem na criação, em 2014, do Mecanismo Único de Resolução. Este mecanismo prevê um quadro de gestão das crises bancárias para a resolução dos bancos importantes em determinados Estados‑Membros. Baseia-se nomeadamente no Conselho Único de Resolução, que tem por missão preparar e implementar a resolução dos bancos cujo incumprimento é provável ou certo. Em especial, através de vários Acórdãos proferidos em 22 de novembro de 2023, o Tribunal Geral pronunciou-se de forma inédita sobre um pedido de anulação de uma decisão do Conselho Único de Resolução respeitante a uma eventual indemnização dos acionistas e dos credores afetados por uma resolução bancária (processos apensos T‑302/20, T‑303/20 e T‑307/20 Del Valle Ruíz e o./CUR, bem como processos T‑304/20 Molina Fernández/CUR, T‑330/20 ACMO e o./CUR e T‑340/20 Galván Fernández-Guillén/CUR).

Por último, não pode deixar de se assinalar, de entre as novidades jurisprudenciais que marcaram o ano transato, o Acórdão de 13 de setembro de 2023, Venezuela/Conselho (T-65/18 RENV; v. capítulo «Retrospetiva sobre os Grandes Acórdãos do Ano»). Em formação de Grande Secção, o Tribunal Geral pronunciou-se sobre a legalidade de medidas restritivas que visam um Estado terceiro, no caso concreto a Venezuela, devido à constante degradação, neste país, da situação em termos de Democracia, de Estado de direito e de Direitos do Homem. Neste âmbito, o Tribunal Geral foi levado a analisar as delicadas questões do direito a ser ouvido deste Estado terceiro e as pretensas violações do direito internacional invocadas por este.

 
904
processos findos
786
ações e recursos diretos dos quais:
Propriedade intelectual e industrial
278
Auxílios de Estado e concorrência
163
Função pública da UE
66
14
recursos iniciados pelos Estados‑Membros
Duração média dos processos:
18,2 meses
Percentagem de decisões do Tribunal Geral que foram objeto de recurso para o Tribunal de Justiça:
31%
 
1 841
processos pendentes (em 31 de dezembro de 2023)
Principais matérias tratadas:
Direito institucional
543
Propriedade intelectual e industrial
330
Política económica e monetária
238
Auxílios de Estado e concorrência
176
Medidas restritivas
116
Função pública da UE
111
Acesso aos documentos
35
Saúde pública
32
Agricultura
30
Política comercial
29

Membros do Tribunal Geral

O Tribunal Geral é composto por dois juízes por Estado-Membro.

Os juízes são escolhidos de entre pessoas que ofereçam todas as garantias de independência e possuam a capacidade requerida para o exercício de altas funções jurisdicionais. São nomeados de comum acordo pelos Governos dos Estados‑Membros, após consulta de um comité encarregado de dar um parecer sobre a adequação dos candidatos. Os seus mandatos são de seis anos, renováveis. Designam entre si, por um período de três anos, o presidente e o vice-presidente. Nomeiam o secretário para um mandato de seis anos.

Os juízes exercem as suas funções com toda a imparcialidade e independência.

Em junho de 2023, Vittorio Di Bucci foi nomeado secretário do Tribunal Geral.

Em setembro de 2023, dois juízes entraram em funções no Tribunal Geral: Saulius Lukas Kalėda (Lituânia) e Louise Spangsberg Grønfeldt (Dinamarca)

M. van der Woude

Presidente

S. S. Papasavvas

Vice-Presidente

D. Spielmann

Presidente da Primeira Secção

A. Marcoulli

Presidente da Segunda Secção

F. Schalin

Presidente da Terceira Secção

R. da Silva Passos

Presidente da Quarta Secção

J. Svenningsen

Presidente da Quinta Secção

M. J. Costeira

Presidente da Sexta Secção

K. Kowalik‑Bańczyk

Presidente da Sétima Secção

A. Kornezov

Presidente da Oitava Secção

L. Truchot

Presidente da Nona Secção

O. Porchia

Presidente da Décima Secção

M. Jaeger

Juiz

H. Kanninen

Juiz

J. Schwarcz

Juiz

M. Kancheva

Juíza

E. Buttigieg

Juiz

V. Tomljenović

Juíza

S. Gervasoni

Juiz

L. Madise

Juiz

N. Półtorak

Juíza

I. Reine

Juíza

P. Nihoul

Juiz

U. Öberg

Juiz

C. Mac Eochaidh

Juiz

G. De Baere

Juiz

R. Frendo

Juíza

T. R. Pynnä

Juíza

J. C. Laitenberger

Juiz

R. Mastroianni

Juiz

J. Martín y Pérez de Nanclares

Juiz

G. Hesse

Juiz

M. Sampol Pucurull

Juiz

M. Stancu

Juíza

P. Škvařilová-Pelzl

Juíza

I. Nõmm

Juiz

G. Steinfatt

Juíza

R. Norkus

Juiz

T. Perišin

Juíza

D. Petrlík

Juiz

M. Brkan

Juíza

P. Zilgalvis

Juiz

K. Kecsmár

Juiz

I. Gâlea

Juiz

I. Dimitrakopoulos

Juiz

D. Kukovec

Juiz

S. Kingston

Juíza

T. Tóth

Juiz

B. Ricziová

Juíza

E. Tichy‑Fisslberger

Juíza

W. Valasidis

Juiz

S. Verschuur

Juiz

S. L. Kalėda

Juiz

L. Spangsberg Grønfeldt

Juíza

V. Di Bucci

Secretário

Ordem protocolar a partir de 27/09/2023

C | Jurisprudência em 2023

Focus

Interação entre a proteção de dados pessoais e o direito da concorrência

Acórdão Meta Platforms e o. de 4 de julho de 2023 (C‑252/21)

A Autoridade Federal da Concorrência alemã proibiu as sociedades do grupo Meta de subordinarem a utilização da rede social Facebook por parte dos seus utilizadores na Alemanha ao tratamento dos seus dados «off-Facebook» sem obter o respetivo consentimento. Esta autoridade considerou que o tratamento de dados em causa não era conforme com o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD) e constituía assim um abuso de posição dominante por parte do grupo Meta.

O Tribunal de Justiça, chamado a pronunciar-se por um tribunal alemão no âmbito de um processo instaurado pelo grupo Meta contra aquela proibição, declarou que as autoridades da concorrência dos Estados‑Membros podem, no âmbito de uma investigação de um abuso de posição dominante, declarar que existe uma violação do RGPD. No entanto, essas autoridades devem cooperar lealmente com as respetivas autoridades de controlo específicas criadas por este regulamento. Se a conduta investigada já tiver sido objeto de uma decisão das autoridades de controlo ou do Tribunal de Justiça, as autoridades da concorrência ficam vinculadas pelas respetivas apreciações sobre o RGPD.

O Tribunal de Justiça pronunciou-se também sobre a questão de saber se o tratamento de dados ditos «sensíveis», que é em princípio proibido pelo RGPD, pode excecionalmente ser admitido nas situações em que estes dados tenham sido manifestamente tornados públicos pelo respetivo titular. O Tribunal declarou que o simples facto de o utilizador consultar sítios Internet ou aplicações que possam revelar dados sensíveis, como a origem racial ou étnica, as opiniões políticas, as convicções religiosas ou a orientação sexual, não significa que o utilizador torna os seus dados manifestamente públicos, na aceção do RGPD. Sucede o mesmo nos casos em que os utilizadores inserem dados ou ativam botões de seleção integrados, a menos que tenham previamente manifestado de forma expressa a sua escolha de tornar estes dados publicamente acessíveis a um número ilimitado de pessoas.

O facto de o operador da rede social ocupar uma posição dominante não obsta a que os utilizadores possam prestar um consentimento válido e livre ao tratamento dos seus dados. Contudo, uma vez que esta posição dominante é suscetível de afetar a liberdade de escolha dos utilizadores, constitui um elemento importante para determinar se o consentimento foi efetivamente prestado de forma válida. O Tribunal de Justiça esclarece ainda que incumbe ao operador fazer prova de que esse consentimento foi prestado.

RGPD

O Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD) uniformiza e compila o direito da União em matéria de proteção de dados pessoais sob um único regime.

O RGPD prescreve obrigações a todos os organismos, públicos ou privados quando esteja em causa a recolha de dados pessoais no território da União. Os organismos que violem as obrigações do RGPD estão sujeitos a diferentes tipos de sanções.

Na era digital, a União consagra, por intermédio do RGPD, vários direitos a favor dos particulares, como o direito à informação, ao esquecimento, ao acesso ou à eliminação de dados pessoais recolhidos, contribuindo para reforçar a proteção da vida privada dos particulares. Estas regras são consideradas as mais rigorosas ao nível mundial no que respeita à proteção de dados.

Dados «off-Facebook»

A Meta Platforms Ireland gere a oferta em linha da rede social Facebook no espaço da União. Quando se registam no Facebook, os seus utilizadores aceitam as condições gerais estabelecidas por esta sociedade, as quais contêm as políticas de utilização dos dados e das cookies. Segundo estas políticas, a Meta Platforms Ireland recolhe dados relativos às atividades dos utilizadores dentro e fora da rede social e cruza-os com as contas Facebook dos utilizadores em causa. Estes dados, também designados por dados «off-Facebook», referem-se nomeadamente à consulta de páginas Internet e de aplicações terceiras, bem como à utilização dos outros serviços em linha que pertencem ao grupo Meta (entre os quais o Instagram e o WhatsApp). Os dados recolhidos permitem personalizar os anúncios publicitários dirigidos aos utilizadores do Facebook.

Focus

Acórdão European Superleague Company, de 21 de dezembro de 2023 (C‑333/21)

A FIFA e a UEFA são federações internacionais de futebol que supervisionam o futebol profissional na Europa. Adotaram regras que lhes conferem o poder de autorizar as competições europeias de futebol interclubes e de explorar os diferentes direitos de transmissão correspondentes. A UEFA organiza também competições entre clubes europeus, como, por exemplo, a Liga dos Campeões.

Doze clubes de futebol europeus pretenderam lançar um projeto de nova competição de futebol: a Superleague. Este projeto é suscetível de afetar o desenrolar das competições interclubes da UEFA e a exploração dos direitos de transmissão correspondentes. A FIFA e a UEFA opuseram-se ao projeto e ameaçaram aplicar sanções aos clubes e aos jogadores que decidissem participar no mesmo.

A empresa responsável pelo projeto, a European Superleague Company, impugnou as regras da FIFA e da UEFA num tribunal de Madrid, que questionou o Tribunal de Justiça sobre a sua compatibilidade com o direito da União, o qual proíbe os obstáculos à livre concorrência e à livre prestação de serviços.

Na senda da sua jurisprudência «Bosman», o Tribunal de Justiça salientou que a organização das competições desportivas e a exploração dos correspondentes direitos de transmissão constituem atividades económicas abrangidas pelo direito da União.

O Tribunal de Justiça declarou que os poderes de regulamentação, de fiscalização e de sanção de que dispõem a FIFA e a UEFA no que respeita à organização de competições de futebol potencialmente concorrentes, como o projeto Superleague, têm, sob pena de infringir o direito da concorrência da União e a livre prestação de serviços, de ser exercidos de maneira transparente, objetiva, não discriminatória e proporcionada.

Por outro lado, o Tribunal de Justiça considerou que as regras da FIFA e da UEFA relativas à exploração dos direitos de transmissão são suscetíveis de colidir com o direito da concorrência da União se não beneficiarem os outros intervenientes do futebol, assegurando, por exemplo, uma redistribuição solidária das receitas geradas. O Tribunal salientou que essas regras eram passíveis de prejudicar os clubes de futebol europeus, as empresas que operam no mercado da comunicação social, bem como os consumidores e os telespectadores, impedindo-os de usufruir de novas competições potencialmente inovadoras ou interessantes.

Jurisprudência «Bosman»

No seu histórico Acórdão Bosman, de 15 de dezembro de 1995 (C-415/93), o Tribunal de Justiça declarou que a prática de um desporto constitui, regra geral, uma atividade económica abrangida pelo direito da União. Considerou também que a livre circulação de trabalhadores se opõe:

  • às clausulas de nacionalidade adotadas por federações desportivas segundo as quais os clubes desportivos só podem fazer alinhar um número limitado de jogadores profissionais nacionais de outros Estados‑Membros, e
  • às cláusulas de transferência estabelecidas por essas federações, segundo as quais um jogador profissional nacional de um Estado-Membro, no termo do contrato que o vincula a um clube, só pode ser contratado por um clube de outro Estado-Membro se este último pagar uma indemnização ao clube de origem.

O Tribunal de Justiça e o desporto

Desde a prolação do Acórdão Bosman que o Tribunal de Justiça se pronunciou diversas vezes sobre as condições de exercício de um desporto à luz do direito económico da União:

  • as cláusulas de nacionalidade referidas no Acórdão Bosman no que respeita aos desportistas nacionais dos Estados‑Membros também não podem ser aplicadas aos desportistas provenientes de um Estado com o qual a União celebrou um acordo de associação ou de parceria [Acórdãos Deutscher Handballbund, de 8 de maio de 2003 (C-438/00), e Simutenkov, de 12 de abril de 2005 (C-265/03)],
  • a regulamentação antidopagem do Comité Olímpico Internacional está abrangida pelo direito da concorrência da União mas não é contrária ao mesmo porque é necessária para assegurar o bom desenrolar das competições desportivas [Acórdão Meca-Medina and Majcen/Comissão, de 18 de julho de 2006 (C-519/04 P)],
  • os clubes de futebol podem pedir uma indemnização proporcionada às despesas da formação, pelos jovens jogadores que formaram, quando estes jogadores pretendam celebrar o seu primeiro contrato profissional com um clube de outro Estado-Membro [Acórdão Olympique Lyonnais, de 16 de março de 2010 (C-325/08)].

Focus

Proteção dos dados pessoais e combate às infrações em matéria de concorrência entre empresas

Acórdão Meta Platforms Ireland/Comissão de 24 de maio de 2023 (T-451/20)

Poderes de inquérito da Comissão

As regras de concorrência da União Europeia proíbem os acordos entre empresas, as decisões de associações de empresas e as práticas concertadas que sejam suscetíveis de afetar o comércio entre os Estados‑Membros e que tenham por efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado interno [artigo 101.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)]. Estas regras proíbem também as empresas que detêm uma posição dominante num determinado mercado de abusar desta posição, praticando por exemplo preços desleais, limitando a produção ou impedindo o desenvolvimento técnico em detrimento dos consumidores (artigo 102.º TFUE).

O Regulamento da UE n.º 1/2003 desempenha um papel essencial na implementação das regras de concorrência. Atribui à Comissão Europeia amplos poderes de inquérito. A Comissão pode nomeadamente proceder a inspeções e ouvir qualquer pessoa que possa ter informações úteis.

Em 2020, no âmbito de um inquérito relativo a um alegado comportamento anticoncorrencial por parte do grupo Facebook quanto à utilização feita por este dos dados pessoais e à gestão da sua plataforma de rede social, a Comissão solicitou à Meta Platforms Ireland que lhe fornecesse todos os documentos preparados ou recebidos por três dos seus responsáveis e que contivessem um ou vários termos específicos.

Entre estes termos figuravam nomeadamente as expressões «big question» (grande questão), «for free» (gratuitamente), «not good for us» (que nos é desfavorável) e «shut* down» (desligar).

Uma vez que não forneceu estas informações, a Meta estava potencialmente sujeita a uma coima diária de 8 milhões.

A Meta contestou a legalidade deste pedido de informações da Comissão Europeia no Tribunal Geral da União Europeia. No entender da Meta, aqueles termos de pesquisa eram manifesta e excessivamente vagos e gerais e faziam parte de uma «pesca de informações» de grande dimensão.

A Meta apresentou em simultâneo um pedido de medidas provisórias para suspender o pedido da Comissão enquanto aguardava que o Tribunal Geral se pronunciasse quanto ao mérito.

Em 29 de outubro de 2020, o presidente do Tribunal Geral pronunciou-se sobre o pedido de medidas provisórias. Ordenou a suspensão da decisão da Comissão Europeia até à instituição de um procedimento específico para a apresentação dos documentos pedidos que não tivessem ligação com as atividades comerciais da Meta e que contivessem, além disso, dados pessoais sensíveis («documentos protegidos»). Dando seguimento a esse despacho, a Comissão implementou um procedimento de sala de dados virtual para esses documentos protegidos. No âmbito desse procedimento, os documentos só podiam ser juntos ao processo de inquérito depois de terem sido examinados numa sala de dados virtual por um número limitado de membros da equipa de inquérito e pelos advogados da Meta.

Em 24 de maio de 2023, o Tribunal Geral pronunciou-se quanto ao mérito do processo. O Tribunal Geral negou integralmente provimento ao recurso interposto pela Meta.

No seu acórdão, o Tribunal Geral recordou os amplos poderes de investigação da Comissão Europeia para controlar se as empresas respeitam as regras da concorrência. Neste contexto, a utilização de termos de pesquisa específicos pode revelar‑se útil.

META

A Meta é uma empresa multinacional de tecnologia sediada nos Estados Unidos. Além do Instagram e do WhatsApp, um dos seus principais produtos é a rede social Facebook, que permite aos utilizadores registados criar perfis, carregar fotografias e vídeos, enviar mensagens e estabelecer contactos com outras pessoas. A Meta também oferece um serviço de publicidade em linha, denominado Facebook Marketplace, que permite aos utilizadores comprar e vender bens.

Processo de medidas provisórias

Um pedido de medidas provisórias tem por objetivo que seja decretada a suspensão imediata da execução de um ato de uma instituição, enquanto se aguarda pela tramitação do recurso e pela decisão definitiva. Para que esta medida provisória possa ser decretada pelo presidente do Tribunal Geral, é necessário que, à primeira vista, o recurso não se afigure como sendo desprovido de fundamento sério. O requerente deve também demonstrar que, na ausência de suspensão da execução, sofrerá um prejuízo grave e irreparável. Por último, a decisão deve proceder a uma ponderação entre, por um lado, o interesse do requerente e, por outro, os interesses das outras partes e o interesse público.

Em resposta ao argumento da Meta de que um inquérito que utilize termos de pesquisa constituía uma ingerência na vida privada dos trabalhadores em causa, o Tribunal Geral considerou que se tratava de uma medida adequada para alcançar os objetivos de interesse geral, nomeadamente, a manutenção do regime concorrencial pretendido pelos Tratados da União.

A este respeito, o Tribunal Geral sublinhou as medidas de acompanhamento que foram adotadas. Com efeito, os documentos protegidos deviam ser transmitidos à Comissão num suporte eletrónico separado e colocados numa sala de dados virtual. Só podia aceder a esta a um número restrito de membros da equipa responsável pelo inquérito. A seleção dos documentos a juntar ao processo dever-se-ia efetuar na presença dos advogados da Meta. Em caso de desacordo persistente quanto à qualificação de um documento, procedia-se a arbitragem.

Processo T-452/20

Na mesma data, a Comissão adotou, em relação à Meta Platforms Ireland Ltd, um pedido de informações no âmbito do seu inquérito paralelo sobre certas práticas relativas à plataforma Marketplace. O Tribunal Geral negou provimento ao recurso de anulação dessa decisão interposto pela Meta Platforms Ireland Ltd no seu acórdão proferido no mesmo dia no âmbito do processo T-452/20.

A Meta interpôs recursos no Tribunal de Justiça contra os Acórdãos T-451/20 e T-452/20 do Tribunal Geral (processos pendentes C-497/23 P e C-496/23 P).

Focus

Proteção das empresas europeias contra as sanções extraterritoriais dos Estados Unidos

Acórdão IFIC Holding/Comissão de 12 de julho de 2023 (T-8/21)

Efeito extraterritorial de legislação adotada por países terceiros

Verifica-se extraterritorialidade da legislação quando o seu efeito se estende para lá das fronteiras do Estado que a adotou. O Estatuto de Bloqueio da União Europeia [Regulamento (CE) n.º 2271/96 do Conselho] protege os operadores económicos da União contra a aplicação extraterritorial de legislação de países terceiros. A União Europeia adotou este estatuto em 1996 para proteger as empresas europeias cujas atividades comerciais com Cuba, o Irão ou a Líbia eram visadas pelos Estados Unidos.

Em 2018, em resposta à retirada dos EUA do Acordo Nuclear com o Irão, a União atualizou o seu Estatuto de Bloqueio por forma a nele incluir as sanções extraterritoriais novamente reimpostas. Esta medida faz parte do apoio da União à aplicação contínua e integral do Acordo Nuclear iraniano, apoiando nomeadamente as relações comerciais e económicas entre a União e o Irão.

Em 2018, os Estados Unidos retiraram-se do Acordo Nuclear com o Irão, que tem por objeto controlar o programa nuclear iraniano e levantar as sanções económicas contra o Irão. Na sequência dessa retirada, os Estados Unidos voltaram a aplicar sanções ao Irão e a restabelecer uma lista de pessoas cujos bens foram bloqueados. Foi também novamente proibido o comércio com qualquer pessoa ou entidade que figure da lista elaborada pelas autoridades americanas. Esta proibição aplica-se, também, às empresas estabelecidas fora dos Estados Unidos, entre as quais se incluíam empresas europeias.

Em resposta a esta reintrodução de sanções, a União Europeia atualizou a sua lei denominada «Estatuto de Bloqueio» para salvaguardar os interesses das suas empresas. Do mesmo modo, para proteger as empresas europeias dos efeitos da aplicação extraterritorial das sanções americanas, estas foram proibidas de as cumprir, salvo se autorizadas pela Comissão Europeia. É de salientar que esta autorização pode ser concedida quando a inobservância das sanções estrangeiras é suscetível de prejudicar seriamente os interesses da empresa em causa ou os da União.

A IFIC Holding AG é uma sociedade alemã indiretamente detida pelo Estado iraniano que foi adicionada à lista em 2018. Na sequência desta inscrição, a Clearstream Banking AG, único banco depositário de títulos autorizado na Alemanha, interrompeu o pagamento à IFIC dos dividendos que esta recebia de várias sociedades alemãs nas quais detinha participações e bloqueou-os numa conta separada.

A Clearstream, por outro lado, pediu autorização à Comissão para cumprir as sanções americanas no que respeita aos títulos ou aos fundos da IFIC. A Comissão concedeu inicialmente esta autorização em abril de 2020, por um período de 12 meses, tendo-a posteriormente renovado em 2021 e 2022. A IFIC contestou estas decisões interpondo um recurso de anulação no Tribunal Geral.

O Tribunal Geral negou provimento ao recurso interposto pela IFIC, autorizando deste modo a Clearstream Banking AG a cumprir as sanções americanas impostas ao Irão. O Tribunal Geral considerou que embora a Comissão estivesse obrigada a ter em conta os interesses da empresa que pediu a autorização (Clearstream), não estava obrigada a ter em conta os interesses da empresa inscrita na lista (IFIC) nem estava obrigada a explorar alternativas menos restritivas para esta. Também entendeu que os objetivos prosseguidos pela União Europeia no âmbito das sanções extraterritoriais de um país terceiro justificavam a limitação do direito da IFIC a ser ouvida, pela Comissão, durante o processo de decisão que precedeu a adoção da sua autorização.

Recurso de anulação

No âmbito dos recursos de anulação é pedida a anulação dos atos das instituições da União contrários ao direito da União. Desde que verificadas determinadas condições, os Estados‑Membros, as Instituições Europeias e os particulares podem interpor recurso de anulação no Tribunal de Justiça ou no Tribunal Geral. Se o recurso for julgado procedente, o ato é anulado. A instituição em causa deve então providenciar no sentido de colmatar o eventual vazio jurídico criado pela anulação do ato.

Processo Bank Melli Iran (C-124/20)

Neste outro processo, o BMI, um banco do Estado iraniano, invocou o Estatuto de Bloqueio nos tribunais alemães para contestar a aplicação das sanções americanas na Alemanha. O Tribunal de Justiça, chamado pela primeira vez a pronunciar-se no âmbito do Estatuto de Bloqueio da União Europeia, declarou que a proibição, prevista no direito da União, do cumprimento das sanções impostas pelos Estados Unidos contra o Irão pode ser invocada perante os tribunais nacionais no âmbito de uma ação cível.

Retrospetiva sobre os grandes acórdãos do ano

Consumidores


A política europeia dos consumidores visa proteger a saúde, a segurança e os interesses económicos e jurídicos dos consumidores no espaço da União, independentemente do local onde vivam, para o qual se desloquem ou no qual façam as suas compras.


O Tribunal de Justiça: garantir os direitos dos consumidores da União Europeia

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  • Um particular intentou uma ação judicial contra o Grupo Mercedes-Benz por considerar que este lhe causou danos ao ter equipado o seu veículo com um software de programação (denominado dispositivo manipulador) que reduz a taxa de reciclagem dos gases de escape em tempo frio. Na sua opinião, este software de programação tem consequências adversas para o ambiente e é contrário ao direito da União. No direito alemão, em caso de mera negligência, pode ser reconhecido o direito à indemnização quando uma lei destinada a proteger outrem tenha sido violada. Um tribunal alemão perguntou ao Tribunal de Justiça se o direito da União protege os interesses particulares de um comprador individual de tal veículo. O Tribunal de Justiça declarou que o direito da União estabelece um nexo direto entre o fabricante automóvel e o comprador individual de um veículo a motor. Deste modo, o comprador de um veículo a motor equipado com um dispositivo manipulador ilícito beneficia de um direito a indemnização por parte do fabricante automóvel quando o referido dispositivo tenha causado um dano a esse comprador.

    Acórdão Mercedes-Benz Group de 21 de março de 2023 (C-100/21)

  • Um tribunal espanhol pediu ao Tribunal de Justiça que se pronunciasse sobre a compatibilidade com o direito da União de uma regulamentação local relativa aos serviços de aluguer de transporte individual e remunerado de passageiros em veículos descaracterizados da plataforma eletrónica («TVDE») na aglomeração de Barcelona. Esta regulamentação exige às empresas que já dispõem de uma autorização para prestar estes serviços ao nível nacional que obtenham uma licença suplementar para poderem operar na aglomeração de Barcelona. Limita também o número de licenças de serviços de TVDE a um trigésimo das licenças de serviços de táxi concedidas para esta aglomeração. O Tribunal de Justiça declarou que a obtenção de uma licença suplementar à prevista ao nível nacional pode revelar‑se necessária para uma boa gestão do transporte, mas que a limitação do número de licenças de serviços de TVDE constitui uma restrição injustificada à liberdade de estabelecimento e é, por conseguinte, contrária ao direito da União.

    Acórdão Prestige and Limousine de 8 de junho de 2023 (C-50/21)

  • Um ciclista que utilizava uma bicicleta com assistência elétrica na via pública perto de Bruges (Bélgica) foi vítima de um grave acidente e faleceu alguns meses mais tarde. Durante o processo judicial destinado a determinar se existia um eventual direito a indemnização, surgiu um diferendo quanto à questão de saber se uma bicicleta que tenha assistência elétrica deve ser qualificada de «veículo». Esta qualificação (que depende da interpretação de uma diretiva europeia) é crucial para determinar se a vítima era o condutor do «veículo automóvel» ou se podia ter direito a uma indemnização automática na qualidade de «utente mais fraco da via», em conformidade com o direito belga. No seu acórdão, o Tribunal de Justiça considerou que uma bicicleta com assistência elétrica não é abrangida pela obrigação de seguro dos veículos automóveis, porquanto essa bicicleta não é exclusivamente acionada por uma força mecânica. Com efeito, engenhos que não sejam acionados exclusivamente por uma força mecânica, como uma bicicleta com assistência elétrica que pode acelerar até à velocidade de 20 km/hora após um impulso muscular inicial, não parecem suscetíveis de causar a terceiros danos físicos ou materiais comparáveis aos que podem ser causados por motociclos, veículos automóveis, camiões ou outros veículos acionados exclusivamente por uma força mecânica, podendo estes últimos movimentar-se de forma significativamente mais rápida.

    Acórdão KBC Verzekeringen de 12 de outubro de 2023 (C-286/22)

  • A pandemia de Covid-19 conduziu diversos Estados‑Membros, entre eles a Eslováquia, a adotar medidas relativas ao reembolso, pelas agências de viagens, de estadas canceladas por razões sanitárias. Essas regulamentações nacionais permitem que sejam emitidos vales de valor equivalente utilizáveis durante dezoito meses, unicamente reembolsáveis depois de este prazo ter decorrido. Estas iniciativas foram justificadas pelos riscos de insolvência e pelas dificuldades enfrentadas pelos organizadores de viagens. O Tribunal de Justiça declarou que os Estados‑Membros não podem invocar a força maior para derrogar a obrigação de reembolso integral prevista na diretiva «Viagens organizadas». O Tribunal de Justiça considerou que a restituição do montante da viagem tem de se efetuar sob a forma de uma quantia em dinheiro: as agências de viagem não podem oferecer vales de valor equivalente, salvo se o viajante aceitar voluntariamente esta modalidade. Ao ter adotado uma alteração legislativa que privou temporariamente os viajantes dos seus direitos a rescindir um contrato de viagem organizada sem o pagamento de custos e a receber um reembolso integral, a Eslováquia não cumpriu a obrigação que lhe incumbe por força do direito da União.

    Acórdãos UFC -Que Choisir e CLCV (C-407/21) e Comissão/Eslováquia de 8 de junho de 2023 (C-540/21)

Ambiente

A União está empenhada em preservar e melhorar a qualidade do ambiente e em proteger a saúde humana. Baseia-se nos princípios da precaução e da prevenção, bem como no princípio do «poluidor-pagador».


O Tribunal de Justiça e o ambiente

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  • Em 2018, o Tribunal de Justiça declarou que a Roménia tinha de pôr termo à deposição ilegal de resíduos e encerrar 68 aterros não autorizados. Em 2022, por considerar que a Roménia ainda não tinha tomado as medidas necessárias para dar execução ao Acórdão de 2018, a Comissão Europeia intentou uma nova ação por incumprimento. O Tribunal de Justiça constatou que a Roménia ainda mantinha 31 instalações não autorizadas. Por conseguinte, a Roménia foi condenada a pagar 1,5 milhões de euros e 600 euros por dia de atraso e por aterro não autorizado. Para fixar o montante desta coima, o Tribunal de Justiça tomou em consideração a gravidade da infração, a sua duração e a capacidade de pagamento da Roménia. O incumprimento do Acórdão de 2018 acarreta um sério risco de poluição e graves consequências para a saúde humana em razão da libertação nociva de substâncias químicas nocivas nos solos, no ar e na água.

    Acórdão Comissão/Roménia de 14 de dezembro de 2023 (C-109/22)

Dados pessoais

A regulamentação da União Europeia forma um alicerce sólido e coerente para a proteção dos dados pessoais. O tratamento e o armazenamento desses dados devem corresponder aos requisitos de licitude previstos na regulamentação, nomeadamente de se limitar ao estritamente necessário e de não violar de forma desproporcionada o direito à vida privada.


O Tribunal de Justiça no mundo digital

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  • Baseando-se no RGPD, um cidadão pediu à Österreichische Post, que é a principal operadora de serviços postais e logísticos na Áustria, que lhe comunicasse a identidade dos destinatários aos quais este operador tinha divulgado os seus dados pessoais. O Supremo Tribunal austríaco perguntou ao Tribunal de Justiça se o RGPD confere ao titular dos dados o direito de conhecer a identidade efetiva dos destinatários. O Tribunal de Justiça respondeu que, quando os dados pessoais foram ou venham a ser divulgados a destinatários, o responsável pelo tratamento está obrigado a fornecer ao titular dos dados, a seu pedido, a identidade efetiva desses destinatários. Só quando não for (ainda) possível identificar esses destinatários é que o responsável pelo processamento se pode limitar a indicar unicamente as categorias de destinatários em causa. Sucede o mesmo quando o responsável demonstre que o pedido é manifestamente infundado ou excessivo.

    Acórdão Österreichische Post de 12 de janeiro de 2023 (C-154/21)

  • Em 2014, um empregado, que era simultaneamente cliente do Banco Pankki S, teve conhecimento de que os seus dados pessoais tinham sido consultados várias vezes por outros membros do pessoal do banco. Tendo dúvidas sobre a licitude destas consultas, esse empregado, entretanto despedido pelo Pankki S, pediu a este último que lhe comunicasse a identidade das pessoas que consultaram os seus dados, as datas exatas e as razões das consultas. O Pankki S recusou comunicar a identidade dos empregados com o fundamento de que essas informações constituíam dados pessoais desses empregados. Questionado por um tribunal finlandês, o Tribunal de Justiça declarou que qualquer pessoa tem direito de conhecer a data e as razões pelas quais os seus dados pessoais foram consultados e que a circunstância de o responsável pelo tratamento exercer uma atividade bancária não tem impacto neste direito.

    Acórdão Pankki S de 22 de junho de 2023 (C-579/21)

  • Questionado pelo Supremo Tribunal Administrativo da Lituânia, o Tribunal de Justiça declarou que a diretiva «Privacidade e comunicações eletrónicas» se opõe à utilização, no âmbito de inquéritos relativos à corrupção no setor público, de dados resultantes das comunicações eletrónicas que foram conservados pelos prestadores de serviços de comunicações eletrónicas e que, em seguida, foram disponibilizados às autoridades competentes para efeitos de luta contra a criminalidade grave. Além disso, os dados de tráfego e de localização armazenados por prestadores de serviços para efeitos de luta contra a criminalidade grave e disponibilizados às autoridades competentes não podem ser transmitidos a posteriori a outras autoridades para lutar contra erros de serviço que se assemelhem a corrupção.

    Acórdão Lietuvos Respublikos generalinė prokuratūra de 7 de setembro de 2023 (C-162/22)

  • Um paciente pediu à sua dentista que lhe fornecesse gratuitamente uma cópia do seu registo clínico, mas a dentista exigiu, contudo, que o paciente assumisse as despesas relacionadas com o fornecimento dessa cópia. Por considerar que tem direito a uma cópia gratuita, o paciente recorreu aos tribunais alemães. Em resposta à questão prejudicial que lhe foi submetida, o Tribunal de Justiça recordou que o RGPD consagra o direito de o paciente obter uma primeira cópia do seu registo clínico sem que isso implique, em princípio, o pagamento de despesas e que o responsável pelo tratamento só pode exigir o pagamento quando o paciente já tiver recebido gratuitamente uma primeira cópia. Deste modo, um dentista tem a obrigação de fornecer gratuitamente uma primeira cópia dos dados do paciente sem que este último tenha de justificar o seu pedido.

    Acórdão FT (Cópias do registo clínico) de 26 de outubro de 2023 (C-307/22)

Igualdade de tratamento e direito do trabalho

Trabalham na União Europeia mais de 240 milhões de pessoas. Por conseguinte, um grande número de cidadãos beneficia diretamente das disposições do direito do trabalho europeu que estabelece normas mínimas em matéria de condições de trabalho e de emprego, completando assim as políticas instituídas pelos Estados‑Membros.


O Tribunal de Justiça: garantir a igualdade de tratamento e proteger os direitos das minorias

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O Tribunal de Justiça no local de trabalho – Proteger os direitos dos trabalhadores

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  • Questionado por um tribunal polaco, o Tribunal de Justiça recordou que a proteção contra a discriminação, conferida pela Diretiva 2000/78 relativa à igualdade de tratamento no emprego e na atividade profissional, é aplicável a qualquer atividade profissional real e exercida no âmbito de uma relação jurídica estável. Também é aplicável a uma atividade exercida por um trabalhador independente que trabalha com base num contrato de prestação de serviços. A decisão de rescindir e de não renovar um contrato deste tipo coloca um trabalhador independente numa situação comparável à de um trabalhador dependente despedido. Por outro lado, o Tribunal de Justiça sublinhou que a liberdade contratual não pode justificar a recusa de celebrar um contrato com uma pessoa em razão da sua orientação sexual.

    Acórdão TP (Editor Audiovisual para a Televisão Pública) de 12 de janeiro de 2023 (C-356/21)

  • Um piloto alemão trabalhava a tempo parcial para uma companhia aérea e o seu contrato de trabalho previa um vencimento de base que dependia do tempo de serviço de voo. Esse piloto também podia beneficiar de uma remuneração complementar se efetuasse mensalmente um determinado número de horas de serviço de voo e se ultrapassasse determinados limiares fixados no seu contrato. Ora, estes limiares eram idênticos para os pilotos que trabalhassem a tempo inteiro e a tempo parcial. Um tribunal alemão submeteu ao Tribunal de Justiça a questão de saber se as normas nacionais que requerem que um trabalhador a tempo parcial preste o mesmo número de horas de trabalho que um trabalhador a tempo inteiro para obter uma remuneração complementar constituem uma discriminação proibida pelo direito da União. O Tribunal de Justiça respondeu de forma afirmativa, sublinhando que a obtenção de uma remuneração acrescida pelo facto de ser ultrapassado certo número de horas de trabalho não pode desfavorecer o trabalhador a tempo parcial.

    Acórdão Lufthansa CityLine de 19 de outubro de 2023 (C-660/20)

  • Um maquinista de caminho de ferro funcionário da MÁV-START, que é a sociedade ferroviária nacional húngara, contestou a decisão da sua entidade patronal de não lhe conceder um período de descanso diário de pelo menos onze horas ininterruptas. Ao abrigo da diretiva relativa a determinados aspetos da organização do tempo de trabalho, este período de descanso deve ser concedido ao trabalhador após cada período de 24 horas, quando este período anteceda ou se siga a um período de descanso semanal ou um período de férias. O Tribunal de Justiça salienta que os períodos de descanso diário e semanal constituem dois direitos autónomos que prosseguem objetivos distintos. O período de descanso diário não faz parte do período de descanso semanal, acrescendo a este último, ainda que o anteceda diretamente. Por conseguinte, é necessário garantir aos trabalhadores o gozo efetivo de cada um destes direitos.

    Acórdão MÁV-START de 2 de março de 2023 (C-477/21)

Cidadania europeia

Qualquer pessoa que tenha a nacionalidade de um Estado da União é automaticamente cidadão da União Europeia. A cidadania europeia acresce à cidadania nacional e não a substitui. Os cidadãos da União Europeia beneficiam de direitos específicos garantidos pelos Tratados Europeus.

  • A filha de uma mãe dinamarquesa e de um pai americano com dupla nacionalidade dinamarquesa e americana desde o seu nascimento nos Estados Unidos apresentou na Dinamarca, aos 22 anos de idade, um pedido de manutenção da sua nacionalidade dinamarquesa, o que lhe foi recusado pela regulamentação dinamarquesa aplicável. Questionado por um tribunal dinamarquês sobre a compatibilidade desta regulamentação com o direito da União, o Tribunal de Justiça declarou que a Dinamarca pode, em princípio, prever que os seus nacionais que nasceram no estrangeiro e que nunca viveram no seu território percam a nacionalidade dinamarquesa quando completam 22 anos de idade. Todavia, esta medida tem de respeitar o princípio da proporcionalidade quando também implique a perda da cidadania europeia. É o que sucede se a pessoa em causa não tiver a nacionalidade de outro Estado-Membro. Assim, o Direito da União opõe-se à perda definitiva da nacionalidade dinamarquesa e, por conseguinte, da cidadania europeia sem que a pessoa interessada tenha sido informada desse facto, ou sem que tenha tido a possibilidade de pedir uma apreciação individual das consequências dessa perda.

    Acórdão Udlændinge- og Integrationsministeriet de 5 de setembro de 2023 (C-689/21)

Migrações

A União Europeia adotou um conjunto de normas para estabelecer uma política migratória europeia eficaz, humanitária e segura. O Sistema Europeu Comum de Asilo define normas mínimas para o tratamento de todos os requerentes de asilo e dos seus pedidos na União.

  • Dois nacionais sírios, a Sra. X e o Sr. Y, casaram em 2016 na Síria e tiveram dois filhos. Em 2019, o Sr. Y deixou a Síria para ir para a Bélgica, tendo a Sra. X e os dois filhos permanecido na Síria. Em 2022, a administração belga reconheceu ao Sr. Y o estatuto de refugiado na Bélgica. O advogado da Sra. X e dos seus filhos pediu, por correio eletrónico, o reagrupamento familiar para se juntarem ao Sr. Y na Bélgica, indicando que as circunstâncias excecionais no noroeste da Síria os impediam de comparecer num posto diplomático belga para aí apresentarem o pedido. O Serviço de Estrangeiros respondeu que a legislação belga se opõe a que os pedidos sejam apresentados por correio eletrónico e convidou a Sra. X e os seus filhos a contactar a embaixada belga. Questionado por um tribunal belga, o Tribunal de Justiça declarou que a legislação belga que impõe que um pedido de reagrupamento familiar tenha de ser apresentado pessoalmente num posto diplomático é contrária ao direito da União. Não obstante, a regulamentação pode prever a possibilidade de exigir a comparência pessoal numa fase posterior.

    Acórdão Afrin de 18 de abril de 2023 (C-1/23 PPU)

  • A Hungria aprovou uma lei que obrigava as pessoas de países terceiros ou apátridas que se encontravam no seu território ou nas suas fronteiras a dirigirem-se primeiro a uma das suas embaixadas no estrangeiro, na Sérvia ou na Ucrânia, para aí apresentarem uma declaração e obterem uma autorização de entrada no território, antes de aí poderem solicitar a proteção internacional. O Tribunal de Justiça declarou que a Hungria criou entraves injustificados para os requerentes de asilo, contrários aos princípios fundamentais da União, tornando o pedido de asilo excessivamente complexo. A luta contra as doenças contagiosas no contexto da pandemia de Covid-19 não justifica esta medida, uma vez que é desproporcionada em relação ao objetivo prosseguido.

    Acórdão Comissão/Hungria de 22 de junho de 2023 (C-823/21)

Estado de direito

A Carta do Direitos Fundamentais da União Europeia, à semelhança do Tratado da União Europeia, refere-se expressamente ao Estado de direito, que é um dos valores comuns aos Estados‑Membros. A independência e a imparcialidade dos tribunais são elementos essenciais do Estado de direito.


Proteger o Estado de direito na União Europeia

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  • A Comissão contestou a reforma da justiça polaca de dezembro de 2019 no Tribunal de Justiça. Este deu provimento à ação da Comissão, recordando que os Estados‑Membros têm de evitar qualquer regressão, à luz do valor que representa o Estado de direito, da sua legislação em matéria de organização da justiça. O Tribunal de Justiça declarou que é incompatível com o direito da União o facto de os juízes nacionais, que são eles próprios chamados a aplicar o direito da União, correrem o risco de ver as questões relativas ao seu estatuto e ao exercício das suas funções serem decididas por um tribunal que não preenche os requisitos de independência e de imparcialidade. Por outro lado, os juízes nacionais não podem ser impedidos de apreciar se um tribunal ou um juiz preenche os requisitos de uma tutela jurisdicional efetiva decorrentes do direito da União, submetendo, se necessário, questões prejudiciais ao Tribunal de Justiça. Por último, as disposições nacionais que impõem aos juízes a obrigação de indicar se pertencem a uma associação, a uma fundação sem fins lucrativos ou a um partido político, e preveem a publicação em linha dessas informações, são contrárias à proteção dos dados pessoais e ao respeito pela vida privada.

    Acórdão Comissão I Polónia de 5 de junho de 2023 (C-204/21)

Propriedade intelectual

A regulamentação adotada pela União para proteger a propriedade intelectual (direitos de autor) e industrial (direito das marcas, proteção dos desenhos e modelos) melhora a competitividade das empresas ao favorecer um ambiente propício à criatividade e à inovação.


Propriedade intelectual no Tribunal Geral da União Europeia

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  • O Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO) indeferiu o pedido de registo internacional do sinal nominativo «EMMENTALER». A Emmentaler Switzerland contestou esta decisão, a qual foi novamente confirmada pelo EUIPO devido ao caráter descritivo da marca. No seu acórdão, o Tribunal Geral negou provimento ao recurso interposto pela Emmentaler Switzerland, por considerar que o público alemão compreende imediatamente que o sinal «EMMENTALER» designa um tipo de queijo, o que faz dele uma marca descritiva. Com efeito, para que o registo de um sinal seja recusado, é suficiente que este tenha caráter descritivo numa parte da União.O termo «EMMENTALER» não pode assim ser protegido como marca da União Europeia para queijos.

    Acórdão Emmentaler Switzerland / EUIPO (EMMENTALER) de 24 de maio de 2023 (T-2/21)

  • O registo do logótipo do Batman como marca da União Europeia foi contestado no Tribunal Geral por um produtor italiano de vestuário de carnaval. O Tribunal Geral declarou que as provas apresentadas por este não eram suficientes para demonstrar que esta marca, que representa um morcego numa moldura oval, não tinha caráter distintivo. É este caráter distintivo que permite ao público associar os produtos abrangidos pela marca à editora do Batman, a DC Comics, e distingui‑los dos de outras empresas.

    Acórdão Aprile e Commerciale Italiana / EUIPO - DC Comics de 7 de junho de 2023 (T-735/21)

  • Num litígio entre organismos romenos de gestão de direitos de autor e uma companhia aérea, o Tribunal de Justiça declarou que a difusão num meio de transporte de passageiros de uma obra musical para efeitos de utilização como música ambiente constitui uma comunicação ao público na aceção do direito da União. Em contrapartida, a mera instalação, a bordo de um meio de transporte, de um equipamento de difusão sonora e, eventualmente, de um programa informático que permite a difusão de música ambiente não constitui uma comunicação ao público. Por conseguinte, o direito da União opõe-se a uma regulamentação nacional que estabelece uma presunção de que ocorre uma comunicação ao público de obras musicais que se baseia apenas na existência de sistemas de difusão sonora nos meios de transporte.

    Acórdãos Blue Air Aviation e UPFR de 20 de abril de 2023 (processos apensos C-775/21 e C-826/21)

  • Na sequência de um litígio que correu no Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO), relativo ao registo de um sinal tridimensional de uma scooter «Vespa», a Piaggio interpôs recurso no Tribunal Geral. A Piaggio apresentou à EUIPO diversos elementos de prova relevantes, tais como inquéritos de opinião, dados relativos aos volumes de vendas, bem como a presença da «Vespa» no Museum of Modern Art de Nova Iorque, a utilização de scooters «Vespa» em filmes mundialmente famosos como Férias em Roma, ou ainda a existência de clubes «Vespa» em diversos Estados‑Membros. A Piaggio entende que estes elementos confirmam o caráter icónico da «Vespa» e, por conseguinte, o seu reconhecimento global em toda a União. O Tribunal Geral deu razão à Piaggio, afirmando que os elementos de prova demonstraram que através da utilização da marca em toda a União a marca adquiriu caráter distintivo.

    Acórdão Piaggio & C./EUIPO – Zhejiang Zhongneng Industry Group de 29 de novembro de 2023 (T-19/22)

Medidas restritivas e política externa

As medidas restritivas ou «sanções» constituem um instrumento essencial da Política Externa e de Segurança Comum da União Europeia para salvaguardar os seus valores, os seus interesses fundamentais e a sua segurança. As sanções têm como objetivo provocar uma mudança de política ou de comportamento por parte das entidades ou pessoas em causa.

  • A Belaeronavigatsia, empresa estatal bielorrussa responsável pela regulação do espaço aéreo, foi inscrita nas listas de sanções do Conselho da União Europeia devido à responsabilidade que lhe foi imputada por o voo FR4978 ter sido desviado para o aeroporto de Minsk, em 23 de maio de 2021, o que permitiu que dois opositores ao regime que se encontravam a bordo (Raman Pratasevitch e Sofia Sapega) fossem detidos. Interpretando pela primeira vez o conceito de «responsável pela repressão», o Tribunal Geral negou provimento ao recurso interposto pela Belaeronavigatsia por considerar que a empresa estatal não podia ignorar que aquele desvio contribuiria para a repressão da sociedade civil e da oposição democrática na Bielorrússia.

    Acórdão Belaeronavigatsia/Conselho de 17 de fevereiro de 2023 (T-536/21)

  • Em resposta à anexação ilegal da Crimeia e da cidade de Sebastopol pela Rússia em março de 2014, o Conselho da União Europeia adotou, em 17 de março de 2014, uma série de medidas restritivas. Na sequência do início da guerra em grande escala levada a cabo pela Rússia contra a Ucrânia em fevereiro de 2022, o Conselho acrescentou nomes de membros do Governo, de bancos, de empresários e de membros da Assembleia Federal da Federação da Rússia (Duma) às listas de pessoas e entidades abrangidas pelas medidas restritivas. Em especial, o Conselho acrescentou o nome de Violetta Prigozhina, mãe de Yevgeniy Prigozhin, responsável pelo destacamento dos mercenários do Grupo Wagner que combatem pela Rússia na Ucrânia. O Tribunal Geral deu provimento ao pedido de anulação dos atos do Conselho praticados contra Violetta Prigozhina, por entender que a inscrição do seu nome nas listas se baseava unicamente na sua relação familiar com o filho, o que não é suficiente para justificar tais medidas.

    Acórdão Prigozhina/Conselho de 8 de março de 2023 (T-212/22)

  • Perante a deterioração dos direitos humanos, do Estado de direito e da democracia na Venezuela, o Conselho da União Europeia adotou, em 2017, medidas restritivas tendo em conta a situação nesse Estado. Em 2019, o Tribunal Geral negou provimento a um recurso interposto pela Venezuela contra essas medidas, uma vez que estas não afetavam diretamente a situação jurídica deste Estado. Chamado a pronunciar-se em sede de um recurso, o Tribunal de Justiça anulou em 2021 o acórdão do Tribunal Geral e remeteu-lhe o processo para reapreciação. No seu acórdão de 2023, o Tribunal Geral julgou improcedentes todos os fundamentos invocados pela Venezuela para anular as referidas medidas restritivas.

    Acórdão Venezuela/Conselho de 13 de setembro de 2023 (T-65/18 RENV)

  • Roman Arkadyevich Abramovich é um empresário de nacionalidade russa, israelita e portuguesa. É o principal acionista da sociedade-mãe Evraz, que é um dos principais grupos russos no setor siderúrgico e mineiro, bem como um dos maiores contribuintes russos. Na sequência do ataque da Rússia contra a Ucrânia, o Conselho congelou os fundos e proibiu a entrada na União Europeia ou o trânsito de mulheres e de homens de negócios influentes que exercem atividades em setores económicos que fornecem uma fonte significativa de rendimentos ao Governo da Rússia. Roman Arkadyevich Abramovich impugnou no Tribunal Geral a inscrição do seu nome e a respetiva manutenção na lista de medidas restritivas destinadas a exercer maior pressão sobre a Rússia. O Tribunal Geral negou provimento ao recurso interposto por Abramovich e confirmou assim as medidas restritivas adotadas contra este.

    Acórdão Abramovich/Conselho de 20 de dezembro de 2023 (T-313/22)

Política comercial

A política comercial é uma competência exclusiva da UE. A União legisla em matéria de política comercial e celebra acordos comerciais internacionais. O facto de a União agir de forma concertada, expressando-se a uma única voz na cena mundial, coloca-a numa posição de força em matéria de comércio internacional.

  • Em 2020, os Estados Unidos aumentaram os direitos aduaneiros sobre as importações de determinados produtos de alumínio e de aço. A título de resposta, a Comissão adotou um regulamento que aplicou direitos aduaneiros adicionais sobre as importações na União de determinados produtos originários dos Estados Unidos. A Zippo Manufacturing Co., um fabricante americano de isqueiros abrangido por este aumento, impugnou essa medida perante o Tribunal Geral, que anulou o referido regulamento. Segundo o Tribunal Geral, a Comissão não respeitou o direito da Zippo de ser ouvida nem, consequentemente, o princípio da boa administração. A Comissão deveria ter ouvido a Zippo antes de adotar esse aumento, visto que, antes de tal adoção, sabia que o aumento dos direitos aduaneiros afetava principalmente os isqueiros da Zippo.

    Acórdão Zippo Manufacturing e o./Comissão de 18 de outubro de 2023 (T-402/20)

Tax rulings

Os impostos diretos são, em princípio, da competência dos Estados‑Membros. No entanto, têm de respeitar as regras de base da União Europeia, nomeadamente a proibição dos auxílios de Estado. Assim, a União fiscaliza a legalidade das decisões fiscais antecipadas (tax rulings) de certos Estados‑Membros que concedem um tratamento fiscal especial a empresas multinacionais.

  • Através de uma decisão fiscal antecipada (tax ruling) de 2003, as autoridades luxemburguesas aceitaram a proposta do grupo Amazon relativa ao tratamento de uma filial estabelecida no Luxemburgo para efeitos do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas. A Comissão considerou que esse tax ruling constituía um auxílio de Estado incompatível com o mercado interno. Na sequência das ações judiciais do Luxemburgo e da Amazon, o Tribunal Geral anulou a decisão da Comissão por entender que esta não tinha demonstrado que a filial da Amazon tinha beneficiado de uma redução indevida da sua carga fiscal. O Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso interposto pela Comissão contra o acórdão do Tribunal Geral por entender que este determinou erradamente o «sistema de referência» para apreciar a existência de tal auxílio.

    Acórdão Comissão/Amazon.com e o. de 14 de dezembro de 2023 (C-457/21 P)

  • Em 2018, a Comissão constatou que as autoridades fiscais luxemburguesas tinham concedido tax rulings ao grupo Engie, os quais, segundo a Comissão, permitiram a este grupo evitar a tributação dos lucros obtidos pelas filiais do grupo estabelecidas no Luxemburgo. A Comissão considerou que que estas tax rulings constituem auxílios de Estado incompatíveis com o mercado interno. Tendo o Tribunal Geral negado provimento aos seus recursos, o grupo Engie e o Luxemburgo interpuseram recurso no Tribunal de Justiça, o qual declarou que a Comissão cometeu um erro quando determinou o «sistema de referência» para apreciar a seletividade destas medidas fiscais e as qualificou, assim, como auxílios de Estado proibidos.

    Acórdãos Luxemburgo/Comissão e Engie Global LNG Holding e o./Comissão (processos apensos C-451/21 P e C-454/21 P)

Concorrência

A União Europeia garante o cumprimento das normas que protegem a livre concorrência. São proibidas as práticas que têm por objetivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado interno e que podem ser sancionadas através da aplicação de coimas.

  • A Comissão investigou o bloqueio geográfico de determinados jogos de vídeo para PC na plataforma Steam. A Comissão considerou que o operador desta plataforma, a Valve e cinco editoras de jogos (a Bandai, a Capcom, a Focus Home, a Koch Media e a ZeniMax) tinham infringido o direito da concorrência da União. A Comissão acusou a Valve e as cinco editoras de terem participado num conjunto de acordos anticoncorrenciais ou de práticas concertadas. Estas tinham por objetivo restringir as vendas transfronteiriças através da implementação de dispositivos de controlo territorial, em especial nos países bálticos, bem como nalguns países da Europa Central e Oriental. A Valve contestou a decisão da Comissão no Tribunal Geral. O Tribunal Geral negou provimento ao recurso por considerar que a Comissão demonstrou corretamente que existia um acordo entre a Valve e cada uma das cinco editoras destinados a restringir as importações paralelas através do bloqueio geográfico das chaves que permitiam ativar os jogos de vídeo em causa na plataforma Steam. Este bloqueio geográfico destinava-se a impedir que os jogos de vídeo, distribuídos nalguns países a preços baixos, fossem comprados por distribuidores ou por utilizadores que se encontrassem noutros países nos quais os preços são bem mais elevados.

    Acórdão Valve Corporation/Comissão de 27 de setembro de 2023 (T-172/21)

Acesso aos documentos

A transparência da vida pública é um princípio fundamental da União. Qualquer cidadão ou pessoa coletiva da União pode, em princípio, aceder aos documentos das instituições. Todavia, em certos casos, esse acesso pode ser recusado, se tal se justificar.

  • Emilio De Capitani pediu que lhe fosse concedido acesso a determinados documentos trocados no grupo de trabalho «Direito das sociedades» do Conselho da União Europeia relativos ao processo legislativo de alteração da Diretiva 2013/34 relativa às demonstrações financeiras anuais. O Conselho recusou o acesso alegando que a respetiva divulgação poderia prejudicar gravemente o seu processo decisório e por considerar que a natureza das informações era demasiado sensível e técnica para que as mesmas pudessem ser divulgadas. Emilio De Capitani contestou essa decisão no Tribunal Geral. O Tribunal Geral examinou, no âmbito dos processos legislativos da União Europeia, a conciliação dos princípios da publicidade e da transparência com a exceção da divulgação de documentos para proteger o processo decisório. O Tribunal Geral sublinhou que, num sistema baseado no princípio da legitimidade democrática, o legislador tem de responder pelos seus atos perante o público. O exercício pelos cidadãos dos seus direitos democráticos pressupõe a possibilidade de estes seguirem pormenorizadamente o processo decisório das Instituições que participam nos processos legislativos. Por conseguinte, o Tribunal Geral anulou a decisão do Conselho que recusou o acesso aos documentos de trabalho da diretiva.

    Acórdão De Capitani/Conselho de 25 de janeiro de 2023 (T-163/21)

A Direção da Investigação e Documentação propõe aos profissionais do direito, no âmbito da sua Coletânea dos Resumos, uma «Seleção dos grandes acórdãos» e um «Boletim mensal de jurisprudência» do Tribunal de Justiça e do Tribunal Geral.

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